‘Quero redefinir meu cérebro’: mulheres recorrem à terapia psicodélica para curar traumas


Traumatizadas pela guerra e agressões sexuais, algumas veteranas dos EUA estão procurando ajuda em uma clínica mexicana que trata depressão e dependência com alucinógenos potentes

Por Ernesto Londoño
Atualização:

THE NEW YORK TIMES - LIFE/STYLE - TIJUANA, México - Nuvens de incenso rodavam pela sala mal iluminada enquanto sete mulheres se revezavam explicando o que as levou a se inscrever para um fim de semana de terapia psicodélica em uma vila no norte do México com vistas arrebatadoras do oceano.

Mulheres se reúnem em cerimônia de chá de cogumelo psicodélico em março em um retiro de terapia de veteranos no México. Foto: Meridith Kohut/The New York Times

Uma ex-fuzileira naval dos EUA disse que esperava se conectar com o espírito de sua mãe, que se matou 11 anos atrás. Uma veterana do Exército disse que foi abusada sexualmente por um parente quando criança. Outras veteranas disseram ter sido agredidas sexualmente por colegas de serviço.

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A esposa de um especialista em desativação de bombas da Marinha engasgou ao lamentar que anos de missões implacáveis de combate tenham transformado seu marido em um pai ausente e disfuncional.

Kristine Bostwick, 38, ex-paramédica da Marinha, disse esperar que a participação em cerimônias com substâncias que alteram a mente a ajude a fazer as pazes com o fim de um casamento turbulento e talvez aliviar as enxaquecas que se tornaram um tormento diário.

“Quero redefinir todo meu cérebro”, ela disse durante a sessão introdutória de um recente retiro de três dias, enxugando as lágrimas. “Meus filhos merecem. Eu mereço.”

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Um crescente corpo de pesquisas sobre os benefícios terapêuticos da terapia psicodélica gerou entusiasmo entre alguns psiquiatras e investidores de risco.

Medidas para descriminalizar psicodélicos, financiar pesquisas sobre seu potencial de cura e estabelecer estruturas para seu uso medicinal foram aprovadas com apoio bipartidário em conselhos municipais e legislaturas estaduais nos Estados Unidos nos últimos anos.

Grande parte do apelo crescente a tais tratamentos foi impulsionado por veteranos das guerras americanas no Afeganistão e no Iraque. Tendo se voltado para terapias experimentais para tratar transtorno de estresse pós-traumático, lesões cerebrais traumáticas, vício e depressão, muitos ex-militares se tornaram defensores efusivos de uma adoção mais ampla dos psicodélicos.

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Os participantes de retiros psicodélicos costumam pagar milhares de dólares pela experiência. Mas essas veteranas e cônjuges de veteranos que viajaram para o México para tratamento no Mission Within estavam participando de graça, como cortesia do Heroic Hearts Project e do Hope Project. Os grupos, fundados por um patrulheiro do Exército e a esposa de um SEAL da Marinha, arrecadam dinheiro para tornar a terapia psicodélica acessível para pessoas de origem militar.

Samantha Juan, veterana do Exército que participou do retiro, brincando com Jack, um cão de serviço especialmente treinado para veteranos militares com transtorno de estresse pós-traumático. Foto: Meridith Kohut/The New York Times

O Mission Within, nos arredores de Tijuana, é dirigido pelo Dr. Martín Polanco, que desde 2017 se concentra quase exclusivamente no tratamento de veteranos.

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“Percebi desde cedo que, se concentrássemos nosso trabalho nos veteranos, teríamos um impacto maior”, disse Polanco, que disse ter tratado mais de 600 mil veteranos americanos no México. “Eles entendem o que é preciso para atingir o desempenho máximo.”

No início, ele disse, tratava quase exclusivamente os veteranos do sexo masculino. Mas recentemente, começou a receber muitos pedidos de mulheres veteranas e esposas de militares e começou a organizar retiros só para mulheres.

