O bigode está de volta à moda, por que tantos homens estão adotando o estilo?


Capaz de evocar desde a masculinidade até a ironia, passando pela alegria sincera da paternidade, esse pequeno pedaço do rosto masculino vive um de seus renascimentos periódicos

Por Shira Telushkin

THE NEW YORK TIMES - LIFE/STYLE - Há cerca de seis meses, Micah Fitzerman-Blue, roteirista em Los Angeles, estava fazendo a barba quando chegou à região entre o nariz e o lábio superior e pensou: “E se eu parar agora?”

Os colegas de quarto Jack Tufts e Joseph Caster no bairro de Bushwick: o bigode está desfrutando um de seus renascimentos periódicos. Foto: Ali Cherkis/The New York Times

“No início, fiquei na dúvida, porque nunca tinha usado só bigode”, disse. Mas, depois de confirmar que sua esposa não se opunha e de perceber como essa parte da barba tinha se tornado comum em seu bairro, Echo Park, adotou o visual. “Fiz 40 anos recentemente e tenho dois filhos pequenos, o que faz com que eu me sinta mais como pai, mas um pai divertido.”

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Ele não está sozinho. O bigode, capaz de evocar desde a masculinidade até a ironia, passando pela alegria sincera da paternidade, vive um de seus renascimentos periódicos. “Outro dia, no metrô, olhei ao redor e outros cinco caras em um raio de um metro usavam bigode”, contou Jimmy Brewer, de 27 anos, ator de Nova York, que deixou o seu crescer enquanto estava de férias, sete meses atrás. Logo depois, conseguiu um papel em um musical da Broadway, “Shucked”, e lhe pediram que não o raspasse até o fim de seu contrato. “Sempre admirei o bigode nos outros, porque parece que quem o usa é mais autoconfiante”, comentou.

Embora seja difícil separar dados sobre o bigode de dados sobre tendências de pelos faciais em geral, o pessoal do setor diz que o aumento é acentuado e recente. Anteriormente domínio de astros pornô, de ícones da contracultura ou do tio antiquado, o bigode está se tornando apenas mais uma opção para os pelos faciais.

Isaiah Campa, tutor em um centro de detenção juvenil. Foto: Ali Cherkis/The New York Times
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As razões são muitas. O bigode é masculino, mas lúdico, em um mundo que valoriza novas formas de lidar com estilos de gênero. Estava prestes a voltar depois de uma década em que todo mundo usava barba, e a quarentena permitiu que muitos o experimentassem e percebessem que gostavam.

“Começou a ganhar muito mais força no ano passado, principalmente depois que Top Gun: Maverick foi lançado. Acho que o bigode hoje ocupa o lugar da barba em 2010. Mas, se acabar tendo poder de permanência, as pessoas que recorreram a ele para chamar a atenção vão começar a procurar outra coisa”, comentou Matty Conrad, que administra várias barbearias em Vancouver, na Colúmbia Britânica, além de um popular canal no YouTube dedicado aos pelos faciais.

Nicky Austin, cabeleireira e maquiadora responsável por manter o icônico bigode de Ted Lasso, atribui a popularidade entre seus clientes em Los Angeles à difusão da cultura da barba, como também a uma nova abertura em relação aos cuidados masculinos. “Conheço homens que vão ao barbeiro todo fim de semana para manter a barba com aparência fresca, o que seria inusitado há 20 anos”, afirmou ela, acrescentando que os calvos muitas vezes veem o bigode como um divisor de águas.

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O bigode se tornou mais comum em espaços queer por volta do fim da década de 2010, especialmente os tipos mais finos que complementavam a estética homoerótica promovida por Tom of Finland, reinante na época. E poderia ter passado em branco se a pandemia não tivesse ocorrido. Durante esse tempo, os homens começaram a fazer a transição da barba para o bigode, e a coisa se espalhou. “A quarentena definitivamente evitou que eu tivesse de lidar com aquela fase intermediária incômoda, que sempre me impediu de deixar crescer o bigode. Tenho 20 e poucos anos, e essa é uma maneira legal de estar na moda enquanto ainda sinto que caminho para uma vida adulta mais madura”, disse Lucas Johnson, professor de inglês em Crown Heights, no Brooklyn, que há dois anos cultiva seu bigode grosso e largo, em estilo Chevron. Ele acrescentou que também aprecia as associações versáteis. “O bigode denota autoridade, mas também sugere certa dose de irreverência. É muito masculino, mas também é muito extravagante e uma discreta espécie de código gay. Todo o espectro de gênero está obcecado com o bigode, assim como eu.”

