Combate ao desperdício de comida vira negócio para startups


Empresas como Food to Save e Refood ganham força em momento de alta nos preços e maior conscientização dos consumidores sobre sustentabilidade

Por Guilherme Guerra
Atualização:

Por trás das vitrines com quitutes deliciosos, padarias e confeitarias enfrentam um problema: o desperdício de alimentos. Nos bastidores, quando esses estabelecimentos não conseguem vender todos os itens expostos, a solução encontrada é a doação de alimentos ou, na maior parte das vezes, o descarte - mesmo que estejam perfeitos para o consumo. 

Para amenizar o prejuízo recorrente dos estabelecimentos, startups da área de alimentos (batizadas de “foodtechs” no jargão do setor) começam a ganhar força por meio de um modelo que consegue aproveitar os alimentos antes que eles engordem os lixões do País. No Brasil, as pioneiras são a Food to Save e a Refood, nascidas na pandemia e concorrentes diretas no mercado da cidade de São Paulo.

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Ambas têm aplicativos por onde os consumidores encontram padarias, confeitarias e outros estabelecimentos do tipo, fazem as compras e recebem uma cesta em casa - bolos, pães e doces costumam fazer parte do cardápio. A plataforma se encarrega de processar o pagamento e cuidar da entrega, embutindo no preço uma taxa de serviço a cada operação. 

Ao comercializar alimentos que seriam descartados pelos estabelecimentos, as startups afirmam que conseguem revender os produtos por preços até XX% mais baratos ao que seria pago na vitrine da loja — algo bastante “apetitoso” em tempos de inflação na cesta de alimentos. 

Além disso, tanto a Food to Save quanto a Refood apostam no formato de “sacola surpresa”: até a chegada da encomenda em casa, o consumidor não sabe o que virá no pacote. No ato da compra, constam informações vagas, como “doces”, “salgados” e “mistos”, por exemplo. Quem escolhe o que irá para cada cliente é o estabelecimento, que não consegue prever o que seria descartado no fim do dia.

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Murilo Ambrogi, Lucas Infante e Fernando Henrique dos Reis fundaram a Food to Save em 2021 Foto: Jefferson de Souza/Food to Save

“Esse não é um modelo criado por nós”, explica ao Estadão o fundador da Food to Save, Lucas Infante. No mundo, o modelo foi criado pela dinamarquesa Too Good to Go, inspiração para as duas startups brasileiras e cujas vendas superam 120 milhões de refeições que iriam para o lixo. “É um formato provocativo, curioso e que traz uma redução de custos para o cliente”, completa o executivo.

Similar ao “boom” da dinamarquesa (que dominou o mercado europeu e hoje aposta nos Estados Unidos e Canadá, ainda sem planos para o Brasil), a Food to Save vem notando a popularização da “sacola surpresa” pelo Brasil. A startup vendeu 125 mil sacolas desde a fundação, em abril de 2021, e registrou especial aceleração do negócio em 2022.

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Recentemente, a startup, que atuava na Grande São Paulo, levantou R$ 1,3 milhão em crowdfunding e abriu operação no Rio. Para este ano, a meta é atingir 370 mil vendas, o que, nos cálculos da empresa, pouparia cerca de 500 toneladas de alimentos que seriam jogados no lixo. Atualmente, franquias da B.Lem, Manai, Carole Crema e Dengo estão entre os estabelecimentos parceiros em São Paulo.

Já a Refood, criada em dezembro de 2020, não revela o número de sacolas entregues, mas afirma que 80 mil consumidores já usaram a plataforma. O negócio da startup vem apostando em uma inserção de bairro em bairro no mercado paulistano. Hoje, são quatro regiões atendidas na capital paulista, com expectativa de chegar a toda a cidade até o fim do ano.

Ainda, a startup conversa com possíveis embaixadores para a marca, como chefs de cozinha — e algumas grandes empresas de alimentos se mostram interessadas em participar da plataforma, como Unilever, Nestlé, Carrefour, Pão de Açúcar e Ambev. “Queremos realizar uma criação de valor dentro da plataforma para apoiar a massificação do movimento contra o desperdício de alimentos”, diz Luciano Touguinha, um dos fundadores da Refood.

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Luciano Touguinha é o fundador da Refood, que combate o desperdício de alimentos com sacolas surpresa Foto: Felipe Rau/Estadão - 17/3/2022

Desperdício e oportunidade

Simone Galante, especialista em serviços alimentícios da consultoria Galunium, explica que o desperdício nas vitrines é um problema crônico dos estabelecimentos. Além de fatores imprevisíveis atuarem para segurar a demanda (chuva pode afastar consumidores da rua, por exemplo), há produtos que perdem valor de venda com o tempo ou, ainda, casos em que o próprio estabelecimento “decreta” a morte desses itens.

