Como os répteis mais frios do planeta sobrevivem a temperaturas tão baixas


Os lagartos Liolaemus desenvolveram habilidades para lidar com o frio por meio de três mecanismos

Por Joshua Rapp Learn

Stephan Halloy estava realizando levantamentos de plantas e espécies silvestres dos elevados platôs perto de San Miguel de Tucumán, noroeste da Argentina, nos anos 1970, quando viu pela primeira vez os "picolés de lagarto". As montanhas em torno dessa cidade argentina saltam rapidamente para altitudes de 4 mil a 5 mil metros, reunindo uma multiplicidade de nichos ecológicos em uma área relativamente pequena. Os plateaus no alto podem ficar quentes durante a tarde, mas a temperatura cai rapidamente para abaixo de zero à noite: não é exatamente o tipo de ambiente onde se esperaria encontrar lagartos.

Ainda assim, Halloy, hoje funcionário do alto escalão do Ministério de Indústrias Primárias da Nova Zelândia, apanhou alguns deles e os colocou em uma caixa do lado de fora da barraca durante a noite. “Quando abri a caixa na manhã seguinte, estavam duros feito pedra: era impossível dobrá-los", lembrou Halloy recentemente. “Pareciam completamente mortos.” Mas, depois que o sol nasceu, os lagartos começaram a descongelar e logo estavam correndo normalmente dentro da caixa. “Obviamente, aquilo me surpreendeu muito", disse Halloy.

Lagarto Liolaemus magellanicus em El Chalten, perto do Monte Fitz Roy, na Argentina. Foto: Joshua Rapp Learn via The New York Times
continua após a publicidade

Nos anos 1990, o biólogo Robert Espinoza, da Universidade Estadual da Califórnia, em Northridge, soube dessa história pelo relato de Halloy, e ele tem estudado os picolés de lagarto desde então. Os lagartos pertencem ao gênero Liolaemus, e pesquisas realizadas por Espinoza e seus colegas revelaram que os lagartos são os mais frios do planeta, conseguindo manter o corpo a temperaturas baixíssimas, sobrevivendo ao congelamento e habitando regiões mais ao sul e de maior altitude do que qualquer outra espécie conhecida de lagarto. “São verdadeiros recordistas", disse Espinoza.

Espécies de Liolaemus foram encontradas na ilha da Terra do Fogo, no extremo sul das Américas, e um pesquisador soube de relatos da presença deles na geleira de Perito Moreno, na Patagônia. A maioria dos Liolaemus é encontrada na Argentina e no Chile, embora alguns sejam observados até no Peru. Contendo mais de 272 espécies documentadas, o gênero Liolaemus é o segundo maior entre todos os répteis, mamíferos e pássaros, perdendo apenas para os anoles, outro tipo de lagarto.

Espinoza ainda está pesquisando como esses lagartos sobrevivem a climas tão frios. Em um experimento, a equipe dele adaptou imitações de lagartos feitas de cobre oco com termômetros para registrar o histórico de temperaturas, instalando-os em uma área com altitude de 4.075m na província de Salta.

continua após a publicidade

Os aparelhos registraram temperaturas de até -24˚C na superfície e -9˚C no subsolo (os lagartos costumam passar a noite em cavernas). Em seguida, a equipe testou a adaptação de seis espécies ao frio em diferentes altitudes. Eles descobriram que alguns conseguiam sobreviver ao frio de até -6˚C, embora Espinoza desconfie que os lagartos são capazes de suportar temperaturas ainda mais baixas.

O Liolaemus huacahuasicus, espécie que Halloy encontrou inicialmente, habita uma montanha aproximadamente 500m mais alta do que a espécie de altitude mais elevada analisada por Espinoza — supõe-se que seria uma área mais fria. Halloy destacou em publicação de 1989 que o Liolaemus huacahuasicus poderia sobreviver ao congelamento até -10˚C, mas somente até uma altitude de 4.250m; os lagartos morriam se resfriados a -3˚C em testes realizados à altitude de 450m.

