Videochamadas são uma usina de exaustão e estudo mostra os motivos


Principal forma de interação em tempos de pandemia, chamadas em vídeo por serviços como Zoom, Google Meet e Microsoft Teams têm demandas específicas para o cérebro, o que leva muita gente a sentir cansaço extremo

Por Bruna Arimathea
”Efeitos colaterais” das plataformas de vídeo afetam áreas da saúde física e mental, mas podem ser diminuídos com adaptações durante rotina Foto: Idris Solomon/Reuters

Gabriela Costa, 25, é professora de inglês e mestranda em geografia — em tempos de pandemia, serviços como o Zoom foram as suas salas de aula. A mudança foi sentida. “A gente fica muito mais cansado. Quando termina a aula, só me jogo na cama”, diz. Ela não está sozinha. Ao longo do último ano, a sensação de exaustão causada por videochamadas foi sentida por muita gente que teve de trabalhar ou estudar em casa — o fenômeno ganhou até nome, “zoom fatigue” (ou “fadiga de zoom”). Agora, cientistas começam a entender melhor as causas para o problema e os seus efeitos. 

No final de fevereiro, uma pesquisa da Universidade Stanford mostrou que a exposição excessiva às videochamadas são prejudiciais a curto e longo prazo. Entre os sintomas estão dores de cabeça, depressão e crises de ansiedade. Jeremy Bailenson, professor que liderou o estudo, detectou que, entre as causas do cansaço, estão: a relação com os olhares de terceiros, a exposição à própria imagem na tela, a falta de exercício e a frustração em não conseguir se expressar por meio da câmera. 

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O primeiro fator descrito por Bailenson é uma espécie de estresse por ser o “centro das atenções”. Ele acontece porque cada um dos participantes da conversa recebe o tempo todo os olhares do grupo. Um painel de conferência pode ter dezenas de olhares diferentes, mas estarão todos voltados para o usuário à medida que ele assiste a própria tela da plataforma. 

Para a neurocientista doutora pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Thaís Gameiro, o problema vai além de apenas mostrar o rosto em uma reunião. Ela explica que a sensação de monitoramento a longo prazo traz reações cerebrais que tendem a nos afastar do conforto de uma situação presencial. “Com a câmera ligada, você é o centro das atenções mesmo quando não está falando. Somos muito sensíveis à avaliação social”, diz Thaís.

A nossa própria imagem transmitida na tela também joga contra. Dar aquela olhadinha no próprio vídeo antes ou durante uma reunião com a câmera ligada é tentador — chega a ser quase uma regra na etiqueta secreta das videoconferências. Mas ficar a maior parte do tempo se olhando pode entrar na conta do estresse. 

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“Diante da tela, ficamos olhando o tempo todo para o nosso rosto como se a gente estivesse olhando para um espelho. É o tempo todo olhando a expressão, querendo adequar para que ela possa ser a mais agradável possível. O usuário pode correr o risco de se desconectar do que está fazendo para se analisar”, explica Sylvia van Enck, especialista em dependência de Tecnologia do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas. 

Arthur Loureiro, cosmólogo e pesquisador na University College of London, sabe bem como é enfrentar esse “problema”. O gaúcho passa até 15 horas por semana em reuniões e não consegue evitar rever a postura e reparar em aspectos de seu quarto enquanto está com a câmera ligada.

“Sempre fico olhando a minha imagem. Às vezes eu percebo e fico um pouco preocupado com o fundo do vídeo, tentando esconder alguma coisa. Mas acontece automaticamente. Tento me policiar e olhar para a pessoa que está falando”. 

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A pesquisa de Stanford vai além da recomendação: desligue a própria imagem. Isso pode diminuir a exposição e ser um fator a menos de estresse e autojulgamento. “No mundo real, se alguém estivesse te seguindo com um espelho constantemente — de forma que, enquanto você estivesse falando com as pessoas você estivesse se vendo em um espelho, isso seria loucura”, afirma Bailenson.

Falta de expressão e de movimento

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Por um lado, as videochamadas turbinam a exposição de nossas imagens. Por outro, eliminam tudo o que compõe uma conversa presencial: falar, gesticular, fazer caretas. Elisa Brietzke, psiquiatra e professora da Escola Paulista de Medicina, explica que nosso cérebro é programado para reconhecer sinais corporais, que complementam a fala. A falta deles é significativa para a atenção e para a frustração com a conversa. "O cérebro fica o tempo todo procurando por pistas visuais sobre o que está acontecendo”, diz. 

Como são essenciais para a compreensão, é necessário esforço para que eles ocorram na videochamada. O planejamento é mais um dos fatores de estresse encontrados por Bailenson.

