O calendário ocidental, reajustado por Gregório XIII em 1582, marca o início de um novo ciclo solar, o ano bissexto de 2024. Esse ajuste foi feito com a exclusão de alguns dos anos bissextos - deixaram de ser bissextos os anos múltiplos de 100, desde que não múltiplos de 400. Para corrigir o erro acumulado, em 1592 a data foi adiantada 13 dias. O fato de Gregório ser papa romano, e ter havido o grande cisma de 1054, fez com que igrejas orientais preferissem manter o calendário anterior, o Juliano, criado por Júlio César em 45 AC. Para os ortodoxos russos, por exemplo, o Natal cai em 7 de janeiro. De qualquer forma há razoável consenso que estamos entrando em 2024 DC - Depois de Cristo (ou 2024 AD - Anno Domini).
E, se tempo encolhe à medida que envelhecemos, isso acontece ainda mais com a velocidade da tecnologia. Como dizia Millor, “o tempo não existe; só existe o passar do tempo…”. Estamos em tempos de internet e de inteligência artificial (IA), mas isso não nos exime das tradicionais resoluções de ano novo. Uma consulta aos modelos de LLM, como ChatGPT, Bard, PI e outros, pedindo sugestão de resoluções de ano novo mostra respostas muito coerentes e aparentemente bem intencionadas, mesmo repetindo platitudes e obviedades.
As IA estão dispostas a não correr riscos com posições polêmicas. Arrisco-me então, com a audácia de alguém que não usa o Waze, a afastar-me do que a IA recomenda em direção a algo mais chão: que tal trazer de volta a responsabilidade aos nossos atos e palavras? A internet, essa faca de dois gumes, ao mesmo em que estimula a “soltar o verbo” sem peias nem maiores considerações, traz uma ameaças à nossa privacidade e a falsa impressão de anonimato: há a possibilidade praticamente certa de sempre se identificar o originador de uma fala. A internet é uma “rede de controle” no sentido em que nada pode ser feito sem que o “lado de lá” o permita ou registre, seja verificando o usuário, seja armazenando o endereço IP.
Assim, mais que tentar atribuir ao meio a responsabilidade pelo que de bom ou mau acontece, parece muito mais razoável utilizar a característica da rede para responsabilizar cada um pelo que realmente faz ou fala. Repetindo o velho dito de Vint Cerf, a internet comporta-se como espelho da sociedade e, ao vermos na rede algo que nos desagrada, de nada adiantará quebrar o espelho, ou, à moda do avestruz que enterra a cabeça na areia, ignorar a real causa.
Sem dúvida vai haver necessidade de revisão da legislação, mas isso não impede que leis já existentes possam ser aplicadas com foco muito claro no responsável por cada dano, seja ele pessoa física ou jurídica. Tentar impedir que isso ocorra com “medidas sistêmicas” seria o mesmo que impedir violência física manietando preventivamente todos os indivíduos. Os dias de hoje trazem riscos que devem ser reconhecidos e enfrentados. E para isso precisamos de bom senso e alguma sorte. Como dizia Nelson Rodrigues, “com sorte você atravessa o mundo, sem sorte você não atravessa a rua.” Bom 2024 a todos!