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“Todo mundo quer uma vitrine cheia, e a beleza desse estabelecimento está associada a ter muitos produtos expostos, mesmo que não vão ser consumidos”, explica Simone, que incentiva técnicas de vitrine que não prejudiquem o tempo de vida de um produto.

Nos cálculos da consultoria, cerca de 5% do que é exposto nas vitrines chega a ser descartado diariamente. “Por isso, esse é um mercado muito grande de atuação para essas startups. É uma oportunidade recorrente”, aponta a especialista. Simone acrescenta, porém, que tecnologias que estendam a vida desses produtos em exposição nas lojas podem ser um entrave para essas companhias no médio prazo.

Em toda a cadeia de alimentos, que vai da colheita à entrega ao consumidor, o desperdício é de 17%, segundo dados de um relatório desenvolvido pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente junto com a organização de resíduos WRAP. No Brasil, o descarte médio é de 60 quilos por pessoa em todos os anos.

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“Todo mundo concorda que precisamos reduzir o desperdício, mas, na hora em que vamos para ação, como fazer isso?”, questiona Simone.

‘Foodtechs’ em pauta

Até a pandemia de covid-19, o assunto da alimentação era secundário no ecossistema de inovação, que preferia focar esforços e capital nas áreas de finanças, mobilidade, imóveis e logística – setores onde há o maior número de unicórnios no Brasil, as raras startups avaliadas em mais de US$ 1 bilhão.

Nos últimos meses, porém, aportes nas foodtechs vêm pipocando com mais frequência. Neste ano, as startups Diferente (de entrega de alimentos “feios” que seriam descartados nas gôndolas do mercado), Floki (de digitalização de bares e restaurantes) e Raízs (de entregas de alimentos orgânicos) foram algumas das agraciadas com cheques para escalar seus negócios pelo Brasil.

Outro fator que esquenta o segmento é o olhar direcionado de fundos de investimento para o tema. De olho em algumas dessas companhias, a gestora Outcast Ventures apontou em março passado que há 350 startups brasileiras na área de alimentos e acredita haver potencial para esse número crescer muito mais nos próximos anos: “As ‘foodtechs’ são a próxima onda gigante de startups, assim como hoje são as fintechs”, contou José Rodolpho Bernardoni, presidente do fundo, em entrevista ao Estadão à época.

Infante, da Food to Save, concorda. Com a expectativa de a Terra ter 9 bilhões de pessoas circulando no planeta, a sociedade precisa enfrentar problemas crônicos, como fome e desperdício. “Não faltam alimentos. Precisamos lidar com novas formas de produção, distribuição e consumo. E quem vai puxar isso são as foodtechs.” / COLABOROU ANDRÉ JANKAVSKI

Por trás das vitrines com quitutes deliciosos, padarias e confeitarias enfrentam um problema: o desperdício de alimentos. Nos bastidores, quando esses estabelecimentos não conseguem vender todos os itens expostos, a solução encontrada é a doação de alimentos ou, na maior parte das vezes, o descarte - mesmo que estejam perfeitos para o consumo. 

Para amenizar o prejuízo recorrente dos estabelecimentos, startups da área de alimentos (batizadas de “foodtechs” no jargão do setor) começam a ganhar força por meio de um modelo que consegue aproveitar os alimentos antes que eles engordem os lixões do País. No Brasil, as pioneiras são a Food to Save e a Refood, nascidas na pandemia e concorrentes diretas no mercado da cidade de São Paulo.

Ambas têm aplicativos por onde os consumidores encontram padarias, confeitarias e outros estabelecimentos do tipo, fazem as compras e recebem uma cesta em casa - bolos, pães e doces costumam fazer parte do cardápio. A plataforma se encarrega de processar o pagamento e cuidar da entrega, embutindo no preço uma taxa de serviço a cada operação. 

Ao comercializar alimentos que seriam descartados pelos estabelecimentos, as startups afirmam que conseguem revender os produtos por preços até XX% mais baratos ao que seria pago na vitrine da loja — algo bastante “apetitoso” em tempos de inflação na cesta de alimentos. 

Além disso, tanto a Food to Save quanto a Refood apostam no formato de “sacola surpresa”: até a chegada da encomenda em casa, o consumidor não sabe o que virá no pacote. No ato da compra, constam informações vagas, como “doces”, “salgados” e “mistos”, por exemplo. Quem escolhe o que irá para cada cliente é o estabelecimento, que não consegue prever o que seria descartado no fim do dia.