Tem história

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A popularidade do bigode sempre foi particularmente suscetível aos ícones culturais e às tendências do momento. No início dos anos 1900, era em geral elaborado, como o estilo morsa de Theodore Roosevelt ou com as pontas espetadas do bigode inglês (como o do arquiduque Francisco Ferdinando), irônica e brevemente retomado nos primeiros anos de 2000 por hipsters de suspensórios nos EUA.

Até 1916, os soldados britânicos eram proibidos de raspar o lábio superior, talvez por causa das profundas associações do bigode com a virilidade e a força.

Estilos mais elaborados também eram alvo fácil de zombaria. O bigode de Charlie Chaplin, aquele pequeno quadradinho acima do lábio, foi adotado especificamente por conta de seu apelo humorístico, antes de ser associado a Hitler e perder para sempre seu lugar no ciclo da moda.

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FreddieMercury, vocalista da bandaQueen, pede fogo para acender seu cigarro, durante entrevista coletivana primeira visita do grupo ao Brasil, 19/3/1981. Foto: Mário Leite/Estadão

Depois da década de 1950, tornou-se a marca facial contracultural adotada por uma miríade de grupos considerados subversivos - hippies cabeludos, marxistas, gays. Freddie Mercury tinha um dos bigodes mais icônicos do século.

À medida que a nítida divisão de estilo entre o convencionalismo e a contracultura começou a desaparecer nas décadas de 1970 e 80, o bigode passou a ser associado à bossa masculina e era visto no rosto de Burt Reynolds, Tom Selleck, Sam Elliott e outros. Nem todo mundo conseguia cultivá-lo, o que sempre fez parte de seu charme, mas essas associações hipermasculinas acabaram caindo no exagero, e o bigode foi adotado de forma lúdica na cultura queer. Acabou muito difundido em toda a indústria pornográfica, dando-lhe um toque de degeneração.

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É claro que, em muitos lugares, como no Oriente Médio e no México, o bigode tem um conjunto próprio de associações, e estas foram muitas vezes levadas para os Estados Unidos, dando ao estilo diferentes significados para diferentes grupos. Para os negros americanos, sua evocação de autoridade o tornou particularmente popular entre líderes na era dos direitos civis, incluindo Thurgood Marshall e Martin Luther King Jr., antes de ser deixado de lado nos anos 1970. (Como Wesley Morris detalhou em um ensaio de 2020 no The New York Times, continua sendo uma maneira de se envolver com a identidade negra.)

No fim dos anos 1990, o bigode estava tão fora de moda que poucos pensavam que voltaria. Mas, com o surgimento de inúmeros bigodudos, o estilo lentamente se tornou livre das associações de subcultura que conquistara na década de 1980, levando mais homens a considerá-lo no próprio rosto.

Nick Offerman como Ron Swanson e Amy Poehler como Leslie Knope na série 'Parks and Recreation'. Foto: Ben Cohen/NBC

Atualmente, duas opções se mostraram particularmente populares: o chevron (como o usado por Ron Swanson em Parks and Recreation) e o bigode proeminente cercado por barba rala, conhecido como beardstache (basta pensar em Henry Cavil, The Weeknd ou qualquer estudante de doutorado no Brooklyn). Escolhas mais trabalhadas, incluindo o bigode lápis, o bigode repartido ou o bigode com pontas espetadas, continuam a ser o domínio dos excepcionalmente capazes.

Mas qualquer escolha de estilo que mude significativamente o rosto vai parecer um pouco cômica, um pouco irônica e brincalhona. E, em um mundo que revisita o cerne do que significa masculinidade, essas associações também podem ser bem-vindas.

À medida que o bigode se torna mais popular, muitos homens estão percebendo que sabem muito pouco sobre sua manutenção. Que estilo funciona para seu rosto? Como deve ser aparado? Quanto tempo leva para crescer? “Só porque o cara quer um, não significa que seja necessariamente adequado ao formato de seu rosto, à textura de seu cabelo ou ao padrão de crescimento. O importante é trabalhar com o que você tem”, disse Conrad, o barbeiro de Vancouver. Mas pequenos ajustes podem ter um grande impacto. Segundo ele, a única diferença entre o bigode estilo papai de Ted Lasso e o bigode machão de Burt Reynolds é uma modelagem sutil.