Espinoza e os colegas de pesquisa descobriram que os lagartos Liolaemus desenvolveram habilidades para lidar com o frio por meio de três mecanismos. Alguns evitam o frio extremo procurando o subterrâneo. Outros usam um processo de super-resfriamento; ficando completamente imóveis, eles permitem que o corpo alcance temperatura abaixo do ponto de congelamento sem de fato congelar. Finalmente, alguns são capazes de tolerar o congelamento do corpo por breves períodos. Espinoza disse que algumas espécies de Liolaemus devem fazer uso de mais de um desses mecanismos, dependendo das condições.

continua após a publicidade

A estratégia do congelamento do corpo todo é provavelmente semelhante à observada nos sapos da floresta na América do Norte, que ficam congelados no inverno graças a uma solução anticongelante de glucose que protege suas células; Espinoza ainda precisa investigar a hipótese para se certificar. O lagarto que habita mais ao sul em todo o mundo, o lagarto manchado de Darwin, outra espécie argentina que Espinoza estudou, provavelmente adota a estratégia do supercongelamento.

A razão pela qual os lagartos Liolaemus podem suportar temperaturas tão baixas e tamanhas altitudes também pode explicar por que há tantos lagartos desse tipo. Se apenas 50 tinham sido descritos pela ciência quando Halloy os estudou no fim dos anos 1970, hoje são mais de 272 espécies.

Espinoza e outros descobriram uma série de espécies, e o zoólogo Fernando Lobo, da Universidade Nacional of Salta, na Argentina, com quem ele trabalha ocasionalmente, descobriu 30 ou mais espécies de Liolaemus e do seu parente próximo, gênero Phymaturus. Em um dos casos, Lobo descobriu uma espécie dentro da própria barraca, no tempo fechado e gelado da província argentina de Santa Cruz, perto da fronteira com o Chile.

continua após a publicidade

“Não se pareciam com os demais", disse Lobo. “Suspeitamos que fosse uma espécie nova. Nos 25 anos mais recentes, sentimos essa emoção dezenas de vezes.” No ritmo atual de descoberta, os Liolaemus provavelmente se tornarão o gênero mais numeroso entre répteis, mamíferos e pássaros nos próximos anos. / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

The New York Times Licensing Group - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito do The New York Times

Stephan Halloy estava realizando levantamentos de plantas e espécies silvestres dos elevados platôs perto de San Miguel de Tucumán, noroeste da Argentina, nos anos 1970, quando viu pela primeira vez os "picolés de lagarto". As montanhas em torno dessa cidade argentina saltam rapidamente para altitudes de 4 mil a 5 mil metros, reunindo uma multiplicidade de nichos ecológicos em uma área relativamente pequena. Os plateaus no alto podem ficar quentes durante a tarde, mas a temperatura cai rapidamente para abaixo de zero à noite: não é exatamente o tipo de ambiente onde se esperaria encontrar lagartos.

Ainda assim, Halloy, hoje funcionário do alto escalão do Ministério de Indústrias Primárias da Nova Zelândia, apanhou alguns deles e os colocou em uma caixa do lado de fora da barraca durante a noite. “Quando abri a caixa na manhã seguinte, estavam duros feito pedra: era impossível dobrá-los", lembrou Halloy recentemente. “Pareciam completamente mortos.” Mas, depois que o sol nasceu, os lagartos começaram a descongelar e logo estavam correndo normalmente dentro da caixa. “Obviamente, aquilo me surpreendeu muito", disse Halloy.

Lagarto Liolaemus magellanicus em El Chalten, perto do Monte Fitz Roy, na Argentina. Foto: Joshua Rapp Learn via The New York Times

Nos anos 1990, o biólogo Robert Espinoza, da Universidade Estadual da Califórnia, em Northridge, soube dessa história pelo relato de Halloy, e ele tem estudado os picolés de lagarto desde então. Os lagartos pertencem ao gênero Liolaemus, e pesquisas realizadas por Espinoza e seus colegas revelaram que os lagartos são os mais frios do planeta, conseguindo manter o corpo a temperaturas baixíssimas, sobrevivendo ao congelamento e habitando regiões mais ao sul e de maior altitude do que qualquer outra espécie conhecida de lagarto. “São verdadeiros recordistas", disse Espinoza.

Espécies de Liolaemus foram encontradas na ilha da Terra do Fogo, no extremo sul das Américas, e um pesquisador soube de relatos da presença deles na geleira de Perito Moreno, na Patagônia. A maioria dos Liolaemus é encontrada na Argentina e no Chile, embora alguns sejam observados até no Peru. Contendo mais de 272 espécies documentadas, o gênero Liolaemus é o segundo maior entre todos os répteis, mamíferos e pássaros, perdendo apenas para os anoles, outro tipo de lagarto.