Com exceção dos ensaios clínicos, a terapia psicodélica é atualmente realizada na clandestinidade ou sob uma legalidade nebulosa. À medida que a demanda aumenta, alguns países da América Latina, incluindo Costa Rica, Jamaica e México, tornaram-se centros de protocolos experimentais e estudos clínicos.

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No México, duas das substâncias que Polanco administra - a ibogaína, um psicoativo à base de plantas comumente usado para tratar o vício, e o 5-MeO-DMT, um poderoso alucinógeno derivado do veneno do sapo do deserto de Sonora - não são ilegais nem aprovadas para uso médico. A terceira, os cogumelos psicodélicos, pode ser tomada legalmente em cerimônias que seguem as tradições indígenas.

No momento em que as sete mulheres se reuniram em círculo para a cerimônia do cogumelo em um sábado recente, cada uma havia assinado um termo de isenção de responsabilidade. Elas preencheram questionários que medem o estresse pós-traumático e outras doenças psicológicas e passaram por um check-up médico.

Conduzindo a cerimônia estava Andrea Lucie, uma especialista chilena-americana em medicina mente-corpo que passou a maior parte de sua carreira trabalhando com veteranos americanos feridos. Depois de soprar sálvia queimada em xícaras de chá de cogumelos servidos em uma bandeja decorada com flores e velas, Lucie leu um poema de María Sabina, uma curandeira indígena mexicana que já conduziu cerimônias com cogumelos.

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Os cogumelos que produzem psilocibina, uma droga psicodélica natural. Foto: Meridith Kohut/The New York Times

“Cure-se com amor lindo e lembre-se sempre, você é o remédio”, recitou Lucie, que é de uma família indígena Mapuche no Chile.

Depois de beber, as mulheres deitaram em colchões no chão e colocaram máscaras nos olhos enquanto uma música suave tocava em um alto-falante.

As primeiras agitações ocorreram cerca de 40 minutos após a cerimônia. Duas mulheres baixaram as máscaras e choraram. Uma riu e depois começou a gargalhar.

Então começaram os lamentos. Jenna Lombardo-Grosso, a ex-fuzileira naval que perdeu a mãe por suicídio, saiu da sala e se aconchegou com Lucie no andar de baixo.

Lombardo-Grosso, 37, soluçou e gritou: “Por que, por que, por que!” Mais tarde, ela explicou que os cogumelos tinham feito surgir episódios traumáticos de abuso sexual na infância.

Dentro da sala de cerimônias, Samantha Juan, a veterana do Exército que foi abusada sexualmente quando criança, começou a chorar e pegou seu diário. Foi sua terceira vez em um retiro administrado por Polanco, onde ela disse ter enfrentado uma vida inteira de memórias traumáticas que a levaram a beber muito e usar drogas para escapar de sua dor depois de deixar o Exército em 2014.

“Aprendi a ter empatia e bondade comigo mesma”, disse Juan, 37.

Seu objetivo neste retiro, ela disse, era fazer as pazes com uma agressão sexual que ela disse ter sofrido no Exército.

“Na jornada de hoje, o foco é o perdão”, disse Juan pouco antes de tomar os cogumelos. “Não quero mais esse tipo de angústia em mim.”

À medida que os efeitos dos cogumelos passavam, predominava uma sensação de calma. As mulheres trocavam histórias sobre suas viagens, contavam piadas e se perdiam em longos abraços.

O nervosismo voltou na manhã seguinte enquanto as mulheres esperavam sua vez de fumar 5-MeO-DMT, uma viagem que Polanco chama de “estilingue” pela velocidade e intensidade da experiência.

Naquela noite, Alison Logan, esposa de um especialista em neutralização de explosivos da Marinha que estava prestes a se divorciar, parecia abatida. As viagens, ela disse, trouxeram sua tristeza à tona, mas não forneceram insights nem senso de resolução.

“Parecia muita dor sem nenhuma resposta”, ela disse.

Mas as outras participantes disseram que suas doenças físicas desapareceram e seu humor melhorou.

