Twitter chega aos 15 anos tentando se reinventar, mas sucesso está em xeque


Rede social tenta acrescentar novos recursos para se manter relevante, mas não quer abandonar a essência de conversas em tempo real

Por Guilherme Guerra
Na corrida por tentar se renovar, o Twitter pode acabar deixando para trás a sua essência, focada em acontecimentos do momento Foto: Ognen Teofilovski/Reuters

“Estou apenas configurando meu Twitter”, tuitou Jack Dorsey, fundador da empresa, em 21 de março de 2006. Embora inocente, o primeiro tuíte da história sintetizava bem o espírito do serviço nos anos seguintes: uma ferramenta para publicações curtas e eficientes sobre assuntos do momento, mesmo que esses temas sejam extremamente pessoais. Ao atingir 15 anos no ar, porém, a empresa tenta se reinventar. Com a forte concorrência de outras redes sociais, o Twitter vem rascunhando e lançando novas ferramentas para manter o frescor da primeira década e meia. É um processo que parece empolgante, mas especialistas questionam se isso será suficiente para manter o passarinho azul voando.

Nesta quinta, 27, a rede social deixou vazar o que deve ser a principal novidade da plataforma em anos: o Twitter Blue, um serviço de assinatura que terá ferramentas exclusivas como editar tuítes já publicados, pastas para guardar publicações por temas, mudança de cor da plataforma (azul, vermelho, amarelo, roxo, laranja e verde) e um modo de leitura para reunir em um só texto longos fios de tuítes (ou threads). O preço? R$ 15,90 no Brasil (ou US$ 2,99 nos Estados Unidos). 

continua após a publicidade

Antes disso, no início do mês, o Twitter lançou os Espaços, o tão aguardado recurso “inspirado” nas salas de áudio do Clubhouse — a rede social exclusiva que bombou no início deste ano, mas que vem perdendo fôlego. A chegada do Twitter dá um chacoalhão no mercado porque é a primeira grande empresa a lançar sua solução depois do rival (Facebook, por exemplo, também desenvolve algo parecido para não ficar atrás dos concorrentes) e porque, ao contrário do adversário recém-chegado, já existe um público estabelecido na plataforma. Agora, as pessoas podem falar da CPI da Covid em salas de voz e em tempo real, por exemplo. 

Recentemente, a empresa finalizou a compra da Scroll, plataforma de notícias para assinar e ler notícias de portais como Insider, BuzzFeed e USA Today sem anúncios (espécie de streaming de notícias). Além dela , o Twitter comprou a Revue para tentar construir um sistema de newsletter. O ritmo de compras da empresa em 2021 indica que algo acontece nas entranhas do mundo de Jack Dorsey. Foram seis aquisições até agora, maior número desde 2015, quando a rede social abocanhou oito startups. Nas últimas semanas, já é possível dar “gorjetas” para as contas favoritas

A ferramenta recente que teve maior adesão até agora foi inspirada na concorrência: os “fleets”, inspirados nos “snaps” curtos e autodeletáveis do Snapchat (que seriam copiados pelo Instagram, onde ficaria mais conhecido pelos “stories”). O problema é que os fleets são excessivamente longos para uma rede social tão conhecida pela instantaneidade. 

continua após a publicidade

“A pergunta que fica é: qual é a essência da plataforma hoje em dia? O que ela consegue inovar dentro desse ‘what’s happening’?”, reflete Gustavo Daudt Fischer, professor do programa de pós-graduação em Ciências da Comunicação da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos).

Desafio

O grande desafio de todas essas novidades é não só reter a fiel base da plataforma, mas também atrair novos usuários, o principal calcanhar de Aquiles do Twitter nos últimos anos, e aumentar as fontes de receitas.

continua após a publicidade

É algo com o qual o mercado financeiro parece concordar. No último balanço da empresa, referente ao primeiro trimestre deste ano, as ações da companhia despencaram 10% após o fim do pregão, quando o Twitter desapontou os investidores e revelou um crescimento abaixo da expectativa, de 7 milhões de usuários monetizáveis diariamente ativos na plataforma — a principal métrica para analisar o sucesso de uma rede social. No total, a plataforma somou até março de 2021 um total de 199 milhões de usuários, abaixo dos 200 milhões esperados pelo mercado.