The New York Times Licensing Group - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito do The New York Times

THE NEW YORK TIMES - LIFE/STYLE - Há cerca de seis meses, Micah Fitzerman-Blue, roteirista em Los Angeles, estava fazendo a barba quando chegou à região entre o nariz e o lábio superior e pensou: “E se eu parar agora?”

Os colegas de quarto Jack Tufts e Joseph Caster no bairro de Bushwick: o bigode está desfrutando um de seus renascimentos periódicos. Foto: Ali Cherkis/The New York Times

“No início, fiquei na dúvida, porque nunca tinha usado só bigode”, disse. Mas, depois de confirmar que sua esposa não se opunha e de perceber como essa parte da barba tinha se tornado comum em seu bairro, Echo Park, adotou o visual. “Fiz 40 anos recentemente e tenho dois filhos pequenos, o que faz com que eu me sinta mais como pai, mas um pai divertido.”

Ele não está sozinho. O bigode, capaz de evocar desde a masculinidade até a ironia, passando pela alegria sincera da paternidade, vive um de seus renascimentos periódicos. “Outro dia, no metrô, olhei ao redor e outros cinco caras em um raio de um metro usavam bigode”, contou Jimmy Brewer, de 27 anos, ator de Nova York, que deixou o seu crescer enquanto estava de férias, sete meses atrás. Logo depois, conseguiu um papel em um musical da Broadway, “Shucked”, e lhe pediram que não o raspasse até o fim de seu contrato. “Sempre admirei o bigode nos outros, porque parece que quem o usa é mais autoconfiante”, comentou.

Embora seja difícil separar dados sobre o bigode de dados sobre tendências de pelos faciais em geral, o pessoal do setor diz que o aumento é acentuado e recente. Anteriormente domínio de astros pornô, de ícones da contracultura ou do tio antiquado, o bigode está se tornando apenas mais uma opção para os pelos faciais.

Isaiah Campa, tutor em um centro de detenção juvenil. Foto: Ali Cherkis/The New York Times

As razões são muitas. O bigode é masculino, mas lúdico, em um mundo que valoriza novas formas de lidar com estilos de gênero. Estava prestes a voltar depois de uma década em que todo mundo usava barba, e a quarentena permitiu que muitos o experimentassem e percebessem que gostavam.

“Começou a ganhar muito mais força no ano passado, principalmente depois que Top Gun: Maverick foi lançado. Acho que o bigode hoje ocupa o lugar da barba em 2010. Mas, se acabar tendo poder de permanência, as pessoas que recorreram a ele para chamar a atenção vão começar a procurar outra coisa”, comentou Matty Conrad, que administra várias barbearias em Vancouver, na Colúmbia Britânica, além de um popular canal no YouTube dedicado aos pelos faciais.

Nicky Austin, cabeleireira e maquiadora responsável por manter o icônico bigode de Ted Lasso, atribui a popularidade entre seus clientes em Los Angeles à difusão da cultura da barba, como também a uma nova abertura em relação aos cuidados masculinos. “Conheço homens que vão ao barbeiro todo fim de semana para manter a barba com aparência fresca, o que seria inusitado há 20 anos”, afirmou ela, acrescentando que os calvos muitas vezes veem o bigode como um divisor de águas.

O bigode se tornou mais comum em espaços queer por volta do fim da década de 2010, especialmente os tipos mais finos que complementavam a estética homoerótica promovida por Tom of Finland, reinante na época. E poderia ter passado em branco se a pandemia não tivesse ocorrido. Durante esse tempo, os homens começaram a fazer a transição da barba para o bigode, e a coisa se espalhou. “A quarentena definitivamente evitou que eu tivesse de lidar com aquela fase intermediária incômoda, que sempre me impediu de deixar crescer o bigode. Tenho 20 e poucos anos, e essa é uma maneira legal de estar na moda enquanto ainda sinto que caminho para uma vida adulta mais madura”, disse Lucas Johnson, professor de inglês em Crown Heights, no Brooklyn, que há dois anos cultiva seu bigode grosso e largo, em estilo Chevron. Ele acrescentou que também aprecia as associações versáteis. “O bigode denota autoridade, mas também sugere certa dose de irreverência. É muito masculino, mas também é muito extravagante e uma discreta espécie de código gay. Todo o espectro de gênero está obcecado com o bigode, assim como eu.”

