iFood se inspira no ChatGPT para mudar o jeito de pedir delivery de comida


Tentando liderar o avanço da IA no Brasil, gigante passa a incluir sistemas da OpenAI em seu aplicativo, tornando possível falar com o sistema de forma natural

Por Bruno Romani
Atualização:

Em apenas oito meses, o ChatGPT se consolidou como a principal novidade do mundo digital. No entanto, o chatbot inteligente da OpenAI está longe de ser uma brincadeira passageira e começa a inspirar um dos gigantes nacionais da tecnologia a se tornar uma “usina” de inteligência artificial (IA).

Nos últimos meses, o iFood passou a experimentar com IA gerativa, a classe de sistemas popularizada pelo ChatGPT, e os resultados começam a ficar visíveis para os clientes a partir desta quinta, 29, com mudanças importantes no app de delivery. Ao Estadão, Flávio Stecca, vice-presidente de tecnologia da empresa, mostrou o que vem por aí.

O primeiro dos novos recursos vai permitir ao cliente fazer pedidos de compras, tanto de restaurantes quanto de mercados, usando linguagem natural. Ou seja, você poderá falar para o app do mesmo jeito que faria com um atendente humano: “Quero cinco Big Macs, dois sem picles, todos com batata frita e quatro Cocas e um Guaraná. Duas Cocas são sem gelo”. A IA vai converter o áudio em texto, que será trabalhado no sistema da OpenAI que dá acesso ao “cérebro” do ChatGPT. O app então vai exibir o pedido estruturado, já pronto para confirmação de compra. Não será mais necessário navegar pela interface do app.

continua após a publicidade

A IA poderá ir além e fazer sugestões de pedidos. Será possível falar, “Quero um bife a parmegiana mais barato e próximo de mim”. O app então exibirá opções com as características pedidas. Nos pedidos de mercado, ele mais mudanças. Você poderá falar “quero ingredientes para um bolo de cenoura”. A IA vai sugerir os ingredientes, estruturar o pedido no app e mostrar onde é mais barato realizar a compra.

Flávio Stecca, vice-presidente de tecnologia do iFood, comanda um time com 2,2 mil funcionários  Foto: Werther Santana/Estadão

Também anunciada nesta quinta, outra solução do iFood que se abastece dos modelos da OpenAI é voltada para mercados, farmácias e petshops parceiros. Ele é um bot, turbinado pelo GPT, feito para ser integrado ao WhatsApp desses estabelecimentos. Batizado de Compr.A.I., ele permite que os clientes digitem também em linguagem natural seus pedidos, que são estruturados para a compra final.

continua após a publicidade

O projeto está sendo testado desde agosto do ano passado pelos Supermercados Nei Mar, de Bragança Paulista (SP), e foi acelerado em março deste ano, quando a OpenAI divulgou o GPT-4. Atualmente, são 70 parceiros testando a ferramenta e há uma fila de espera para interessados.

“Eu estou muito empolgado com a IA gerativa. Já faz uns três anos que temos muita expectativa sobre a tecnologia e o ChatGPT é um marco interessante”, diz Stecca. “Acho que estamos em um momento muito parecido com o lançamento do iPhone em 2007. A tecnologia vai evoluir e ganhar uma capacidade surreal”, diz.

Eu estou muito empolgado com a IA gerativa. Acho que estamos em um momento muito parecido com o lançamento do iPhone em 2007. A tecnologia vai evoluir e ganhar uma capacidade surreal

Flávio Stecca, vice-presidente de tecnologia do iFood

continua após a publicidade

Usina de inteligência artificial

Os novos recursos do app são o desfecho de uma preparação de cinco anos no iFood. Quando Stecca chegou na empresa em 2018, o time de tecnologia tinha apenas 120 funcionários - apenas 12 dedicados a dados. Hoje são 2,2 mil profissionais, divididos em 17 times de IA. Curiosidade: a companhia não tem um “setor de IA” por considerar que a tecnologia precisa estar espalhada em suas diversas áreas.

Já em 2018, a equipe de Stecca estreou seu primeiro algoritmo, então capaz detectar o risco de transações. Posteriormente, sistemas de IA tomaram conta do app. Eles são usados para logística, estimativa de tempo, recomendação de produtos, prospecção de negócios, processamento de pedidos, sugestão de ofertas e disponibilidade de ítems.

continua após a publicidade

“Se não fossem esses sistemas, o iFood teria que ter 200 mil funcionários para atender os pedidos nos horários de pico”, conta ele. Nesses momentos, a companhia processa 400 mil pedidos simultâneos com um quadro de 5 mil pessoas, número já atualizado depois das demissões realizadas em março deste ano.