“Para trazer novas audiências e fortes receitas, não basta continuar monetizando a sua base existente de usuários. É preciso trazer uma audiência adicional”, afirma Yuval Ben-Itzhak, o presidente executivo da Socialbakers, empresa de marketing de mídias sociais. Para ele, os Espaços são aperfeiçoamentos à plataforma, e não necessariamente inovações, já que a solução é encontrada em concorrentes.“E, para inovar, o Twitter precisa criar novas experiências com novos propósitos. Manter retenção é bom, mas não é o suficiente.”

reference
continua após a publicidade

O CEO da Socialbakers acrescenta que, ao contrário de outras redes sociais, o Twitter não está focando em turbinar a comercialização dentro da plataforma, como faz o Grupo Facebook, que incentiva compras por meio de publicidade e páginas próprias para vendedores em suas redes. “Ainda não estamos ouvindo isso do Twitter e o mercado espera algo maior do que esses aperfeiçoamentos”, diz.

O diretor acadêmico da escola Digital House, Edney Souza, aponta que nem todas as novidades anunciadas e projetadas podem funcionar. Para ele, os Espaços podem não atrair novos usuários, mas o projeto de gorjetas tem potencial de fisgar influenciadores digitais de plataformas como Instagram. Como efeito prático, a publicidade digital acompanha esses perfis que trazem consigo prestígio e milhões de seguidores.

“Nós vivemos a era da democratização do acesso ao conteúdo de pessoas com milhões e milhões de seguidores. As pessoas tiveram preferência pelo YouTube porque a plataforma monetiza automaticamente os canais. Posteriormente, o Instagram atraiu por conta da monetização. Se o Twitter conseguir transformar isso em receita alternativa para os influenciadores, pode ser interessante”, explica Souza, acrescentando que a medida pode não ser suficiente para atrair esses perfis com alcance massivo: “Desenvolver um mecanismo de modelo de receita não garante dinheiro para a plataforma.”

continua após a publicidade

“A criação das bonificações do Twitter é o primeiro passo de nosso trabalho para criar novas maneiras de receber e mostrar apoio com dinheiro pela plataforma”, afirma em entrevista por e-mail ao Estadão a gerente sênior de produtos do Twitter, Esther Crawford. Segundo ela, a empresa estuda criar salas de bate-papo em tempo real com ingressos pagos para entregar nos Espaços. “O recurso é uma maneira para que os anfitriões sejam recompensados pelas experiências que estão criando, obtendo apoio financeiro ao mesmo tempo em que oferecemos aos ouvintes acesso exclusivo às conversas que mais lhes interessam.”

Esther Crawford é a gerente de produtos do Twitter Foto: Divulgação/Twitter

Identidade

continua após a publicidade

Por outro lado, a empresa vive um dilema. Na corrida por tentar se renovar, a empresa pode acabar deixando para trás a sua essência, focada em acontecimentos do momento. “O Twitter está em uma crise de identidade de adolescente, de ver para onde vai seguir”, diz Fischer. 

No passado, tentativas muito abruptas de mudanças não deram certo. Em 2015, a plataforma comprou o Periscope, ferramenta de vídeo em tempo real (ou seja, de lives), mas o recurso parecia inovador demais para a época e foi fechado em 31 de março deste ano. Antes disso, em 2012, comprou o Vine, rede social de vídeos curtos que é a precursora do TikTok, mas, também à frente de seu tempo, foi descontinuada em 2016. 

Assim, a maior inovação do Twitter continua sendo o lançamento do “próprio Twitter”. Ou seja, o foco em acontecimentos em tempo real ainda é o forte do serviço. “O Twitter ainda é a única plataforma onde as coisas acontecem de forma massiva em tempo real”, afirma Edney Souza. 

Além de aliado de grandes eventos, o Twitter se tornou sinônimo de plataforma para desculpas de celebridades, anúncios presidenciais (o ex-presidente americano Donald Trump e o presidente Jair Bolsonaro são exemplos de chefes de Estado que usam a plataforma de maneira extraoficial) e de boletins noticiosos. 

É nisso que o Twitter aposta: “Somos, e continuaremos sendo, um serviço onde as pessoas podem ter conversas para se manterem informadas sobre o que está acontecendo”, afirma Esther. 

