Fundadores das ‘Big Techs’ pulam do barco enquanto os problemas crescem


Com o fim do encantamento e mais pressão regulatória, criadores das gigantes tecnológicas trocam o comando das empresas por negócios longe da internet

Por Bruna Arimathea e Giovanna Wolf
Sob pressão para que o Twitter moderasse melhor seus conteúdos, Dorsey trocou a rede pelo mundo das fintechs e dos criptoativos Foto: Toby Melville/Reuters

Depois de seis anos, Jack Dorsey deixou no final de novembro o comando do Twitter, empresa que ele ajudou a fundar em 2006. Mais do que uma virada de página para a rede do passarinho azul, o fim da gestão de Dorsey também encerra a era na qual as grandes empresas de internet contavam com carisma e o pulso firme de seus fundadores. Agora, está estabelecida uma nova geração de chefões no mundo tecnológico, que tem pela frente o desafio de gerir grandes companhias em um contexto de menos encantamento e mais pressão regulatória.

Antes de Dorsey, Jeff Bezos deixou o comando da Amazon após 27 anos – o anúncio ocorreu em fevereiro e a saída em agosto deste ano. O bilionário decidiu se dedicar à empresa de exploração espacial Blue Origin – em julho, ele próprio participou de uma viagem suborbital da companhia, a bordo do foguete New Shepard. Já o fundador do Twitter também parece animado em deixar para trás o mundo da internet “tradicional”. Dorsey se dedicará ao mundo das criptomoedas: ele é CEO da fintech Block desde 2009 e mantém uma paixão pelos ativos digitais.

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“Acho que é fundamental que uma empresa possa se manter por conta própria, livre da influência ou direção de seu fundador”, disse Dorsey. Claro, o executivo pode estar pensando na saúde da empresa, mas o momento também é conveniente para quem sai.

Nos últimos anos, a euforia com empresas de tecnologias foi silenciada por um escrutínio global. Com isso, mais do que apresentações glamourosas de produtos e balanços financeiros estupendos, os CEOs passaram a lidar com críticas envolvendo temas como privacidade, segurança e monopólio. Depor perante congressistas americanos, por exemplo, virou rotina para os chefões – EUA e Europa têm cobrado cada vez mais esclarecimentos sobre concorrência desleal, moderação de conteúdo, funcionamento de algoritmos, entre outras questões. A diversão virou dor de cabeça.

Antes de deixarem Amazon e Twitter, Bezos e Dorsey guiavam barcos em águas turbulentas. Para além de ser uma empresa com capacidade de entregas megarrápidas, a Amazon passou a ser questionada por más condições de trabalho em seus armazéns – circulam acusações de que os funcionários da varejista sofrem com regras rígidas em relação a pausas no horário de trabalho, incluindo para usar o toalete. A Amazon também tem sido alvo de ações antitruste, que alegam que a empresa usa dados não públicos de vendedores de sua plataforma para obter vantagem competitiva no mercado. 

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O Twitter, por sua vez, está no centro de debates sobre moderação de conteúdo e enfrenta críticas sobre o funcionamento dos algoritmos da plataforma e seu papel na distribuição de conteúdo falso e extremista. 

De olho no espaço, Bezos anunciou saída da Amazon em fevereiro Foto: Andrew Harrer/Bloomberg

Ave rara

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Para especialistas, a troca de gestão é um processo natural e saudável para as companhias, seja qual for o mercado. “O empreendedor leva o negócio até um certo momento e, às vezes, em um determinado ponto ele não tem mais ambição de continuar desenvolvendo o negócio. Você chegou no topo da montanha e o que você faz? Acha outra montanha para subir”, afirma Marcelo Nakagawa, professor de empreendedorismo e inovação do Insper. 

Esse processo de mudança de direção das Big Techs começou há alguns anos. Em 2019, Larry Page e Sergey Brin, responsáveis por criar o motor de buscas que deu origem ao Google em 1998, deixaram os cargos executivos na Alphabet (holding que controla a marca), passando o bastão para Sundar Pichai. Page e Brin também partiram para projetos futuristas longe da internet, como táxis voadores.

É um movimento recente inclusive na geração mais antiga de grandes companhias tecnológicas. Na Microsoft, Bill Gates deixou o cargo em 2000 e permaneceu no conselho da companhia até 2020 – enquanto o bilionário afirma que deixou a cadeira para se dedicar a trabalhos filantrópicos, a Microsoft diz que a saída do magnata da diretoria foi uma recomendação do conselho após uma investigação de assédio sobre um caso extraconjugal do bilionário.