Logística e recomendação de produtos são usos mais óbvios de IA - qualquer app que se preze opera com algum sistema do tipo. Chamam a atenção outros casos: um dos algoritmos de prospecção de negócios analisa imagens do Google Maps para tentar entender a densidade de tipos de restaurantes em uma determinada região. Se, por exemplo, o sistema entende que há restaurantes de comida japonesa na região que estão fora do app - e que exista demanda para aquele tipo de comida -, o time de campo procura os estabelecimentos para incorporá-los à plataforma.

Dessa forma, o iFood roda atualmente 124 modelos diferentes de IA em seu negócio, um número que deve continuar em expansão nos próximos anos. A companhia empresta modelos de IA que vão além da OpenAI, e usa IAs de Amazon, Google e Anthropic - 20% dos cientistas de dados da companhia também realizam pesquisa básica, procurando artigos e soluções no meio acadêmico.

continua após a publicidade
Bot do Supermercado Nei Mar, que usa o GPT como "cérebro" e é oferecido pelo iFood para estabelecimentos parceiros  Foto: WhatsApp/Reprodução

Nova era da inteligência artificial

Por meio do Prosus, grupo holandês controlador do iFood, Stecca e seu time tiveram contato com IA gerativa antes mesmo do ChatGPT ser tornado público, em novembro do ano passado. “Eles têm um grupo de tecnologia avançada e por ali tivemos acesso aos sistemas da OpenAI”, conta ele.

continua após a publicidade

A partir da descoberta, o iFood desenvolveu o seu próprio “ChatGPT” interno. Batizado de “PlusOne”, o bot opera dentro do Slack da empresa e passou a auxiliar os funcionários de setores diversos do negócio.

Em um dos casos, um funcionário pediu para o bot classificar e organizar comentários de clientes feitos no app - a informação pode ser usada posteriormente para entender os níveis de satisfação dos usuários.

Em outro caso, uma funcionária responsável por organizar as inscrições de entregadores em um programa educacional pediu para o bot extrair os números de CPF de fotos que apareciam nas fichas de cadastro e organizá-los de forma estruturada. O PlusOne trabalhou em conjunto com uma IA de detecção de imagens e fez o trabalho em pouco tempo.

Com receita de R$ 7,1 bilhões em seu último ano fiscal, o Food não sabe dizer quanto a IA gerativa pode acrescentar ao montante. É uma conta difícil de fazer, pois os sistemas podem trazer não apenas ganhos nos negócios diretos, como também melhorias importantes em eficiência. A consultoria McKinsey estima que a IA gerativa pode acrescentar anualmente US$ 4,4 trilhões à economia global.

Stecca teve contato com a IA gerativa antes mesmo do ChatGPT ter se tornado público Foto: Werther Santana/Estadão

Assim, a companhia passou a estimular funcionários a testarem a tecnologia. Em abril deste ano, foi realizado um hackathon interno para estimular a familiarização com IAs gerativas. O saldo foi alto: 932 funcionários participantes e 108 ideias de projetos para uso da tecnologia. Entre elas estão digitalização e otimização na criação de cardápios, criação de cardápio com upload de foto, conversão de imagem em lista de compras e chatbot para recomendação de pedidos.

“É possível imaginar também usar a tecnologia para criar uma espécie de assistente para os atendentes, que precisam intervir em casos mais complicados, como a arbitragem entre as partes de um pedido que não foi entregue”, diz Stecca.

Ele acredita que os sistemas de IA gerativa não irão substituir completamente o time de atendentes, mas a preocupação para os profissionais é grande. Segundo o Goldman Sachs, 300 milhões de postos de trabalho podem ser afetados pela IA gerativa. A tendência é que não apenas o assistente de atendente, como bots de conversa, reduzam quadros humanos.

Futuro próximo

Por enquanto, Stecca precisa contornar problemas que parecem mais simples. O novo recurso de voz no app do iFood não chegará para todos os usuários de uma só vez. O lançamento gradual tem explicação: a OpenAI cobra caro pelo acesso ao cérebro do ChatGPT - com 40 milhões de usuários, o iFood poderia ter que encarar uma conta muito alta.

Não é apenas uma estratégia financeira, como também uma forma de garantir que a plataforma continue funcionando sem engasgos. A própria OpenAI limita o acesso ao GPT-4 por meio de cobrança de assinatura - o GPT-3, de acesso gratuito, costumava travar em momentos de pico.