“Você precisa ter certeza de que sua cabeça está enquadrada no centro do vídeo. Se quiser mostrar a alguém que está de acordo com essa pessoa, faça um aceno exagerado com a cabeça ou levante o polegar. Isso adiciona carga cognitiva, pois você está usando calorias mentais para se comunicar”, diz o professor no estudo.

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Infelizmente, os gestos exagerados talvez sejam os maiores esforços físicos feitos durante a era da videochamada. As longas horas em aulas e reuniões colocaram as pessoas em um novo grau de sedentarismo — mesmo aquelas que já não eram ativas agora sofrem com a falta de pausas para se alongar, beber água e até ir ao banheiro.

“Mesmo em uma reunião prolongada as pessoas levantam e saem. É uma coisa que na etiqueta da videoconferência pega um pouco mal”, explica Elisa. “Eu passo quase 100% do tempo sentado e é muito cansativo. Quando chega no final do dia eu preciso me levantar e dar um tempo livre”, diz Arthur.

E se os intervalos para o cafezinho são escassos, muitas vezes o tempo para praticar algum exercício é quase nulo. Por isso, Bailenson indica que é necessário fazer pausas periódicas para refrescar o corpo e a mente. 

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Adaptação

Segundo Thaís, todos os hábitos adquiridos na vida à distância podem ser resolvidos depois da pandemia. Mas, enquanto plataformas como Zoom, Google Meet e Microsoft Teams estiverem a todo vapor, notificações de exaustão provavelmente vão continuar sendo enviadas para o seu cérebro — todas as empresas foram procuradas pela reportagem e apenas o Google não se pronunciou. O Zoom compartilhou práticas de uso da plataforma, como recomendações de descanso. 

Microsoft informou que trabalha desde o ano passado com pesquisas sobre os impactos da videoconferência em seus usuários. De acordo com a empresa, algumas ferramentas como o “juntos”, que permite que todos os participantes tenham o mesmo plano de fundo na chamada, ajudaram a diminuir a discrepância de imagens na tela e a incluir os membros do vídeo em um mesmo ambiente.

“Presencialmente existem outros tipos de sinais. A gente viu que tornar a experiência um pouco mais próxima do que a gente tem no real era importante. Lançamos o modo 'juntos', onde utilizamos inteligência artificial para colocar o vídeo das pessoas em uma perspectiva diferente”, afirma Mariana Hatsuumura, diretora de trabalho moderno da Microsoft Brasil. 

Parece pouco diante do estudo. E, pelo jeito, a única saída é tomar algumas medidas de adaptação. Pausas para caminhar, ir ao banheiro e beber água devem ser feitas periodicamente, além de, sempre que possível, tirar algunsmomentos para ficar com a câmera desligada. 

Reservar um local de trabalho especialmente para as chamadas também pode ajudar o corpo a entender quando é hora de descanso e quando é hora do trabalho. A regra, como para muitas coisas durante a pandemia, é uma só: é preciso se adaptar sem perder a qualidade de vida. 

“Os seres humanos conseguem se adaptar. Então, podemos nos adaptar a essa nova rotina, mas ela precisa ser ajustada”, diz Thaís.

*É estagiária sob supervisão do editor Bruno Romani 

”Efeitos colaterais” das plataformas de vídeo afetam áreas da saúde física e mental, mas podem ser diminuídos com adaptações durante rotina Foto: Idris Solomon/Reuters

Gabriela Costa, 25, é professora de inglês e mestranda em geografia — em tempos de pandemia, serviços como o Zoom foram as suas salas de aula. A mudança foi sentida. “A gente fica muito mais cansado. Quando termina a aula, só me jogo na cama”, diz. Ela não está sozinha. Ao longo do último ano, a sensação de exaustão causada por videochamadas foi sentida por muita gente que teve de trabalhar ou estudar em casa — o fenômeno ganhou até nome, “zoom fatigue” (ou “fadiga de zoom”). Agora, cientistas começam a entender melhor as causas para o problema e os seus efeitos. 

No final de fevereiro, uma pesquisa da Universidade Stanford mostrou que a exposição excessiva às videochamadas são prejudiciais a curto e longo prazo. Entre os sintomas estão dores de cabeça, depressão e crises de ansiedade. Jeremy Bailenson, professor que liderou o estudo, detectou que, entre as causas do cansaço, estão: a relação com os olhares de terceiros, a exposição à própria imagem na tela, a falta de exercício e a frustração em não conseguir se expressar por meio da câmera. 