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No setor de tecnologia, transições como essa costumam chamar a atenção, porque criador e criatura tendem a ser vistos como uma coisa só, diz Marcelo Pedroso, professor da FEA-USP. “Eles são fundadores de grandes companhias e acabam ficando famosos. Acabam se tornando figuras excêntricas, que chamam muita atenção. Quando acontece uma troca, o barulho é grande”, diz. 

Márcio Kanamaru, sócio-líder de tecnologia, mídia e telecomunicações da KPMG no Brasil, também lembra que os primeiros líderes das Big Techs eram figuras simbólicas e por isso as trocas ganham holofotes quando acontecem. “Os fundadores de empresas que chegaram longe trazem uma aura inspiradora. Eles eram quase deuses”, afirma. 

No círculo das Big Techs americanas, apenas uma ainda conserva na raiz a liderança de seu fundador: o Facebook. À frente de um conglomerado de redes sociais, serviços e escândalos, Mark Zuckerberg se assemelha aos seus colegas na ambição de um projeto novo longe da internet comum – o metaverso – mas não parece planejar uma saída estratégica da companhia. 

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Assim, Zuckerberg virou uma “ave rara” entre seus pares, o que nem sempre significa algo positivo. Para alguns especialistas, ele já carrega uma certa aura de anacronismo, além de atrapalhar o planejamento futuro das suas empresas. Nakagawa alerta que pode ser problemático construir um líder tão centrado na empresa. Em outras palavras, é preciso saber a hora de parar.

Sob nova direção

Diante dessa ruptura, uma nova geração de CEOs surge no Vale do Silício. Parag Agrawal, diretor de tecnologia do Twitter, substituirá Dorsey no comando da rede social. Na Amazon, Bezos passou o bastão para Andy Jassy, que até então comandava a divisão de nuvem da varejista. Nas mudanças anteriores, Sundar Pichai assumiu a Alphabet em 2019 e Satya Nadella se tornou CEO da Microsoft em 2014, sucedendo Steve Ballmer. 

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Na visão de Nakagawa, os novos líderes terão de administrar impérios em um cenário desafiador. “É um momento de intensa mudança, porque as empresas estão crescendo muito: os CEOs passam a precisar de uma capacidade executiva muito maior do que apenas empreender. As Big Techs estão apanhando atualmente, pois o poder traz muita responsabilidade também”,diz. 

Já é possível perceber algumas características dos novos chefões. Contrariando a geração dos “gênios e loucos”, os nomes que lideram as Big Techs demonstram um perfil mais discreto – pelo menos por enquanto. 

Para o professor do Insper, isso não é coincidência: na rodada de troca de presidentes dos últimos anos, o processo de sucessão do cargo buscou personalidades mais seguras e “profissionais”. “Os novos CEOs sabem que precisam ser mais discretos justamente para valorizar os resultados obtidos e fugir da comparação de popularidade com o fundador da companhia”, afirma. 

Mesmo com as mudanças, é possível que os balanços espetaculares sejam mantidos. O que ainda não está claro é se o setor que passa por essa transformação ainda é capaz de inovar como em outros tempos. Sem Bezos, Dorsey, Page, Brin e outros nomes, é possível dizer ainda que a internet é ‘sexy’? 

Sob pressão para que o Twitter moderasse melhor seus conteúdos, Dorsey trocou a rede pelo mundo das fintechs e dos criptoativos Foto: Toby Melville/Reuters

Depois de seis anos, Jack Dorsey deixou no final de novembro o comando do Twitter, empresa que ele ajudou a fundar em 2006. Mais do que uma virada de página para a rede do passarinho azul, o fim da gestão de Dorsey também encerra a era na qual as grandes empresas de internet contavam com carisma e o pulso firme de seus fundadores. Agora, está estabelecida uma nova geração de chefões no mundo tecnológico, que tem pela frente o desafio de gerir grandes companhias em um contexto de menos encantamento e mais pressão regulatória.

Antes de Dorsey, Jeff Bezos deixou o comando da Amazon após 27 anos – o anúncio ocorreu em fevereiro e a saída em agosto deste ano. O bilionário decidiu se dedicar à empresa de exploração espacial Blue Origin – em julho, ele próprio participou de uma viagem suborbital da companhia, a bordo do foguete New Shepard. Já o fundador do Twitter também parece animado em deixar para trás o mundo da internet “tradicional”. Dorsey se dedicará ao mundo das criptomoedas: ele é CEO da fintech Block desde 2009 e mantém uma paixão pelos ativos digitais.