Outro desafio é melhorar o funcionamento dos novos lançamentos. A reportagem testou o Compr.A.I. do supermercado Nei Mar e nem sempre o bot foi capaz de responder o que era pedido - ainda que a maneira dele produzir respostas seja idêntica à do ChatGPT. No entanto, diante das mudanças propostas, o executivo parece não se assustar,

“Não estou super preocupado porque isso vai se resolver. Daqui cinco anos, provavelmente veremos muitas mudanças, no nível que foi a transição web versus iPhone”, diz.

Em apenas oito meses, o ChatGPT se consolidou como a principal novidade do mundo digital. No entanto, o chatbot inteligente da OpenAI está longe de ser uma brincadeira passageira e começa a inspirar um dos gigantes nacionais da tecnologia a se tornar uma “usina” de inteligência artificial (IA).

Nos últimos meses, o iFood passou a experimentar com IA gerativa, a classe de sistemas popularizada pelo ChatGPT, e os resultados começam a ficar visíveis para os clientes a partir desta quinta, 29, com mudanças importantes no app de delivery. Ao Estadão, Flávio Stecca, vice-presidente de tecnologia da empresa, mostrou o que vem por aí.

O primeiro dos novos recursos vai permitir ao cliente fazer pedidos de compras, tanto de restaurantes quanto de mercados, usando linguagem natural. Ou seja, você poderá falar para o app do mesmo jeito que faria com um atendente humano: “Quero cinco Big Macs, dois sem picles, todos com batata frita e quatro Cocas e um Guaraná. Duas Cocas são sem gelo”. A IA vai converter o áudio em texto, que será trabalhado no sistema da OpenAI que dá acesso ao “cérebro” do ChatGPT. O app então vai exibir o pedido estruturado, já pronto para confirmação de compra. Não será mais necessário navegar pela interface do app.

A IA poderá ir além e fazer sugestões de pedidos. Será possível falar, “Quero um bife a parmegiana mais barato e próximo de mim”. O app então exibirá opções com as características pedidas. Nos pedidos de mercado, ele mais mudanças. Você poderá falar “quero ingredientes para um bolo de cenoura”. A IA vai sugerir os ingredientes, estruturar o pedido no app e mostrar onde é mais barato realizar a compra.

Flávio Stecca, vice-presidente de tecnologia do iFood, comanda um time com 2,2 mil funcionários  Foto: Werther Santana/Estadão

Também anunciada nesta quinta, outra solução do iFood que se abastece dos modelos da OpenAI é voltada para mercados, farmácias e petshops parceiros. Ele é um bot, turbinado pelo GPT, feito para ser integrado ao WhatsApp desses estabelecimentos. Batizado de Compr.A.I., ele permite que os clientes digitem também em linguagem natural seus pedidos, que são estruturados para a compra final.

O projeto está sendo testado desde agosto do ano passado pelos Supermercados Nei Mar, de Bragança Paulista (SP), e foi acelerado em março deste ano, quando a OpenAI divulgou o GPT-4. Atualmente, são 70 parceiros testando a ferramenta e há uma fila de espera para interessados.

“Eu estou muito empolgado com a IA gerativa. Já faz uns três anos que temos muita expectativa sobre a tecnologia e o ChatGPT é um marco interessante”, diz Stecca. “Acho que estamos em um momento muito parecido com o lançamento do iPhone em 2007. A tecnologia vai evoluir e ganhar uma capacidade surreal”, diz.

Eu estou muito empolgado com a IA gerativa. Acho que estamos em um momento muito parecido com o lançamento do iPhone em 2007. A tecnologia vai evoluir e ganhar uma capacidade surreal

Flávio Stecca, vice-presidente de tecnologia do iFood

Usina de inteligência artificial

Os novos recursos do app são o desfecho de uma preparação de cinco anos no iFood. Quando Stecca chegou na empresa em 2018, o time de tecnologia tinha apenas 120 funcionários - apenas 12 dedicados a dados. Hoje são 2,2 mil profissionais, divididos em 17 times de IA. Curiosidade: a companhia não tem um “setor de IA” por considerar que a tecnologia precisa estar espalhada em suas diversas áreas.

Já em 2018, a equipe de Stecca estreou seu primeiro algoritmo, então capaz detectar o risco de transações. Posteriormente, sistemas de IA tomaram conta do app. Eles são usados para logística, estimativa de tempo, recomendação de produtos, prospecção de negócios, processamento de pedidos, sugestão de ofertas e disponibilidade de ítems.

“Se não fossem esses sistemas, o iFood teria que ter 200 mil funcionários para atender os pedidos nos horários de pico”, conta ele. Nesses momentos, a companhia processa 400 mil pedidos simultâneos com um quadro de 5 mil pessoas, número já atualizado depois das demissões realizadas em março deste ano.

