Temporada de busca por um supercondutor termina de maneira frustrante; qual o futuro da área?


Depois dos casos fracassados do LK-99 e do hidreto de lutécio, área vive ressaca na busca por materiais com propriedades supercondutoras em temperatura ambiente

Por Bruno Romani

A busca por um material supercondutor em temperatura ambiente teve uma temporada frustrante em 2023. A descoberta, que poderia revolucionar diversas áreas da ciência e da tecnologia, foi anunciada por dois grupos diferentes de pesquisadores ao longo do ano, mas logo a fanfarra deu lugar a suspeitas de fraude e críticas de falhas básicas nas pesquisas. Para entusiastas e pesquisadores, o momento é de entender para onde vão as pesquisas.

Os supercondutores são materiais capazes de conduzir eletricidade sem nenhuma resistência, o que significa que não há perda de energia por meio do calor. A existência deles é conhecida há mais de um século, mas, até aqui, suas propriedades só aparecem sob circunstâncias especiais.

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“O material precisa estar abaixo de uma temperatura crítica, de uma pressão crítica e de um campo magnético crítico”, explica Jorge Luiz Pimentel Jr, vice-diretor do Instituto de Matemática, Estatística e Física da Universidade Federal do Rio Grande (FURG). Isso significa que as aplicações atuais de supercondutores exigem sistemas de resfriamento e pressão específicos, o que encarece e inviabiliza a sua aplicação em larga escala.

É isso que dois grupos diferentes de pesquisa afirmavam ter superado. Tanto o grupo liderado pelo americano Ranga P. Dias, da Universidade de Rochester (EUA), quanto o dos sul-coreanos Sukbae Lee and Ji-Hoon Kim, da startup Quantum Energy Research Center, anunciaram, respectivamente em março e em julho, terem descoberto supercondutores em temperatura ambiente. Se verdadeiros, seriam anúncios revolucionários.

Supercondutores em temperatura ambiente poderiam ser usados em cabos de transmissão de energia, permitindo eficiência máxima. Turbinas eólicas poderiam gerar mais energia, carros elétricos demandariam menos de suas baterias e trens magnéticos se tornariam mais acessíveis. Em casos mais hipotéticos, a descoberta abriria as portas para reatores de fusão nuclear, que funcionam como fontes abundantes de energia limpa.

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Computador quântico poderia se beneficiar de componentes supercondutores  Foto: Google/Divulgação

Na computação quântica, máquinas que prometem capacidade muito superior à dos computadores atuais, o supercondutor poderia viabilizar avanços difíceis de imaginar. “Os principais computadores quânticos são baseados em circuitos supercondutores e um dos principais desafios é manter os sistemas resfriados, o que aumenta muito o custo. Se fosse possível construir circuitos supercondutores em temperatura, provavelmente a capacidade aumentaria”, explica Bárbara Amaral, pesquisadora de informação quântica do Instituto de Física da Universidade de São Paulo (USP).

“O pesquisador que descobrir um supercondutor em temperatura ambiente é um grande candidato ao Prêmio Nobel. Isso mudaria tudo”, explica Luiz Tadeu Fernandes Eleno, professor da Escola de Engenharia de Lorena (EEL) na USP.

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Pressa e desejo

A possibilidade de entrar para a história parece mexer com a ambição de alguns cientistas. Os pesquisadores sul-coreanos publicaram em julho dois estudos que apresentavam o LK-99, um mineral que contém cobre, chumbo, fósforo e oxigênio. Segundo eles, o material apresentava propriedades supercondutoras em temperatura e pressão ambiente. Logo, porém, foram contestados - a apresentação do trabalho, feita sem a revisão de pares, aumentou a desconfiança.

“Ao olhar os gráficos dos coreanos, a resistência elétrica nunca chegou a zero. Há muitos problemas nos detalhes e qualquer pessoa da área consegue ver. Não acho que houve má-fé no caso deles. É um artigo ingênuo. Essas pessoas nem são da área de supercondutividade, não são conhecidas,” explica Eleno. Posteriormente, os pesquisadores admitiram problemas no artigo e prometeram uma nova versão com correções - a atualização não havia sido publicada até a conclusão deste texto.

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Já o caso americano, liderado por Dias, parece levar a interpretações piores sobre sua atuação. Em março, ele e outros 10 cientistas descreveram como o hidreto de lutécio (um material feito de lutécio e hidrogênio) adquiriu propriedades supercondutoras quando misturado a nitrogênio e exposto a uma pressão de 145 mil libras por polegada quadrada.