Murilo Ambrogi, Lucas Infante e Fernando Henrique dos Reis fundaram a Food to Save em 2021 Foto: Jefferson de Souza/Food to Save

“Esse não é um modelo criado por nós”, explica ao Estadão o fundador da Food to Save, Lucas Infante. No mundo, o modelo foi criado pela dinamarquesa Too Good to Go, inspiração para as duas startups brasileiras e cujas vendas superam 120 milhões de refeições que iriam para o lixo. “É um formato provocativo, curioso e que traz uma redução de custos para o cliente”, completa o executivo.

Similar ao “boom” da dinamarquesa (que dominou o mercado europeu e hoje aposta nos Estados Unidos e Canadá, ainda sem planos para o Brasil), a Food to Save vem notando a popularização da “sacola surpresa” pelo Brasil. A startup vendeu 125 mil sacolas desde a fundação, em abril de 2021, e registrou especial aceleração do negócio em 2022.

Recentemente, a startup, que atuava na Grande São Paulo, levantou R$ 1,3 milhão em crowdfunding e abriu operação no Rio. Para este ano, a meta é atingir 370 mil vendas, o que, nos cálculos da empresa, pouparia cerca de 500 toneladas de alimentos que seriam jogados no lixo. Atualmente, franquias da B.Lem, Manai, Carole Crema e Dengo estão entre os estabelecimentos parceiros em São Paulo.

Já a Refood, criada em dezembro de 2020, não revela o número de sacolas entregues, mas afirma que 80 mil consumidores já usaram a plataforma. O negócio da startup vem apostando em uma inserção de bairro em bairro no mercado paulistano. Hoje, são quatro regiões atendidas na capital paulista, com expectativa de chegar a toda a cidade até o fim do ano.

Ainda, a startup conversa com possíveis embaixadores para a marca, como chefs de cozinha — e algumas grandes empresas de alimentos se mostram interessadas em participar da plataforma, como Unilever, Nestlé, Carrefour, Pão de Açúcar e Ambev. “Queremos realizar uma criação de valor dentro da plataforma para apoiar a massificação do movimento contra o desperdício de alimentos”, diz Luciano Touguinha, um dos fundadores da Refood.

Luciano Touguinha é o fundador da Refood, que combate o desperdício de alimentos com sacolas surpresa Foto: Felipe Rau/Estadão - 17/3/2022

Desperdício e oportunidade

Simone Galante, especialista em serviços alimentícios da consultoria Galunium, explica que o desperdício nas vitrines é um problema crônico dos estabelecimentos. Além de fatores imprevisíveis atuarem para segurar a demanda (chuva pode afastar consumidores da rua, por exemplo), há produtos que perdem valor de venda com o tempo ou, ainda, casos em que o próprio estabelecimento “decreta” a morte desses itens.

“Todo mundo quer uma vitrine cheia, e a beleza desse estabelecimento está associada a ter muitos produtos expostos, mesmo que não vão ser consumidos”, explica Simone, que incentiva técnicas de vitrine que não prejudiquem o tempo de vida de um produto.

Nos cálculos da consultoria, cerca de 5% do que é exposto nas vitrines chega a ser descartado diariamente. “Por isso, esse é um mercado muito grande de atuação para essas startups. É uma oportunidade recorrente”, aponta a especialista. Simone acrescenta, porém, que tecnologias que estendam a vida desses produtos em exposição nas lojas podem ser um entrave para essas companhias no médio prazo.

Em toda a cadeia de alimentos, que vai da colheita à entrega ao consumidor, o desperdício é de 17%, segundo dados de um relatório desenvolvido pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente junto com a organização de resíduos WRAP. No Brasil, o descarte médio é de 60 quilos por pessoa em todos os anos.

“Todo mundo concorda que precisamos reduzir o desperdício, mas, na hora em que vamos para ação, como fazer isso?”, questiona Simone.

‘Foodtechs’ em pauta

Até a pandemia de covid-19, o assunto da alimentação era secundário no ecossistema de inovação, que preferia focar esforços e capital nas áreas de finanças, mobilidade, imóveis e logística – setores onde há o maior número de unicórnios no Brasil, as raras startups avaliadas em mais de US$ 1 bilhão.

Nos últimos meses, porém, aportes nas foodtechs vêm pipocando com mais frequência. Neste ano, as startups Diferente (de entrega de alimentos “feios” que seriam descartados nas gôndolas do mercado), Floki (de digitalização de bares e restaurantes) e Raízs (de entregas de alimentos orgânicos) foram algumas das agraciadas com cheques para escalar seus negócios pelo Brasil.