Resta saber se as novidades a caminho não irão distorcer os objetivos da empresa ao mesmo tempo em que trazem frescor para a plataforma. É uma grande equação sem respostas simples. Mas virar adulto nunca foi fácil.

Na corrida por tentar se renovar, o Twitter pode acabar deixando para trás a sua essência, focada em acontecimentos do momento Foto: Ognen Teofilovski/Reuters

“Estou apenas configurando meu Twitter”, tuitou Jack Dorsey, fundador da empresa, em 21 de março de 2006. Embora inocente, o primeiro tuíte da história sintetizava bem o espírito do serviço nos anos seguintes: uma ferramenta para publicações curtas e eficientes sobre assuntos do momento, mesmo que esses temas sejam extremamente pessoais. Ao atingir 15 anos no ar, porém, a empresa tenta se reinventar. Com a forte concorrência de outras redes sociais, o Twitter vem rascunhando e lançando novas ferramentas para manter o frescor da primeira década e meia. É um processo que parece empolgante, mas especialistas questionam se isso será suficiente para manter o passarinho azul voando.

Nesta quinta, 27, a rede social deixou vazar o que deve ser a principal novidade da plataforma em anos: o Twitter Blue, um serviço de assinatura que terá ferramentas exclusivas como editar tuítes já publicados, pastas para guardar publicações por temas, mudança de cor da plataforma (azul, vermelho, amarelo, roxo, laranja e verde) e um modo de leitura para reunir em um só texto longos fios de tuítes (ou threads). O preço? R$ 15,90 no Brasil (ou US$ 2,99 nos Estados Unidos). 

Antes disso, no início do mês, o Twitter lançou os Espaços, o tão aguardado recurso “inspirado” nas salas de áudio do Clubhouse — a rede social exclusiva que bombou no início deste ano, mas que vem perdendo fôlego. A chegada do Twitter dá um chacoalhão no mercado porque é a primeira grande empresa a lançar sua solução depois do rival (Facebook, por exemplo, também desenvolve algo parecido para não ficar atrás dos concorrentes) e porque, ao contrário do adversário recém-chegado, já existe um público estabelecido na plataforma. Agora, as pessoas podem falar da CPI da Covid em salas de voz e em tempo real, por exemplo. 

Recentemente, a empresa finalizou a compra da Scroll, plataforma de notícias para assinar e ler notícias de portais como Insider, BuzzFeed e USA Today sem anúncios (espécie de streaming de notícias). Além dela , o Twitter comprou a Revue para tentar construir um sistema de newsletter. O ritmo de compras da empresa em 2021 indica que algo acontece nas entranhas do mundo de Jack Dorsey. Foram seis aquisições até agora, maior número desde 2015, quando a rede social abocanhou oito startups. Nas últimas semanas, já é possível dar “gorjetas” para as contas favoritas

A ferramenta recente que teve maior adesão até agora foi inspirada na concorrência: os “fleets”, inspirados nos “snaps” curtos e autodeletáveis do Snapchat (que seriam copiados pelo Instagram, onde ficaria mais conhecido pelos “stories”). O problema é que os fleets são excessivamente longos para uma rede social tão conhecida pela instantaneidade. 

“A pergunta que fica é: qual é a essência da plataforma hoje em dia? O que ela consegue inovar dentro desse ‘what’s happening’?”, reflete Gustavo Daudt Fischer, professor do programa de pós-graduação em Ciências da Comunicação da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos).

Desafio

O grande desafio de todas essas novidades é não só reter a fiel base da plataforma, mas também atrair novos usuários, o principal calcanhar de Aquiles do Twitter nos últimos anos, e aumentar as fontes de receitas.

É algo com o qual o mercado financeiro parece concordar. No último balanço da empresa, referente ao primeiro trimestre deste ano, as ações da companhia despencaram 10% após o fim do pregão, quando o Twitter desapontou os investidores e revelou um crescimento abaixo da expectativa, de 7 milhões de usuários monetizáveis diariamente ativos na plataforma — a principal métrica para analisar o sucesso de uma rede social. No total, a plataforma somou até março de 2021 um total de 199 milhões de usuários, abaixo dos 200 milhões esperados pelo mercado.

