A inteligência artificial (IA) deve deixar a internet e dominar os eletro-eletrônicos em 2024, sendo incorporada de geladeiras a TVs. Uma pista desse futuro foi dada pela principal feira de tecnologia e inovação do mundo, a Consumer Electronics Show (CES) de 2024, que começou em Las Vegas (Estados Unidos) no último dia 9 e seguiu até sexta-feira, 12. E isso não é uma surpresa, visto o sucesso do ChatGPT, serviço de chatbot lançado pela OpenAI em 2022 e que, rapidamente, tornou-se um dos maiores sucessos da história da internet, com mais de 100 milhões de usuários por mês.
Na feira deste ano, empresas de tecnologia apresentavam os mais diversos produtos e soluções com a IA. É o caso das coreanas Samsung e LG, que revelaram uma linha de portfólios mais inteligentes, de televisores a geladeiras e aspiradores-robô. Nem os automóveis vão escapar: a Volkswagen anunciou que vai inserir o ChatGPT nos futuros veículos da marca alemã, que vão ganhar as capacidades conversacionais desenvolvidas pela OpenAI.
Houve também os típicos protótipos curiosos da CES, feira em que são exibidas bugigangas que podem nunca chegar ao mercado, mas soam interessantes. A startup chinesa DeRucci revelou colchões e travesseiros inteligentes, que utilizam IA para se adaptar ao corpo do consumidor e apontar problemas de saúde (vencedor do prêmio de inovação deste ano na CES), enquanto a Oclean desenvolveu uma escova de dente elétrica cuja IA dá um retorno sobre a qualidade da escovação do usuário. Na cozinha, a Revolution Cooking apresentou o Macrowave, um eletrodoméstico que é simultaneamente airfryer, torradeira e microondas — e traz um painel inteligente, por onde a IA pode receber comandos.
De certa forma é como se aquilo que era chamado de “smart” ganhasse o rótulo “com IA”. Ou seja, uma smart TV agora é uma TV com IA.
“A IA está ganhando notoriedade em muitos setores, e a CES serve como um termômetro das tendências tecnológicas, aplicadas em uma enorme variedade de produtos e serviços, desde dispositivos portáteis, automóveis elétricos, indústria, agricultura e saúde”, explica Rafael Luz, analista principal de nuvem da consultoria de tecnologia Keeggo.
Rafael Luz, analista da consultoria Keeggo
Luz aponta que o campo vinha numa ascensão há anos, com o desenvolvimento de algoritmos, programas de leitura de imagens, maior disponibilidade de dados e aumento na capacidade de processamento. “É claro que o sucesso do ChatGPT não garante o futuro da IA. No entanto, é impossível negar que o modelo da OpenAI desempenhou um papel crucial no aumento do interesse e aceitação dessa tecnologia”, acrescenta.
Para o analista Dan Ives, da consultoria WedBush, a feira deste ano teve como objetivo apresentar casos práticos da inteligência artificial generativa, área em que a máquina consegue “criar” textos ou mídias (como faz o ChatGPT). Segundo pesquisa feita pela consultoria, mais de 50% empresas consultadas afirmaram que veem mais de duas dezenas de casos práticos dessa tecnologia, como em análise de dados, marketing, sumarização de documentos e mais, com consequências diretas, como maior eficiência do negócio e redução de custos.
“Para uma feira de tecnologia que começou em 1967 e foi um evento fundamental no boom tecnológico da década de 1990, já estamos vendo o burburinho e a empolgação que correspondem a esse período de ruptura graças à Revolução da IA”, escreveu o analista.
IA ganha ‘cara’
A feira deste ano também reforçou outra tendência: os dispositivos inteiramente movidos a inteligência artificial, sem telas e botões. Para muitos, são os substitutos do smartphone — ou, em outras palavras, os dispositivos “matadores de iPhone”.
Até então, o exemplo mais conhecido é o AI Pin, um broche preso à camisa ou blusa que, controlado por voz, projeta imagens na palma da mão (leia mais aqui). Criado pela startup americana Humane (formada por ex-veteranos da Apple), o dispositivo é vendido a US$ 699 desde o final do ano passado, com entregas planejadas para março deste ano - nesta semana, a empresa demitiu 4% dos funcionários e diminuiu orçamentos planejados para o ano.
Já a startup Rabbit apresentou na CES 2024 o R1, um dispositivo portátil retangular que promete comandar seu celular sem que você precise tirá-lo do bolso — tudo graças aos comandos de voz pela desenvolvida pela empresa. O aparelho é vendido a US$ 199 e deve ser entregue entre março e abril deste ano. Mesmo assim, já vendeu 10 mil unidades.
Robôs simpáticos, tipo de produto recorrente na CES, também ficaram inteligentes neste ano. Por exemplo, são o caso da própria Samsung, que atualizou o Ballie com funções de comandar outros dispositivos pela casa; e da Beyjing KEYi Technology, que criou um dispositivo para andar pela casa com o “cérebro” do ChatGPT.
“Estamos acostumados com assistentes virtuais que, muitas vezes, nos irritam pela sua baixa capacidade de entendimento e solução de problemas”, aponta Rafael Luz, da Keeggo. Segundo ele, o impulso do ChatGPT vão além da própria inteligência, pois incluem personalização de dispositivos (com capacidade de se moldar a diferentes pessoas) e interatividade (mais amigável e interativo que botões ou falar de maneira objetiva.
“Cada vez mais, vamos encontrar assistentes com capacidade para tarefas mais complexas, compreendendo nossas perguntas e nos direcionando para caminhos de solução efetiva”, diz o consultor.