Espinoza ainda está pesquisando como esses lagartos sobrevivem a climas tão frios. Em um experimento, a equipe dele adaptou imitações de lagartos feitas de cobre oco com termômetros para registrar o histórico de temperaturas, instalando-os em uma área com altitude de 4.075m na província de Salta.

Os aparelhos registraram temperaturas de até -24˚C na superfície e -9˚C no subsolo (os lagartos costumam passar a noite em cavernas). Em seguida, a equipe testou a adaptação de seis espécies ao frio em diferentes altitudes. Eles descobriram que alguns conseguiam sobreviver ao frio de até -6˚C, embora Espinoza desconfie que os lagartos são capazes de suportar temperaturas ainda mais baixas.

O Liolaemus huacahuasicus, espécie que Halloy encontrou inicialmente, habita uma montanha aproximadamente 500m mais alta do que a espécie de altitude mais elevada analisada por Espinoza — supõe-se que seria uma área mais fria. Halloy destacou em publicação de 1989 que o Liolaemus huacahuasicus poderia sobreviver ao congelamento até -10˚C, mas somente até uma altitude de 4.250m; os lagartos morriam se resfriados a -3˚C em testes realizados à altitude de 450m.

Espinoza e os colegas de pesquisa descobriram que os lagartos Liolaemus desenvolveram habilidades para lidar com o frio por meio de três mecanismos. Alguns evitam o frio extremo procurando o subterrâneo. Outros usam um processo de super-resfriamento; ficando completamente imóveis, eles permitem que o corpo alcance temperatura abaixo do ponto de congelamento sem de fato congelar. Finalmente, alguns são capazes de tolerar o congelamento do corpo por breves períodos. Espinoza disse que algumas espécies de Liolaemus devem fazer uso de mais de um desses mecanismos, dependendo das condições.

A estratégia do congelamento do corpo todo é provavelmente semelhante à observada nos sapos da floresta na América do Norte, que ficam congelados no inverno graças a uma solução anticongelante de glucose que protege suas células; Espinoza ainda precisa investigar a hipótese para se certificar. O lagarto que habita mais ao sul em todo o mundo, o lagarto manchado de Darwin, outra espécie argentina que Espinoza estudou, provavelmente adota a estratégia do supercongelamento.

A razão pela qual os lagartos Liolaemus podem suportar temperaturas tão baixas e tamanhas altitudes também pode explicar por que há tantos lagartos desse tipo. Se apenas 50 tinham sido descritos pela ciência quando Halloy os estudou no fim dos anos 1970, hoje são mais de 272 espécies.

Espinoza e outros descobriram uma série de espécies, e o zoólogo Fernando Lobo, da Universidade Nacional of Salta, na Argentina, com quem ele trabalha ocasionalmente, descobriu 30 ou mais espécies de Liolaemus e do seu parente próximo, gênero Phymaturus. Em um dos casos, Lobo descobriu uma espécie dentro da própria barraca, no tempo fechado e gelado da província argentina de Santa Cruz, perto da fronteira com o Chile.

“Não se pareciam com os demais", disse Lobo. “Suspeitamos que fosse uma espécie nova. Nos 25 anos mais recentes, sentimos essa emoção dezenas de vezes.” No ritmo atual de descoberta, os Liolaemus provavelmente se tornarão o gênero mais numeroso entre répteis, mamíferos e pássaros nos próximos anos. / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

The New York Times Licensing Group - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito do The New York Times

Stephan Halloy estava realizando levantamentos de plantas e espécies silvestres dos elevados platôs perto de San Miguel de Tucumán, noroeste da Argentina, nos anos 1970, quando viu pela primeira vez os "picolés de lagarto". As montanhas em torno dessa cidade argentina saltam rapidamente para altitudes de 4 mil a 5 mil metros, reunindo uma multiplicidade de nichos ecológicos em uma área relativamente pequena. Os plateaus no alto podem ficar quentes durante a tarde, mas a temperatura cai rapidamente para abaixo de zero à noite: não é exatamente o tipo de ambiente onde se esperaria encontrar lagartos.