Lombardo-Grosso disse que o retiro a ajudou a fazer as pazes com a perda de sua mãe e mudou sua visão de futuro de uma sensação de medo para uma de otimismo. “Eu me sinto inteira”, ela disse alguns dias depois de sua casa em Tulsa, Oklahoma. “Não falta mais nada.” /TRADUÇÃO LÍVIA BUELONI GONÇALVES

The New York Times Licensing Group - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito do The New York Times

THE NEW YORK TIMES - LIFE/STYLE - TIJUANA, México - Nuvens de incenso rodavam pela sala mal iluminada enquanto sete mulheres se revezavam explicando o que as levou a se inscrever para um fim de semana de terapia psicodélica em uma vila no norte do México com vistas arrebatadoras do oceano.

Mulheres se reúnem em cerimônia de chá de cogumelo psicodélico em março em um retiro de terapia de veteranos no México. Foto: Meridith Kohut/The New York Times

Uma ex-fuzileira naval dos EUA disse que esperava se conectar com o espírito de sua mãe, que se matou 11 anos atrás. Uma veterana do Exército disse que foi abusada sexualmente por um parente quando criança. Outras veteranas disseram ter sido agredidas sexualmente por colegas de serviço.

A esposa de um especialista em desativação de bombas da Marinha engasgou ao lamentar que anos de missões implacáveis de combate tenham transformado seu marido em um pai ausente e disfuncional.

Kristine Bostwick, 38, ex-paramédica da Marinha, disse esperar que a participação em cerimônias com substâncias que alteram a mente a ajude a fazer as pazes com o fim de um casamento turbulento e talvez aliviar as enxaquecas que se tornaram um tormento diário.

“Quero redefinir todo meu cérebro”, ela disse durante a sessão introdutória de um recente retiro de três dias, enxugando as lágrimas. “Meus filhos merecem. Eu mereço.”

Um crescente corpo de pesquisas sobre os benefícios terapêuticos da terapia psicodélica gerou entusiasmo entre alguns psiquiatras e investidores de risco.

Medidas para descriminalizar psicodélicos, financiar pesquisas sobre seu potencial de cura e estabelecer estruturas para seu uso medicinal foram aprovadas com apoio bipartidário em conselhos municipais e legislaturas estaduais nos Estados Unidos nos últimos anos.

Grande parte do apelo crescente a tais tratamentos foi impulsionado por veteranos das guerras americanas no Afeganistão e no Iraque. Tendo se voltado para terapias experimentais para tratar transtorno de estresse pós-traumático, lesões cerebrais traumáticas, vício e depressão, muitos ex-militares se tornaram defensores efusivos de uma adoção mais ampla dos psicodélicos.

Os participantes de retiros psicodélicos costumam pagar milhares de dólares pela experiência. Mas essas veteranas e cônjuges de veteranos que viajaram para o México para tratamento no Mission Within estavam participando de graça, como cortesia do Heroic Hearts Project e do Hope Project. Os grupos, fundados por um patrulheiro do Exército e a esposa de um SEAL da Marinha, arrecadam dinheiro para tornar a terapia psicodélica acessível para pessoas de origem militar.

Samantha Juan, veterana do Exército que participou do retiro, brincando com Jack, um cão de serviço especialmente treinado para veteranos militares com transtorno de estresse pós-traumático. Foto: Meridith Kohut/The New York Times

O Mission Within, nos arredores de Tijuana, é dirigido pelo Dr. Martín Polanco, que desde 2017 se concentra quase exclusivamente no tratamento de veteranos.

“Percebi desde cedo que, se concentrássemos nosso trabalho nos veteranos, teríamos um impacto maior”, disse Polanco, que disse ter tratado mais de 600 mil veteranos americanos no México. “Eles entendem o que é preciso para atingir o desempenho máximo.”

No início, ele disse, tratava quase exclusivamente os veteranos do sexo masculino. Mas recentemente, começou a receber muitos pedidos de mulheres veteranas e esposas de militares e começou a organizar retiros só para mulheres.

Com exceção dos ensaios clínicos, a terapia psicodélica é atualmente realizada na clandestinidade ou sob uma legalidade nebulosa. À medida que a demanda aumenta, alguns países da América Latina, incluindo Costa Rica, Jamaica e México, tornaram-se centros de protocolos experimentais e estudos clínicos.