LK-99 levita em superfície magnética  Foto: Rokas/Adobe Stock

Desde o anúncio, a comunidade científica recebeu o caso com ceticismo. E o caso piorou no final de setembro, quando oito dos coautores da pesquisa pediram a remoção do artigo. Eles disseram que levantaram preocupações durante a preparação da pesquisa. “Essas preocupações incluíam representações claramente enganosas e/ou imprecisas da pesquisa”, escreveram.

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Em carta à revista Nature, que publicou a pesquisa inicialmente, os coautores descreveram o que consideravam falhas significativas no estudo e disseram que acreditavam que “Dias não agiu de boa-fé em relação à preparação e à apresentação do artigo”.

O porta-voz de Dias disse que o professor nunca intimidou seus alunos. “Todas as discussões eram abertas e disponíveis a todos os coautores”, reforçou. “Os coautores tomaram decisões coletivas sobre a publicação.”

Antes disso, um grupo de cientistas do Brasil, Áustria, Itália e Inglaterra, liderados pelo pesquisador Pedro Ferreira, da ELL, fez simulações computacionais sobre as propriedades supercondutoras de mais de 200 mil combinações para um composto de lutécio, hidrogênio e nitrogênio. Nenhuma delas apresentou as características propostas por Dias - e a pesquisa foi positivamente destacada pelos editores da Nature.

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Futuro ainda promissor

Apesar do final nada empolgante depois de meses de muitas emoções, a busca pelo supercondutor perfeito continua - e não desanima os pesquisadores. “A área ainda é muito promissora para pesquisa básica e para a formação de recursos humanos. Há ainda muitas perguntas a serem respondidas”, afirma Pimentel Jr.

Por exemplo, o mundo dos materiais “não convencionais”, que não seguem a teoria sobre como surge a supercondutividade (chamada de BCS), tem muito a avançar. “Não existe uma teoria unificada sobre materiais usuais, que seguem a BCS, e os não-usuais. E minha aposta é de que uma eventual descoberta de supercondutor em temperatura ambiente virá de um material não-convencional”, explica Eleno.

Talvez, parte do dinheiro de financiamento da área fuja em um primeiro momento, mas esse é um campo muito importante para a física básica. E tem potencial revolucionário para a tecnologia

Luiz Tadeu Fernandes Eleno, professor da Escola de Engenharia de Lorena (EEL) na USP

“Talvez, parte do dinheiro de financiamento da área fuja em um primeiro momento, mas esse é um campo muito importante para a física básica. E tem potencial revolucionário para a tecnologia”, continua ele.

Ainda que um supercondutor em temperatura ambiente seja descoberto, todos os seus benefícios não ocorreriam imediatamente. O custo para produção em larga escala e a disponibilidade na natureza teriam que ser acessíveis. Na transmissão de energia, por exemplo, teria que ser avaliada também a capacidade do material ser transformado em fio. Em outras palavras, a simples descoberta desse material não seria o ponto de chegada para área, e, sim, um ponto de partida para um novo momento.

Chegar lá exigirá muita persistência, cálculos, simulações computacionais - e uma boa dose de ceticismo.

A busca por um material supercondutor em temperatura ambiente teve uma temporada frustrante em 2023. A descoberta, que poderia revolucionar diversas áreas da ciência e da tecnologia, foi anunciada por dois grupos diferentes de pesquisadores ao longo do ano, mas logo a fanfarra deu lugar a suspeitas de fraude e críticas de falhas básicas nas pesquisas. Para entusiastas e pesquisadores, o momento é de entender para onde vão as pesquisas.

Os supercondutores são materiais capazes de conduzir eletricidade sem nenhuma resistência, o que significa que não há perda de energia por meio do calor. A existência deles é conhecida há mais de um século, mas, até aqui, suas propriedades só aparecem sob circunstâncias especiais.

“O material precisa estar abaixo de uma temperatura crítica, de uma pressão crítica e de um campo magnético crítico”, explica Jorge Luiz Pimentel Jr, vice-diretor do Instituto de Matemática, Estatística e Física da Universidade Federal do Rio Grande (FURG). Isso significa que as aplicações atuais de supercondutores exigem sistemas de resfriamento e pressão específicos, o que encarece e inviabiliza a sua aplicação em larga escala.

