Meme ‘This is fine’ faz 10 anos e continua traduzindo nossas angústias


Vez ou outra, todos nós já estivemos no meio do incêndio que cerca o personagem do quadrinho

Por Kelsey Ables
Atualização:

No começo, ele era apenas um cachorro de uma história em quadrinhos numa uma casa pegando fogo, indiferente à sua situação terrível. “This is fine” (“está tudo bem”, em tradução literal), ele dizia, para ninguém em particular. Mas, uma década depois de o artista K. C. Green ter desenhado a cena, aquele animal derrotista continua vivo como um meme viral – e que, de certa forma, fez sentido para todos nós.

Universitários estressados, políticos irritados, entusiastas das criptomoedas desanimados e blogueiros cristãos desiludidos viram a si mesmos ou as suas crises naquele cachorro. Usando um chapeuzinho elegante e encarando sua xícara de café, ele se tornou o padroeiro da negação na internet, um herói da resignação desamparada.

A história em quadrinhos original de Green, publicada em 9 de janeiro de 2013, continua em quatro cenas seguintes que costumam não aparecer no meme e termina com o animal queimado. No entanto, ao longo dos anos, Green, 35 anos, passou a se interessar mais em como o cachorro – um personagem de sua série de quadrinhos “Gunshow”, conhecido como Question Hound – poderia ter um final mais feliz.

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Ele gosta das novas versões da história em quadrinhos que sugerem “crescer com essa angústia, unir forças e não se sentir totalmente desamparado”, disse ele pouco depois do décimo aniversário da publicação.

Nessas iterações, seu amigo peludo tem uma certa dose de controle sobre a ação e as consequências – sugerindo que o mesmo ocorre conosco.

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Em uma versão que circulou após a vitória de Joe Biden nas eleições de 2020, um bombeiro resgata o cachorro de uma espessa fumaça cinza. Já em outra para videogame, o cão está armado com um extintor de incêndio. Em outra paródia, ele não chega nem a se envolver em todo o fiasco em chamas. Em vez disso, ele está cercado por vasos de plantas. “This is fine”, de fato.

Green criou a história em quadrinhos quando estava tendo dificuldades para se adaptar aos antidepressivos, mas, na última década, ela foi usada para se referir a problemas tão díspares quanto a agonia de comer um salgadinho extremamente picante e a crise do custo de vida. Logo no começo, ela era usada na maioria das vezes para fazer referência a batalhas pessoais, mas ao longo dos anos de pandemia, mudanças climáticas e outros conflitos, seu sucesso virou um sintoma de um sentido mais amplo de que “estamos observando algo desmoronar”, diz Green.

Após a eleição de 2016 nos EUA, que elegeu Donald Trump como presidente, Green desenhou sua própria versão alternativa, na qual o cachorro grita: “Não tá tudo bem” e apaga o fogo. “O que eu na verdade nunca vi no [uso original do] meme foi amadurecer a partir dos problemas com os quais estamos lidando”, disse ele.

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Isso não saía da cabeça de Green conforme a popularidade das imagens aumentava com as novas crises. Ele vende mercadorias relacionadas ao meme e faz projetos alusivos à história em quadrinhos para apoiar seu outro trabalho, mas pode parecer estranho construir uma carreira em cima de uma imagem de desamparo, segundo o artista. “O meme continua o mesmo, mas o que as pessoas tiram a partir dele é um pouco diferente a cada ano”, disse ele. “Isso não é tão ruim.”

Meme "This is Fine" ficou popular na internet nos últimos 10 anos Foto: K. C. Green/Reprodução

Antes, “a casa em chamas talvez fossem suas provas finais”, disse ele referindo-se a um uso popular do meme à princípio. “Agora, parece que ela é o mundo, o seu país.”

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Mas não é que a sociedade tenha entrado num caos permanente. Se antes encarávamos as chamas quando assistíamos aos noticiários na TV à noite, a presença constante da internet tornou muitos de nós moradores daquela casa pegando fogo.

“À medida que ficamos mais online, isso se torna mais evidente”, disse Green. “Vemos todas as coisas absurdas que as pessoas fazem e dizem.”