Outro fator que esquenta o segmento é o olhar direcionado de fundos de investimento para o tema. De olho em algumas dessas companhias, a gestora Outcast Ventures apontou em março passado que há 350 startups brasileiras na área de alimentos e acredita haver potencial para esse número crescer muito mais nos próximos anos: “As ‘foodtechs’ são a próxima onda gigante de startups, assim como hoje são as fintechs”, contou José Rodolpho Bernardoni, presidente do fundo, em entrevista ao Estadão à época.

Infante, da Food to Save, concorda. Com a expectativa de a Terra ter 9 bilhões de pessoas circulando no planeta, a sociedade precisa enfrentar problemas crônicos, como fome e desperdício. “Não faltam alimentos. Precisamos lidar com novas formas de produção, distribuição e consumo. E quem vai puxar isso são as foodtechs.” / COLABOROU ANDRÉ JANKAVSKI

Por trás das vitrines com quitutes deliciosos, padarias e confeitarias enfrentam um problema: o desperdício de alimentos. Nos bastidores, quando esses estabelecimentos não conseguem vender todos os itens expostos, a solução encontrada é a doação de alimentos ou, na maior parte das vezes, o descarte - mesmo que estejam perfeitos para o consumo. 

Para amenizar o prejuízo recorrente dos estabelecimentos, startups da área de alimentos (batizadas de “foodtechs” no jargão do setor) começam a ganhar força por meio de um modelo que consegue aproveitar os alimentos antes que eles engordem os lixões do País. No Brasil, as pioneiras são a Food to Save e a Refood, nascidas na pandemia e concorrentes diretas no mercado da cidade de São Paulo.

Ambas têm aplicativos por onde os consumidores encontram padarias, confeitarias e outros estabelecimentos do tipo, fazem as compras e recebem uma cesta em casa - bolos, pães e doces costumam fazer parte do cardápio. A plataforma se encarrega de processar o pagamento e cuidar da entrega, embutindo no preço uma taxa de serviço a cada operação. 

Ao comercializar alimentos que seriam descartados pelos estabelecimentos, as startups afirmam que conseguem revender os produtos por preços até XX% mais baratos ao que seria pago na vitrine da loja — algo bastante “apetitoso” em tempos de inflação na cesta de alimentos. 

Além disso, tanto a Food to Save quanto a Refood apostam no formato de “sacola surpresa”: até a chegada da encomenda em casa, o consumidor não sabe o que virá no pacote. No ato da compra, constam informações vagas, como “doces”, “salgados” e “mistos”, por exemplo. Quem escolhe o que irá para cada cliente é o estabelecimento, que não consegue prever o que seria descartado no fim do dia.

Murilo Ambrogi, Lucas Infante e Fernando Henrique dos Reis fundaram a Food to Save em 2021 Foto: Jefferson de Souza/Food to Save

“Esse não é um modelo criado por nós”, explica ao Estadão o fundador da Food to Save, Lucas Infante. No mundo, o modelo foi criado pela dinamarquesa Too Good to Go, inspiração para as duas startups brasileiras e cujas vendas superam 120 milhões de refeições que iriam para o lixo. “É um formato provocativo, curioso e que traz uma redução de custos para o cliente”, completa o executivo.

Similar ao “boom” da dinamarquesa (que dominou o mercado europeu e hoje aposta nos Estados Unidos e Canadá, ainda sem planos para o Brasil), a Food to Save vem notando a popularização da “sacola surpresa” pelo Brasil. A startup vendeu 125 mil sacolas desde a fundação, em abril de 2021, e registrou especial aceleração do negócio em 2022.

Recentemente, a startup, que atuava na Grande São Paulo, levantou R$ 1,3 milhão em crowdfunding e abriu operação no Rio. Para este ano, a meta é atingir 370 mil vendas, o que, nos cálculos da empresa, pouparia cerca de 500 toneladas de alimentos que seriam jogados no lixo. Atualmente, franquias da B.Lem, Manai, Carole Crema e Dengo estão entre os estabelecimentos parceiros em São Paulo.

Já a Refood, criada em dezembro de 2020, não revela o número de sacolas entregues, mas afirma que 80 mil consumidores já usaram a plataforma. O negócio da startup vem apostando em uma inserção de bairro em bairro no mercado paulistano. Hoje, são quatro regiões atendidas na capital paulista, com expectativa de chegar a toda a cidade até o fim do ano.

