Por décadas o aparelho televisão foi considerado o centro do entretenimento familiar - e o sonho de consumo de muitos jovens era ter o aparelho no próprio quarto. Porém, para a geração Z (pessoas nascidas entre 1995 e 2010) isso é coisa do passado e o televisor vem perdendo o seu lugar de destaque. A mudança de hábitos, marcada pela preferência por dispositivos móveis como smartphones e computadores, está redefinindo a forma como essa geração enxerga o eletrônico que um dia reinou nos lares de todo o mundo.
Um estudo realizado em 2022 pela Ofcom, agência reguladora britânica, revelou que jovens entre 16 e 24 anos ficam menos de uma hora em frente a televisão por dia (em média 39 minutos diários), isso incluindo assistir programas da TV aberta ou vídeos e conteúdos selecionados ou espelhados pelo próprio usuário.
Para entender melhor essa transformação, Eduardo Pellanda, professor da PUC-RS, explica que o principal fator para isso é o aumento de estímulos, o que estaria exigindo um comportamento de multitarefas. “Temos muitas opções de streamings, de redes sociais, de atenções múltiplas, e, cognitivamente, a gente não consegue consumir tudo isso. Então, aquele conteúdo que eu sei que vai demandar mais tempo, que eu preciso ficar parado para assistir naquela tela grande, eu não vou nem começar”, diz.
Segundo o estudo do TIC Domicílios 2023, 63% dos jovens entre 16 e 24 anos usam internet pela televisão (para assistir streaming e conteúdos variados), enquanto 100% dessa faixa opta pelo acesso em smartphones para acessar conteúdos de mídia. Esses dados refletem uma tendência crescente de abandono do aparelho de TV, mesmo quando se trata de espelhar a tela do celular ou do computador no televisor.
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Isabella Castellani, estudante de medicina veterinária de 22 anos, mora com os pais e possui uma televisão em casa, que fica na sala, mas conta que não usa o aparelho mesmo quando está sozinha. “Eu praticamente não uso televisão, nem quando estou sozinha. Acho que não é um aparelho muito prático”, diz, “Prefiro pegar meu computador, que é pequeno, para assistir filmes e séries na cama. A TV ocupa um espaço desnecessário e faz a mesma coisa que o meu computador já faz”.
Isabella Castellani, estudante de medicina veterinária
Maior interesse por vídeos curtos
Ainda conforme a pesquisa da Ofcom, 5,2 milhões de jovens entre 15 e 24 anos usaram o TikTok, passando em média 58 minutos por dia na plataforma, o que mostra uma preferência pelo modelo de vídeos e conteúdos mais curtos. “Eu costumo assistir bastante conteúdo curto e rápido e me familiarizo mais com isso”, conta Miguel Vilella, estudante de curso pré-vestibular de 18 anos, “Quando eu estou indo pra aula, no metrô, principalmente, é mais fácil eu ver um TikTok do que ver um filme”.
Pellanda explica que esse interesse maior por vídeos curtos acontece devido à nova realidade multitarefas que a geração Z vem experimentando. “Agora você pode ver um TikTok enquanto está fazendo outras coisas, indo para algum lugar, por exemplo. Antes a gente ia ver uma novela, e ficávamos horas parados na frente da TV para assistir, mas agora você pode fazer múltiplas coisas ao mesmo tempo”, afirma.
Essa mudança de hábito também está relacionada à natureza pessoal e portátil dos dispositivos móveis. “A TV, normalmente tem um uso mais social, em que você vê um futebol junto, assiste um filme com a família, enquanto isso o celular é algo mais pessoal, é um aparelho nosso mesmo”, explica o professor.
“Quando estou com mais pessoas, presencialmente, eu uso a televisão para assistir algum conteúdo porque a tela é maior e todo mundo consegue ver”, conta Miguel, “Fora isso, quando estou sozinho assisto tudo pelo celular, sinto que me concentro melhor assistindo por ele, eu fico mais ligado”.
“Na casa de outras pessoas, ou num bar, eu assisto TV porque estamos em mais pessoas, mas tirando essas situações, quando eu estou sozinha eu fico no celular ou no computador mesmo”, afirma Isabella. “Meu namorado não está no Brasil no momento, e mesmo quando assistimos um filme, assistimos pelo celular ou computador, usando o Discord”, conta a estudante de veterinária, “Um de nós compartilha a tela com o filme ou série na chamada e assistimos ao mesmo tempo, sem precisar de uma TV”.
TV continua sendo um aparelho essencial em casa?
Apesar da televisão ser considerada por muitos o principal aparelho para se ter em casa, a geração Z discorda, ficando do lado dos dispositivos móveis. “Eu me lembro que as pessoas diziam que jamais iriam ver um filme inteiro ou conteúdos mais longos dentro de uma telinha de celular, mas as telas dos celulares ficaram com uma qualidade absurdamente boa. E sempre estão na palma da mão, então isso mudou muito”, explica o professor da PUC-RS.
Essas melhorias nos aparelhos portáteis se refletem principalmente na visão dos jovens sobre os dispositivos principais em uma casa. “Eu não considero mais a TV necessária em uma casa moderna, acho que daqui pra frente as pessoas vão ter apenas uma televisão por casa, porque os essenciais, para mim, são celular e computador”, diz Miguel, “Nesses aparelhos, tanto ver conteúdos longos quanto curtos dá certo, diferente da televisão”.
“Atualmente o aparelho que não pode faltar em casa é um computador”, afirma Isabella, “Ele faz as mesmas coisas que uma televisão, é maior que um celular e é portátil. Acho bem mais fácil e prático que a TV, que já nem tem tanta importância”.
*Alice Labate é estagiária sob supervisão do editor Bruno Romani