Ainda assim, Halloy, hoje funcionário do alto escalão do Ministério de Indústrias Primárias da Nova Zelândia, apanhou alguns deles e os colocou em uma caixa do lado de fora da barraca durante a noite. “Quando abri a caixa na manhã seguinte, estavam duros feito pedra: era impossível dobrá-los", lembrou Halloy recentemente. “Pareciam completamente mortos.” Mas, depois que o sol nasceu, os lagartos começaram a descongelar e logo estavam correndo normalmente dentro da caixa. “Obviamente, aquilo me surpreendeu muito", disse Halloy.

Lagarto Liolaemus magellanicus em El Chalten, perto do Monte Fitz Roy, na Argentina. Foto: Joshua Rapp Learn via The New York Times

Nos anos 1990, o biólogo Robert Espinoza, da Universidade Estadual da Califórnia, em Northridge, soube dessa história pelo relato de Halloy, e ele tem estudado os picolés de lagarto desde então. Os lagartos pertencem ao gênero Liolaemus, e pesquisas realizadas por Espinoza e seus colegas revelaram que os lagartos são os mais frios do planeta, conseguindo manter o corpo a temperaturas baixíssimas, sobrevivendo ao congelamento e habitando regiões mais ao sul e de maior altitude do que qualquer outra espécie conhecida de lagarto. “São verdadeiros recordistas", disse Espinoza.

Espécies de Liolaemus foram encontradas na ilha da Terra do Fogo, no extremo sul das Américas, e um pesquisador soube de relatos da presença deles na geleira de Perito Moreno, na Patagônia. A maioria dos Liolaemus é encontrada na Argentina e no Chile, embora alguns sejam observados até no Peru. Contendo mais de 272 espécies documentadas, o gênero Liolaemus é o segundo maior entre todos os répteis, mamíferos e pássaros, perdendo apenas para os anoles, outro tipo de lagarto.

Espinoza ainda está pesquisando como esses lagartos sobrevivem a climas tão frios. Em um experimento, a equipe dele adaptou imitações de lagartos feitas de cobre oco com termômetros para registrar o histórico de temperaturas, instalando-os em uma área com altitude de 4.075m na província de Salta.

Os aparelhos registraram temperaturas de até -24˚C na superfície e -9˚C no subsolo (os lagartos costumam passar a noite em cavernas). Em seguida, a equipe testou a adaptação de seis espécies ao frio em diferentes altitudes. Eles descobriram que alguns conseguiam sobreviver ao frio de até -6˚C, embora Espinoza desconfie que os lagartos são capazes de suportar temperaturas ainda mais baixas.

O Liolaemus huacahuasicus, espécie que Halloy encontrou inicialmente, habita uma montanha aproximadamente 500m mais alta do que a espécie de altitude mais elevada analisada por Espinoza — supõe-se que seria uma área mais fria. Halloy destacou em publicação de 1989 que o Liolaemus huacahuasicus poderia sobreviver ao congelamento até -10˚C, mas somente até uma altitude de 4.250m; os lagartos morriam se resfriados a -3˚C em testes realizados à altitude de 450m.

Espinoza e os colegas de pesquisa descobriram que os lagartos Liolaemus desenvolveram habilidades para lidar com o frio por meio de três mecanismos. Alguns evitam o frio extremo procurando o subterrâneo. Outros usam um processo de super-resfriamento; ficando completamente imóveis, eles permitem que o corpo alcance temperatura abaixo do ponto de congelamento sem de fato congelar. Finalmente, alguns são capazes de tolerar o congelamento do corpo por breves períodos. Espinoza disse que algumas espécies de Liolaemus devem fazer uso de mais de um desses mecanismos, dependendo das condições.

A estratégia do congelamento do corpo todo é provavelmente semelhante à observada nos sapos da floresta na América do Norte, que ficam congelados no inverno graças a uma solução anticongelante de glucose que protege suas células; Espinoza ainda precisa investigar a hipótese para se certificar. O lagarto que habita mais ao sul em todo o mundo, o lagarto manchado de Darwin, outra espécie argentina que Espinoza estudou, provavelmente adota a estratégia do supercongelamento.

A razão pela qual os lagartos Liolaemus podem suportar temperaturas tão baixas e tamanhas altitudes também pode explicar por que há tantos lagartos desse tipo. Se apenas 50 tinham sido descritos pela ciência quando Halloy os estudou no fim dos anos 1970, hoje são mais de 272 espécies.

