“Quero que a revolução digital finalmente chegue à cozinha”, defende o campinense Marcelo Coelho. Com um mestrado em curso no Media Lab do MIT, o brasileiro desenvolveu uma impressora 3D de comida, que batizou de Cornucopia. Em parceria com o colega israelense Amit Zoran, ele idealizou e construiu a traquitana que, ainda em testes, teria se saído “melhor do que o esperado”. Os alimentos que imprimiu, ele não conta — a invenção ainda está sendo patenteada.
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Com o aparelho, Coelho espera criar sabores e texturas inéditos (Foto: Divulgação)
Os ingredientes ficam armazenados nas cápsulas multicoloridas em cima da máquina, que funcionam mais ou menos como os cartuchos de tinta das impressoras tradicionais. Conectado à internet, o equipamentoavisa quando algo acaba e pode até encomendar mais, automaticamente. Abaixo, o cabeçote puxa a matéria-prima, mistura de acordo com a receita e molda o alimento em três dimensões. Na superfície de preparo do prato, são reguladas temperatura e umidade, com incrível exatidão. Na tela sensível ao toque que fica na frente, você adiciona e compartilha receitas – basta escolher e imprimir o seu almoço.
A engenhoca surgiu de uma inquietação. Se o digital parece transformar quase todas as áreas de trabalho, as tecnologias fundamentais da cozinha continuam as mesmas de sempre. “Tirando o micro-ondas, a maioria das técnicas que usamos já têm mais de quinhentos anos. Nada muito novo aconteceu até agora”, diz.
Acusado de tentar criar o fast-food do futuro, sempre pronto para gerar junk food quentinha, Coelho se defende. “Quero aumentar a criatividade, criar um novo conceito de cozinha. Não queremos que as pessoas parem de cozinhar, apertem um botão e imprimam sua lasanha todo dia. Queremos criar uma ferramenta adicional”, diz ele, em entrevista ao Link. A Cornucopia controla a composição dos alimentos em nível molecular, além de modelar com uma exatidão que chega a um décimo de milímetro.
Da mesma forma, a ideia não é substituir o fogão ou o micro-ondas, mas oferecer uma alternativa capaz de criar pratos inovadores. “O legal da impressão 3D é que você pode fazer as coisas com muita precisão. Você aperta um botão e cria um bolo em que cada camada de recheio tem exatamente um milímetro, todas com sabores diferentes. Você faz experiências gastronômicas. A primeira mordida tem um gosto e a segunda tem outro, completamente diferente”, imagina.
A qualidade da comida que a Cornucopia produzirá, para Marcelo, só dependerá das pessoas que a comprarão. “Depende muito. A escolha é de cada um. Assim como você pode comprar comida congelada todo dia”, diz. Já as possibilidades, segundo ele, são quase ilimitadas, dependendo apenas do tipo de alimento que se adequará ao sistema, justamente o que os dois criadores estão estudando agora.
Se o forno micro-ondas ditou um caminho para a comida quando foi lançado comercialmente no começo dos anos 50, as impressoras 3D renovariam a cozinha doméstica.“Sei lá, dá você grelhar carne em uma churrasqueira normal e, ao mesmo tempo, imprimir uma massa que vai formar o prato”, imagina.
Não é a primeira vez que Coelho, ex-aluno de Cinema na USP e formado em Artes e Computação no Canadá, pensa a alimentação. No projeto artístico DinnerWare, ele fez uma espécie de jantar eletrônico. Prato, talheres, copos de vinho e um saleiro – tudo fazia parte de um circuito que respondia ao alimento e aos gestos de comer de cada um. “Nessa época, eu quis experimentar com os rituais de jantar. Toda cultura tem uma forma diferente de sentar na mesa, de comer, de posicionar o prato ou o garfo. O que eu fiz foi equipá-los com uma tecnologia bem simples, com materiais que conduzem eletricidade. Modificando seus hábitos, você modifica a iluminação do prato”, explica.
“O legal desse projeto é que eu montei uns pratos, fiz um jantar em casa e chamei meus amigos para comerem aqui – e isso mudou completamente a forma como eles comiam. É engraçado como uma tecnologia simples pode mudar uma prática de anos”, completa, com uma frase final que poderia servir para a sua invenção mais recente.
Marcelo prevê vários futuros para a Cornucopia, como sua adoção em restaurantes que experimentam com o formato e com a apresentação da comida, mas acha mais interessante ainda a parte que nem ele consegue imaginar:“Acredito que as pessoas vão achar formas de usar essa máquina que nem eu consegui prever. O mais interessante é isso: criar uma habilidade nova, que ainda não existe, e deixar as pessoas criarem em cima”.
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