Tem história

A popularidade do bigode sempre foi particularmente suscetível aos ícones culturais e às tendências do momento. No início dos anos 1900, era em geral elaborado, como o estilo morsa de Theodore Roosevelt ou com as pontas espetadas do bigode inglês (como o do arquiduque Francisco Ferdinando), irônica e brevemente retomado nos primeiros anos de 2000 por hipsters de suspensórios nos EUA.

Até 1916, os soldados britânicos eram proibidos de raspar o lábio superior, talvez por causa das profundas associações do bigode com a virilidade e a força.

Estilos mais elaborados também eram alvo fácil de zombaria. O bigode de Charlie Chaplin, aquele pequeno quadradinho acima do lábio, foi adotado especificamente por conta de seu apelo humorístico, antes de ser associado a Hitler e perder para sempre seu lugar no ciclo da moda.

FreddieMercury, vocalista da bandaQueen, pede fogo para acender seu cigarro, durante entrevista coletivana primeira visita do grupo ao Brasil, 19/3/1981. Foto: Mário Leite/Estadão

Depois da década de 1950, tornou-se a marca facial contracultural adotada por uma miríade de grupos considerados subversivos - hippies cabeludos, marxistas, gays. Freddie Mercury tinha um dos bigodes mais icônicos do século.

À medida que a nítida divisão de estilo entre o convencionalismo e a contracultura começou a desaparecer nas décadas de 1970 e 80, o bigode passou a ser associado à bossa masculina e era visto no rosto de Burt Reynolds, Tom Selleck, Sam Elliott e outros. Nem todo mundo conseguia cultivá-lo, o que sempre fez parte de seu charme, mas essas associações hipermasculinas acabaram caindo no exagero, e o bigode foi adotado de forma lúdica na cultura queer. Acabou muito difundido em toda a indústria pornográfica, dando-lhe um toque de degeneração.

É claro que, em muitos lugares, como no Oriente Médio e no México, o bigode tem um conjunto próprio de associações, e estas foram muitas vezes levadas para os Estados Unidos, dando ao estilo diferentes significados para diferentes grupos. Para os negros americanos, sua evocação de autoridade o tornou particularmente popular entre líderes na era dos direitos civis, incluindo Thurgood Marshall e Martin Luther King Jr., antes de ser deixado de lado nos anos 1970. (Como Wesley Morris detalhou em um ensaio de 2020 no The New York Times, continua sendo uma maneira de se envolver com a identidade negra.)

No fim dos anos 1990, o bigode estava tão fora de moda que poucos pensavam que voltaria. Mas, com o surgimento de inúmeros bigodudos, o estilo lentamente se tornou livre das associações de subcultura que conquistara na década de 1980, levando mais homens a considerá-lo no próprio rosto.

Nick Offerman como Ron Swanson e Amy Poehler como Leslie Knope na série 'Parks and Recreation'. Foto: Ben Cohen/NBC

Atualmente, duas opções se mostraram particularmente populares: o chevron (como o usado por Ron Swanson em Parks and Recreation) e o bigode proeminente cercado por barba rala, conhecido como beardstache (basta pensar em Henry Cavil, The Weeknd ou qualquer estudante de doutorado no Brooklyn). Escolhas mais trabalhadas, incluindo o bigode lápis, o bigode repartido ou o bigode com pontas espetadas, continuam a ser o domínio dos excepcionalmente capazes.

Mas qualquer escolha de estilo que mude significativamente o rosto vai parecer um pouco cômica, um pouco irônica e brincalhona. E, em um mundo que revisita o cerne do que significa masculinidade, essas associações também podem ser bem-vindas.

À medida que o bigode se torna mais popular, muitos homens estão percebendo que sabem muito pouco sobre sua manutenção. Que estilo funciona para seu rosto? Como deve ser aparado? Quanto tempo leva para crescer? “Só porque o cara quer um, não significa que seja necessariamente adequado ao formato de seu rosto, à textura de seu cabelo ou ao padrão de crescimento. O importante é trabalhar com o que você tem”, disse Conrad, o barbeiro de Vancouver. Mas pequenos ajustes podem ter um grande impacto. Segundo ele, a única diferença entre o bigode estilo papai de Ted Lasso e o bigode machão de Burt Reynolds é uma modelagem sutil.