Ainda, a startup conversa com possíveis embaixadores para a marca, como chefs de cozinha — e algumas grandes empresas de alimentos se mostram interessadas em participar da plataforma, como Unilever, Nestlé, Carrefour, Pão de Açúcar e Ambev. “Queremos realizar uma criação de valor dentro da plataforma para apoiar a massificação do movimento contra o desperdício de alimentos”, diz Luciano Touguinha, um dos fundadores da Refood.

Luciano Touguinha é o fundador da Refood, que combate o desperdício de alimentos com sacolas surpresa Foto: Felipe Rau/Estadão - 17/3/2022

Desperdício e oportunidade

Simone Galante, especialista em serviços alimentícios da consultoria Galunium, explica que o desperdício nas vitrines é um problema crônico dos estabelecimentos. Além de fatores imprevisíveis atuarem para segurar a demanda (chuva pode afastar consumidores da rua, por exemplo), há produtos que perdem valor de venda com o tempo ou, ainda, casos em que o próprio estabelecimento “decreta” a morte desses itens.

“Todo mundo quer uma vitrine cheia, e a beleza desse estabelecimento está associada a ter muitos produtos expostos, mesmo que não vão ser consumidos”, explica Simone, que incentiva técnicas de vitrine que não prejudiquem o tempo de vida de um produto.

Nos cálculos da consultoria, cerca de 5% do que é exposto nas vitrines chega a ser descartado diariamente. “Por isso, esse é um mercado muito grande de atuação para essas startups. É uma oportunidade recorrente”, aponta a especialista. Simone acrescenta, porém, que tecnologias que estendam a vida desses produtos em exposição nas lojas podem ser um entrave para essas companhias no médio prazo.

Em toda a cadeia de alimentos, que vai da colheita à entrega ao consumidor, o desperdício é de 17%, segundo dados de um relatório desenvolvido pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente junto com a organização de resíduos WRAP. No Brasil, o descarte médio é de 60 quilos por pessoa em todos os anos.

“Todo mundo concorda que precisamos reduzir o desperdício, mas, na hora em que vamos para ação, como fazer isso?”, questiona Simone.

‘Foodtechs’ em pauta

Até a pandemia de covid-19, o assunto da alimentação era secundário no ecossistema de inovação, que preferia focar esforços e capital nas áreas de finanças, mobilidade, imóveis e logística – setores onde há o maior número de unicórnios no Brasil, as raras startups avaliadas em mais de US$ 1 bilhão.

Nos últimos meses, porém, aportes nas foodtechs vêm pipocando com mais frequência. Neste ano, as startups Diferente (de entrega de alimentos “feios” que seriam descartados nas gôndolas do mercado), Floki (de digitalização de bares e restaurantes) e Raízs (de entregas de alimentos orgânicos) foram algumas das agraciadas com cheques para escalar seus negócios pelo Brasil.

Outro fator que esquenta o segmento é o olhar direcionado de fundos de investimento para o tema. De olho em algumas dessas companhias, a gestora Outcast Ventures apontou em março passado que há 350 startups brasileiras na área de alimentos e acredita haver potencial para esse número crescer muito mais nos próximos anos: “As ‘foodtechs’ são a próxima onda gigante de startups, assim como hoje são as fintechs”, contou José Rodolpho Bernardoni, presidente do fundo, em entrevista ao Estadão à época.

Infante, da Food to Save, concorda. Com a expectativa de a Terra ter 9 bilhões de pessoas circulando no planeta, a sociedade precisa enfrentar problemas crônicos, como fome e desperdício. “Não faltam alimentos. Precisamos lidar com novas formas de produção, distribuição e consumo. E quem vai puxar isso são as foodtechs.” / COLABOROU ANDRÉ JANKAVSKI

Por trás das vitrines com quitutes deliciosos, padarias e confeitarias enfrentam um problema: o desperdício de alimentos. Nos bastidores, quando esses estabelecimentos não conseguem vender todos os itens expostos, a solução encontrada é a doação de alimentos ou, na maior parte das vezes, o descarte - mesmo que estejam perfeitos para o consumo. 

Para amenizar o prejuízo recorrente dos estabelecimentos, startups da área de alimentos (batizadas de “foodtechs” no jargão do setor) começam a ganhar força por meio de um modelo que consegue aproveitar os alimentos antes que eles engordem os lixões do País. No Brasil, as pioneiras são a Food to Save e a Refood, nascidas na pandemia e concorrentes diretas no mercado da cidade de São Paulo.