Logística e recomendação de produtos são usos mais óbvios de IA - qualquer app que se preze opera com algum sistema do tipo. Chamam a atenção outros casos: um dos algoritmos de prospecção de negócios analisa imagens do Google Maps para tentar entender a densidade de tipos de restaurantes em uma determinada região. Se, por exemplo, o sistema entende que há restaurantes de comida japonesa na região que estão fora do app - e que exista demanda para aquele tipo de comida -, o time de campo procura os estabelecimentos para incorporá-los à plataforma.

Dessa forma, o iFood roda atualmente 124 modelos diferentes de IA em seu negócio, um número que deve continuar em expansão nos próximos anos. A companhia empresta modelos de IA que vão além da OpenAI, e usa IAs de Amazon, Google e Anthropic - 20% dos cientistas de dados da companhia também realizam pesquisa básica, procurando artigos e soluções no meio acadêmico.

Bot do Supermercado Nei Mar, que usa o GPT como "cérebro" e é oferecido pelo iFood para estabelecimentos parceiros  Foto: WhatsApp/Reprodução

Nova era da inteligência artificial

Por meio do Prosus, grupo holandês controlador do iFood, Stecca e seu time tiveram contato com IA gerativa antes mesmo do ChatGPT ser tornado público, em novembro do ano passado. “Eles têm um grupo de tecnologia avançada e por ali tivemos acesso aos sistemas da OpenAI”, conta ele.

A partir da descoberta, o iFood desenvolveu o seu próprio “ChatGPT” interno. Batizado de “PlusOne”, o bot opera dentro do Slack da empresa e passou a auxiliar os funcionários de setores diversos do negócio.

Em um dos casos, um funcionário pediu para o bot classificar e organizar comentários de clientes feitos no app - a informação pode ser usada posteriormente para entender os níveis de satisfação dos usuários.

Em outro caso, uma funcionária responsável por organizar as inscrições de entregadores em um programa educacional pediu para o bot extrair os números de CPF de fotos que apareciam nas fichas de cadastro e organizá-los de forma estruturada. O PlusOne trabalhou em conjunto com uma IA de detecção de imagens e fez o trabalho em pouco tempo.

Com receita de R$ 7,1 bilhões em seu último ano fiscal, o Food não sabe dizer quanto a IA gerativa pode acrescentar ao montante. É uma conta difícil de fazer, pois os sistemas podem trazer não apenas ganhos nos negócios diretos, como também melhorias importantes em eficiência. A consultoria McKinsey estima que a IA gerativa pode acrescentar anualmente US$ 4,4 trilhões à economia global.

Stecca teve contato com a IA gerativa antes mesmo do ChatGPT ter se tornado público Foto: Werther Santana/Estadão

Assim, a companhia passou a estimular funcionários a testarem a tecnologia. Em abril deste ano, foi realizado um hackathon interno para estimular a familiarização com IAs gerativas. O saldo foi alto: 932 funcionários participantes e 108 ideias de projetos para uso da tecnologia. Entre elas estão digitalização e otimização na criação de cardápios, criação de cardápio com upload de foto, conversão de imagem em lista de compras e chatbot para recomendação de pedidos.

“É possível imaginar também usar a tecnologia para criar uma espécie de assistente para os atendentes, que precisam intervir em casos mais complicados, como a arbitragem entre as partes de um pedido que não foi entregue”, diz Stecca.

Ele acredita que os sistemas de IA gerativa não irão substituir completamente o time de atendentes, mas a preocupação para os profissionais é grande. Segundo o Goldman Sachs, 300 milhões de postos de trabalho podem ser afetados pela IA gerativa. A tendência é que não apenas o assistente de atendente, como bots de conversa, reduzam quadros humanos.

Futuro próximo

Por enquanto, Stecca precisa contornar problemas que parecem mais simples. O novo recurso de voz no app do iFood não chegará para todos os usuários de uma só vez. O lançamento gradual tem explicação: a OpenAI cobra caro pelo acesso ao cérebro do ChatGPT - com 40 milhões de usuários, o iFood poderia ter que encarar uma conta muito alta.

Não é apenas uma estratégia financeira, como também uma forma de garantir que a plataforma continue funcionando sem engasgos. A própria OpenAI limita o acesso ao GPT-4 por meio de cobrança de assinatura - o GPT-3, de acesso gratuito, costumava travar em momentos de pico.

Outro desafio é melhorar o funcionamento dos novos lançamentos. A reportagem testou o Compr.A.I. do supermercado Nei Mar e nem sempre o bot foi capaz de responder o que era pedido - ainda que a maneira dele produzir respostas seja idêntica à do ChatGPT. No entanto, diante das mudanças propostas, o executivo parece não se assustar,

“Não estou super preocupado porque isso vai se resolver. Daqui cinco anos, provavelmente veremos muitas mudanças, no nível que foi a transição web versus iPhone”, diz.