No México, duas das substâncias que Polanco administra - a ibogaína, um psicoativo à base de plantas comumente usado para tratar o vício, e o 5-MeO-DMT, um poderoso alucinógeno derivado do veneno do sapo do deserto de Sonora - não são ilegais nem aprovadas para uso médico. A terceira, os cogumelos psicodélicos, pode ser tomada legalmente em cerimônias que seguem as tradições indígenas.

No momento em que as sete mulheres se reuniram em círculo para a cerimônia do cogumelo em um sábado recente, cada uma havia assinado um termo de isenção de responsabilidade. Elas preencheram questionários que medem o estresse pós-traumático e outras doenças psicológicas e passaram por um check-up médico.

Conduzindo a cerimônia estava Andrea Lucie, uma especialista chilena-americana em medicina mente-corpo que passou a maior parte de sua carreira trabalhando com veteranos americanos feridos. Depois de soprar sálvia queimada em xícaras de chá de cogumelos servidos em uma bandeja decorada com flores e velas, Lucie leu um poema de María Sabina, uma curandeira indígena mexicana que já conduziu cerimônias com cogumelos.

Os cogumelos que produzem psilocibina, uma droga psicodélica natural. Foto: Meridith Kohut/The New York Times

“Cure-se com amor lindo e lembre-se sempre, você é o remédio”, recitou Lucie, que é de uma família indígena Mapuche no Chile.

Depois de beber, as mulheres deitaram em colchões no chão e colocaram máscaras nos olhos enquanto uma música suave tocava em um alto-falante.

As primeiras agitações ocorreram cerca de 40 minutos após a cerimônia. Duas mulheres baixaram as máscaras e choraram. Uma riu e depois começou a gargalhar.

Então começaram os lamentos. Jenna Lombardo-Grosso, a ex-fuzileira naval que perdeu a mãe por suicídio, saiu da sala e se aconchegou com Lucie no andar de baixo.

Lombardo-Grosso, 37, soluçou e gritou: “Por que, por que, por que!” Mais tarde, ela explicou que os cogumelos tinham feito surgir episódios traumáticos de abuso sexual na infância.

Dentro da sala de cerimônias, Samantha Juan, a veterana do Exército que foi abusada sexualmente quando criança, começou a chorar e pegou seu diário. Foi sua terceira vez em um retiro administrado por Polanco, onde ela disse ter enfrentado uma vida inteira de memórias traumáticas que a levaram a beber muito e usar drogas para escapar de sua dor depois de deixar o Exército em 2014.

“Aprendi a ter empatia e bondade comigo mesma”, disse Juan, 37.

Seu objetivo neste retiro, ela disse, era fazer as pazes com uma agressão sexual que ela disse ter sofrido no Exército.

“Na jornada de hoje, o foco é o perdão”, disse Juan pouco antes de tomar os cogumelos. “Não quero mais esse tipo de angústia em mim.”

À medida que os efeitos dos cogumelos passavam, predominava uma sensação de calma. As mulheres trocavam histórias sobre suas viagens, contavam piadas e se perdiam em longos abraços.

O nervosismo voltou na manhã seguinte enquanto as mulheres esperavam sua vez de fumar 5-MeO-DMT, uma viagem que Polanco chama de “estilingue” pela velocidade e intensidade da experiência.

Naquela noite, Alison Logan, esposa de um especialista em neutralização de explosivos da Marinha que estava prestes a se divorciar, parecia abatida. As viagens, ela disse, trouxeram sua tristeza à tona, mas não forneceram insights nem senso de resolução.

“Parecia muita dor sem nenhuma resposta”, ela disse.

Mas as outras participantes disseram que suas doenças físicas desapareceram e seu humor melhorou.