O primeiro fator descrito por Bailenson é uma espécie de estresse por ser o “centro das atenções”. Ele acontece porque cada um dos participantes da conversa recebe o tempo todo os olhares do grupo. Um painel de conferência pode ter dezenas de olhares diferentes, mas estarão todos voltados para o usuário à medida que ele assiste a própria tela da plataforma. 

Para a neurocientista doutora pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Thaís Gameiro, o problema vai além de apenas mostrar o rosto em uma reunião. Ela explica que a sensação de monitoramento a longo prazo traz reações cerebrais que tendem a nos afastar do conforto de uma situação presencial. “Com a câmera ligada, você é o centro das atenções mesmo quando não está falando. Somos muito sensíveis à avaliação social”, diz Thaís.

A nossa própria imagem transmitida na tela também joga contra. Dar aquela olhadinha no próprio vídeo antes ou durante uma reunião com a câmera ligada é tentador — chega a ser quase uma regra na etiqueta secreta das videoconferências. Mas ficar a maior parte do tempo se olhando pode entrar na conta do estresse. 

“Diante da tela, ficamos olhando o tempo todo para o nosso rosto como se a gente estivesse olhando para um espelho. É o tempo todo olhando a expressão, querendo adequar para que ela possa ser a mais agradável possível. O usuário pode correr o risco de se desconectar do que está fazendo para se analisar”, explica Sylvia van Enck, especialista em dependência de Tecnologia do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas. 

Arthur Loureiro, cosmólogo e pesquisador na University College of London, sabe bem como é enfrentar esse “problema”. O gaúcho passa até 15 horas por semana em reuniões e não consegue evitar rever a postura e reparar em aspectos de seu quarto enquanto está com a câmera ligada.

“Sempre fico olhando a minha imagem. Às vezes eu percebo e fico um pouco preocupado com o fundo do vídeo, tentando esconder alguma coisa. Mas acontece automaticamente. Tento me policiar e olhar para a pessoa que está falando”. 

A pesquisa de Stanford vai além da recomendação: desligue a própria imagem. Isso pode diminuir a exposição e ser um fator a menos de estresse e autojulgamento. “No mundo real, se alguém estivesse te seguindo com um espelho constantemente — de forma que, enquanto você estivesse falando com as pessoas você estivesse se vendo em um espelho, isso seria loucura”, afirma Bailenson.

Falta de expressão e de movimento

Por um lado, as videochamadas turbinam a exposição de nossas imagens. Por outro, eliminam tudo o que compõe uma conversa presencial: falar, gesticular, fazer caretas. Elisa Brietzke, psiquiatra e professora da Escola Paulista de Medicina, explica que nosso cérebro é programado para reconhecer sinais corporais, que complementam a fala. A falta deles é significativa para a atenção e para a frustração com a conversa. "O cérebro fica o tempo todo procurando por pistas visuais sobre o que está acontecendo”, diz. 

Como são essenciais para a compreensão, é necessário esforço para que eles ocorram na videochamada. O planejamento é mais um dos fatores de estresse encontrados por Bailenson.

“Você precisa ter certeza de que sua cabeça está enquadrada no centro do vídeo. Se quiser mostrar a alguém que está de acordo com essa pessoa, faça um aceno exagerado com a cabeça ou levante o polegar. Isso adiciona carga cognitiva, pois você está usando calorias mentais para se comunicar”, diz o professor no estudo.

Infelizmente, os gestos exagerados talvez sejam os maiores esforços físicos feitos durante a era da videochamada. As longas horas em aulas e reuniões colocaram as pessoas em um novo grau de sedentarismo — mesmo aquelas que já não eram ativas agora sofrem com a falta de pausas para se alongar, beber água e até ir ao banheiro.

“Mesmo em uma reunião prolongada as pessoas levantam e saem. É uma coisa que na etiqueta da videoconferência pega um pouco mal”, explica Elisa. “Eu passo quase 100% do tempo sentado e é muito cansativo. Quando chega no final do dia eu preciso me levantar e dar um tempo livre”, diz Arthur.

E se os intervalos para o cafezinho são escassos, muitas vezes o tempo para praticar algum exercício é quase nulo. Por isso, Bailenson indica que é necessário fazer pausas periódicas para refrescar o corpo e a mente. 

Adaptação

Segundo Thaís, todos os hábitos adquiridos na vida à distância podem ser resolvidos depois da pandemia. Mas, enquanto plataformas como Zoom, Google Meet e Microsoft Teams estiverem a todo vapor, notificações de exaustão provavelmente vão continuar sendo enviadas para o seu cérebro — todas as empresas foram procuradas pela reportagem e apenas o Google não se pronunciou. O Zoom compartilhou práticas de uso da plataforma, como recomendações de descanso. 