“Para trazer novas audiências e fortes receitas, não basta continuar monetizando a sua base existente de usuários. É preciso trazer uma audiência adicional”, afirma Yuval Ben-Itzhak, o presidente executivo da Socialbakers, empresa de marketing de mídias sociais. Para ele, os Espaços são aperfeiçoamentos à plataforma, e não necessariamente inovações, já que a solução é encontrada em concorrentes.“E, para inovar, o Twitter precisa criar novas experiências com novos propósitos. Manter retenção é bom, mas não é o suficiente.”

reference

O CEO da Socialbakers acrescenta que, ao contrário de outras redes sociais, o Twitter não está focando em turbinar a comercialização dentro da plataforma, como faz o Grupo Facebook, que incentiva compras por meio de publicidade e páginas próprias para vendedores em suas redes. “Ainda não estamos ouvindo isso do Twitter e o mercado espera algo maior do que esses aperfeiçoamentos”, diz.

O diretor acadêmico da escola Digital House, Edney Souza, aponta que nem todas as novidades anunciadas e projetadas podem funcionar. Para ele, os Espaços podem não atrair novos usuários, mas o projeto de gorjetas tem potencial de fisgar influenciadores digitais de plataformas como Instagram. Como efeito prático, a publicidade digital acompanha esses perfis que trazem consigo prestígio e milhões de seguidores.

“Nós vivemos a era da democratização do acesso ao conteúdo de pessoas com milhões e milhões de seguidores. As pessoas tiveram preferência pelo YouTube porque a plataforma monetiza automaticamente os canais. Posteriormente, o Instagram atraiu por conta da monetização. Se o Twitter conseguir transformar isso em receita alternativa para os influenciadores, pode ser interessante”, explica Souza, acrescentando que a medida pode não ser suficiente para atrair esses perfis com alcance massivo: “Desenvolver um mecanismo de modelo de receita não garante dinheiro para a plataforma.”

“A criação das bonificações do Twitter é o primeiro passo de nosso trabalho para criar novas maneiras de receber e mostrar apoio com dinheiro pela plataforma”, afirma em entrevista por e-mail ao Estadão a gerente sênior de produtos do Twitter, Esther Crawford. Segundo ela, a empresa estuda criar salas de bate-papo em tempo real com ingressos pagos para entregar nos Espaços. “O recurso é uma maneira para que os anfitriões sejam recompensados pelas experiências que estão criando, obtendo apoio financeiro ao mesmo tempo em que oferecemos aos ouvintes acesso exclusivo às conversas que mais lhes interessam.”

Esther Crawford é a gerente de produtos do Twitter Foto: Divulgação/Twitter

Identidade

Por outro lado, a empresa vive um dilema. Na corrida por tentar se renovar, a empresa pode acabar deixando para trás a sua essência, focada em acontecimentos do momento. “O Twitter está em uma crise de identidade de adolescente, de ver para onde vai seguir”, diz Fischer. 

No passado, tentativas muito abruptas de mudanças não deram certo. Em 2015, a plataforma comprou o Periscope, ferramenta de vídeo em tempo real (ou seja, de lives), mas o recurso parecia inovador demais para a época e foi fechado em 31 de março deste ano. Antes disso, em 2012, comprou o Vine, rede social de vídeos curtos que é a precursora do TikTok, mas, também à frente de seu tempo, foi descontinuada em 2016. 

Assim, a maior inovação do Twitter continua sendo o lançamento do “próprio Twitter”. Ou seja, o foco em acontecimentos em tempo real ainda é o forte do serviço. “O Twitter ainda é a única plataforma onde as coisas acontecem de forma massiva em tempo real”, afirma Edney Souza. 

Além de aliado de grandes eventos, o Twitter se tornou sinônimo de plataforma para desculpas de celebridades, anúncios presidenciais (o ex-presidente americano Donald Trump e o presidente Jair Bolsonaro são exemplos de chefes de Estado que usam a plataforma de maneira extraoficial) e de boletins noticiosos. 

É nisso que o Twitter aposta: “Somos, e continuaremos sendo, um serviço onde as pessoas podem ter conversas para se manterem informadas sobre o que está acontecendo”, afirma Esther. 

Resta saber se as novidades a caminho não irão distorcer os objetivos da empresa ao mesmo tempo em que trazem frescor para a plataforma. É uma grande equação sem respostas simples. Mas virar adulto nunca foi fácil.