E não há amortecedor entre qualquer disparate que o Twitter tenha acabado de lhe mostrar e as demandas banais da vida. Esse é o sentimento surreal ao qual a história em quadrinhos faz referência de forma mais incisiva. Dirigir para o trabalho sob um céu laranja enquanto vê de longe incêndios florestais. Parar no supermercado para comprar leite ao mesmo tempo que uma insurreição acontece. Passear com o cachorro ao som das sirenes estridentes das ambulâncias no pico da pandemia de covid.

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“Está tudo bem”, dizemos a nós mesmos para conseguir sobreviver. “Está tudo bem”, dizemos, quando sabemos com certeza que não está.

E, no entanto, há algo de reconfortante em ter uma imagem a qual se remeter em momentos de desamparo, disse Green – como se, ao sentir empatia pelo cachorro da história em quadrinhos, todos estivéssemos soltando o ar juntos.

“Para mim, era o que eu sentia até me adaptar à minha medicação. Para algumas crianças, eram as provas finais. Para uns, tinha a ver com Trump ser eleito. Para outros, com a covid”, disse ele. “É bem legal. Cria uma espécie de comunidade.”/TRADUÇÃO DE ROMINA CÁCIA

No começo, ele era apenas um cachorro de uma história em quadrinhos numa uma casa pegando fogo, indiferente à sua situação terrível. “This is fine” (“está tudo bem”, em tradução literal), ele dizia, para ninguém em particular. Mas, uma década depois de o artista K. C. Green ter desenhado a cena, aquele animal derrotista continua vivo como um meme viral – e que, de certa forma, fez sentido para todos nós.

Universitários estressados, políticos irritados, entusiastas das criptomoedas desanimados e blogueiros cristãos desiludidos viram a si mesmos ou as suas crises naquele cachorro. Usando um chapeuzinho elegante e encarando sua xícara de café, ele se tornou o padroeiro da negação na internet, um herói da resignação desamparada.

A história em quadrinhos original de Green, publicada em 9 de janeiro de 2013, continua em quatro cenas seguintes que costumam não aparecer no meme e termina com o animal queimado. No entanto, ao longo dos anos, Green, 35 anos, passou a se interessar mais em como o cachorro – um personagem de sua série de quadrinhos “Gunshow”, conhecido como Question Hound – poderia ter um final mais feliz.

Ele gosta das novas versões da história em quadrinhos que sugerem “crescer com essa angústia, unir forças e não se sentir totalmente desamparado”, disse ele pouco depois do décimo aniversário da publicação.

Nessas iterações, seu amigo peludo tem uma certa dose de controle sobre a ação e as consequências – sugerindo que o mesmo ocorre conosco.

Em uma versão que circulou após a vitória de Joe Biden nas eleições de 2020, um bombeiro resgata o cachorro de uma espessa fumaça cinza. Já em outra para videogame, o cão está armado com um extintor de incêndio. Em outra paródia, ele não chega nem a se envolver em todo o fiasco em chamas. Em vez disso, ele está cercado por vasos de plantas. “This is fine”, de fato.

Green criou a história em quadrinhos quando estava tendo dificuldades para se adaptar aos antidepressivos, mas, na última década, ela foi usada para se referir a problemas tão díspares quanto a agonia de comer um salgadinho extremamente picante e a crise do custo de vida. Logo no começo, ela era usada na maioria das vezes para fazer referência a batalhas pessoais, mas ao longo dos anos de pandemia, mudanças climáticas e outros conflitos, seu sucesso virou um sintoma de um sentido mais amplo de que “estamos observando algo desmoronar”, diz Green.

Após a eleição de 2016 nos EUA, que elegeu Donald Trump como presidente, Green desenhou sua própria versão alternativa, na qual o cachorro grita: “Não tá tudo bem” e apaga o fogo. “O que eu na verdade nunca vi no [uso original do] meme foi amadurecer a partir dos problemas com os quais estamos lidando”, disse ele.

Isso não saía da cabeça de Green conforme a popularidade das imagens aumentava com as novas crises. Ele vende mercadorias relacionadas ao meme e faz projetos alusivos à história em quadrinhos para apoiar seu outro trabalho, mas pode parecer estranho construir uma carreira em cima de uma imagem de desamparo, segundo o artista. “O meme continua o mesmo, mas o que as pessoas tiram a partir dele é um pouco diferente a cada ano”, disse ele. “Isso não é tão ruim.”