Ambas têm aplicativos por onde os consumidores encontram padarias, confeitarias e outros estabelecimentos do tipo, fazem as compras e recebem uma cesta em casa - bolos, pães e doces costumam fazer parte do cardápio. A plataforma se encarrega de processar o pagamento e cuidar da entrega, embutindo no preço uma taxa de serviço a cada operação. 

Ao comercializar alimentos que seriam descartados pelos estabelecimentos, as startups afirmam que conseguem revender os produtos por preços até XX% mais baratos ao que seria pago na vitrine da loja — algo bastante “apetitoso” em tempos de inflação na cesta de alimentos. 

Além disso, tanto a Food to Save quanto a Refood apostam no formato de “sacola surpresa”: até a chegada da encomenda em casa, o consumidor não sabe o que virá no pacote. No ato da compra, constam informações vagas, como “doces”, “salgados” e “mistos”, por exemplo. Quem escolhe o que irá para cada cliente é o estabelecimento, que não consegue prever o que seria descartado no fim do dia.

Murilo Ambrogi, Lucas Infante e Fernando Henrique dos Reis fundaram a Food to Save em 2021 Foto: Jefferson de Souza/Food to Save

“Esse não é um modelo criado por nós”, explica ao Estadão o fundador da Food to Save, Lucas Infante. No mundo, o modelo foi criado pela dinamarquesa Too Good to Go, inspiração para as duas startups brasileiras e cujas vendas superam 120 milhões de refeições que iriam para o lixo. “É um formato provocativo, curioso e que traz uma redução de custos para o cliente”, completa o executivo.

Similar ao “boom” da dinamarquesa (que dominou o mercado europeu e hoje aposta nos Estados Unidos e Canadá, ainda sem planos para o Brasil), a Food to Save vem notando a popularização da “sacola surpresa” pelo Brasil. A startup vendeu 125 mil sacolas desde a fundação, em abril de 2021, e registrou especial aceleração do negócio em 2022.

Recentemente, a startup, que atuava na Grande São Paulo, levantou R$ 1,3 milhão em crowdfunding e abriu operação no Rio. Para este ano, a meta é atingir 370 mil vendas, o que, nos cálculos da empresa, pouparia cerca de 500 toneladas de alimentos que seriam jogados no lixo. Atualmente, franquias da B.Lem, Manai, Carole Crema e Dengo estão entre os estabelecimentos parceiros em São Paulo.

Já a Refood, criada em dezembro de 2020, não revela o número de sacolas entregues, mas afirma que 80 mil consumidores já usaram a plataforma. O negócio da startup vem apostando em uma inserção de bairro em bairro no mercado paulistano. Hoje, são quatro regiões atendidas na capital paulista, com expectativa de chegar a toda a cidade até o fim do ano.

Ainda, a startup conversa com possíveis embaixadores para a marca, como chefs de cozinha — e algumas grandes empresas de alimentos se mostram interessadas em participar da plataforma, como Unilever, Nestlé, Carrefour, Pão de Açúcar e Ambev. “Queremos realizar uma criação de valor dentro da plataforma para apoiar a massificação do movimento contra o desperdício de alimentos”, diz Luciano Touguinha, um dos fundadores da Refood.

Luciano Touguinha é o fundador da Refood, que combate o desperdício de alimentos com sacolas surpresa Foto: Felipe Rau/Estadão - 17/3/2022

Desperdício e oportunidade

Simone Galante, especialista em serviços alimentícios da consultoria Galunium, explica que o desperdício nas vitrines é um problema crônico dos estabelecimentos. Além de fatores imprevisíveis atuarem para segurar a demanda (chuva pode afastar consumidores da rua, por exemplo), há produtos que perdem valor de venda com o tempo ou, ainda, casos em que o próprio estabelecimento “decreta” a morte desses itens.

“Todo mundo quer uma vitrine cheia, e a beleza desse estabelecimento está associada a ter muitos produtos expostos, mesmo que não vão ser consumidos”, explica Simone, que incentiva técnicas de vitrine que não prejudiquem o tempo de vida de um produto.

Nos cálculos da consultoria, cerca de 5% do que é exposto nas vitrines chega a ser descartado diariamente. “Por isso, esse é um mercado muito grande de atuação para essas startups. É uma oportunidade recorrente”, aponta a especialista. Simone acrescenta, porém, que tecnologias que estendam a vida desses produtos em exposição nas lojas podem ser um entrave para essas companhias no médio prazo.

Em toda a cadeia de alimentos, que vai da colheita à entrega ao consumidor, o desperdício é de 17%, segundo dados de um relatório desenvolvido pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente junto com a organização de resíduos WRAP. No Brasil, o descarte médio é de 60 quilos por pessoa em todos os anos.

