O rastreamento de contatos, fundamental para a contenção do vírus, fracassa no Ocidente


Medida é vista como ferramenta vital para evitar lockdowns e economias abertas, mas isso requer um sistema robusto, testes rápidos generalizados e confiança pública

Por Benjamin Mueller
Atualização:

LONDRES – Quando o coronavírus invadiu a Europa e os Estados Unidos nesta primavera (hemisfério norte), os governos fizeram uma promessa tentadora aos seus cidadãos já sem recursos: em breve, legiões de detetives da doença procurariam todas as pessoas que pudessem ter sido expostas ao vírus, confinando-as em suas casas e deixando que todas as outras continuassem levando a sua vida.

Cerca de oito meses mais tarde, enquanto uma teia de novas infecções se espalha sobre a Europa e os Estados Unidos, essa promessa praticamente evaporou. Apesar das reiteradas promessas das nações ocidentais da criação de operações que realizariam uma varredura dos países com a finalidade de testar e rastrear, estes sistemas falharam em razão da incapacidade dos governos de oferecer suporte aos cidadãos durante onerosas quarentenas ou de traçar detalhes precisos do seu paradeiro.

Pessoas caminham em Paris. Foto: Dmitry Kostyukov/The New York Times
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Isto acabou com a esperança de que apontariam medidas para a substituição do lockdown, e minou a frágil confiança nos governos. Presas a normas de privacidade, as autoridades ocidentais em grande parte confiaram que as pessoas forneceriam nomes aos investigadores dos contatos.

Mas esta confiança não foi retribuída, em grande parte porque os governos negligenciaram serviços cruciais para conquistar a cooperação das pessoas: um rápido e preciso sistema de testes e garantias de que as pessoas teriam casa, comida e ajuda financeira enquanto permanecessem isoladas.

“As autoridades de saúde pública se apaixonaram pela ideia do rastreamento dos contatos como uma tática importante – e de fato é – mas que acabaria sendo como se as pessoas fossem para a guerra e falassem apenas de tanques”, disse Brian Castrucci, presidente da Beaumont Foundation, uma organização de ajuda na área de saúde pública em Maryland.

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Igualmente importante foi o fato de as autoridades não avaliarem devidamente as consequências da enorme falta de confiança nos governos e de um conjunto de teorias da conspiração a respeito da disseminação do vírus. Temerosos de mergulhar com seus amigos em um doloroso período sem trabalho, os pacientes infectados apresentaram um número mínimo de contatos e frequentemente menosprezaram as normas do auto-isolamento.

Agora, os rastreadores dos contatos lutam para chegar até as pessoas que testam positivo e são rejeitados ao fazer isso. Teoricamente, os países deveriam criar programas de testes em massa que forneceriam diagnósticos rápidos. Então um grupo de rastreadores encontraria os que cruzaram o caminho da pessoa infectada, e recomendaria que ficassem em casa.

As autoridades selecionadas apresentaram o sistema como uma ponte crucial entre o lockdown e uma vacina, permitindo-lhes conter pequenos surtos sem fechar grandes partes da sociedade. Mas a construção desta ponte tem sido no mínimo conturbada. Os sistemas de saúde pública do Ocidente não obtiveram o sucesso alcançado em algumas partes do Extremo Oriente onde o medo de epidemias se tornou mais profundo com os surtos da grave síndrome respiratória aguda (SARS) e da síndrome respiratória do Oriente Médio (MERS).

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Depois destes surtos, lugares como Taiwan e a Coreia do Sul montaram rigorosos sistemas de rastreamento e estruturas legais visando limitar as liberdades civis durante uma epidemia. Alguns rastreadores usaram dados do celular e do cartão de crédito para identificar as pessoas potencialmente expostas.

Mas na Europa e nos Estados Unidos, que em grande parte confiaram que o público forneceria as informações e obedeceria voluntariamente às regras da quarentena, a resposta foi errática. Além disso, o Ocidente esbarrou no fato de que o rastreamento dos contatos, embora útil na contenção de casos limitados, foi ultrapassado por uma nova explosão de infecções. 