É isso que dois grupos diferentes de pesquisa afirmavam ter superado. Tanto o grupo liderado pelo americano Ranga P. Dias, da Universidade de Rochester (EUA), quanto o dos sul-coreanos Sukbae Lee and Ji-Hoon Kim, da startup Quantum Energy Research Center, anunciaram, respectivamente em março e em julho, terem descoberto supercondutores em temperatura ambiente. Se verdadeiros, seriam anúncios revolucionários.

Supercondutores em temperatura ambiente poderiam ser usados em cabos de transmissão de energia, permitindo eficiência máxima. Turbinas eólicas poderiam gerar mais energia, carros elétricos demandariam menos de suas baterias e trens magnéticos se tornariam mais acessíveis. Em casos mais hipotéticos, a descoberta abriria as portas para reatores de fusão nuclear, que funcionam como fontes abundantes de energia limpa.

Computador quântico poderia se beneficiar de componentes supercondutores  Foto: Google/Divulgação

Na computação quântica, máquinas que prometem capacidade muito superior à dos computadores atuais, o supercondutor poderia viabilizar avanços difíceis de imaginar. “Os principais computadores quânticos são baseados em circuitos supercondutores e um dos principais desafios é manter os sistemas resfriados, o que aumenta muito o custo. Se fosse possível construir circuitos supercondutores em temperatura, provavelmente a capacidade aumentaria”, explica Bárbara Amaral, pesquisadora de informação quântica do Instituto de Física da Universidade de São Paulo (USP).

“O pesquisador que descobrir um supercondutor em temperatura ambiente é um grande candidato ao Prêmio Nobel. Isso mudaria tudo”, explica Luiz Tadeu Fernandes Eleno, professor da Escola de Engenharia de Lorena (EEL) na USP.

Pressa e desejo

A possibilidade de entrar para a história parece mexer com a ambição de alguns cientistas. Os pesquisadores sul-coreanos publicaram em julho dois estudos que apresentavam o LK-99, um mineral que contém cobre, chumbo, fósforo e oxigênio. Segundo eles, o material apresentava propriedades supercondutoras em temperatura e pressão ambiente. Logo, porém, foram contestados - a apresentação do trabalho, feita sem a revisão de pares, aumentou a desconfiança.

“Ao olhar os gráficos dos coreanos, a resistência elétrica nunca chegou a zero. Há muitos problemas nos detalhes e qualquer pessoa da área consegue ver. Não acho que houve má-fé no caso deles. É um artigo ingênuo. Essas pessoas nem são da área de supercondutividade, não são conhecidas,” explica Eleno. Posteriormente, os pesquisadores admitiram problemas no artigo e prometeram uma nova versão com correções - a atualização não havia sido publicada até a conclusão deste texto.

Já o caso americano, liderado por Dias, parece levar a interpretações piores sobre sua atuação. Em março, ele e outros 10 cientistas descreveram como o hidreto de lutécio (um material feito de lutécio e hidrogênio) adquiriu propriedades supercondutoras quando misturado a nitrogênio e exposto a uma pressão de 145 mil libras por polegada quadrada.

LK-99 levita em superfície magnética  Foto: Rokas/Adobe Stock

Desde o anúncio, a comunidade científica recebeu o caso com ceticismo. E o caso piorou no final de setembro, quando oito dos coautores da pesquisa pediram a remoção do artigo. Eles disseram que levantaram preocupações durante a preparação da pesquisa. “Essas preocupações incluíam representações claramente enganosas e/ou imprecisas da pesquisa”, escreveram.

Em carta à revista Nature, que publicou a pesquisa inicialmente, os coautores descreveram o que consideravam falhas significativas no estudo e disseram que acreditavam que “Dias não agiu de boa-fé em relação à preparação e à apresentação do artigo”.

O porta-voz de Dias disse que o professor nunca intimidou seus alunos. “Todas as discussões eram abertas e disponíveis a todos os coautores”, reforçou. “Os coautores tomaram decisões coletivas sobre a publicação.”

Antes disso, um grupo de cientistas do Brasil, Áustria, Itália e Inglaterra, liderados pelo pesquisador Pedro Ferreira, da ELL, fez simulações computacionais sobre as propriedades supercondutoras de mais de 200 mil combinações para um composto de lutécio, hidrogênio e nitrogênio. Nenhuma delas apresentou as características propostas por Dias - e a pesquisa foi positivamente destacada pelos editores da Nature.

Futuro ainda promissor

Apesar do final nada empolgante depois de meses de muitas emoções, a busca pelo supercondutor perfeito continua - e não desanima os pesquisadores. “A área ainda é muito promissora para pesquisa básica e para a formação de recursos humanos. Há ainda muitas perguntas a serem respondidas”, afirma Pimentel Jr.

