Apesar de ser uma novela “rural”, Pantanal, cujo remake estreia nesta segunda, 28, promete ser a novela mais tecnológica exibida até aqui pela TV Globo. Quem decidir assistir ao primeiro capítulo pelo Globoplay vai encontrar a primeira novela já produzida pelo canal com resolução 8K e tecnologia Dolby Atmos de áudio — os formatos já haviam sido testados em eventos esportivos, como as Olimpíadas. Agora chegou a hora de a onça e da personagem Juma terem suas resoluções turbinadas.
A tecnologia 8K diz respeito à quantidade de pixels inseridos na tela. Quanto maior a resolução, ou seja, o número de pixels (px), maior será a quantidade de detalhes que a imagem poderá dividir em cores e exibir. Na atual configuração do 8K, a resolução é de 7.680 por 4.320 pixels, quatro vezes maior que o 4K e 16 vezes mais nítida que as telas Full HD. A tecnologia faz diferença principalmente para quem tem televisores de tela grande, a partir de 75 polegadas.
De acordo com Paulo Rabello, diretor do hub de operações de conteúdo da TV Globo, esse é o caminho que a emissora deve seguir daqui para frente. Há algum tempo, as novelas são exibidas em resolução 4K no Globoplay, mas as equipes sonham em dar um salto para dobrar a qualidade da imagem nos próximos anos.
“Sempre foi um sonho nosso fazer um capítulo de novela em 8K. É um volume de dados e informações que é 16 vezes mais pixels que um HD. A quantidade de dados que você tem que processar é muito grande. O processo de gravar e finalizar esse conteúdo, gasta mais tempo, mais memória e poder de processamento”, explica Rabelo.
A escolha por turbinar a resolução numa produção focada no campo também tem explicação. “Quisemos fazer em Pantanal pelos elementos naturais porque a gente sabe que eles trazem uma percepção para as pessoas de resolução muito grande em um pôr do sol, uma imagem que salta mais aos olhos”, pontua Rabelo.
Reprodução 3D
Outro recurso altamente tecnológico para dar realidade ao ambiente do Pantanal é a reprodução digital em 3D de aspectos naturais, como pássaros e vegetação. Para isso, é usada uma técnica que mapeia, ponto a ponto, as características físicas dos objetos para construir um modelo base. A partir disso, o objeto é computadorizado para que se possa adicionar movimentos. Foi essa tecnologia, por exemplo, que permitiu à novela exibir um ambiente alagado do Pantanal — na época das gravações, o ecossistema passava por um período de seca.
Ao todo, o processo para produzir o primeiro capítulo demorou sete meses - claro, o trabalho foi intercalado com outras tarefas. Para o capítulo desta segunda-feira, o público pode esperar um “minifilme”, conta Marcelo Bossoni, diretor de tecnologia de entretenimento da Globo. Ele, claro, se refere ao trabalho tecnológico dedicado à produção.
“Foi preciso redesenhar todo o nosso processo de pós-produção para esse primeiro episódio, porque ele tem o tamanho de um filme. Geralmente, com essa qualidade, o mercado demora dois anos para produzir. Fizemos isso em praticamente sete meses. Demoramos cinco vezes mais em relação ao tempo usado no material 4K. O processo de colorização, que traz a grande diferença ao resultado final, levou nove vezes mais tempo do que um material tradicional demandaria”, explica Bossoni. “A gente trabalhava com arquivos com tamanhos de 10,5 GB por minuto nas gravações. Isso é quase quatro vezes maior do que acontece no 4K”. Foram processados somente nesse primeiro episódio quase 15 TB de material bruto em redes internas de fibra óptica com 100 Gbps (gigabytes por segundo) de velocidade.
O custo de avançar na tecnologia também foi alto. As alocações de profissionais e equipamentos foram cerca de 2,5 maiores do que uma novela comum da emissora.
Já o áudio, ambientado com gravações do próprio Pantanal, vai chegar no streaming com mixagem e surround Dolby Atmos. “A gente fez também um processo de mixagem de áudio que, para uma novela, é um processo inédito. Isso traz mais elementos de som para uma determinada cena”, explica Rabelo.
Para poucos
O Pantanal altamente tecnológico, porém, não estará disponível para qualquer “peão”. O episódio em 8K vai estar disponível apenas no Globoplay - portanto, não será exibido em TV aberta. Entre as explicações estão o fato de que o Brasil ainda não tem uma resolução regulamentando transmissões em 4K e 8K por TV aberta.
Mesmo no Globoplay, há restrições. Para rodar o capítulo com tranquilidade, a configuração mínima de internet precisa ter entre 25 Mbps e 30 Mbps (megabytes por segundo) dedicados apenas para o streaming - portanto, planos que prometem até 30 Mbps de velocidade não devem funcionar bem, visto que as operadoras não entregam a velocidade total contratada e que a conexão domiciliar é compartilhada entre outros equipamentos.
Além disso, os televisores precisam ter painel 8K, que custam a partir de R$ 5,7 mil em telas a partir de 55 polegadas, e o sistema de som precisa ser compatível com a tecnologia Dolby Atmos. Rabelo diz que os testes da emissora indicam também alguma dificuldade de processamento de imagem em TVs lançadas antes do segundo semestre de 2020.
Tentativa e erro
Segundo Rabelo, o uso de tecnologias “da moda” em produções da Globo não é novo. A emissora já embarcou em alguns caminhos certeiros, como o 4K, mas também já experimentou tecnologias que não avançaram. Uma delas é a imagem 3D, que foi testada, inclusive, em transmissões do reality show da casa Big Brother Brasil, mas que não resultou em um produto satisfatório na empresa - o 3D era a grande aposta dos fabricantes de TV no começo da década de 2010, mas os resultados fizeram a indústria recuar.
Rabelo afirma que mais ferramentas estão sendo mais estudadas, e que espera que esse trabalho a longo prazo possa se materializar em outras produções. No laboratório de tecnologia da empresa, por exemplo, já existem estudos para desenvolver recursos ligados ao metaverso. Ainda, é possível encontrar algumas utilizações de inteligência artificial e holografia — essas, porém, ainda não estão prontas para serem utilizadas em larga escala.
O foco, porém, parece estar todo no 8K - a ideia é que a tecnologia não vire lenda como a de Juma Marruá. “Assim como a gente consegue fazer cada vez mais coisas em 4K com o custo de produções em HD, queremos que no futuro seja possível ter novelas 8K com o mesmo custo da tecnologia 4K de hoje”, afirma Bossoni.