Os clientes de uma loja fazem fila para se registrar com telefones celulares para rastreamento de contato em Bangkok em maio. Foto: Adam Dean/The New York Times
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“O sistema de rastreamento não é realista e é inútil”, disse Mahmoud Salamon, de 27 anos, recentemente formado na escola de administração em visita a Brighton, na costa meridional da Inglaterra, onde um centro de testes aberto em um estádio foi fechado recentemente devido ao início da temporada de futebol.

Ele disse que não confia nos restaurantes e nas lojas que têm as suas informações pessoais, Em Taiwan, uma pessoa infectada menciona mais de 15 contatos em média, e os rastreadores muitas vezes entrevistam pacientes pessoalmente, na tentativa de extrair detalhes a respeito de empregos secretos ou casos extraconjugais. Mas na Europa o quadro é muito diferente, e a escassa cooperação deixou estarrecidos os especialistas em saúde pública.

Na Espanha, onde os hospitais lutam com uma nova onda de casos, os rastreadores identificam, em média, apenas três contatos para cada caso conhecido. Na França, o número caiu abaixo de três. E estes números são superiores aos dos Estados Unidos. Em Nova York, cada pessoa infectada informa em média 1 ,1 nome.

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Na Inglaterra, as pessoas tampouco informam muitos contatos – cerca de cinco em média – e nem seguem as normas. Em uma pesquisa com cerca de 32 mil britânicos, menos de 1 de cada 5 que informaram sintomas de coronavírus disseram que haviam ficado em casa. Das pessoas alertadas de que haviam estado próximas de um infectado, apenas 1 em 10 disse que tinha cumprido as ordens de auto-isolar-se.

“Isto sugere que há certo ceticismo na população quanto à colaboração”, afirmou o professor Christophe Fraser da Universidade de Oxford, assessor do programa de rastreamento do governo, referindo-se à proporção de casos conhecidos – um quinto – que não apresentaram nenhum outro nome. O crucial é que muitos governos do Ocidente fracassaram em atenuar o golpe financeiro e psicológico do autoisolamento garantindo os testes aos cidadãos ou dando-lhes recursos suficientes para que pudessem deixar de trabalhar por duas semanas.

Como os resultados dos testes demoram em muitos países, os rastreadores não conseguem antecipar-se ao vírus. Em Paris, as pessoas esperam até uma semana para conseguir agendar um teste e os resultados. A Inglaterra recentemente registrou um acúmulo de quase 200 mil amostras de laboratório não testadas, o que torna impossível rastrear o vírus nas escolas recentemente reabertas. Alguns líderes eleitos culparam os cidadãos recalcitrantes por prejudicarem o rastreamento dos contatos.

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O primeiro-ministro Boris Johnson afirmou recentemente que o problema era o fato de a Grã-Bretanha ser “um país que ama a liberdade”. No entanto, as provas de cada uma destas afirmações são mínimas. Alguns países conseguiram rastrear o vírus com sucesso apesar da resistência das pessoas, em grande parte investindo em departamentos de saúde cronicamente desprovidos de recursos, afirmaram epidemiologistas. O número de pessoas que afirmaram que se recusariam a dar os nomes aos rastreadores foi o dobro das ouvidas na Grã-Bretanha, segundo uma pesquisa do Imperial College London.

Mesmo assim, o país manteve sob controle um pequeno aumento das novas infecções. Além do forte programa de testes adotado pela Alemanha, disse Ralf Reintjes, professor de epidemiologia da Universidade de Ciências Aplicadas de Hamburgo, o país também respondeu à pandemia investindo em suas cerca de 400 clínicas de saúde públicas, que há muito vinham realizando o rastreamento dos contatos para doenças transmissíveis.