Em apenas oito meses, o ChatGPT se consolidou como a principal novidade do mundo digital. No entanto, o chatbot inteligente da OpenAI está longe de ser uma brincadeira passageira e começa a inspirar um dos gigantes nacionais da tecnologia a se tornar uma “usina” de inteligência artificial (IA).

Nos últimos meses, o iFood passou a experimentar com IA gerativa, a classe de sistemas popularizada pelo ChatGPT, e os resultados começam a ficar visíveis para os clientes a partir desta quinta, 29, com mudanças importantes no app de delivery. Ao Estadão, Flávio Stecca, vice-presidente de tecnologia da empresa, mostrou o que vem por aí.

O primeiro dos novos recursos vai permitir ao cliente fazer pedidos de compras, tanto de restaurantes quanto de mercados, usando linguagem natural. Ou seja, você poderá falar para o app do mesmo jeito que faria com um atendente humano: “Quero cinco Big Macs, dois sem picles, todos com batata frita e quatro Cocas e um Guaraná. Duas Cocas são sem gelo”. A IA vai converter o áudio em texto, que será trabalhado no sistema da OpenAI que dá acesso ao “cérebro” do ChatGPT. O app então vai exibir o pedido estruturado, já pronto para confirmação de compra. Não será mais necessário navegar pela interface do app.

A IA poderá ir além e fazer sugestões de pedidos. Será possível falar, “Quero um bife a parmegiana mais barato e próximo de mim”. O app então exibirá opções com as características pedidas. Nos pedidos de mercado, ele mais mudanças. Você poderá falar “quero ingredientes para um bolo de cenoura”. A IA vai sugerir os ingredientes, estruturar o pedido no app e mostrar onde é mais barato realizar a compra.

Flávio Stecca, vice-presidente de tecnologia do iFood, comanda um time com 2,2 mil funcionários  Foto: Werther Santana/Estadão

Também anunciada nesta quinta, outra solução do iFood que se abastece dos modelos da OpenAI é voltada para mercados, farmácias e petshops parceiros. Ele é um bot, turbinado pelo GPT, feito para ser integrado ao WhatsApp desses estabelecimentos. Batizado de Compr.A.I., ele permite que os clientes digitem também em linguagem natural seus pedidos, que são estruturados para a compra final.

O projeto está sendo testado desde agosto do ano passado pelos Supermercados Nei Mar, de Bragança Paulista (SP), e foi acelerado em março deste ano, quando a OpenAI divulgou o GPT-4. Atualmente, são 70 parceiros testando a ferramenta e há uma fila de espera para interessados.

“Eu estou muito empolgado com a IA gerativa. Já faz uns três anos que temos muita expectativa sobre a tecnologia e o ChatGPT é um marco interessante”, diz Stecca. “Acho que estamos em um momento muito parecido com o lançamento do iPhone em 2007. A tecnologia vai evoluir e ganhar uma capacidade surreal”, diz.

Eu estou muito empolgado com a IA gerativa. Acho que estamos em um momento muito parecido com o lançamento do iPhone em 2007. A tecnologia vai evoluir e ganhar uma capacidade surreal

Flávio Stecca, vice-presidente de tecnologia do iFood

Usina de inteligência artificial

Os novos recursos do app são o desfecho de uma preparação de cinco anos no iFood. Quando Stecca chegou na empresa em 2018, o time de tecnologia tinha apenas 120 funcionários - apenas 12 dedicados a dados. Hoje são 2,2 mil profissionais, divididos em 17 times de IA. Curiosidade: a companhia não tem um “setor de IA” por considerar que a tecnologia precisa estar espalhada em suas diversas áreas.

Já em 2018, a equipe de Stecca estreou seu primeiro algoritmo, então capaz detectar o risco de transações. Posteriormente, sistemas de IA tomaram conta do app. Eles são usados para logística, estimativa de tempo, recomendação de produtos, prospecção de negócios, processamento de pedidos, sugestão de ofertas e disponibilidade de ítems.

“Se não fossem esses sistemas, o iFood teria que ter 200 mil funcionários para atender os pedidos nos horários de pico”, conta ele. Nesses momentos, a companhia processa 400 mil pedidos simultâneos com um quadro de 5 mil pessoas, número já atualizado depois das demissões realizadas em março deste ano.