Meme "This is Fine" ficou popular na internet nos últimos 10 anos Foto: K. C. Green/Reprodução

Antes, “a casa em chamas talvez fossem suas provas finais”, disse ele referindo-se a um uso popular do meme à princípio. “Agora, parece que ela é o mundo, o seu país.”

Mas não é que a sociedade tenha entrado num caos permanente. Se antes encarávamos as chamas quando assistíamos aos noticiários na TV à noite, a presença constante da internet tornou muitos de nós moradores daquela casa pegando fogo.

“À medida que ficamos mais online, isso se torna mais evidente”, disse Green. “Vemos todas as coisas absurdas que as pessoas fazem e dizem.”

E não há amortecedor entre qualquer disparate que o Twitter tenha acabado de lhe mostrar e as demandas banais da vida. Esse é o sentimento surreal ao qual a história em quadrinhos faz referência de forma mais incisiva. Dirigir para o trabalho sob um céu laranja enquanto vê de longe incêndios florestais. Parar no supermercado para comprar leite ao mesmo tempo que uma insurreição acontece. Passear com o cachorro ao som das sirenes estridentes das ambulâncias no pico da pandemia de covid.

“Está tudo bem”, dizemos a nós mesmos para conseguir sobreviver. “Está tudo bem”, dizemos, quando sabemos com certeza que não está.

E, no entanto, há algo de reconfortante em ter uma imagem a qual se remeter em momentos de desamparo, disse Green – como se, ao sentir empatia pelo cachorro da história em quadrinhos, todos estivéssemos soltando o ar juntos.

“Para mim, era o que eu sentia até me adaptar à minha medicação. Para algumas crianças, eram as provas finais. Para uns, tinha a ver com Trump ser eleito. Para outros, com a covid”, disse ele. “É bem legal. Cria uma espécie de comunidade.”/TRADUÇÃO DE ROMINA CÁCIA

No começo, ele era apenas um cachorro de uma história em quadrinhos numa uma casa pegando fogo, indiferente à sua situação terrível. “This is fine” (“está tudo bem”, em tradução literal), ele dizia, para ninguém em particular. Mas, uma década depois de o artista K. C. Green ter desenhado a cena, aquele animal derrotista continua vivo como um meme viral – e que, de certa forma, fez sentido para todos nós.

Universitários estressados, políticos irritados, entusiastas das criptomoedas desanimados e blogueiros cristãos desiludidos viram a si mesmos ou as suas crises naquele cachorro. Usando um chapeuzinho elegante e encarando sua xícara de café, ele se tornou o padroeiro da negação na internet, um herói da resignação desamparada.

A história em quadrinhos original de Green, publicada em 9 de janeiro de 2013, continua em quatro cenas seguintes que costumam não aparecer no meme e termina com o animal queimado. No entanto, ao longo dos anos, Green, 35 anos, passou a se interessar mais em como o cachorro – um personagem de sua série de quadrinhos “Gunshow”, conhecido como Question Hound – poderia ter um final mais feliz.

Ele gosta das novas versões da história em quadrinhos que sugerem “crescer com essa angústia, unir forças e não se sentir totalmente desamparado”, disse ele pouco depois do décimo aniversário da publicação.

Nessas iterações, seu amigo peludo tem uma certa dose de controle sobre a ação e as consequências – sugerindo que o mesmo ocorre conosco.

Em uma versão que circulou após a vitória de Joe Biden nas eleições de 2020, um bombeiro resgata o cachorro de uma espessa fumaça cinza. Já em outra para videogame, o cão está armado com um extintor de incêndio. Em outra paródia, ele não chega nem a se envolver em todo o fiasco em chamas. Em vez disso, ele está cercado por vasos de plantas. “This is fine”, de fato.

Green criou a história em quadrinhos quando estava tendo dificuldades para se adaptar aos antidepressivos, mas, na última década, ela foi usada para se referir a problemas tão díspares quanto a agonia de comer um salgadinho extremamente picante e a crise do custo de vida. Logo no começo, ela era usada na maioria das vezes para fazer referência a batalhas pessoais, mas ao longo dos anos de pandemia, mudanças climáticas e outros conflitos, seu sucesso virou um sintoma de um sentido mais amplo de que “estamos observando algo desmoronar”, diz Green.