Espinoza e outros descobriram uma série de espécies, e o zoólogo Fernando Lobo, da Universidade Nacional of Salta, na Argentina, com quem ele trabalha ocasionalmente, descobriu 30 ou mais espécies de Liolaemus e do seu parente próximo, gênero Phymaturus. Em um dos casos, Lobo descobriu uma espécie dentro da própria barraca, no tempo fechado e gelado da província argentina de Santa Cruz, perto da fronteira com o Chile.

“Não se pareciam com os demais", disse Lobo. “Suspeitamos que fosse uma espécie nova. Nos 25 anos mais recentes, sentimos essa emoção dezenas de vezes.” No ritmo atual de descoberta, os Liolaemus provavelmente se tornarão o gênero mais numeroso entre répteis, mamíferos e pássaros nos próximos anos. / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

The New York Times Licensing Group - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito do The New York Times

Stephan Halloy estava realizando levantamentos de plantas e espécies silvestres dos elevados platôs perto de San Miguel de Tucumán, noroeste da Argentina, nos anos 1970, quando viu pela primeira vez os "picolés de lagarto". As montanhas em torno dessa cidade argentina saltam rapidamente para altitudes de 4 mil a 5 mil metros, reunindo uma multiplicidade de nichos ecológicos em uma área relativamente pequena. Os plateaus no alto podem ficar quentes durante a tarde, mas a temperatura cai rapidamente para abaixo de zero à noite: não é exatamente o tipo de ambiente onde se esperaria encontrar lagartos.

Ainda assim, Halloy, hoje funcionário do alto escalão do Ministério de Indústrias Primárias da Nova Zelândia, apanhou alguns deles e os colocou em uma caixa do lado de fora da barraca durante a noite. “Quando abri a caixa na manhã seguinte, estavam duros feito pedra: era impossível dobrá-los", lembrou Halloy recentemente. “Pareciam completamente mortos.” Mas, depois que o sol nasceu, os lagartos começaram a descongelar e logo estavam correndo normalmente dentro da caixa. “Obviamente, aquilo me surpreendeu muito", disse Halloy.

Lagarto Liolaemus magellanicus em El Chalten, perto do Monte Fitz Roy, na Argentina. Foto: Joshua Rapp Learn via The New York Times

Nos anos 1990, o biólogo Robert Espinoza, da Universidade Estadual da Califórnia, em Northridge, soube dessa história pelo relato de Halloy, e ele tem estudado os picolés de lagarto desde então. Os lagartos pertencem ao gênero Liolaemus, e pesquisas realizadas por Espinoza e seus colegas revelaram que os lagartos são os mais frios do planeta, conseguindo manter o corpo a temperaturas baixíssimas, sobrevivendo ao congelamento e habitando regiões mais ao sul e de maior altitude do que qualquer outra espécie conhecida de lagarto. “São verdadeiros recordistas", disse Espinoza.

Espécies de Liolaemus foram encontradas na ilha da Terra do Fogo, no extremo sul das Américas, e um pesquisador soube de relatos da presença deles na geleira de Perito Moreno, na Patagônia. A maioria dos Liolaemus é encontrada na Argentina e no Chile, embora alguns sejam observados até no Peru. Contendo mais de 272 espécies documentadas, o gênero Liolaemus é o segundo maior entre todos os répteis, mamíferos e pássaros, perdendo apenas para os anoles, outro tipo de lagarto.

Espinoza ainda está pesquisando como esses lagartos sobrevivem a climas tão frios. Em um experimento, a equipe dele adaptou imitações de lagartos feitas de cobre oco com termômetros para registrar o histórico de temperaturas, instalando-os em uma área com altitude de 4.075m na província de Salta.

Os aparelhos registraram temperaturas de até -24˚C na superfície e -9˚C no subsolo (os lagartos costumam passar a noite em cavernas). Em seguida, a equipe testou a adaptação de seis espécies ao frio em diferentes altitudes. Eles descobriram que alguns conseguiam sobreviver ao frio de até -6˚C, embora Espinoza desconfie que os lagartos são capazes de suportar temperaturas ainda mais baixas.