The New York Times Licensing Group - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito do The New York Times

THE NEW YORK TIMES - LIFE/STYLE - Há cerca de seis meses, Micah Fitzerman-Blue, roteirista em Los Angeles, estava fazendo a barba quando chegou à região entre o nariz e o lábio superior e pensou: “E se eu parar agora?”

Os colegas de quarto Jack Tufts e Joseph Caster no bairro de Bushwick: o bigode está desfrutando um de seus renascimentos periódicos. Foto: Ali Cherkis/The New York Times

“No início, fiquei na dúvida, porque nunca tinha usado só bigode”, disse. Mas, depois de confirmar que sua esposa não se opunha e de perceber como essa parte da barba tinha se tornado comum em seu bairro, Echo Park, adotou o visual. “Fiz 40 anos recentemente e tenho dois filhos pequenos, o que faz com que eu me sinta mais como pai, mas um pai divertido.”

Ele não está sozinho. O bigode, capaz de evocar desde a masculinidade até a ironia, passando pela alegria sincera da paternidade, vive um de seus renascimentos periódicos. “Outro dia, no metrô, olhei ao redor e outros cinco caras em um raio de um metro usavam bigode”, contou Jimmy Brewer, de 27 anos, ator de Nova York, que deixou o seu crescer enquanto estava de férias, sete meses atrás. Logo depois, conseguiu um papel em um musical da Broadway, “Shucked”, e lhe pediram que não o raspasse até o fim de seu contrato. “Sempre admirei o bigode nos outros, porque parece que quem o usa é mais autoconfiante”, comentou.

Embora seja difícil separar dados sobre o bigode de dados sobre tendências de pelos faciais em geral, o pessoal do setor diz que o aumento é acentuado e recente. Anteriormente domínio de astros pornô, de ícones da contracultura ou do tio antiquado, o bigode está se tornando apenas mais uma opção para os pelos faciais.

Isaiah Campa, tutor em um centro de detenção juvenil. Foto: Ali Cherkis/The New York Times

As razões são muitas. O bigode é masculino, mas lúdico, em um mundo que valoriza novas formas de lidar com estilos de gênero. Estava prestes a voltar depois de uma década em que todo mundo usava barba, e a quarentena permitiu que muitos o experimentassem e percebessem que gostavam.

“Começou a ganhar muito mais força no ano passado, principalmente depois que Top Gun: Maverick foi lançado. Acho que o bigode hoje ocupa o lugar da barba em 2010. Mas, se acabar tendo poder de permanência, as pessoas que recorreram a ele para chamar a atenção vão começar a procurar outra coisa”, comentou Matty Conrad, que administra várias barbearias em Vancouver, na Colúmbia Britânica, além de um popular canal no YouTube dedicado aos pelos faciais.

Nicky Austin, cabeleireira e maquiadora responsável por manter o icônico bigode de Ted Lasso, atribui a popularidade entre seus clientes em Los Angeles à difusão da cultura da barba, como também a uma nova abertura em relação aos cuidados masculinos. “Conheço homens que vão ao barbeiro todo fim de semana para manter a barba com aparência fresca, o que seria inusitado há 20 anos”, afirmou ela, acrescentando que os calvos muitas vezes veem o bigode como um divisor de águas.

O bigode se tornou mais comum em espaços queer por volta do fim da década de 2010, especialmente os tipos mais finos que complementavam a estética homoerótica promovida por Tom of Finland, reinante na época. E poderia ter passado em branco se a pandemia não tivesse ocorrido. Durante esse tempo, os homens começaram a fazer a transição da barba para o bigode, e a coisa se espalhou. “A quarentena definitivamente evitou que eu tivesse de lidar com aquela fase intermediária incômoda, que sempre me impediu de deixar crescer o bigode. Tenho 20 e poucos anos, e essa é uma maneira legal de estar na moda enquanto ainda sinto que caminho para uma vida adulta mais madura”, disse Lucas Johnson, professor de inglês em Crown Heights, no Brooklyn, que há dois anos cultiva seu bigode grosso e largo, em estilo Chevron. Ele acrescentou que também aprecia as associações versáteis. “O bigode denota autoridade, mas também sugere certa dose de irreverência. É muito masculino, mas também é muito extravagante e uma discreta espécie de código gay. Todo o espectro de gênero está obcecado com o bigode, assim como eu.”