Lombardo-Grosso disse que o retiro a ajudou a fazer as pazes com a perda de sua mãe e mudou sua visão de futuro de uma sensação de medo para uma de otimismo. “Eu me sinto inteira”, ela disse alguns dias depois de sua casa em Tulsa, Oklahoma. “Não falta mais nada.” /TRADUÇÃO LÍVIA BUELONI GONÇALVES

The New York Times Licensing Group - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito do The New York Times

THE NEW YORK TIMES - LIFE/STYLE - TIJUANA, México - Nuvens de incenso rodavam pela sala mal iluminada enquanto sete mulheres se revezavam explicando o que as levou a se inscrever para um fim de semana de terapia psicodélica em uma vila no norte do México com vistas arrebatadoras do oceano.

Mulheres se reúnem em cerimônia de chá de cogumelo psicodélico em março em um retiro de terapia de veteranos no México. Foto: Meridith Kohut/The New York Times

Uma ex-fuzileira naval dos EUA disse que esperava se conectar com o espírito de sua mãe, que se matou 11 anos atrás. Uma veterana do Exército disse que foi abusada sexualmente por um parente quando criança. Outras veteranas disseram ter sido agredidas sexualmente por colegas de serviço.

A esposa de um especialista em desativação de bombas da Marinha engasgou ao lamentar que anos de missões implacáveis de combate tenham transformado seu marido em um pai ausente e disfuncional.

Kristine Bostwick, 38, ex-paramédica da Marinha, disse esperar que a participação em cerimônias com substâncias que alteram a mente a ajude a fazer as pazes com o fim de um casamento turbulento e talvez aliviar as enxaquecas que se tornaram um tormento diário.

“Quero redefinir todo meu cérebro”, ela disse durante a sessão introdutória de um recente retiro de três dias, enxugando as lágrimas. “Meus filhos merecem. Eu mereço.”

Um crescente corpo de pesquisas sobre os benefícios terapêuticos da terapia psicodélica gerou entusiasmo entre alguns psiquiatras e investidores de risco.

Medidas para descriminalizar psicodélicos, financiar pesquisas sobre seu potencial de cura e estabelecer estruturas para seu uso medicinal foram aprovadas com apoio bipartidário em conselhos municipais e legislaturas estaduais nos Estados Unidos nos últimos anos.

Grande parte do apelo crescente a tais tratamentos foi impulsionado por veteranos das guerras americanas no Afeganistão e no Iraque. Tendo se voltado para terapias experimentais para tratar transtorno de estresse pós-traumático, lesões cerebrais traumáticas, vício e depressão, muitos ex-militares se tornaram defensores efusivos de uma adoção mais ampla dos psicodélicos.

Os participantes de retiros psicodélicos costumam pagar milhares de dólares pela experiência. Mas essas veteranas e cônjuges de veteranos que viajaram para o México para tratamento no Mission Within estavam participando de graça, como cortesia do Heroic Hearts Project e do Hope Project. Os grupos, fundados por um patrulheiro do Exército e a esposa de um SEAL da Marinha, arrecadam dinheiro para tornar a terapia psicodélica acessível para pessoas de origem militar.

Samantha Juan, veterana do Exército que participou do retiro, brincando com Jack, um cão de serviço especialmente treinado para veteranos militares com transtorno de estresse pós-traumático. Foto: Meridith Kohut/The New York Times

O Mission Within, nos arredores de Tijuana, é dirigido pelo Dr. Martín Polanco, que desde 2017 se concentra quase exclusivamente no tratamento de veteranos.

“Percebi desde cedo que, se concentrássemos nosso trabalho nos veteranos, teríamos um impacto maior”, disse Polanco, que disse ter tratado mais de 600 mil veteranos americanos no México. “Eles entendem o que é preciso para atingir o desempenho máximo.”

No início, ele disse, tratava quase exclusivamente os veteranos do sexo masculino. Mas recentemente, começou a receber muitos pedidos de mulheres veteranas e esposas de militares e começou a organizar retiros só para mulheres.

Com exceção dos ensaios clínicos, a terapia psicodélica é atualmente realizada na clandestinidade ou sob uma legalidade nebulosa. À medida que a demanda aumenta, alguns países da América Latina, incluindo Costa Rica, Jamaica e México, tornaram-se centros de protocolos experimentais e estudos clínicos.