O Liolaemus huacahuasicus, espécie que Halloy encontrou inicialmente, habita uma montanha aproximadamente 500m mais alta do que a espécie de altitude mais elevada analisada por Espinoza — supõe-se que seria uma área mais fria. Halloy destacou em publicação de 1989 que o Liolaemus huacahuasicus poderia sobreviver ao congelamento até -10˚C, mas somente até uma altitude de 4.250m; os lagartos morriam se resfriados a -3˚C em testes realizados à altitude de 450m.

Espinoza e os colegas de pesquisa descobriram que os lagartos Liolaemus desenvolveram habilidades para lidar com o frio por meio de três mecanismos. Alguns evitam o frio extremo procurando o subterrâneo. Outros usam um processo de super-resfriamento; ficando completamente imóveis, eles permitem que o corpo alcance temperatura abaixo do ponto de congelamento sem de fato congelar. Finalmente, alguns são capazes de tolerar o congelamento do corpo por breves períodos. Espinoza disse que algumas espécies de Liolaemus devem fazer uso de mais de um desses mecanismos, dependendo das condições.

A estratégia do congelamento do corpo todo é provavelmente semelhante à observada nos sapos da floresta na América do Norte, que ficam congelados no inverno graças a uma solução anticongelante de glucose que protege suas células; Espinoza ainda precisa investigar a hipótese para se certificar. O lagarto que habita mais ao sul em todo o mundo, o lagarto manchado de Darwin, outra espécie argentina que Espinoza estudou, provavelmente adota a estratégia do supercongelamento.

A razão pela qual os lagartos Liolaemus podem suportar temperaturas tão baixas e tamanhas altitudes também pode explicar por que há tantos lagartos desse tipo. Se apenas 50 tinham sido descritos pela ciência quando Halloy os estudou no fim dos anos 1970, hoje são mais de 272 espécies.

Espinoza e outros descobriram uma série de espécies, e o zoólogo Fernando Lobo, da Universidade Nacional of Salta, na Argentina, com quem ele trabalha ocasionalmente, descobriu 30 ou mais espécies de Liolaemus e do seu parente próximo, gênero Phymaturus. Em um dos casos, Lobo descobriu uma espécie dentro da própria barraca, no tempo fechado e gelado da província argentina de Santa Cruz, perto da fronteira com o Chile.

“Não se pareciam com os demais", disse Lobo. “Suspeitamos que fosse uma espécie nova. Nos 25 anos mais recentes, sentimos essa emoção dezenas de vezes.” No ritmo atual de descoberta, os Liolaemus provavelmente se tornarão o gênero mais numeroso entre répteis, mamíferos e pássaros nos próximos anos. / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

The New York Times Licensing Group - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito do The New York Times

Stephan Halloy estava realizando levantamentos de plantas e espécies silvestres dos elevados platôs perto de San Miguel de Tucumán, noroeste da Argentina, nos anos 1970, quando viu pela primeira vez os "picolés de lagarto". As montanhas em torno dessa cidade argentina saltam rapidamente para altitudes de 4 mil a 5 mil metros, reunindo uma multiplicidade de nichos ecológicos em uma área relativamente pequena. Os plateaus no alto podem ficar quentes durante a tarde, mas a temperatura cai rapidamente para abaixo de zero à noite: não é exatamente o tipo de ambiente onde se esperaria encontrar lagartos.

Ainda assim, Halloy, hoje funcionário do alto escalão do Ministério de Indústrias Primárias da Nova Zelândia, apanhou alguns deles e os colocou em uma caixa do lado de fora da barraca durante a noite. “Quando abri a caixa na manhã seguinte, estavam duros feito pedra: era impossível dobrá-los", lembrou Halloy recentemente. “Pareciam completamente mortos.” Mas, depois que o sol nasceu, os lagartos começaram a descongelar e logo estavam correndo normalmente dentro da caixa. “Obviamente, aquilo me surpreendeu muito", disse Halloy.

Lagarto Liolaemus magellanicus em El Chalten, perto do Monte Fitz Roy, na Argentina. Foto: Joshua Rapp Learn via The New York Times

Nos anos 1990, o biólogo Robert Espinoza, da Universidade Estadual da Califórnia, em Northridge, soube dessa história pelo relato de Halloy, e ele tem estudado os picolés de lagarto desde então. Os lagartos pertencem ao gênero Liolaemus, e pesquisas realizadas por Espinoza e seus colegas revelaram que os lagartos são os mais frios do planeta, conseguindo manter o corpo a temperaturas baixíssimas, sobrevivendo ao congelamento e habitando regiões mais ao sul e de maior altitude do que qualquer outra espécie conhecida de lagarto. “São verdadeiros recordistas", disse Espinoza.