Logística e recomendação de produtos são usos mais óbvios de IA - qualquer app que se preze opera com algum sistema do tipo. Chamam a atenção outros casos: um dos algoritmos de prospecção de negócios analisa imagens do Google Maps para tentar entender a densidade de tipos de restaurantes em uma determinada região. Se, por exemplo, o sistema entende que há restaurantes de comida japonesa na região que estão fora do app - e que exista demanda para aquele tipo de comida -, o time de campo procura os estabelecimentos para incorporá-los à plataforma.

Dessa forma, o iFood roda atualmente 124 modelos diferentes de IA em seu negócio, um número que deve continuar em expansão nos próximos anos. A companhia empresta modelos de IA que vão além da OpenAI, e usa IAs de Amazon, Google e Anthropic - 20% dos cientistas de dados da companhia também realizam pesquisa básica, procurando artigos e soluções no meio acadêmico.

Bot do Supermercado Nei Mar, que usa o GPT como "cérebro" e é oferecido pelo iFood para estabelecimentos parceiros  Foto: WhatsApp/Reprodução

Nova era da inteligência artificial

Por meio do Prosus, grupo holandês controlador do iFood, Stecca e seu time tiveram contato com IA gerativa antes mesmo do ChatGPT ser tornado público, em novembro do ano passado. “Eles têm um grupo de tecnologia avançada e por ali tivemos acesso aos sistemas da OpenAI”, conta ele.

A partir da descoberta, o iFood desenvolveu o seu próprio “ChatGPT” interno. Batizado de “PlusOne”, o bot opera dentro do Slack da empresa e passou a auxiliar os funcionários de setores diversos do negócio.

Em um dos casos, um funcionário pediu para o bot classificar e organizar comentários de clientes feitos no app - a informação pode ser usada posteriormente para entender os níveis de satisfação dos usuários.

Em outro caso, uma funcionária responsável por organizar as inscrições de entregadores em um programa educacional pediu para o bot extrair os números de CPF de fotos que apareciam nas fichas de cadastro e organizá-los de forma estruturada. O PlusOne trabalhou em conjunto com uma IA de detecção de imagens e fez o trabalho em pouco tempo.

Com receita de R$ 7,1 bilhões em seu último ano fiscal, o Food não sabe dizer quanto a IA gerativa pode acrescentar ao montante. É uma conta difícil de fazer, pois os sistemas podem trazer não apenas ganhos nos negócios diretos, como também melhorias importantes em eficiência. A consultoria McKinsey estima que a IA gerativa pode acrescentar anualmente US$ 4,4 trilhões à economia global.

Stecca teve contato com a IA gerativa antes mesmo do ChatGPT ter se tornado público Foto: Werther Santana/Estadão

Assim, a companhia passou a estimular funcionários a testarem a tecnologia. Em abril deste ano, foi realizado um hackathon interno para estimular a familiarização com IAs gerativas. O saldo foi alto: 932 funcionários participantes e 108 ideias de projetos para uso da tecnologia. Entre elas estão digitalização e otimização na criação de cardápios, criação de cardápio com upload de foto, conversão de imagem em lista de compras e chatbot para recomendação de pedidos.

“É possível imaginar também usar a tecnologia para criar uma espécie de assistente para os atendentes, que precisam intervir em casos mais complicados, como a arbitragem entre as partes de um pedido que não foi entregue”, diz Stecca.

Ele acredita que os sistemas de IA gerativa não irão substituir completamente o time de atendentes, mas a preocupação para os profissionais é grande. Segundo o Goldman Sachs, 300 milhões de postos de trabalho podem ser afetados pela IA gerativa. A tendência é que não apenas o assistente de atendente, como bots de conversa, reduzam quadros humanos.

Futuro próximo

Por enquanto, Stecca precisa contornar problemas que parecem mais simples. O novo recurso de voz no app do iFood não chegará para todos os usuários de uma só vez. O lançamento gradual tem explicação: a OpenAI cobra caro pelo acesso ao cérebro do ChatGPT - com 40 milhões de usuários, o iFood poderia ter que encarar uma conta muito alta.

Não é apenas uma estratégia financeira, como também uma forma de garantir que a plataforma continue funcionando sem engasgos. A própria OpenAI limita o acesso ao GPT-4 por meio de cobrança de assinatura - o GPT-3, de acesso gratuito, costumava travar em momentos de pico.

Outro desafio é melhorar o funcionamento dos novos lançamentos. A reportagem testou o Compr.A.I. do supermercado Nei Mar e nem sempre o bot foi capaz de responder o que era pedido - ainda que a maneira dele produzir respostas seja idêntica à do ChatGPT. No entanto, diante das mudanças propostas, o executivo parece não se assustar,

“Não estou super preocupado porque isso vai se resolver. Daqui cinco anos, provavelmente veremos muitas mudanças, no nível que foi a transição web versus iPhone”, diz.