Após a eleição de 2016 nos EUA, que elegeu Donald Trump como presidente, Green desenhou sua própria versão alternativa, na qual o cachorro grita: “Não tá tudo bem” e apaga o fogo. “O que eu na verdade nunca vi no [uso original do] meme foi amadurecer a partir dos problemas com os quais estamos lidando”, disse ele.

Isso não saía da cabeça de Green conforme a popularidade das imagens aumentava com as novas crises. Ele vende mercadorias relacionadas ao meme e faz projetos alusivos à história em quadrinhos para apoiar seu outro trabalho, mas pode parecer estranho construir uma carreira em cima de uma imagem de desamparo, segundo o artista. “O meme continua o mesmo, mas o que as pessoas tiram a partir dele é um pouco diferente a cada ano”, disse ele. “Isso não é tão ruim.”

Meme "This is Fine" ficou popular na internet nos últimos 10 anos Foto: K. C. Green/Reprodução

Antes, “a casa em chamas talvez fossem suas provas finais”, disse ele referindo-se a um uso popular do meme à princípio. “Agora, parece que ela é o mundo, o seu país.”

Mas não é que a sociedade tenha entrado num caos permanente. Se antes encarávamos as chamas quando assistíamos aos noticiários na TV à noite, a presença constante da internet tornou muitos de nós moradores daquela casa pegando fogo.

“À medida que ficamos mais online, isso se torna mais evidente”, disse Green. “Vemos todas as coisas absurdas que as pessoas fazem e dizem.”

E não há amortecedor entre qualquer disparate que o Twitter tenha acabado de lhe mostrar e as demandas banais da vida. Esse é o sentimento surreal ao qual a história em quadrinhos faz referência de forma mais incisiva. Dirigir para o trabalho sob um céu laranja enquanto vê de longe incêndios florestais. Parar no supermercado para comprar leite ao mesmo tempo que uma insurreição acontece. Passear com o cachorro ao som das sirenes estridentes das ambulâncias no pico da pandemia de covid.

“Está tudo bem”, dizemos a nós mesmos para conseguir sobreviver. “Está tudo bem”, dizemos, quando sabemos com certeza que não está.

E, no entanto, há algo de reconfortante em ter uma imagem a qual se remeter em momentos de desamparo, disse Green – como se, ao sentir empatia pelo cachorro da história em quadrinhos, todos estivéssemos soltando o ar juntos.

“Para mim, era o que eu sentia até me adaptar à minha medicação. Para algumas crianças, eram as provas finais. Para uns, tinha a ver com Trump ser eleito. Para outros, com a covid”, disse ele. “É bem legal. Cria uma espécie de comunidade.”/TRADUÇÃO DE ROMINA CÁCIA

No começo, ele era apenas um cachorro de uma história em quadrinhos numa uma casa pegando fogo, indiferente à sua situação terrível. “This is fine” (“está tudo bem”, em tradução literal), ele dizia, para ninguém em particular. Mas, uma década depois de o artista K. C. Green ter desenhado a cena, aquele animal derrotista continua vivo como um meme viral – e que, de certa forma, fez sentido para todos nós.

Universitários estressados, políticos irritados, entusiastas das criptomoedas desanimados e blogueiros cristãos desiludidos viram a si mesmos ou as suas crises naquele cachorro. Usando um chapeuzinho elegante e encarando sua xícara de café, ele se tornou o padroeiro da negação na internet, um herói da resignação desamparada.

A história em quadrinhos original de Green, publicada em 9 de janeiro de 2013, continua em quatro cenas seguintes que costumam não aparecer no meme e termina com o animal queimado. No entanto, ao longo dos anos, Green, 35 anos, passou a se interessar mais em como o cachorro – um personagem de sua série de quadrinhos “Gunshow”, conhecido como Question Hound – poderia ter um final mais feliz.

Ele gosta das novas versões da história em quadrinhos que sugerem “crescer com essa angústia, unir forças e não se sentir totalmente desamparado”, disse ele pouco depois do décimo aniversário da publicação.

Nessas iterações, seu amigo peludo tem uma certa dose de controle sobre a ação e as consequências – sugerindo que o mesmo ocorre conosco.