Tem história

A popularidade do bigode sempre foi particularmente suscetível aos ícones culturais e às tendências do momento. No início dos anos 1900, era em geral elaborado, como o estilo morsa de Theodore Roosevelt ou com as pontas espetadas do bigode inglês (como o do arquiduque Francisco Ferdinando), irônica e brevemente retomado nos primeiros anos de 2000 por hipsters de suspensórios nos EUA.

Até 1916, os soldados britânicos eram proibidos de raspar o lábio superior, talvez por causa das profundas associações do bigode com a virilidade e a força.

Estilos mais elaborados também eram alvo fácil de zombaria. O bigode de Charlie Chaplin, aquele pequeno quadradinho acima do lábio, foi adotado especificamente por conta de seu apelo humorístico, antes de ser associado a Hitler e perder para sempre seu lugar no ciclo da moda.

FreddieMercury, vocalista da bandaQueen, pede fogo para acender seu cigarro, durante entrevista coletivana primeira visita do grupo ao Brasil, 19/3/1981. Foto: Mário Leite/Estadão

Depois da década de 1950, tornou-se a marca facial contracultural adotada por uma miríade de grupos considerados subversivos - hippies cabeludos, marxistas, gays. Freddie Mercury tinha um dos bigodes mais icônicos do século.

À medida que a nítida divisão de estilo entre o convencionalismo e a contracultura começou a desaparecer nas décadas de 1970 e 80, o bigode passou a ser associado à bossa masculina e era visto no rosto de Burt Reynolds, Tom Selleck, Sam Elliott e outros. Nem todo mundo conseguia cultivá-lo, o que sempre fez parte de seu charme, mas essas associações hipermasculinas acabaram caindo no exagero, e o bigode foi adotado de forma lúdica na cultura queer. Acabou muito difundido em toda a indústria pornográfica, dando-lhe um toque de degeneração.

É claro que, em muitos lugares, como no Oriente Médio e no México, o bigode tem um conjunto próprio de associações, e estas foram muitas vezes levadas para os Estados Unidos, dando ao estilo diferentes significados para diferentes grupos. Para os negros americanos, sua evocação de autoridade o tornou particularmente popular entre líderes na era dos direitos civis, incluindo Thurgood Marshall e Martin Luther King Jr., antes de ser deixado de lado nos anos 1970. (Como Wesley Morris detalhou em um ensaio de 2020 no The New York Times, continua sendo uma maneira de se envolver com a identidade negra.)

No fim dos anos 1990, o bigode estava tão fora de moda que poucos pensavam que voltaria. Mas, com o surgimento de inúmeros bigodudos, o estilo lentamente se tornou livre das associações de subcultura que conquistara na década de 1980, levando mais homens a considerá-lo no próprio rosto.

Nick Offerman como Ron Swanson e Amy Poehler como Leslie Knope na série 'Parks and Recreation'. Foto: Ben Cohen/NBC

Atualmente, duas opções se mostraram particularmente populares: o chevron (como o usado por Ron Swanson em Parks and Recreation) e o bigode proeminente cercado por barba rala, conhecido como beardstache (basta pensar em Henry Cavil, The Weeknd ou qualquer estudante de doutorado no Brooklyn). Escolhas mais trabalhadas, incluindo o bigode lápis, o bigode repartido ou o bigode com pontas espetadas, continuam a ser o domínio dos excepcionalmente capazes.

Mas qualquer escolha de estilo que mude significativamente o rosto vai parecer um pouco cômica, um pouco irônica e brincalhona. E, em um mundo que revisita o cerne do que significa masculinidade, essas associações também podem ser bem-vindas.

À medida que o bigode se torna mais popular, muitos homens estão percebendo que sabem muito pouco sobre sua manutenção. Que estilo funciona para seu rosto? Como deve ser aparado? Quanto tempo leva para crescer? “Só porque o cara quer um, não significa que seja necessariamente adequado ao formato de seu rosto, à textura de seu cabelo ou ao padrão de crescimento. O importante é trabalhar com o que você tem”, disse Conrad, o barbeiro de Vancouver. Mas pequenos ajustes podem ter um grande impacto. Segundo ele, a única diferença entre o bigode estilo papai de Ted Lasso e o bigode machão de Burt Reynolds é uma modelagem sutil.

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