O mercado de tecnologia está mais difícil. Após a onda de demissões em massa iniciada em 2022, desenvolvedores e programadores estão vendo encolher seus salários, surgir menos vagas e presenciando mais dificuldades para novatos – é o que aponta o estudo “Guia Salarial Tecnologia 2024″, realizado pela consultoria brasileira Fox Human Capital e divulgado em reportagem na semana passada pelo Estadão.
Essas mudanças contrastam com os salários altos e benefícios diversos tão tradicionais no mercado de tecnologia. Segundo o relatório da Fox Human, essas características ainda são verdadeiras, pois ainda se trata de uma área promissora. Mas as negociações entre empresas e candidatos, nos últimos anos, está mais equilibrada, com as empresas ganhando mais poder na conversa.
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A mudança começou em 2022. Esse foi o ano em que se deu início à alta dos juros globais e em que as companhias de tecnologia começaram a notar menor demanda por seus serviços digitais, altamente utilizados durante a pandemia de covid-19. O cenário desafiador forçou essas empresas a buscar maior eficiência na operação, bem como reduzir custos, realizando demissões e enxugando áreas que não eram tão lucrativas. Consequentemente, equipes ficaram menores, e a demanda por novos profissionais diminuiu.
“O mercado de trabalho corrigiu as distorções nos salários após os layoffs”, explica Filippe Apolo, um dos coordenadores do estudo da Fox Human Capital, da qual o executivo é fundador e sócio. “Antes, estava desequilibrado e irracional. Havia uma discrepância nos salários. E o mercado corrigiu o excesso de profissionais recebendo muito dinheiro.”
Abaixo, veja cinco pontos para entender o que mudou no novo mercado de tecnologia.
Redução de salários
Com as demissões em massa, as empresas de tecnologia repensaram os salários de novos funcionários contratados. E o ajuste foi negativo para muitas categorias, segundo aponta o estudo da Fox Human Capital.
Salários para desenvolvedores full stack, front end e back end com mais tempo de carreira (sênior) subiram, em média, 12% de 2022 para 2024. Já os novatos (juniores e plenos) viram encolher em 14,5%, em média.
Diminuição de vagas
Companhias de tecnologia também estão contratando menos pessoas da área de programação, buscando mais eficiência e redução de custos. Para desenvolvedores, isso significa que as vagas estão mais disputadas.
O mercado de recrutamento em tecnologia contrasta com o que se via até 2022. Antes dessa época, as empresas estavam em crescimento acelerado, muito por conta do impulso exigido pela digitalização causada pela pandemia de covid-19.
Filippe Apolo, sócio da Fox Human Capital
Novatos com mais dificuldades
Desenvolvedores juniores são os mais afetados pelas mudanças no mercado de tecnologia. Isso porque, para as empresas, em um cenário de menos contratações, é mais eficiente contratar profissionais mais velhos, tidos como mais qualificados para resolver grandes problemas de programação.
Chegada da inteligência artificial (IA)
A inteligência artificial (IA) pode prejudicar também os próprios funcionários de tecnologia. Na área, ferramentas que ajudam a escrever linhas de código começam a se popularizar, como o copiloto do GitHub ou o próprio ChatGPT.
“Os profissionais que executam funções mais repetitivas estão mais ameaçados”, explica Filippe Apolo. “Há três anos, um desenvolvedor demorava três a quatro horas para codar uma linha. Hoje, com IA, ele demora 20 ou 30 minutos para realizar o mesmo trabalho.”
Há um lado bom: vagas para quem trabalha com IA (como cientista de dados e especialistas em aprendizado de máquina) estão em alta.
Salário emocional
Para compensar o cenário de piora para os funcionários, empresas de tecnologia adotaram o que a consultoria Fox Human chama de “salário emocional”.
Salário emocional refere-se ao conjunto de benefícios que vão além do holerite mensal, como assistência médica, vale-transporte, vale-refeição e afins. Outro fator é o ambiente de trabalho, o que inclui o enfoque em saúde mental e em políticas de trabalho remoto.
“No momento em que os salários estão em baixa, olhar para o salário emocional é uma forma de atrair bons profissionais. Nossas empresas precisam ‘sambar’ mais para competir com as empresas que pagam em dólar, trazendo diferenciais como programas de diversidade, por exemplo”, diz Apolo. “Salário emocional é acolhimento, perspectiva, benefício. A companhia que não tiver vai perder competitividade no mercado.”