Em uma versão que circulou após a vitória de Joe Biden nas eleições de 2020, um bombeiro resgata o cachorro de uma espessa fumaça cinza. Já em outra para videogame, o cão está armado com um extintor de incêndio. Em outra paródia, ele não chega nem a se envolver em todo o fiasco em chamas. Em vez disso, ele está cercado por vasos de plantas. “This is fine”, de fato.

Green criou a história em quadrinhos quando estava tendo dificuldades para se adaptar aos antidepressivos, mas, na última década, ela foi usada para se referir a problemas tão díspares quanto a agonia de comer um salgadinho extremamente picante e a crise do custo de vida. Logo no começo, ela era usada na maioria das vezes para fazer referência a batalhas pessoais, mas ao longo dos anos de pandemia, mudanças climáticas e outros conflitos, seu sucesso virou um sintoma de um sentido mais amplo de que “estamos observando algo desmoronar”, diz Green.

Após a eleição de 2016 nos EUA, que elegeu Donald Trump como presidente, Green desenhou sua própria versão alternativa, na qual o cachorro grita: “Não tá tudo bem” e apaga o fogo. “O que eu na verdade nunca vi no [uso original do] meme foi amadurecer a partir dos problemas com os quais estamos lidando”, disse ele.

Isso não saía da cabeça de Green conforme a popularidade das imagens aumentava com as novas crises. Ele vende mercadorias relacionadas ao meme e faz projetos alusivos à história em quadrinhos para apoiar seu outro trabalho, mas pode parecer estranho construir uma carreira em cima de uma imagem de desamparo, segundo o artista. “O meme continua o mesmo, mas o que as pessoas tiram a partir dele é um pouco diferente a cada ano”, disse ele. “Isso não é tão ruim.”

Meme "This is Fine" ficou popular na internet nos últimos 10 anos Foto: K. C. Green/Reprodução

Antes, “a casa em chamas talvez fossem suas provas finais”, disse ele referindo-se a um uso popular do meme à princípio. “Agora, parece que ela é o mundo, o seu país.”

Mas não é que a sociedade tenha entrado num caos permanente. Se antes encarávamos as chamas quando assistíamos aos noticiários na TV à noite, a presença constante da internet tornou muitos de nós moradores daquela casa pegando fogo.

“À medida que ficamos mais online, isso se torna mais evidente”, disse Green. “Vemos todas as coisas absurdas que as pessoas fazem e dizem.”

E não há amortecedor entre qualquer disparate que o Twitter tenha acabado de lhe mostrar e as demandas banais da vida. Esse é o sentimento surreal ao qual a história em quadrinhos faz referência de forma mais incisiva. Dirigir para o trabalho sob um céu laranja enquanto vê de longe incêndios florestais. Parar no supermercado para comprar leite ao mesmo tempo que uma insurreição acontece. Passear com o cachorro ao som das sirenes estridentes das ambulâncias no pico da pandemia de covid.

“Está tudo bem”, dizemos a nós mesmos para conseguir sobreviver. “Está tudo bem”, dizemos, quando sabemos com certeza que não está.

E, no entanto, há algo de reconfortante em ter uma imagem a qual se remeter em momentos de desamparo, disse Green – como se, ao sentir empatia pelo cachorro da história em quadrinhos, todos estivéssemos soltando o ar juntos.

“Para mim, era o que eu sentia até me adaptar à minha medicação. Para algumas crianças, eram as provas finais. Para uns, tinha a ver com Trump ser eleito. Para outros, com a covid”, disse ele. “É bem legal. Cria uma espécie de comunidade.”/TRADUÇÃO DE ROMINA CÁCIA

No começo, ele era apenas um cachorro de uma história em quadrinhos numa uma casa pegando fogo, indiferente à sua situação terrível. “This is fine” (“está tudo bem”, em tradução literal), ele dizia, para ninguém em particular. Mas, uma década depois de o artista K. C. Green ter desenhado a cena, aquele animal derrotista continua vivo como um meme viral – e que, de certa forma, fez sentido para todos nós.

Universitários estressados, políticos irritados, entusiastas das criptomoedas desanimados e blogueiros cristãos desiludidos viram a si mesmos ou as suas crises naquele cachorro. Usando um chapeuzinho elegante e encarando sua xícara de café, ele se tornou o padroeiro da negação na internet, um herói da resignação desamparada.