A Inglaterra, por outro lado, assinou um contrato de 108 milhões de libras esterlinas (US$ 138 milhões) a uma companhia de outsourcing colocando o destino do rastreamento de contatos nas mãos de funcionários de ‘call centers’ mal treinados. / TRADUÇÃO DE ANNA CAPOVILLA

The New York Times Licensing Group - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito do The New York Times

LONDRES – Quando o coronavírus invadiu a Europa e os Estados Unidos nesta primavera (hemisfério norte), os governos fizeram uma promessa tentadora aos seus cidadãos já sem recursos: em breve, legiões de detetives da doença procurariam todas as pessoas que pudessem ter sido expostas ao vírus, confinando-as em suas casas e deixando que todas as outras continuassem levando a sua vida.

Cerca de oito meses mais tarde, enquanto uma teia de novas infecções se espalha sobre a Europa e os Estados Unidos, essa promessa praticamente evaporou. Apesar das reiteradas promessas das nações ocidentais da criação de operações que realizariam uma varredura dos países com a finalidade de testar e rastrear, estes sistemas falharam em razão da incapacidade dos governos de oferecer suporte aos cidadãos durante onerosas quarentenas ou de traçar detalhes precisos do seu paradeiro.

Pessoas caminham em Paris. Foto: Dmitry Kostyukov/The New York Times

Isto acabou com a esperança de que apontariam medidas para a substituição do lockdown, e minou a frágil confiança nos governos. Presas a normas de privacidade, as autoridades ocidentais em grande parte confiaram que as pessoas forneceriam nomes aos investigadores dos contatos.

Mas esta confiança não foi retribuída, em grande parte porque os governos negligenciaram serviços cruciais para conquistar a cooperação das pessoas: um rápido e preciso sistema de testes e garantias de que as pessoas teriam casa, comida e ajuda financeira enquanto permanecessem isoladas.

“As autoridades de saúde pública se apaixonaram pela ideia do rastreamento dos contatos como uma tática importante – e de fato é – mas que acabaria sendo como se as pessoas fossem para a guerra e falassem apenas de tanques”, disse Brian Castrucci, presidente da Beaumont Foundation, uma organização de ajuda na área de saúde pública em Maryland.

Igualmente importante foi o fato de as autoridades não avaliarem devidamente as consequências da enorme falta de confiança nos governos e de um conjunto de teorias da conspiração a respeito da disseminação do vírus. Temerosos de mergulhar com seus amigos em um doloroso período sem trabalho, os pacientes infectados apresentaram um número mínimo de contatos e frequentemente menosprezaram as normas do auto-isolamento.

Agora, os rastreadores dos contatos lutam para chegar até as pessoas que testam positivo e são rejeitados ao fazer isso. Teoricamente, os países deveriam criar programas de testes em massa que forneceriam diagnósticos rápidos. Então um grupo de rastreadores encontraria os que cruzaram o caminho da pessoa infectada, e recomendaria que ficassem em casa.

As autoridades selecionadas apresentaram o sistema como uma ponte crucial entre o lockdown e uma vacina, permitindo-lhes conter pequenos surtos sem fechar grandes partes da sociedade. Mas a construção desta ponte tem sido no mínimo conturbada. Os sistemas de saúde pública do Ocidente não obtiveram o sucesso alcançado em algumas partes do Extremo Oriente onde o medo de epidemias se tornou mais profundo com os surtos da grave síndrome respiratória aguda (SARS) e da síndrome respiratória do Oriente Médio (MERS).

Depois destes surtos, lugares como Taiwan e a Coreia do Sul montaram rigorosos sistemas de rastreamento e estruturas legais visando limitar as liberdades civis durante uma epidemia. Alguns rastreadores usaram dados do celular e do cartão de crédito para identificar as pessoas potencialmente expostas.

Mas na Europa e nos Estados Unidos, que em grande parte confiaram que o público forneceria as informações e obedeceria voluntariamente às regras da quarentena, a resposta foi errática. Além disso, o Ocidente esbarrou no fato de que o rastreamento dos contatos, embora útil na contenção de casos limitados, foi ultrapassado por uma nova explosão de infecções. 