Microsoft informou que trabalha desde o ano passado com pesquisas sobre os impactos da videoconferência em seus usuários. De acordo com a empresa, algumas ferramentas como o “juntos”, que permite que todos os participantes tenham o mesmo plano de fundo na chamada, ajudaram a diminuir a discrepância de imagens na tela e a incluir os membros do vídeo em um mesmo ambiente.

“Presencialmente existem outros tipos de sinais. A gente viu que tornar a experiência um pouco mais próxima do que a gente tem no real era importante. Lançamos o modo 'juntos', onde utilizamos inteligência artificial para colocar o vídeo das pessoas em uma perspectiva diferente”, afirma Mariana Hatsuumura, diretora de trabalho moderno da Microsoft Brasil. 

Parece pouco diante do estudo. E, pelo jeito, a única saída é tomar algumas medidas de adaptação. Pausas para caminhar, ir ao banheiro e beber água devem ser feitas periodicamente, além de, sempre que possível, tirar algunsmomentos para ficar com a câmera desligada. 

Reservar um local de trabalho especialmente para as chamadas também pode ajudar o corpo a entender quando é hora de descanso e quando é hora do trabalho. A regra, como para muitas coisas durante a pandemia, é uma só: é preciso se adaptar sem perder a qualidade de vida. 

“Os seres humanos conseguem se adaptar. Então, podemos nos adaptar a essa nova rotina, mas ela precisa ser ajustada”, diz Thaís.

*É estagiária sob supervisão do editor Bruno Romani 

”Efeitos colaterais” das plataformas de vídeo afetam áreas da saúde física e mental, mas podem ser diminuídos com adaptações durante rotina Foto: Idris Solomon/Reuters

Gabriela Costa, 25, é professora de inglês e mestranda em geografia — em tempos de pandemia, serviços como o Zoom foram as suas salas de aula. A mudança foi sentida. “A gente fica muito mais cansado. Quando termina a aula, só me jogo na cama”, diz. Ela não está sozinha. Ao longo do último ano, a sensação de exaustão causada por videochamadas foi sentida por muita gente que teve de trabalhar ou estudar em casa — o fenômeno ganhou até nome, “zoom fatigue” (ou “fadiga de zoom”). Agora, cientistas começam a entender melhor as causas para o problema e os seus efeitos. 

No final de fevereiro, uma pesquisa da Universidade Stanford mostrou que a exposição excessiva às videochamadas são prejudiciais a curto e longo prazo. Entre os sintomas estão dores de cabeça, depressão e crises de ansiedade. Jeremy Bailenson, professor que liderou o estudo, detectou que, entre as causas do cansaço, estão: a relação com os olhares de terceiros, a exposição à própria imagem na tela, a falta de exercício e a frustração em não conseguir se expressar por meio da câmera. 

O primeiro fator descrito por Bailenson é uma espécie de estresse por ser o “centro das atenções”. Ele acontece porque cada um dos participantes da conversa recebe o tempo todo os olhares do grupo. Um painel de conferência pode ter dezenas de olhares diferentes, mas estarão todos voltados para o usuário à medida que ele assiste a própria tela da plataforma. 

Para a neurocientista doutora pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Thaís Gameiro, o problema vai além de apenas mostrar o rosto em uma reunião. Ela explica que a sensação de monitoramento a longo prazo traz reações cerebrais que tendem a nos afastar do conforto de uma situação presencial. “Com a câmera ligada, você é o centro das atenções mesmo quando não está falando. Somos muito sensíveis à avaliação social”, diz Thaís.

A nossa própria imagem transmitida na tela também joga contra. Dar aquela olhadinha no próprio vídeo antes ou durante uma reunião com a câmera ligada é tentador — chega a ser quase uma regra na etiqueta secreta das videoconferências. Mas ficar a maior parte do tempo se olhando pode entrar na conta do estresse. 

“Diante da tela, ficamos olhando o tempo todo para o nosso rosto como se a gente estivesse olhando para um espelho. É o tempo todo olhando a expressão, querendo adequar para que ela possa ser a mais agradável possível. O usuário pode correr o risco de se desconectar do que está fazendo para se analisar”, explica Sylvia van Enck, especialista em dependência de Tecnologia do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas. 

Arthur Loureiro, cosmólogo e pesquisador na University College of London, sabe bem como é enfrentar esse “problema”. O gaúcho passa até 15 horas por semana em reuniões e não consegue evitar rever a postura e reparar em aspectos de seu quarto enquanto está com a câmera ligada.