Espécies de Liolaemus foram encontradas na ilha da Terra do Fogo, no extremo sul das Américas, e um pesquisador soube de relatos da presença deles na geleira de Perito Moreno, na Patagônia. A maioria dos Liolaemus é encontrada na Argentina e no Chile, embora alguns sejam observados até no Peru. Contendo mais de 272 espécies documentadas, o gênero Liolaemus é o segundo maior entre todos os répteis, mamíferos e pássaros, perdendo apenas para os anoles, outro tipo de lagarto.

Espinoza ainda está pesquisando como esses lagartos sobrevivem a climas tão frios. Em um experimento, a equipe dele adaptou imitações de lagartos feitas de cobre oco com termômetros para registrar o histórico de temperaturas, instalando-os em uma área com altitude de 4.075m na província de Salta.

Os aparelhos registraram temperaturas de até -24˚C na superfície e -9˚C no subsolo (os lagartos costumam passar a noite em cavernas). Em seguida, a equipe testou a adaptação de seis espécies ao frio em diferentes altitudes. Eles descobriram que alguns conseguiam sobreviver ao frio de até -6˚C, embora Espinoza desconfie que os lagartos são capazes de suportar temperaturas ainda mais baixas.

O Liolaemus huacahuasicus, espécie que Halloy encontrou inicialmente, habita uma montanha aproximadamente 500m mais alta do que a espécie de altitude mais elevada analisada por Espinoza — supõe-se que seria uma área mais fria. Halloy destacou em publicação de 1989 que o Liolaemus huacahuasicus poderia sobreviver ao congelamento até -10˚C, mas somente até uma altitude de 4.250m; os lagartos morriam se resfriados a -3˚C em testes realizados à altitude de 450m.

Espinoza e os colegas de pesquisa descobriram que os lagartos Liolaemus desenvolveram habilidades para lidar com o frio por meio de três mecanismos. Alguns evitam o frio extremo procurando o subterrâneo. Outros usam um processo de super-resfriamento; ficando completamente imóveis, eles permitem que o corpo alcance temperatura abaixo do ponto de congelamento sem de fato congelar. Finalmente, alguns são capazes de tolerar o congelamento do corpo por breves períodos. Espinoza disse que algumas espécies de Liolaemus devem fazer uso de mais de um desses mecanismos, dependendo das condições.

A estratégia do congelamento do corpo todo é provavelmente semelhante à observada nos sapos da floresta na América do Norte, que ficam congelados no inverno graças a uma solução anticongelante de glucose que protege suas células; Espinoza ainda precisa investigar a hipótese para se certificar. O lagarto que habita mais ao sul em todo o mundo, o lagarto manchado de Darwin, outra espécie argentina que Espinoza estudou, provavelmente adota a estratégia do supercongelamento.

A razão pela qual os lagartos Liolaemus podem suportar temperaturas tão baixas e tamanhas altitudes também pode explicar por que há tantos lagartos desse tipo. Se apenas 50 tinham sido descritos pela ciência quando Halloy os estudou no fim dos anos 1970, hoje são mais de 272 espécies.

Espinoza e outros descobriram uma série de espécies, e o zoólogo Fernando Lobo, da Universidade Nacional of Salta, na Argentina, com quem ele trabalha ocasionalmente, descobriu 30 ou mais espécies de Liolaemus e do seu parente próximo, gênero Phymaturus. Em um dos casos, Lobo descobriu uma espécie dentro da própria barraca, no tempo fechado e gelado da província argentina de Santa Cruz, perto da fronteira com o Chile.

“Não se pareciam com os demais", disse Lobo. “Suspeitamos que fosse uma espécie nova. Nos 25 anos mais recentes, sentimos essa emoção dezenas de vezes.” No ritmo atual de descoberta, os Liolaemus provavelmente se tornarão o gênero mais numeroso entre répteis, mamíferos e pássaros nos próximos anos. / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

The New York Times Licensing Group - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito do The New York Times

Atualizamos nossa política de cookies

Ao utilizar nossos serviços, você aceita a política de monitoramento de cookies.