Os clientes de uma loja fazem fila para se registrar com telefones celulares para rastreamento de contato em Bangkok em maio. Foto: Adam Dean/The New York Times

“O sistema de rastreamento não é realista e é inútil”, disse Mahmoud Salamon, de 27 anos, recentemente formado na escola de administração em visita a Brighton, na costa meridional da Inglaterra, onde um centro de testes aberto em um estádio foi fechado recentemente devido ao início da temporada de futebol.

Ele disse que não confia nos restaurantes e nas lojas que têm as suas informações pessoais, Em Taiwan, uma pessoa infectada menciona mais de 15 contatos em média, e os rastreadores muitas vezes entrevistam pacientes pessoalmente, na tentativa de extrair detalhes a respeito de empregos secretos ou casos extraconjugais. Mas na Europa o quadro é muito diferente, e a escassa cooperação deixou estarrecidos os especialistas em saúde pública.

Na Espanha, onde os hospitais lutam com uma nova onda de casos, os rastreadores identificam, em média, apenas três contatos para cada caso conhecido. Na França, o número caiu abaixo de três. E estes números são superiores aos dos Estados Unidos. Em Nova York, cada pessoa infectada informa em média 1 ,1 nome.

Na Inglaterra, as pessoas tampouco informam muitos contatos – cerca de cinco em média – e nem seguem as normas. Em uma pesquisa com cerca de 32 mil britânicos, menos de 1 de cada 5 que informaram sintomas de coronavírus disseram que haviam ficado em casa. Das pessoas alertadas de que haviam estado próximas de um infectado, apenas 1 em 10 disse que tinha cumprido as ordens de auto-isolar-se.

“Isto sugere que há certo ceticismo na população quanto à colaboração”, afirmou o professor Christophe Fraser da Universidade de Oxford, assessor do programa de rastreamento do governo, referindo-se à proporção de casos conhecidos – um quinto – que não apresentaram nenhum outro nome. O crucial é que muitos governos do Ocidente fracassaram em atenuar o golpe financeiro e psicológico do autoisolamento garantindo os testes aos cidadãos ou dando-lhes recursos suficientes para que pudessem deixar de trabalhar por duas semanas.

Como os resultados dos testes demoram em muitos países, os rastreadores não conseguem antecipar-se ao vírus. Em Paris, as pessoas esperam até uma semana para conseguir agendar um teste e os resultados. A Inglaterra recentemente registrou um acúmulo de quase 200 mil amostras de laboratório não testadas, o que torna impossível rastrear o vírus nas escolas recentemente reabertas. Alguns líderes eleitos culparam os cidadãos recalcitrantes por prejudicarem o rastreamento dos contatos.

O primeiro-ministro Boris Johnson afirmou recentemente que o problema era o fato de a Grã-Bretanha ser “um país que ama a liberdade”. No entanto, as provas de cada uma destas afirmações são mínimas. Alguns países conseguiram rastrear o vírus com sucesso apesar da resistência das pessoas, em grande parte investindo em departamentos de saúde cronicamente desprovidos de recursos, afirmaram epidemiologistas. O número de pessoas que afirmaram que se recusariam a dar os nomes aos rastreadores foi o dobro das ouvidas na Grã-Bretanha, segundo uma pesquisa do Imperial College London.

Mesmo assim, o país manteve sob controle um pequeno aumento das novas infecções. Além do forte programa de testes adotado pela Alemanha, disse Ralf Reintjes, professor de epidemiologia da Universidade de Ciências Aplicadas de Hamburgo, o país também respondeu à pandemia investindo em suas cerca de 400 clínicas de saúde públicas, que há muito vinham realizando o rastreamento dos contatos para doenças transmissíveis.