“Acho que é fundamental que uma empresa possa se manter por conta própria, livre da influência ou direção de seu fundador”, disse Dorsey. Claro, o executivo pode estar pensando na saúde da empresa, mas o momento também é conveniente para quem sai.

Nos últimos anos, a euforia com empresas de tecnologias foi silenciada por um escrutínio global. Com isso, mais do que apresentações glamourosas de produtos e balanços financeiros estupendos, os CEOs passaram a lidar com críticas envolvendo temas como privacidade, segurança e monopólio. Depor perante congressistas americanos, por exemplo, virou rotina para os chefões – EUA e Europa têm cobrado cada vez mais esclarecimentos sobre concorrência desleal, moderação de conteúdo, funcionamento de algoritmos, entre outras questões. A diversão virou dor de cabeça.

Antes de deixarem Amazon e Twitter, Bezos e Dorsey guiavam barcos em águas turbulentas. Para além de ser uma empresa com capacidade de entregas megarrápidas, a Amazon passou a ser questionada por más condições de trabalho em seus armazéns – circulam acusações de que os funcionários da varejista sofrem com regras rígidas em relação a pausas no horário de trabalho, incluindo para usar o toalete. A Amazon também tem sido alvo de ações antitruste, que alegam que a empresa usa dados não públicos de vendedores de sua plataforma para obter vantagem competitiva no mercado. 

O Twitter, por sua vez, está no centro de debates sobre moderação de conteúdo e enfrenta críticas sobre o funcionamento dos algoritmos da plataforma e seu papel na distribuição de conteúdo falso e extremista. 

De olho no espaço, Bezos anunciou saída da Amazon em fevereiro Foto: Andrew Harrer/Bloomberg

Ave rara

Para especialistas, a troca de gestão é um processo natural e saudável para as companhias, seja qual for o mercado. “O empreendedor leva o negócio até um certo momento e, às vezes, em um determinado ponto ele não tem mais ambição de continuar desenvolvendo o negócio. Você chegou no topo da montanha e o que você faz? Acha outra montanha para subir”, afirma Marcelo Nakagawa, professor de empreendedorismo e inovação do Insper. 

Esse processo de mudança de direção das Big Techs começou há alguns anos. Em 2019, Larry Page e Sergey Brin, responsáveis por criar o motor de buscas que deu origem ao Google em 1998, deixaram os cargos executivos na Alphabet (holding que controla a marca), passando o bastão para Sundar Pichai. Page e Brin também partiram para projetos futuristas longe da internet, como táxis voadores.

É um movimento recente inclusive na geração mais antiga de grandes companhias tecnológicas. Na Microsoft, Bill Gates deixou o cargo em 2000 e permaneceu no conselho da companhia até 2020 – enquanto o bilionário afirma que deixou a cadeira para se dedicar a trabalhos filantrópicos, a Microsoft diz que a saída do magnata da diretoria foi uma recomendação do conselho após uma investigação de assédio sobre um caso extraconjugal do bilionário.

No setor de tecnologia, transições como essa costumam chamar a atenção, porque criador e criatura tendem a ser vistos como uma coisa só, diz Marcelo Pedroso, professor da FEA-USP. “Eles são fundadores de grandes companhias e acabam ficando famosos. Acabam se tornando figuras excêntricas, que chamam muita atenção. Quando acontece uma troca, o barulho é grande”, diz. 

Márcio Kanamaru, sócio-líder de tecnologia, mídia e telecomunicações da KPMG no Brasil, também lembra que os primeiros líderes das Big Techs eram figuras simbólicas e por isso as trocas ganham holofotes quando acontecem. “Os fundadores de empresas que chegaram longe trazem uma aura inspiradora. Eles eram quase deuses”, afirma. 

No círculo das Big Techs americanas, apenas uma ainda conserva na raiz a liderança de seu fundador: o Facebook. À frente de um conglomerado de redes sociais, serviços e escândalos, Mark Zuckerberg se assemelha aos seus colegas na ambição de um projeto novo longe da internet comum – o metaverso – mas não parece planejar uma saída estratégica da companhia. 

Assim, Zuckerberg virou uma “ave rara” entre seus pares, o que nem sempre significa algo positivo. Para alguns especialistas, ele já carrega uma certa aura de anacronismo, além de atrapalhar o planejamento futuro das suas empresas. Nakagawa alerta que pode ser problemático construir um líder tão centrado na empresa. Em outras palavras, é preciso saber a hora de parar.