Em apenas oito meses, o ChatGPT se consolidou como a principal novidade do mundo digital. No entanto, o chatbot inteligente da OpenAI está longe de ser uma brincadeira passageira e começa a inspirar um dos gigantes nacionais da tecnologia a se tornar uma “usina” de inteligência artificial (IA).

Nos últimos meses, o iFood passou a experimentar com IA gerativa, a classe de sistemas popularizada pelo ChatGPT, e os resultados começam a ficar visíveis para os clientes a partir desta quinta, 29, com mudanças importantes no app de delivery. Ao Estadão, Flávio Stecca, vice-presidente de tecnologia da empresa, mostrou o que vem por aí.

O primeiro dos novos recursos vai permitir ao cliente fazer pedidos de compras, tanto de restaurantes quanto de mercados, usando linguagem natural. Ou seja, você poderá falar para o app do mesmo jeito que faria com um atendente humano: “Quero cinco Big Macs, dois sem picles, todos com batata frita e quatro Cocas e um Guaraná. Duas Cocas são sem gelo”. A IA vai converter o áudio em texto, que será trabalhado no sistema da OpenAI que dá acesso ao “cérebro” do ChatGPT. O app então vai exibir o pedido estruturado, já pronto para confirmação de compra. Não será mais necessário navegar pela interface do app.

A IA poderá ir além e fazer sugestões de pedidos. Será possível falar, “Quero um bife a parmegiana mais barato e próximo de mim”. O app então exibirá opções com as características pedidas. Nos pedidos de mercado, ele mais mudanças. Você poderá falar “quero ingredientes para um bolo de cenoura”. A IA vai sugerir os ingredientes, estruturar o pedido no app e mostrar onde é mais barato realizar a compra.

Flávio Stecca, vice-presidente de tecnologia do iFood, comanda um time com 2,2 mil funcionários  Foto: Werther Santana/Estadão

Também anunciada nesta quinta, outra solução do iFood que se abastece dos modelos da OpenAI é voltada para mercados, farmácias e petshops parceiros. Ele é um bot, turbinado pelo GPT, feito para ser integrado ao WhatsApp desses estabelecimentos. Batizado de Compr.A.I., ele permite que os clientes digitem também em linguagem natural seus pedidos, que são estruturados para a compra final.

O projeto está sendo testado desde agosto do ano passado pelos Supermercados Nei Mar, de Bragança Paulista (SP), e foi acelerado em março deste ano, quando a OpenAI divulgou o GPT-4. Atualmente, são 70 parceiros testando a ferramenta e há uma fila de espera para interessados.

“Eu estou muito empolgado com a IA gerativa. Já faz uns três anos que temos muita expectativa sobre a tecnologia e o ChatGPT é um marco interessante”, diz Stecca. “Acho que estamos em um momento muito parecido com o lançamento do iPhone em 2007. A tecnologia vai evoluir e ganhar uma capacidade surreal”, diz.

Eu estou muito empolgado com a IA gerativa. Acho que estamos em um momento muito parecido com o lançamento do iPhone em 2007. A tecnologia vai evoluir e ganhar uma capacidade surreal

Flávio Stecca, vice-presidente de tecnologia do iFood

Usina de inteligência artificial

Os novos recursos do app são o desfecho de uma preparação de cinco anos no iFood. Quando Stecca chegou na empresa em 2018, o time de tecnologia tinha apenas 120 funcionários - apenas 12 dedicados a dados. Hoje são 2,2 mil profissionais, divididos em 17 times de IA. Curiosidade: a companhia não tem um “setor de IA” por considerar que a tecnologia precisa estar espalhada em suas diversas áreas.

Já em 2018, a equipe de Stecca estreou seu primeiro algoritmo, então capaz detectar o risco de transações. Posteriormente, sistemas de IA tomaram conta do app. Eles são usados para logística, estimativa de tempo, recomendação de produtos, prospecção de negócios, processamento de pedidos, sugestão de ofertas e disponibilidade de ítems.

“Se não fossem esses sistemas, o iFood teria que ter 200 mil funcionários para atender os pedidos nos horários de pico”, conta ele. Nesses momentos, a companhia processa 400 mil pedidos simultâneos com um quadro de 5 mil pessoas, número já atualizado depois das demissões realizadas em março deste ano.

Logística e recomendação de produtos são usos mais óbvios de IA - qualquer app que se preze opera com algum sistema do tipo. Chamam a atenção outros casos: um dos algoritmos de prospecção de negócios analisa imagens do Google Maps para tentar entender a densidade de tipos de restaurantes em uma determinada região. Se, por exemplo, o sistema entende que há restaurantes de comida japonesa na região que estão fora do app - e que exista demanda para aquele tipo de comida -, o time de campo procura os estabelecimentos para incorporá-los à plataforma.