Na corrida por tentar se renovar, o Twitter pode acabar deixando para trás a sua essência, focada em acontecimentos do momento Foto: Ognen Teofilovski/Reuters

“Estou apenas configurando meu Twitter”, tuitou Jack Dorsey, fundador da empresa, em 21 de março de 2006. Embora inocente, o primeiro tuíte da história sintetizava bem o espírito do serviço nos anos seguintes: uma ferramenta para publicações curtas e eficientes sobre assuntos do momento, mesmo que esses temas sejam extremamente pessoais. Ao atingir 15 anos no ar, porém, a empresa tenta se reinventar. Com a forte concorrência de outras redes sociais, o Twitter vem rascunhando e lançando novas ferramentas para manter o frescor da primeira década e meia. É um processo que parece empolgante, mas especialistas questionam se isso será suficiente para manter o passarinho azul voando.

Nesta quinta, 27, a rede social deixou vazar o que deve ser a principal novidade da plataforma em anos: o Twitter Blue, um serviço de assinatura que terá ferramentas exclusivas como editar tuítes já publicados, pastas para guardar publicações por temas, mudança de cor da plataforma (azul, vermelho, amarelo, roxo, laranja e verde) e um modo de leitura para reunir em um só texto longos fios de tuítes (ou threads). O preço? R$ 15,90 no Brasil (ou US$ 2,99 nos Estados Unidos). 

Antes disso, no início do mês, o Twitter lançou os Espaços, o tão aguardado recurso “inspirado” nas salas de áudio do Clubhouse — a rede social exclusiva que bombou no início deste ano, mas que vem perdendo fôlego. A chegada do Twitter dá um chacoalhão no mercado porque é a primeira grande empresa a lançar sua solução depois do rival (Facebook, por exemplo, também desenvolve algo parecido para não ficar atrás dos concorrentes) e porque, ao contrário do adversário recém-chegado, já existe um público estabelecido na plataforma. Agora, as pessoas podem falar da CPI da Covid em salas de voz e em tempo real, por exemplo. 

Recentemente, a empresa finalizou a compra da Scroll, plataforma de notícias para assinar e ler notícias de portais como Insider, BuzzFeed e USA Today sem anúncios (espécie de streaming de notícias). Além dela , o Twitter comprou a Revue para tentar construir um sistema de newsletter. O ritmo de compras da empresa em 2021 indica que algo acontece nas entranhas do mundo de Jack Dorsey. Foram seis aquisições até agora, maior número desde 2015, quando a rede social abocanhou oito startups. Nas últimas semanas, já é possível dar “gorjetas” para as contas favoritas

A ferramenta recente que teve maior adesão até agora foi inspirada na concorrência: os “fleets”, inspirados nos “snaps” curtos e autodeletáveis do Snapchat (que seriam copiados pelo Instagram, onde ficaria mais conhecido pelos “stories”). O problema é que os fleets são excessivamente longos para uma rede social tão conhecida pela instantaneidade. 

“A pergunta que fica é: qual é a essência da plataforma hoje em dia? O que ela consegue inovar dentro desse ‘what’s happening’?”, reflete Gustavo Daudt Fischer, professor do programa de pós-graduação em Ciências da Comunicação da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos).

Desafio

O grande desafio de todas essas novidades é não só reter a fiel base da plataforma, mas também atrair novos usuários, o principal calcanhar de Aquiles do Twitter nos últimos anos, e aumentar as fontes de receitas.

É algo com o qual o mercado financeiro parece concordar. No último balanço da empresa, referente ao primeiro trimestre deste ano, as ações da companhia despencaram 10% após o fim do pregão, quando o Twitter desapontou os investidores e revelou um crescimento abaixo da expectativa, de 7 milhões de usuários monetizáveis diariamente ativos na plataforma — a principal métrica para analisar o sucesso de uma rede social. No total, a plataforma somou até março de 2021 um total de 199 milhões de usuários, abaixo dos 200 milhões esperados pelo mercado.