No México, duas das substâncias que Polanco administra - a ibogaína, um psicoativo à base de plantas comumente usado para tratar o vício, e o 5-MeO-DMT, um poderoso alucinógeno derivado do veneno do sapo do deserto de Sonora - não são ilegais nem aprovadas para uso médico. A terceira, os cogumelos psicodélicos, pode ser tomada legalmente em cerimônias que seguem as tradições indígenas.

No momento em que as sete mulheres se reuniram em círculo para a cerimônia do cogumelo em um sábado recente, cada uma havia assinado um termo de isenção de responsabilidade. Elas preencheram questionários que medem o estresse pós-traumático e outras doenças psicológicas e passaram por um check-up médico.

Conduzindo a cerimônia estava Andrea Lucie, uma especialista chilena-americana em medicina mente-corpo que passou a maior parte de sua carreira trabalhando com veteranos americanos feridos. Depois de soprar sálvia queimada em xícaras de chá de cogumelos servidos em uma bandeja decorada com flores e velas, Lucie leu um poema de María Sabina, uma curandeira indígena mexicana que já conduziu cerimônias com cogumelos.

Os cogumelos que produzem psilocibina, uma droga psicodélica natural. Foto: Meridith Kohut/The New York Times

“Cure-se com amor lindo e lembre-se sempre, você é o remédio”, recitou Lucie, que é de uma família indígena Mapuche no Chile.

Depois de beber, as mulheres deitaram em colchões no chão e colocaram máscaras nos olhos enquanto uma música suave tocava em um alto-falante.

As primeiras agitações ocorreram cerca de 40 minutos após a cerimônia. Duas mulheres baixaram as máscaras e choraram. Uma riu e depois começou a gargalhar.

Então começaram os lamentos. Jenna Lombardo-Grosso, a ex-fuzileira naval que perdeu a mãe por suicídio, saiu da sala e se aconchegou com Lucie no andar de baixo.

Lombardo-Grosso, 37, soluçou e gritou: “Por que, por que, por que!” Mais tarde, ela explicou que os cogumelos tinham feito surgir episódios traumáticos de abuso sexual na infância.

Dentro da sala de cerimônias, Samantha Juan, a veterana do Exército que foi abusada sexualmente quando criança, começou a chorar e pegou seu diário. Foi sua terceira vez em um retiro administrado por Polanco, onde ela disse ter enfrentado uma vida inteira de memórias traumáticas que a levaram a beber muito e usar drogas para escapar de sua dor depois de deixar o Exército em 2014.

“Aprendi a ter empatia e bondade comigo mesma”, disse Juan, 37.

Seu objetivo neste retiro, ela disse, era fazer as pazes com uma agressão sexual que ela disse ter sofrido no Exército.

“Na jornada de hoje, o foco é o perdão”, disse Juan pouco antes de tomar os cogumelos. “Não quero mais esse tipo de angústia em mim.”

À medida que os efeitos dos cogumelos passavam, predominava uma sensação de calma. As mulheres trocavam histórias sobre suas viagens, contavam piadas e se perdiam em longos abraços.

O nervosismo voltou na manhã seguinte enquanto as mulheres esperavam sua vez de fumar 5-MeO-DMT, uma viagem que Polanco chama de “estilingue” pela velocidade e intensidade da experiência.

Naquela noite, Alison Logan, esposa de um especialista em neutralização de explosivos da Marinha que estava prestes a se divorciar, parecia abatida. As viagens, ela disse, trouxeram sua tristeza à tona, mas não forneceram insights nem senso de resolução.

“Parecia muita dor sem nenhuma resposta”, ela disse.

Mas as outras participantes disseram que suas doenças físicas desapareceram e seu humor melhorou.

