O israelense Nir Eyal ganhou fama nos últimos anos no Vale do Silício por um motivo bem particular: lançado em 2014, seu livro Hooked: How to Build Habit-Forming Products (Viciado: como criar produtos formadores de hábitos, em tradução livre) virou um guia prático para criar aplicativos de celular cativantes, capazes de “sutilmente motivar o comportamento do cliente” e “trazer continuamente o usuário de volta”. Agora, ele tem um antídoto para seu próprio método: o novo livro, Indistractable: How to Control Your Attention and Choose Your Life (Indistraível: como controlar sua atenção e escolher sua vida, em tradução literal).
O primeiro livro era um guia para viciar – Dave McClure, fundador da incubadora 500 Startups, considerou a obra um “manual essencial para qualquer startup que busca entender a psicologia do usuário”. Isso foi em 2014, quando um app tipo caça-níquel era algo bom e empolgante e não algo digno de preocupação. O novo trabalho é um método para reverter o vício.
Eyal, de 41 anos, não está sozinho nesta mudança de direção. Desde Hooked, muitas pessoas, como Tristan Harris, que foi responsável pela divisão de ética do Google, vêm propagando a ideia de que os telefones não são saudáveis e viciam. Antigos executivos do Facebook e WhatsApp se tornaram críticos da tecnologia. “Começaremos a perceber que ficar acorrentado ao celular é um comportamento de baixo prestígio, como fumar”, escreveu B. J. Fogg, pesquisador da Universidade Stanford.
Mas, ao contrário de outros críticos, Eyal não acha que a tecnologia é o problema – e sim somos nós, humanos. “Falamos sobre vício, mas quando se trata do Candy Crush, é isso mesmo? Não estamos inalando Facebook ou injetando Instagram na veia”, diz ele. “Essas são coisas com relação às quais podemos fazer alguma coisa, mas preferimos pensar no que a tecnologia está fazendo por nós.”
No livro, ele traz um guia para libertar as pessoas de um vício que, acredita, elas nunca tiveram. É apenas uma rejeição da responsabilidade pessoal, em sua opinião. De modo que a solução é recuperar a responsabilidade, adotando inúmeras pequenas atitudes.
Por exemplo: manter seu telefone no silencioso, cedendo menos às notificações. Enviar menos e-mails, mais rápidos. Não passar muito tempo no Slack. Ter apenas um laptop à mão durante reuniões. Introduzir a pressão social, por exemplo, sentando-se ao lado que alguém que pode ver sua tela. Estabelecer “pactos com preço” com pessoas, de modo que você pagará a elas se ficar distraído – mas certificar-se de “aprender” o que é compaixão antes de estabelecer o pacto
Claro que o novo livro de Eyal recebeu críticas. “A tentativa de Nir Eyal é de reverter o processo”, disse Richard Freed, psicólogo infantil que apoia que todos passem menos tempo diante da tela. “Essas pessoas que provocaram tudo isso estão tentando agora vendendo a cura. Mas eram elas que estavam vendendo a droga.”
Eyal disse que não está fazendo uma reversão. Seu modelo foi útil, certamente, e ele acreditava nas táticas. Mas não estava viciando as pessoas. É uma falha delas, afirmou, e não do Instagram, do Facebook ou da Apple. “É um desrespeito às pessoas que têm a patologia do vício afirmarem ‘ah, todos nós temos esta doença’”, disse ele. “Não, não temos”./ TRADUÇÃO DE TEREZINHA MARTINO