O Comitê de Supervisão da Meta, dona de Facebook, Instagram e Whatsapp, anunciou nesta quinta-feira, 22, que derrubou a decisão original da empresa de deixar no ar um vídeo no Facebook que mostra um discurso de um general brasileiro convocando as pessoas a “irem às ruas” e “irem ao Congresso Nacional e ao Supremo Tribunal Federal”. O órgão, chamado em inglês de Oversight Board, é independente e foi criado pela empresa em 2020, para servir como um conselho externo de moderação de conteúdo.
O Comitê de Supervisão aponta que, após o órgão selecionar o caso para avaliar, a Meta determinou que manter o conteúdo no Facebook foi um “erro”. O conselho destaca a polarização política em meio às eleições de 2022, com questionamentos por parte de manifestantes à legitimidade das eleições, pedidos de intervenção militar, acampamentos em frente a bases militares e invasão de prédios do governo, e afirma que o caso levanta preocupações sobre as ações da Meta em meio às eleições gerais no Brasil e em outros lugares.
“Embora desafiar a integridade das eleições seja geralmente considerado discurso protegido, em algumas circunstâncias reivindicações generalizadas que tentam minar as eleições podem levar à violência. Nesse caso, a intenção do locutor, o conteúdo do discurso e seu alcance, bem como a probabilidade de dano iminente decorrente do contexto político do Brasil da época, tudo justificava a retirada da postagem”, diz o órgão.
Segundo o Comitê de Supervisão, o vídeo em questão foi postado por um usuário do Facebook no dia 3 de janeiro de 2023, dois dias após a posse do presidente Lula, com uma legenda chamando para “sitiar” o Congresso como “a última alternativa” ao resultado da eleição. O vídeo mostra ainda um discurso de um general brasileiro apoiador do ex-presidente Jair Bolsonaro, chamando as pessoas para irem às ruas, ao Congresso e ao STF.
Em meio a uma sequência de imagens que incluem um incêndio na Praça dos Três Poderes, surge um texto que diz “Venha para Brasília! Vamos invadir! Vamos sitiar os três poderes” e “exigimos o código-fonte”, frase repetida por manifestantes para questionar, sem provas, a segurança das urnas eletrônicas.
No dia em que o vídeo foi postado, um usuário o denunciou por violar as regras da Meta sobre violência e incitação. No total, quatro usuários denunciaram o conteúdo sete vezes do dia 3 ao dia 4 de janeiro. Com a primeira denúncia, o conteúdo foi analisado por um revisor, que considerou que não houve violação das políticas da Meta. O usuário apelou, mas a decisão foi mantida por um segundo revisor. As outras seis denúncias foram analisadas por cinco moderadores diferentes e todos concluíram que o conteúdo não violava as políticas da Meta. Somente após a seleção do caso pelo Comitê, a Meta determinou que suas repetidas decisões de manter o conteúdo no Facebook foram um erro. O vídeo foi removido em 20 de janeiro de 2023, somente depois que o conselho trouxe o caso à atenção da Meta, destaca o órgão.
No dia 8 de janeiro, apoiadores do ex-presidente Bolsonaro invadiram o Congresso Nacional, o Supremo Tribunal Federal e o Palácio do Planalto, fato que a Meta classificou no dia seguinte como um “evento de violação” de sua política de indivíduos e organizações perigosas, dizendo que removeria “conteúdo que apoia ou elogia essas ações”. A empresa também anunciou que havia “designado o Brasil como um local temporário de alto risco” e que estava removendo “conteúdo pedindo que as pessoas pegassem em armas ou invadissem à força o Congresso, o palácio presidencial e outros prédios federais”.
O conselho aponta que a Meta se afastou de suas próprias regras ao manter o conteúdo em questão no ar, pois o vídeo convocava a entrada em um local considerado de “alto risco” (a Praça dos Três Poderes), em um “local temporariamente de alto risco” (o Brasil). O órgão expressa preocupação com o fato de que, em um período de violência política exacerbada, esse conteúdo e outros semelhantes foram postados e disseminados nas semanas e meses antes de 8 de janeiro, com os moderadores avaliando o conteúdo em questão repetidamente como não violador e falhando em encaminhá-lo para uma análise mais aprofundada.
A Meta afirmou ao Comitê que não tem dados sobre a prevalência de reclamações em suas plataformas relacionadas à eleição e respondeu quando questionada que não tem métricas para analisar o sucesso de seus esforços de integridade eleitoral em geral. Por isso, o conselho recomenda que a empresa desenvolva uma estrutura para avaliar seus esforços de integridade eleitoral e que esclareça em sua Central de Transparência que, além do Protocolo de Política de Crise, a empresa mantém outros protocolos na tentativa de prevenir e lidar com potenciais riscos de danos decorrentes de contextos eleitorais ou outros eventos de alto risco.