“Para trazer novas audiências e fortes receitas, não basta continuar monetizando a sua base existente de usuários. É preciso trazer uma audiência adicional”, afirma Yuval Ben-Itzhak, o presidente executivo da Socialbakers, empresa de marketing de mídias sociais. Para ele, os Espaços são aperfeiçoamentos à plataforma, e não necessariamente inovações, já que a solução é encontrada em concorrentes.“E, para inovar, o Twitter precisa criar novas experiências com novos propósitos. Manter retenção é bom, mas não é o suficiente.”

reference

O CEO da Socialbakers acrescenta que, ao contrário de outras redes sociais, o Twitter não está focando em turbinar a comercialização dentro da plataforma, como faz o Grupo Facebook, que incentiva compras por meio de publicidade e páginas próprias para vendedores em suas redes. “Ainda não estamos ouvindo isso do Twitter e o mercado espera algo maior do que esses aperfeiçoamentos”, diz.

O diretor acadêmico da escola Digital House, Edney Souza, aponta que nem todas as novidades anunciadas e projetadas podem funcionar. Para ele, os Espaços podem não atrair novos usuários, mas o projeto de gorjetas tem potencial de fisgar influenciadores digitais de plataformas como Instagram. Como efeito prático, a publicidade digital acompanha esses perfis que trazem consigo prestígio e milhões de seguidores.

“Nós vivemos a era da democratização do acesso ao conteúdo de pessoas com milhões e milhões de seguidores. As pessoas tiveram preferência pelo YouTube porque a plataforma monetiza automaticamente os canais. Posteriormente, o Instagram atraiu por conta da monetização. Se o Twitter conseguir transformar isso em receita alternativa para os influenciadores, pode ser interessante”, explica Souza, acrescentando que a medida pode não ser suficiente para atrair esses perfis com alcance massivo: “Desenvolver um mecanismo de modelo de receita não garante dinheiro para a plataforma.”

“A criação das bonificações do Twitter é o primeiro passo de nosso trabalho para criar novas maneiras de receber e mostrar apoio com dinheiro pela plataforma”, afirma em entrevista por e-mail ao Estadão a gerente sênior de produtos do Twitter, Esther Crawford. Segundo ela, a empresa estuda criar salas de bate-papo em tempo real com ingressos pagos para entregar nos Espaços. “O recurso é uma maneira para que os anfitriões sejam recompensados pelas experiências que estão criando, obtendo apoio financeiro ao mesmo tempo em que oferecemos aos ouvintes acesso exclusivo às conversas que mais lhes interessam.”

Esther Crawford é a gerente de produtos do Twitter Foto: Divulgação/Twitter

Identidade

Por outro lado, a empresa vive um dilema. Na corrida por tentar se renovar, a empresa pode acabar deixando para trás a sua essência, focada em acontecimentos do momento. “O Twitter está em uma crise de identidade de adolescente, de ver para onde vai seguir”, diz Fischer. 

No passado, tentativas muito abruptas de mudanças não deram certo. Em 2015, a plataforma comprou o Periscope, ferramenta de vídeo em tempo real (ou seja, de lives), mas o recurso parecia inovador demais para a época e foi fechado em 31 de março deste ano. Antes disso, em 2012, comprou o Vine, rede social de vídeos curtos que é a precursora do TikTok, mas, também à frente de seu tempo, foi descontinuada em 2016. 

Assim, a maior inovação do Twitter continua sendo o lançamento do “próprio Twitter”. Ou seja, o foco em acontecimentos em tempo real ainda é o forte do serviço. “O Twitter ainda é a única plataforma onde as coisas acontecem de forma massiva em tempo real”, afirma Edney Souza. 

Além de aliado de grandes eventos, o Twitter se tornou sinônimo de plataforma para desculpas de celebridades, anúncios presidenciais (o ex-presidente americano Donald Trump e o presidente Jair Bolsonaro são exemplos de chefes de Estado que usam a plataforma de maneira extraoficial) e de boletins noticiosos. 

É nisso que o Twitter aposta: “Somos, e continuaremos sendo, um serviço onde as pessoas podem ter conversas para se manterem informadas sobre o que está acontecendo”, afirma Esther. 

Resta saber se as novidades a caminho não irão distorcer os objetivos da empresa ao mesmo tempo em que trazem frescor para a plataforma. É uma grande equação sem respostas simples. Mas virar adulto nunca foi fácil.

Atualizamos nossa política de cookies

Ao utilizar nossos serviços, você aceita a política de monitoramento de cookies.