Por exemplo, o mundo dos materiais “não convencionais”, que não seguem a teoria sobre como surge a supercondutividade (chamada de BCS), tem muito a avançar. “Não existe uma teoria unificada sobre materiais usuais, que seguem a BCS, e os não-usuais. E minha aposta é de que uma eventual descoberta de supercondutor em temperatura ambiente virá de um material não-convencional”, explica Eleno.

Talvez, parte do dinheiro de financiamento da área fuja em um primeiro momento, mas esse é um campo muito importante para a física básica. E tem potencial revolucionário para a tecnologia

Luiz Tadeu Fernandes Eleno, professor da Escola de Engenharia de Lorena (EEL) na USP

“Talvez, parte do dinheiro de financiamento da área fuja em um primeiro momento, mas esse é um campo muito importante para a física básica. E tem potencial revolucionário para a tecnologia”, continua ele.

Ainda que um supercondutor em temperatura ambiente seja descoberto, todos os seus benefícios não ocorreriam imediatamente. O custo para produção em larga escala e a disponibilidade na natureza teriam que ser acessíveis. Na transmissão de energia, por exemplo, teria que ser avaliada também a capacidade do material ser transformado em fio. Em outras palavras, a simples descoberta desse material não seria o ponto de chegada para área, e, sim, um ponto de partida para um novo momento.

Chegar lá exigirá muita persistência, cálculos, simulações computacionais - e uma boa dose de ceticismo.

A busca por um material supercondutor em temperatura ambiente teve uma temporada frustrante em 2023. A descoberta, que poderia revolucionar diversas áreas da ciência e da tecnologia, foi anunciada por dois grupos diferentes de pesquisadores ao longo do ano, mas logo a fanfarra deu lugar a suspeitas de fraude e críticas de falhas básicas nas pesquisas. Para entusiastas e pesquisadores, o momento é de entender para onde vão as pesquisas.

Os supercondutores são materiais capazes de conduzir eletricidade sem nenhuma resistência, o que significa que não há perda de energia por meio do calor. A existência deles é conhecida há mais de um século, mas, até aqui, suas propriedades só aparecem sob circunstâncias especiais.

“O material precisa estar abaixo de uma temperatura crítica, de uma pressão crítica e de um campo magnético crítico”, explica Jorge Luiz Pimentel Jr, vice-diretor do Instituto de Matemática, Estatística e Física da Universidade Federal do Rio Grande (FURG). Isso significa que as aplicações atuais de supercondutores exigem sistemas de resfriamento e pressão específicos, o que encarece e inviabiliza a sua aplicação em larga escala.

É isso que dois grupos diferentes de pesquisa afirmavam ter superado. Tanto o grupo liderado pelo americano Ranga P. Dias, da Universidade de Rochester (EUA), quanto o dos sul-coreanos Sukbae Lee and Ji-Hoon Kim, da startup Quantum Energy Research Center, anunciaram, respectivamente em março e em julho, terem descoberto supercondutores em temperatura ambiente. Se verdadeiros, seriam anúncios revolucionários.

Supercondutores em temperatura ambiente poderiam ser usados em cabos de transmissão de energia, permitindo eficiência máxima. Turbinas eólicas poderiam gerar mais energia, carros elétricos demandariam menos de suas baterias e trens magnéticos se tornariam mais acessíveis. Em casos mais hipotéticos, a descoberta abriria as portas para reatores de fusão nuclear, que funcionam como fontes abundantes de energia limpa.

Computador quântico poderia se beneficiar de componentes supercondutores  Foto: Google/Divulgação

Na computação quântica, máquinas que prometem capacidade muito superior à dos computadores atuais, o supercondutor poderia viabilizar avanços difíceis de imaginar. “Os principais computadores quânticos são baseados em circuitos supercondutores e um dos principais desafios é manter os sistemas resfriados, o que aumenta muito o custo. Se fosse possível construir circuitos supercondutores em temperatura, provavelmente a capacidade aumentaria”, explica Bárbara Amaral, pesquisadora de informação quântica do Instituto de Física da Universidade de São Paulo (USP).

“O pesquisador que descobrir um supercondutor em temperatura ambiente é um grande candidato ao Prêmio Nobel. Isso mudaria tudo”, explica Luiz Tadeu Fernandes Eleno, professor da Escola de Engenharia de Lorena (EEL) na USP.