A história em quadrinhos original de Green, publicada em 9 de janeiro de 2013, continua em quatro cenas seguintes que costumam não aparecer no meme e termina com o animal queimado. No entanto, ao longo dos anos, Green, 35 anos, passou a se interessar mais em como o cachorro – um personagem de sua série de quadrinhos “Gunshow”, conhecido como Question Hound – poderia ter um final mais feliz.

Ele gosta das novas versões da história em quadrinhos que sugerem “crescer com essa angústia, unir forças e não se sentir totalmente desamparado”, disse ele pouco depois do décimo aniversário da publicação.

Nessas iterações, seu amigo peludo tem uma certa dose de controle sobre a ação e as consequências – sugerindo que o mesmo ocorre conosco.

Em uma versão que circulou após a vitória de Joe Biden nas eleições de 2020, um bombeiro resgata o cachorro de uma espessa fumaça cinza. Já em outra para videogame, o cão está armado com um extintor de incêndio. Em outra paródia, ele não chega nem a se envolver em todo o fiasco em chamas. Em vez disso, ele está cercado por vasos de plantas. “This is fine”, de fato.

Green criou a história em quadrinhos quando estava tendo dificuldades para se adaptar aos antidepressivos, mas, na última década, ela foi usada para se referir a problemas tão díspares quanto a agonia de comer um salgadinho extremamente picante e a crise do custo de vida. Logo no começo, ela era usada na maioria das vezes para fazer referência a batalhas pessoais, mas ao longo dos anos de pandemia, mudanças climáticas e outros conflitos, seu sucesso virou um sintoma de um sentido mais amplo de que “estamos observando algo desmoronar”, diz Green.

Após a eleição de 2016 nos EUA, que elegeu Donald Trump como presidente, Green desenhou sua própria versão alternativa, na qual o cachorro grita: “Não tá tudo bem” e apaga o fogo. “O que eu na verdade nunca vi no [uso original do] meme foi amadurecer a partir dos problemas com os quais estamos lidando”, disse ele.

Isso não saía da cabeça de Green conforme a popularidade das imagens aumentava com as novas crises. Ele vende mercadorias relacionadas ao meme e faz projetos alusivos à história em quadrinhos para apoiar seu outro trabalho, mas pode parecer estranho construir uma carreira em cima de uma imagem de desamparo, segundo o artista. “O meme continua o mesmo, mas o que as pessoas tiram a partir dele é um pouco diferente a cada ano”, disse ele. “Isso não é tão ruim.”

Meme "This is Fine" ficou popular na internet nos últimos 10 anos Foto: K. C. Green/Reprodução

Antes, “a casa em chamas talvez fossem suas provas finais”, disse ele referindo-se a um uso popular do meme à princípio. “Agora, parece que ela é o mundo, o seu país.”

Mas não é que a sociedade tenha entrado num caos permanente. Se antes encarávamos as chamas quando assistíamos aos noticiários na TV à noite, a presença constante da internet tornou muitos de nós moradores daquela casa pegando fogo.

“À medida que ficamos mais online, isso se torna mais evidente”, disse Green. “Vemos todas as coisas absurdas que as pessoas fazem e dizem.”

E não há amortecedor entre qualquer disparate que o Twitter tenha acabado de lhe mostrar e as demandas banais da vida. Esse é o sentimento surreal ao qual a história em quadrinhos faz referência de forma mais incisiva. Dirigir para o trabalho sob um céu laranja enquanto vê de longe incêndios florestais. Parar no supermercado para comprar leite ao mesmo tempo que uma insurreição acontece. Passear com o cachorro ao som das sirenes estridentes das ambulâncias no pico da pandemia de covid.

“Está tudo bem”, dizemos a nós mesmos para conseguir sobreviver. “Está tudo bem”, dizemos, quando sabemos com certeza que não está.

E, no entanto, há algo de reconfortante em ter uma imagem a qual se remeter em momentos de desamparo, disse Green – como se, ao sentir empatia pelo cachorro da história em quadrinhos, todos estivéssemos soltando o ar juntos.

“Para mim, era o que eu sentia até me adaptar à minha medicação. Para algumas crianças, eram as provas finais. Para uns, tinha a ver com Trump ser eleito. Para outros, com a covid”, disse ele. “É bem legal. Cria uma espécie de comunidade.”/TRADUÇÃO DE ROMINA CÁCIA

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