Lombardo-Grosso disse que o retiro a ajudou a fazer as pazes com a perda de sua mãe e mudou sua visão de futuro de uma sensação de medo para uma de otimismo. “Eu me sinto inteira”, ela disse alguns dias depois de sua casa em Tulsa, Oklahoma. “Não falta mais nada.” /TRADUÇÃO LÍVIA BUELONI GONÇALVES

The New York Times Licensing Group - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito do The New York Times

THE NEW YORK TIMES - LIFE/STYLE - TIJUANA, México - Nuvens de incenso rodavam pela sala mal iluminada enquanto sete mulheres se revezavam explicando o que as levou a se inscrever para um fim de semana de terapia psicodélica em uma vila no norte do México com vistas arrebatadoras do oceano.

Mulheres se reúnem em cerimônia de chá de cogumelo psicodélico em março em um retiro de terapia de veteranos no México. Foto: Meridith Kohut/The New York Times

Uma ex-fuzileira naval dos EUA disse que esperava se conectar com o espírito de sua mãe, que se matou 11 anos atrás. Uma veterana do Exército disse que foi abusada sexualmente por um parente quando criança. Outras veteranas disseram ter sido agredidas sexualmente por colegas de serviço.

A esposa de um especialista em desativação de bombas da Marinha engasgou ao lamentar que anos de missões implacáveis de combate tenham transformado seu marido em um pai ausente e disfuncional.

Kristine Bostwick, 38, ex-paramédica da Marinha, disse esperar que a participação em cerimônias com substâncias que alteram a mente a ajude a fazer as pazes com o fim de um casamento turbulento e talvez aliviar as enxaquecas que se tornaram um tormento diário.

“Quero redefinir todo meu cérebro”, ela disse durante a sessão introdutória de um recente retiro de três dias, enxugando as lágrimas. “Meus filhos merecem. Eu mereço.”

Um crescente corpo de pesquisas sobre os benefícios terapêuticos da terapia psicodélica gerou entusiasmo entre alguns psiquiatras e investidores de risco.

Medidas para descriminalizar psicodélicos, financiar pesquisas sobre seu potencial de cura e estabelecer estruturas para seu uso medicinal foram aprovadas com apoio bipartidário em conselhos municipais e legislaturas estaduais nos Estados Unidos nos últimos anos.

Grande parte do apelo crescente a tais tratamentos foi impulsionado por veteranos das guerras americanas no Afeganistão e no Iraque. Tendo se voltado para terapias experimentais para tratar transtorno de estresse pós-traumático, lesões cerebrais traumáticas, vício e depressão, muitos ex-militares se tornaram defensores efusivos de uma adoção mais ampla dos psicodélicos.

Os participantes de retiros psicodélicos costumam pagar milhares de dólares pela experiência. Mas essas veteranas e cônjuges de veteranos que viajaram para o México para tratamento no Mission Within estavam participando de graça, como cortesia do Heroic Hearts Project e do Hope Project. Os grupos, fundados por um patrulheiro do Exército e a esposa de um SEAL da Marinha, arrecadam dinheiro para tornar a terapia psicodélica acessível para pessoas de origem militar.

Samantha Juan, veterana do Exército que participou do retiro, brincando com Jack, um cão de serviço especialmente treinado para veteranos militares com transtorno de estresse pós-traumático. Foto: Meridith Kohut/The New York Times

O Mission Within, nos arredores de Tijuana, é dirigido pelo Dr. Martín Polanco, que desde 2017 se concentra quase exclusivamente no tratamento de veteranos.

“Percebi desde cedo que, se concentrássemos nosso trabalho nos veteranos, teríamos um impacto maior”, disse Polanco, que disse ter tratado mais de 600 mil veteranos americanos no México. “Eles entendem o que é preciso para atingir o desempenho máximo.”

No início, ele disse, tratava quase exclusivamente os veteranos do sexo masculino. Mas recentemente, começou a receber muitos pedidos de mulheres veteranas e esposas de militares e começou a organizar retiros só para mulheres.

Com exceção dos ensaios clínicos, a terapia psicodélica é atualmente realizada na clandestinidade ou sob uma legalidade nebulosa. À medida que a demanda aumenta, alguns países da América Latina, incluindo Costa Rica, Jamaica e México, tornaram-se centros de protocolos experimentais e estudos clínicos.