“Sempre fico olhando a minha imagem. Às vezes eu percebo e fico um pouco preocupado com o fundo do vídeo, tentando esconder alguma coisa. Mas acontece automaticamente. Tento me policiar e olhar para a pessoa que está falando”. 

A pesquisa de Stanford vai além da recomendação: desligue a própria imagem. Isso pode diminuir a exposição e ser um fator a menos de estresse e autojulgamento. “No mundo real, se alguém estivesse te seguindo com um espelho constantemente — de forma que, enquanto você estivesse falando com as pessoas você estivesse se vendo em um espelho, isso seria loucura”, afirma Bailenson.

Falta de expressão e de movimento

Por um lado, as videochamadas turbinam a exposição de nossas imagens. Por outro, eliminam tudo o que compõe uma conversa presencial: falar, gesticular, fazer caretas. Elisa Brietzke, psiquiatra e professora da Escola Paulista de Medicina, explica que nosso cérebro é programado para reconhecer sinais corporais, que complementam a fala. A falta deles é significativa para a atenção e para a frustração com a conversa. "O cérebro fica o tempo todo procurando por pistas visuais sobre o que está acontecendo”, diz. 

Como são essenciais para a compreensão, é necessário esforço para que eles ocorram na videochamada. O planejamento é mais um dos fatores de estresse encontrados por Bailenson.

“Você precisa ter certeza de que sua cabeça está enquadrada no centro do vídeo. Se quiser mostrar a alguém que está de acordo com essa pessoa, faça um aceno exagerado com a cabeça ou levante o polegar. Isso adiciona carga cognitiva, pois você está usando calorias mentais para se comunicar”, diz o professor no estudo.

Infelizmente, os gestos exagerados talvez sejam os maiores esforços físicos feitos durante a era da videochamada. As longas horas em aulas e reuniões colocaram as pessoas em um novo grau de sedentarismo — mesmo aquelas que já não eram ativas agora sofrem com a falta de pausas para se alongar, beber água e até ir ao banheiro.

“Mesmo em uma reunião prolongada as pessoas levantam e saem. É uma coisa que na etiqueta da videoconferência pega um pouco mal”, explica Elisa. “Eu passo quase 100% do tempo sentado e é muito cansativo. Quando chega no final do dia eu preciso me levantar e dar um tempo livre”, diz Arthur.

E se os intervalos para o cafezinho são escassos, muitas vezes o tempo para praticar algum exercício é quase nulo. Por isso, Bailenson indica que é necessário fazer pausas periódicas para refrescar o corpo e a mente. 

Adaptação

Segundo Thaís, todos os hábitos adquiridos na vida à distância podem ser resolvidos depois da pandemia. Mas, enquanto plataformas como Zoom, Google Meet e Microsoft Teams estiverem a todo vapor, notificações de exaustão provavelmente vão continuar sendo enviadas para o seu cérebro — todas as empresas foram procuradas pela reportagem e apenas o Google não se pronunciou. O Zoom compartilhou práticas de uso da plataforma, como recomendações de descanso. 

Microsoft informou que trabalha desde o ano passado com pesquisas sobre os impactos da videoconferência em seus usuários. De acordo com a empresa, algumas ferramentas como o “juntos”, que permite que todos os participantes tenham o mesmo plano de fundo na chamada, ajudaram a diminuir a discrepância de imagens na tela e a incluir os membros do vídeo em um mesmo ambiente.

“Presencialmente existem outros tipos de sinais. A gente viu que tornar a experiência um pouco mais próxima do que a gente tem no real era importante. Lançamos o modo 'juntos', onde utilizamos inteligência artificial para colocar o vídeo das pessoas em uma perspectiva diferente”, afirma Mariana Hatsuumura, diretora de trabalho moderno da Microsoft Brasil. 

Parece pouco diante do estudo. E, pelo jeito, a única saída é tomar algumas medidas de adaptação. Pausas para caminhar, ir ao banheiro e beber água devem ser feitas periodicamente, além de, sempre que possível, tirar algunsmomentos para ficar com a câmera desligada. 

Reservar um local de trabalho especialmente para as chamadas também pode ajudar o corpo a entender quando é hora de descanso e quando é hora do trabalho. A regra, como para muitas coisas durante a pandemia, é uma só: é preciso se adaptar sem perder a qualidade de vida. 

“Os seres humanos conseguem se adaptar. Então, podemos nos adaptar a essa nova rotina, mas ela precisa ser ajustada”, diz Thaís.

*É estagiária sob supervisão do editor Bruno Romani 

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