Pressa e desejo

A possibilidade de entrar para a história parece mexer com a ambição de alguns cientistas. Os pesquisadores sul-coreanos publicaram em julho dois estudos que apresentavam o LK-99, um mineral que contém cobre, chumbo, fósforo e oxigênio. Segundo eles, o material apresentava propriedades supercondutoras em temperatura e pressão ambiente. Logo, porém, foram contestados - a apresentação do trabalho, feita sem a revisão de pares, aumentou a desconfiança.

“Ao olhar os gráficos dos coreanos, a resistência elétrica nunca chegou a zero. Há muitos problemas nos detalhes e qualquer pessoa da área consegue ver. Não acho que houve má-fé no caso deles. É um artigo ingênuo. Essas pessoas nem são da área de supercondutividade, não são conhecidas,” explica Eleno. Posteriormente, os pesquisadores admitiram problemas no artigo e prometeram uma nova versão com correções - a atualização não havia sido publicada até a conclusão deste texto.

Já o caso americano, liderado por Dias, parece levar a interpretações piores sobre sua atuação. Em março, ele e outros 10 cientistas descreveram como o hidreto de lutécio (um material feito de lutécio e hidrogênio) adquiriu propriedades supercondutoras quando misturado a nitrogênio e exposto a uma pressão de 145 mil libras por polegada quadrada.

LK-99 levita em superfície magnética  Foto: Rokas/Adobe Stock

Desde o anúncio, a comunidade científica recebeu o caso com ceticismo. E o caso piorou no final de setembro, quando oito dos coautores da pesquisa pediram a remoção do artigo. Eles disseram que levantaram preocupações durante a preparação da pesquisa. “Essas preocupações incluíam representações claramente enganosas e/ou imprecisas da pesquisa”, escreveram.

Em carta à revista Nature, que publicou a pesquisa inicialmente, os coautores descreveram o que consideravam falhas significativas no estudo e disseram que acreditavam que “Dias não agiu de boa-fé em relação à preparação e à apresentação do artigo”.

O porta-voz de Dias disse que o professor nunca intimidou seus alunos. “Todas as discussões eram abertas e disponíveis a todos os coautores”, reforçou. “Os coautores tomaram decisões coletivas sobre a publicação.”

Antes disso, um grupo de cientistas do Brasil, Áustria, Itália e Inglaterra, liderados pelo pesquisador Pedro Ferreira, da ELL, fez simulações computacionais sobre as propriedades supercondutoras de mais de 200 mil combinações para um composto de lutécio, hidrogênio e nitrogênio. Nenhuma delas apresentou as características propostas por Dias - e a pesquisa foi positivamente destacada pelos editores da Nature.

Futuro ainda promissor

Apesar do final nada empolgante depois de meses de muitas emoções, a busca pelo supercondutor perfeito continua - e não desanima os pesquisadores. “A área ainda é muito promissora para pesquisa básica e para a formação de recursos humanos. Há ainda muitas perguntas a serem respondidas”, afirma Pimentel Jr.

Por exemplo, o mundo dos materiais “não convencionais”, que não seguem a teoria sobre como surge a supercondutividade (chamada de BCS), tem muito a avançar. “Não existe uma teoria unificada sobre materiais usuais, que seguem a BCS, e os não-usuais. E minha aposta é de que uma eventual descoberta de supercondutor em temperatura ambiente virá de um material não-convencional”, explica Eleno.

Talvez, parte do dinheiro de financiamento da área fuja em um primeiro momento, mas esse é um campo muito importante para a física básica. E tem potencial revolucionário para a tecnologia

Luiz Tadeu Fernandes Eleno, professor da Escola de Engenharia de Lorena (EEL) na USP

“Talvez, parte do dinheiro de financiamento da área fuja em um primeiro momento, mas esse é um campo muito importante para a física básica. E tem potencial revolucionário para a tecnologia”, continua ele.

Ainda que um supercondutor em temperatura ambiente seja descoberto, todos os seus benefícios não ocorreriam imediatamente. O custo para produção em larga escala e a disponibilidade na natureza teriam que ser acessíveis. Na transmissão de energia, por exemplo, teria que ser avaliada também a capacidade do material ser transformado em fio. Em outras palavras, a simples descoberta desse material não seria o ponto de chegada para área, e, sim, um ponto de partida para um novo momento.

Chegar lá exigirá muita persistência, cálculos, simulações computacionais - e uma boa dose de ceticismo.

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