“Todo mundo concorda que precisamos reduzir o desperdício, mas, na hora em que vamos para ação, como fazer isso?”, questiona Simone.

‘Foodtechs’ em pauta

Até a pandemia de covid-19, o assunto da alimentação era secundário no ecossistema de inovação, que preferia focar esforços e capital nas áreas de finanças, mobilidade, imóveis e logística – setores onde há o maior número de unicórnios no Brasil, as raras startups avaliadas em mais de US$ 1 bilhão.

Nos últimos meses, porém, aportes nas foodtechs vêm pipocando com mais frequência. Neste ano, as startups Diferente (de entrega de alimentos “feios” que seriam descartados nas gôndolas do mercado), Floki (de digitalização de bares e restaurantes) e Raízs (de entregas de alimentos orgânicos) foram algumas das agraciadas com cheques para escalar seus negócios pelo Brasil.

Outro fator que esquenta o segmento é o olhar direcionado de fundos de investimento para o tema. De olho em algumas dessas companhias, a gestora Outcast Ventures apontou em março passado que há 350 startups brasileiras na área de alimentos e acredita haver potencial para esse número crescer muito mais nos próximos anos: “As ‘foodtechs’ são a próxima onda gigante de startups, assim como hoje são as fintechs”, contou José Rodolpho Bernardoni, presidente do fundo, em entrevista ao Estadão à época.

Infante, da Food to Save, concorda. Com a expectativa de a Terra ter 9 bilhões de pessoas circulando no planeta, a sociedade precisa enfrentar problemas crônicos, como fome e desperdício. “Não faltam alimentos. Precisamos lidar com novas formas de produção, distribuição e consumo. E quem vai puxar isso são as foodtechs.” / COLABOROU ANDRÉ JANKAVSKI

Por trás das vitrines com quitutes deliciosos, padarias e confeitarias enfrentam um problema: o desperdício de alimentos. Nos bastidores, quando esses estabelecimentos não conseguem vender todos os itens expostos, a solução encontrada é a doação de alimentos ou, na maior parte das vezes, o descarte - mesmo que estejam perfeitos para o consumo. 

Para amenizar o prejuízo recorrente dos estabelecimentos, startups da área de alimentos (batizadas de “foodtechs” no jargão do setor) começam a ganhar força por meio de um modelo que consegue aproveitar os alimentos antes que eles engordem os lixões do País. No Brasil, as pioneiras são a Food to Save e a Refood, nascidas na pandemia e concorrentes diretas no mercado da cidade de São Paulo.

Ambas têm aplicativos por onde os consumidores encontram padarias, confeitarias e outros estabelecimentos do tipo, fazem as compras e recebem uma cesta em casa - bolos, pães e doces costumam fazer parte do cardápio. A plataforma se encarrega de processar o pagamento e cuidar da entrega, embutindo no preço uma taxa de serviço a cada operação. 

Ao comercializar alimentos que seriam descartados pelos estabelecimentos, as startups afirmam que conseguem revender os produtos por preços até XX% mais baratos ao que seria pago na vitrine da loja — algo bastante “apetitoso” em tempos de inflação na cesta de alimentos. 

Além disso, tanto a Food to Save quanto a Refood apostam no formato de “sacola surpresa”: até a chegada da encomenda em casa, o consumidor não sabe o que virá no pacote. No ato da compra, constam informações vagas, como “doces”, “salgados” e “mistos”, por exemplo. Quem escolhe o que irá para cada cliente é o estabelecimento, que não consegue prever o que seria descartado no fim do dia.

Murilo Ambrogi, Lucas Infante e Fernando Henrique dos Reis fundaram a Food to Save em 2021 Foto: Jefferson de Souza/Food to Save

“Esse não é um modelo criado por nós”, explica ao Estadão o fundador da Food to Save, Lucas Infante. No mundo, o modelo foi criado pela dinamarquesa Too Good to Go, inspiração para as duas startups brasileiras e cujas vendas superam 120 milhões de refeições que iriam para o lixo. “É um formato provocativo, curioso e que traz uma redução de custos para o cliente”, completa o executivo.

Similar ao “boom” da dinamarquesa (que dominou o mercado europeu e hoje aposta nos Estados Unidos e Canadá, ainda sem planos para o Brasil), a Food to Save vem notando a popularização da “sacola surpresa” pelo Brasil. A startup vendeu 125 mil sacolas desde a fundação, em abril de 2021, e registrou especial aceleração do negócio em 2022.