Sob nova direção

Diante dessa ruptura, uma nova geração de CEOs surge no Vale do Silício. Parag Agrawal, diretor de tecnologia do Twitter, substituirá Dorsey no comando da rede social. Na Amazon, Bezos passou o bastão para Andy Jassy, que até então comandava a divisão de nuvem da varejista. Nas mudanças anteriores, Sundar Pichai assumiu a Alphabet em 2019 e Satya Nadella se tornou CEO da Microsoft em 2014, sucedendo Steve Ballmer. 

Na visão de Nakagawa, os novos líderes terão de administrar impérios em um cenário desafiador. “É um momento de intensa mudança, porque as empresas estão crescendo muito: os CEOs passam a precisar de uma capacidade executiva muito maior do que apenas empreender. As Big Techs estão apanhando atualmente, pois o poder traz muita responsabilidade também”,diz. 

Já é possível perceber algumas características dos novos chefões. Contrariando a geração dos “gênios e loucos”, os nomes que lideram as Big Techs demonstram um perfil mais discreto – pelo menos por enquanto. 

Para o professor do Insper, isso não é coincidência: na rodada de troca de presidentes dos últimos anos, o processo de sucessão do cargo buscou personalidades mais seguras e “profissionais”. “Os novos CEOs sabem que precisam ser mais discretos justamente para valorizar os resultados obtidos e fugir da comparação de popularidade com o fundador da companhia”, afirma. 

Mesmo com as mudanças, é possível que os balanços espetaculares sejam mantidos. O que ainda não está claro é se o setor que passa por essa transformação ainda é capaz de inovar como em outros tempos. Sem Bezos, Dorsey, Page, Brin e outros nomes, é possível dizer ainda que a internet é ‘sexy’? 

Sob pressão para que o Twitter moderasse melhor seus conteúdos, Dorsey trocou a rede pelo mundo das fintechs e dos criptoativos Foto: Toby Melville/Reuters

Depois de seis anos, Jack Dorsey deixou no final de novembro o comando do Twitter, empresa que ele ajudou a fundar em 2006. Mais do que uma virada de página para a rede do passarinho azul, o fim da gestão de Dorsey também encerra a era na qual as grandes empresas de internet contavam com carisma e o pulso firme de seus fundadores. Agora, está estabelecida uma nova geração de chefões no mundo tecnológico, que tem pela frente o desafio de gerir grandes companhias em um contexto de menos encantamento e mais pressão regulatória.

Antes de Dorsey, Jeff Bezos deixou o comando da Amazon após 27 anos – o anúncio ocorreu em fevereiro e a saída em agosto deste ano. O bilionário decidiu se dedicar à empresa de exploração espacial Blue Origin – em julho, ele próprio participou de uma viagem suborbital da companhia, a bordo do foguete New Shepard. Já o fundador do Twitter também parece animado em deixar para trás o mundo da internet “tradicional”. Dorsey se dedicará ao mundo das criptomoedas: ele é CEO da fintech Block desde 2009 e mantém uma paixão pelos ativos digitais.

“Acho que é fundamental que uma empresa possa se manter por conta própria, livre da influência ou direção de seu fundador”, disse Dorsey. Claro, o executivo pode estar pensando na saúde da empresa, mas o momento também é conveniente para quem sai.

Nos últimos anos, a euforia com empresas de tecnologias foi silenciada por um escrutínio global. Com isso, mais do que apresentações glamourosas de produtos e balanços financeiros estupendos, os CEOs passaram a lidar com críticas envolvendo temas como privacidade, segurança e monopólio. Depor perante congressistas americanos, por exemplo, virou rotina para os chefões – EUA e Europa têm cobrado cada vez mais esclarecimentos sobre concorrência desleal, moderação de conteúdo, funcionamento de algoritmos, entre outras questões. A diversão virou dor de cabeça.

Antes de deixarem Amazon e Twitter, Bezos e Dorsey guiavam barcos em águas turbulentas. Para além de ser uma empresa com capacidade de entregas megarrápidas, a Amazon passou a ser questionada por más condições de trabalho em seus armazéns – circulam acusações de que os funcionários da varejista sofrem com regras rígidas em relação a pausas no horário de trabalho, incluindo para usar o toalete. A Amazon também tem sido alvo de ações antitruste, que alegam que a empresa usa dados não públicos de vendedores de sua plataforma para obter vantagem competitiva no mercado. 

O Twitter, por sua vez, está no centro de debates sobre moderação de conteúdo e enfrenta críticas sobre o funcionamento dos algoritmos da plataforma e seu papel na distribuição de conteúdo falso e extremista. 