A Inglaterra, por outro lado, assinou um contrato de 108 milhões de libras esterlinas (US$ 138 milhões) a uma companhia de outsourcing colocando o destino do rastreamento de contatos nas mãos de funcionários de ‘call centers’ mal treinados. / TRADUÇÃO DE ANNA CAPOVILLA

The New York Times Licensing Group - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito do The New York Times

LONDRES – Quando o coronavírus invadiu a Europa e os Estados Unidos nesta primavera (hemisfério norte), os governos fizeram uma promessa tentadora aos seus cidadãos já sem recursos: em breve, legiões de detetives da doença procurariam todas as pessoas que pudessem ter sido expostas ao vírus, confinando-as em suas casas e deixando que todas as outras continuassem levando a sua vida.

Cerca de oito meses mais tarde, enquanto uma teia de novas infecções se espalha sobre a Europa e os Estados Unidos, essa promessa praticamente evaporou. Apesar das reiteradas promessas das nações ocidentais da criação de operações que realizariam uma varredura dos países com a finalidade de testar e rastrear, estes sistemas falharam em razão da incapacidade dos governos de oferecer suporte aos cidadãos durante onerosas quarentenas ou de traçar detalhes precisos do seu paradeiro.

Pessoas caminham em Paris. Foto: Dmitry Kostyukov/The New York Times

Isto acabou com a esperança de que apontariam medidas para a substituição do lockdown, e minou a frágil confiança nos governos. Presas a normas de privacidade, as autoridades ocidentais em grande parte confiaram que as pessoas forneceriam nomes aos investigadores dos contatos.

Mas esta confiança não foi retribuída, em grande parte porque os governos negligenciaram serviços cruciais para conquistar a cooperação das pessoas: um rápido e preciso sistema de testes e garantias de que as pessoas teriam casa, comida e ajuda financeira enquanto permanecessem isoladas.

“As autoridades de saúde pública se apaixonaram pela ideia do rastreamento dos contatos como uma tática importante – e de fato é – mas que acabaria sendo como se as pessoas fossem para a guerra e falassem apenas de tanques”, disse Brian Castrucci, presidente da Beaumont Foundation, uma organização de ajuda na área de saúde pública em Maryland.

Igualmente importante foi o fato de as autoridades não avaliarem devidamente as consequências da enorme falta de confiança nos governos e de um conjunto de teorias da conspiração a respeito da disseminação do vírus. Temerosos de mergulhar com seus amigos em um doloroso período sem trabalho, os pacientes infectados apresentaram um número mínimo de contatos e frequentemente menosprezaram as normas do auto-isolamento.

Agora, os rastreadores dos contatos lutam para chegar até as pessoas que testam positivo e são rejeitados ao fazer isso. Teoricamente, os países deveriam criar programas de testes em massa que forneceriam diagnósticos rápidos. Então um grupo de rastreadores encontraria os que cruzaram o caminho da pessoa infectada, e recomendaria que ficassem em casa.

As autoridades selecionadas apresentaram o sistema como uma ponte crucial entre o lockdown e uma vacina, permitindo-lhes conter pequenos surtos sem fechar grandes partes da sociedade. Mas a construção desta ponte tem sido no mínimo conturbada. Os sistemas de saúde pública do Ocidente não obtiveram o sucesso alcançado em algumas partes do Extremo Oriente onde o medo de epidemias se tornou mais profundo com os surtos da grave síndrome respiratória aguda (SARS) e da síndrome respiratória do Oriente Médio (MERS).

Depois destes surtos, lugares como Taiwan e a Coreia do Sul montaram rigorosos sistemas de rastreamento e estruturas legais visando limitar as liberdades civis durante uma epidemia. Alguns rastreadores usaram dados do celular e do cartão de crédito para identificar as pessoas potencialmente expostas.

Mas na Europa e nos Estados Unidos, que em grande parte confiaram que o público forneceria as informações e obedeceria voluntariamente às regras da quarentena, a resposta foi errática. Além disso, o Ocidente esbarrou no fato de que o rastreamento dos contatos, embora útil na contenção de casos limitados, foi ultrapassado por uma nova explosão de infecções. 