Recentemente, a startup, que atuava na Grande São Paulo, levantou R$ 1,3 milhão em crowdfunding e abriu operação no Rio. Para este ano, a meta é atingir 370 mil vendas, o que, nos cálculos da empresa, pouparia cerca de 500 toneladas de alimentos que seriam jogados no lixo. Atualmente, franquias da B.Lem, Manai, Carole Crema e Dengo estão entre os estabelecimentos parceiros em São Paulo.

Já a Refood, criada em dezembro de 2020, não revela o número de sacolas entregues, mas afirma que 80 mil consumidores já usaram a plataforma. O negócio da startup vem apostando em uma inserção de bairro em bairro no mercado paulistano. Hoje, são quatro regiões atendidas na capital paulista, com expectativa de chegar a toda a cidade até o fim do ano.

Ainda, a startup conversa com possíveis embaixadores para a marca, como chefs de cozinha — e algumas grandes empresas de alimentos se mostram interessadas em participar da plataforma, como Unilever, Nestlé, Carrefour, Pão de Açúcar e Ambev. “Queremos realizar uma criação de valor dentro da plataforma para apoiar a massificação do movimento contra o desperdício de alimentos”, diz Luciano Touguinha, um dos fundadores da Refood.

Luciano Touguinha é o fundador da Refood, que combate o desperdício de alimentos com sacolas surpresa Foto: Felipe Rau/Estadão - 17/3/2022

Desperdício e oportunidade

Simone Galante, especialista em serviços alimentícios da consultoria Galunium, explica que o desperdício nas vitrines é um problema crônico dos estabelecimentos. Além de fatores imprevisíveis atuarem para segurar a demanda (chuva pode afastar consumidores da rua, por exemplo), há produtos que perdem valor de venda com o tempo ou, ainda, casos em que o próprio estabelecimento “decreta” a morte desses itens.

“Todo mundo quer uma vitrine cheia, e a beleza desse estabelecimento está associada a ter muitos produtos expostos, mesmo que não vão ser consumidos”, explica Simone, que incentiva técnicas de vitrine que não prejudiquem o tempo de vida de um produto.

Nos cálculos da consultoria, cerca de 5% do que é exposto nas vitrines chega a ser descartado diariamente. “Por isso, esse é um mercado muito grande de atuação para essas startups. É uma oportunidade recorrente”, aponta a especialista. Simone acrescenta, porém, que tecnologias que estendam a vida desses produtos em exposição nas lojas podem ser um entrave para essas companhias no médio prazo.

Em toda a cadeia de alimentos, que vai da colheita à entrega ao consumidor, o desperdício é de 17%, segundo dados de um relatório desenvolvido pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente junto com a organização de resíduos WRAP. No Brasil, o descarte médio é de 60 quilos por pessoa em todos os anos.

“Todo mundo concorda que precisamos reduzir o desperdício, mas, na hora em que vamos para ação, como fazer isso?”, questiona Simone.

‘Foodtechs’ em pauta

Até a pandemia de covid-19, o assunto da alimentação era secundário no ecossistema de inovação, que preferia focar esforços e capital nas áreas de finanças, mobilidade, imóveis e logística – setores onde há o maior número de unicórnios no Brasil, as raras startups avaliadas em mais de US$ 1 bilhão.

Nos últimos meses, porém, aportes nas foodtechs vêm pipocando com mais frequência. Neste ano, as startups Diferente (de entrega de alimentos “feios” que seriam descartados nas gôndolas do mercado), Floki (de digitalização de bares e restaurantes) e Raízs (de entregas de alimentos orgânicos) foram algumas das agraciadas com cheques para escalar seus negócios pelo Brasil.

Outro fator que esquenta o segmento é o olhar direcionado de fundos de investimento para o tema. De olho em algumas dessas companhias, a gestora Outcast Ventures apontou em março passado que há 350 startups brasileiras na área de alimentos e acredita haver potencial para esse número crescer muito mais nos próximos anos: “As ‘foodtechs’ são a próxima onda gigante de startups, assim como hoje são as fintechs”, contou José Rodolpho Bernardoni, presidente do fundo, em entrevista ao Estadão à época.

Infante, da Food to Save, concorda. Com a expectativa de a Terra ter 9 bilhões de pessoas circulando no planeta, a sociedade precisa enfrentar problemas crônicos, como fome e desperdício. “Não faltam alimentos. Precisamos lidar com novas formas de produção, distribuição e consumo. E quem vai puxar isso são as foodtechs.” / COLABOROU ANDRÉ JANKAVSKI

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