De olho no espaço, Bezos anunciou saída da Amazon em fevereiro Foto: Andrew Harrer/Bloomberg

Ave rara

Para especialistas, a troca de gestão é um processo natural e saudável para as companhias, seja qual for o mercado. “O empreendedor leva o negócio até um certo momento e, às vezes, em um determinado ponto ele não tem mais ambição de continuar desenvolvendo o negócio. Você chegou no topo da montanha e o que você faz? Acha outra montanha para subir”, afirma Marcelo Nakagawa, professor de empreendedorismo e inovação do Insper. 

Esse processo de mudança de direção das Big Techs começou há alguns anos. Em 2019, Larry Page e Sergey Brin, responsáveis por criar o motor de buscas que deu origem ao Google em 1998, deixaram os cargos executivos na Alphabet (holding que controla a marca), passando o bastão para Sundar Pichai. Page e Brin também partiram para projetos futuristas longe da internet, como táxis voadores.

É um movimento recente inclusive na geração mais antiga de grandes companhias tecnológicas. Na Microsoft, Bill Gates deixou o cargo em 2000 e permaneceu no conselho da companhia até 2020 – enquanto o bilionário afirma que deixou a cadeira para se dedicar a trabalhos filantrópicos, a Microsoft diz que a saída do magnata da diretoria foi uma recomendação do conselho após uma investigação de assédio sobre um caso extraconjugal do bilionário.

No setor de tecnologia, transições como essa costumam chamar a atenção, porque criador e criatura tendem a ser vistos como uma coisa só, diz Marcelo Pedroso, professor da FEA-USP. “Eles são fundadores de grandes companhias e acabam ficando famosos. Acabam se tornando figuras excêntricas, que chamam muita atenção. Quando acontece uma troca, o barulho é grande”, diz. 

Márcio Kanamaru, sócio-líder de tecnologia, mídia e telecomunicações da KPMG no Brasil, também lembra que os primeiros líderes das Big Techs eram figuras simbólicas e por isso as trocas ganham holofotes quando acontecem. “Os fundadores de empresas que chegaram longe trazem uma aura inspiradora. Eles eram quase deuses”, afirma. 

No círculo das Big Techs americanas, apenas uma ainda conserva na raiz a liderança de seu fundador: o Facebook. À frente de um conglomerado de redes sociais, serviços e escândalos, Mark Zuckerberg se assemelha aos seus colegas na ambição de um projeto novo longe da internet comum – o metaverso – mas não parece planejar uma saída estratégica da companhia. 

Assim, Zuckerberg virou uma “ave rara” entre seus pares, o que nem sempre significa algo positivo. Para alguns especialistas, ele já carrega uma certa aura de anacronismo, além de atrapalhar o planejamento futuro das suas empresas. Nakagawa alerta que pode ser problemático construir um líder tão centrado na empresa. Em outras palavras, é preciso saber a hora de parar.

Sob nova direção

Diante dessa ruptura, uma nova geração de CEOs surge no Vale do Silício. Parag Agrawal, diretor de tecnologia do Twitter, substituirá Dorsey no comando da rede social. Na Amazon, Bezos passou o bastão para Andy Jassy, que até então comandava a divisão de nuvem da varejista. Nas mudanças anteriores, Sundar Pichai assumiu a Alphabet em 2019 e Satya Nadella se tornou CEO da Microsoft em 2014, sucedendo Steve Ballmer. 

Na visão de Nakagawa, os novos líderes terão de administrar impérios em um cenário desafiador. “É um momento de intensa mudança, porque as empresas estão crescendo muito: os CEOs passam a precisar de uma capacidade executiva muito maior do que apenas empreender. As Big Techs estão apanhando atualmente, pois o poder traz muita responsabilidade também”,diz. 

Já é possível perceber algumas características dos novos chefões. Contrariando a geração dos “gênios e loucos”, os nomes que lideram as Big Techs demonstram um perfil mais discreto – pelo menos por enquanto. 

Para o professor do Insper, isso não é coincidência: na rodada de troca de presidentes dos últimos anos, o processo de sucessão do cargo buscou personalidades mais seguras e “profissionais”. “Os novos CEOs sabem que precisam ser mais discretos justamente para valorizar os resultados obtidos e fugir da comparação de popularidade com o fundador da companhia”, afirma. 

Mesmo com as mudanças, é possível que os balanços espetaculares sejam mantidos. O que ainda não está claro é se o setor que passa por essa transformação ainda é capaz de inovar como em outros tempos. Sem Bezos, Dorsey, Page, Brin e outros nomes, é possível dizer ainda que a internet é ‘sexy’? 

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