Os clientes de uma loja fazem fila para se registrar com telefones celulares para rastreamento de contato em Bangkok em maio. Foto: Adam Dean/The New York Times

“O sistema de rastreamento não é realista e é inútil”, disse Mahmoud Salamon, de 27 anos, recentemente formado na escola de administração em visita a Brighton, na costa meridional da Inglaterra, onde um centro de testes aberto em um estádio foi fechado recentemente devido ao início da temporada de futebol.

Ele disse que não confia nos restaurantes e nas lojas que têm as suas informações pessoais, Em Taiwan, uma pessoa infectada menciona mais de 15 contatos em média, e os rastreadores muitas vezes entrevistam pacientes pessoalmente, na tentativa de extrair detalhes a respeito de empregos secretos ou casos extraconjugais. Mas na Europa o quadro é muito diferente, e a escassa cooperação deixou estarrecidos os especialistas em saúde pública.

Na Espanha, onde os hospitais lutam com uma nova onda de casos, os rastreadores identificam, em média, apenas três contatos para cada caso conhecido. Na França, o número caiu abaixo de três. E estes números são superiores aos dos Estados Unidos. Em Nova York, cada pessoa infectada informa em média 1 ,1 nome.

Na Inglaterra, as pessoas tampouco informam muitos contatos – cerca de cinco em média – e nem seguem as normas. Em uma pesquisa com cerca de 32 mil britânicos, menos de 1 de cada 5 que informaram sintomas de coronavírus disseram que haviam ficado em casa. Das pessoas alertadas de que haviam estado próximas de um infectado, apenas 1 em 10 disse que tinha cumprido as ordens de auto-isolar-se.

“Isto sugere que há certo ceticismo na população quanto à colaboração”, afirmou o professor Christophe Fraser da Universidade de Oxford, assessor do programa de rastreamento do governo, referindo-se à proporção de casos conhecidos – um quinto – que não apresentaram nenhum outro nome. O crucial é que muitos governos do Ocidente fracassaram em atenuar o golpe financeiro e psicológico do autoisolamento garantindo os testes aos cidadãos ou dando-lhes recursos suficientes para que pudessem deixar de trabalhar por duas semanas.

Como os resultados dos testes demoram em muitos países, os rastreadores não conseguem antecipar-se ao vírus. Em Paris, as pessoas esperam até uma semana para conseguir agendar um teste e os resultados. A Inglaterra recentemente registrou um acúmulo de quase 200 mil amostras de laboratório não testadas, o que torna impossível rastrear o vírus nas escolas recentemente reabertas. Alguns líderes eleitos culparam os cidadãos recalcitrantes por prejudicarem o rastreamento dos contatos.

O primeiro-ministro Boris Johnson afirmou recentemente que o problema era o fato de a Grã-Bretanha ser “um país que ama a liberdade”. No entanto, as provas de cada uma destas afirmações são mínimas. Alguns países conseguiram rastrear o vírus com sucesso apesar da resistência das pessoas, em grande parte investindo em departamentos de saúde cronicamente desprovidos de recursos, afirmaram epidemiologistas. O número de pessoas que afirmaram que se recusariam a dar os nomes aos rastreadores foi o dobro das ouvidas na Grã-Bretanha, segundo uma pesquisa do Imperial College London.

Mesmo assim, o país manteve sob controle um pequeno aumento das novas infecções. Além do forte programa de testes adotado pela Alemanha, disse Ralf Reintjes, professor de epidemiologia da Universidade de Ciências Aplicadas de Hamburgo, o país também respondeu à pandemia investindo em suas cerca de 400 clínicas de saúde públicas, que há muito vinham realizando o rastreamento dos contatos para doenças transmissíveis.

A Inglaterra, por outro lado, assinou um contrato de 108 milhões de libras esterlinas (US$ 138 milhões) a uma companhia de outsourcing colocando o destino do rastreamento de contatos nas mãos de funcionários de ‘call centers’ mal treinados. / TRADUÇÃO DE ANNA CAPOVILLA

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