No México, duas das substâncias que Polanco administra - a ibogaína, um psicoativo à base de plantas comumente usado para tratar o vício, e o 5-MeO-DMT, um poderoso alucinógeno derivado do veneno do sapo do deserto de Sonora - não são ilegais nem aprovadas para uso médico. A terceira, os cogumelos psicodélicos, pode ser tomada legalmente em cerimônias que seguem as tradições indígenas.

No momento em que as sete mulheres se reuniram em círculo para a cerimônia do cogumelo em um sábado recente, cada uma havia assinado um termo de isenção de responsabilidade. Elas preencheram questionários que medem o estresse pós-traumático e outras doenças psicológicas e passaram por um check-up médico.

Conduzindo a cerimônia estava Andrea Lucie, uma especialista chilena-americana em medicina mente-corpo que passou a maior parte de sua carreira trabalhando com veteranos americanos feridos. Depois de soprar sálvia queimada em xícaras de chá de cogumelos servidos em uma bandeja decorada com flores e velas, Lucie leu um poema de María Sabina, uma curandeira indígena mexicana que já conduziu cerimônias com cogumelos.

Os cogumelos que produzem psilocibina, uma droga psicodélica natural. Foto: Meridith Kohut/The New York Times

“Cure-se com amor lindo e lembre-se sempre, você é o remédio”, recitou Lucie, que é de uma família indígena Mapuche no Chile.

Depois de beber, as mulheres deitaram em colchões no chão e colocaram máscaras nos olhos enquanto uma música suave tocava em um alto-falante.

As primeiras agitações ocorreram cerca de 40 minutos após a cerimônia. Duas mulheres baixaram as máscaras e choraram. Uma riu e depois começou a gargalhar.

Então começaram os lamentos. Jenna Lombardo-Grosso, a ex-fuzileira naval que perdeu a mãe por suicídio, saiu da sala e se aconchegou com Lucie no andar de baixo.

Lombardo-Grosso, 37, soluçou e gritou: “Por que, por que, por que!” Mais tarde, ela explicou que os cogumelos tinham feito surgir episódios traumáticos de abuso sexual na infância.

Dentro da sala de cerimônias, Samantha Juan, a veterana do Exército que foi abusada sexualmente quando criança, começou a chorar e pegou seu diário. Foi sua terceira vez em um retiro administrado por Polanco, onde ela disse ter enfrentado uma vida inteira de memórias traumáticas que a levaram a beber muito e usar drogas para escapar de sua dor depois de deixar o Exército em 2014.

“Aprendi a ter empatia e bondade comigo mesma”, disse Juan, 37.

Seu objetivo neste retiro, ela disse, era fazer as pazes com uma agressão sexual que ela disse ter sofrido no Exército.

“Na jornada de hoje, o foco é o perdão”, disse Juan pouco antes de tomar os cogumelos. “Não quero mais esse tipo de angústia em mim.”

À medida que os efeitos dos cogumelos passavam, predominava uma sensação de calma. As mulheres trocavam histórias sobre suas viagens, contavam piadas e se perdiam em longos abraços.

O nervosismo voltou na manhã seguinte enquanto as mulheres esperavam sua vez de fumar 5-MeO-DMT, uma viagem que Polanco chama de “estilingue” pela velocidade e intensidade da experiência.

Naquela noite, Alison Logan, esposa de um especialista em neutralização de explosivos da Marinha que estava prestes a se divorciar, parecia abatida. As viagens, ela disse, trouxeram sua tristeza à tona, mas não forneceram insights nem senso de resolução.

“Parecia muita dor sem nenhuma resposta”, ela disse.

Mas as outras participantes disseram que suas doenças físicas desapareceram e seu humor melhorou.

Lombardo-Grosso disse que o retiro a ajudou a fazer as pazes com a perda de sua mãe e mudou sua visão de futuro de uma sensação de medo para uma de otimismo. “Eu me sinto inteira”, ela disse alguns dias depois de sua casa em Tulsa, Oklahoma. “Não falta mais nada.” /TRADUÇÃO LÍVIA BUELONI GONÇALVES

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