Dessa forma, o iFood roda atualmente 124 modelos diferentes de IA em seu negócio, um número que deve continuar em expansão nos próximos anos. A companhia empresta modelos de IA que vão além da OpenAI, e usa IAs de Amazon, Google e Anthropic - 20% dos cientistas de dados da companhia também realizam pesquisa básica, procurando artigos e soluções no meio acadêmico.

Bot do Supermercado Nei Mar, que usa o GPT como "cérebro" e é oferecido pelo iFood para estabelecimentos parceiros  Foto: WhatsApp/Reprodução

Nova era da inteligência artificial

Por meio do Prosus, grupo holandês controlador do iFood, Stecca e seu time tiveram contato com IA gerativa antes mesmo do ChatGPT ser tornado público, em novembro do ano passado. “Eles têm um grupo de tecnologia avançada e por ali tivemos acesso aos sistemas da OpenAI”, conta ele.

A partir da descoberta, o iFood desenvolveu o seu próprio “ChatGPT” interno. Batizado de “PlusOne”, o bot opera dentro do Slack da empresa e passou a auxiliar os funcionários de setores diversos do negócio.

Em um dos casos, um funcionário pediu para o bot classificar e organizar comentários de clientes feitos no app - a informação pode ser usada posteriormente para entender os níveis de satisfação dos usuários.

Em outro caso, uma funcionária responsável por organizar as inscrições de entregadores em um programa educacional pediu para o bot extrair os números de CPF de fotos que apareciam nas fichas de cadastro e organizá-los de forma estruturada. O PlusOne trabalhou em conjunto com uma IA de detecção de imagens e fez o trabalho em pouco tempo.

Com receita de R$ 7,1 bilhões em seu último ano fiscal, o Food não sabe dizer quanto a IA gerativa pode acrescentar ao montante. É uma conta difícil de fazer, pois os sistemas podem trazer não apenas ganhos nos negócios diretos, como também melhorias importantes em eficiência. A consultoria McKinsey estima que a IA gerativa pode acrescentar anualmente US$ 4,4 trilhões à economia global.

Stecca teve contato com a IA gerativa antes mesmo do ChatGPT ter se tornado público Foto: Werther Santana/Estadão

Assim, a companhia passou a estimular funcionários a testarem a tecnologia. Em abril deste ano, foi realizado um hackathon interno para estimular a familiarização com IAs gerativas. O saldo foi alto: 932 funcionários participantes e 108 ideias de projetos para uso da tecnologia. Entre elas estão digitalização e otimização na criação de cardápios, criação de cardápio com upload de foto, conversão de imagem em lista de compras e chatbot para recomendação de pedidos.

“É possível imaginar também usar a tecnologia para criar uma espécie de assistente para os atendentes, que precisam intervir em casos mais complicados, como a arbitragem entre as partes de um pedido que não foi entregue”, diz Stecca.

Ele acredita que os sistemas de IA gerativa não irão substituir completamente o time de atendentes, mas a preocupação para os profissionais é grande. Segundo o Goldman Sachs, 300 milhões de postos de trabalho podem ser afetados pela IA gerativa. A tendência é que não apenas o assistente de atendente, como bots de conversa, reduzam quadros humanos.

Futuro próximo

Por enquanto, Stecca precisa contornar problemas que parecem mais simples. O novo recurso de voz no app do iFood não chegará para todos os usuários de uma só vez. O lançamento gradual tem explicação: a OpenAI cobra caro pelo acesso ao cérebro do ChatGPT - com 40 milhões de usuários, o iFood poderia ter que encarar uma conta muito alta.

Não é apenas uma estratégia financeira, como também uma forma de garantir que a plataforma continue funcionando sem engasgos. A própria OpenAI limita o acesso ao GPT-4 por meio de cobrança de assinatura - o GPT-3, de acesso gratuito, costumava travar em momentos de pico.

Outro desafio é melhorar o funcionamento dos novos lançamentos. A reportagem testou o Compr.A.I. do supermercado Nei Mar e nem sempre o bot foi capaz de responder o que era pedido - ainda que a maneira dele produzir respostas seja idêntica à do ChatGPT. No entanto, diante das mudanças propostas, o executivo parece não se assustar,

“Não estou super preocupado porque isso vai se resolver. Daqui cinco anos, provavelmente veremos muitas mudanças, no nível que foi a transição web versus iPhone”, diz.

Atualizamos nossa política de cookies

Ao utilizar nossos serviços, você aceita a política de monitoramento de cookies.