O goiano Rafael Stark nem precisa abrir a boca para dizer que é um nerd. O sobrenome “artístico”, que batiza também a sua startup, é claramente inspirado em Tony Stark, o alter ego do Homem de Ferro. O Stark Bank, porém, tem uma missão bem mais terrena do que salvar a humanidade de supervilões: oferecer um serviço bancário moderno e tecnológico para os “unicórnios” (startups avaliadas em US$ 1 bilhão) do País.
Para isso, o Stark brasileiro reuniu nomes que o Stark da Marvel adoraria ter por perto. A companhia anuncia nesta segunda, 11, que recebeu um cheque de US$ 45 milhões em rodada liderada pela Ribbit Capital, firma americana especializada em fintechs — também participaram SEA Capital, Lachy Groom e K5 Global.
Um outro nome na lista de investidores, porém, se destaca: Jeff Bezos, fundador da Amazon. O segundo homem mais rico do mundo participou da rodada por meio de sua empresa de investimentos pessoais, a Bezos Expeditions. É a primeira vez que o fundo participa de um aporte no Brasil — na América Latina, já havia investido na NotCo, unicórnio chileno de alimentos feitos à base de plantas.
“Perguntei ao pessoal da Expeditions se o aporte dava direito também a uma viagem espacial pela Blue Origin”, brinca Stark, em referência à empresa de exploração espacial de Bezos. Já em tom mais sério, ele explica ao Estadão porque a entrada do fundador da Amazon, e dos outros fundos, é importante. “Precisamos dos melhores sócios diante do desafio que temos: ser o banco principal das grandes empresas, incluindo unicórnios e nomes tradicionais em transformação digital”.
Nas palavras do executivo, fica no ar a sensação de que o Stark Bank quer ser uma espécie de “Nubank das grandes empresas”, uma instituição tecnológica que quer abalar o domínio dos “bancões”. Stark, porém, explica as diferenças: “Para pessoa física ou pequenos negócios, o cliente quer fazer tudo no app e ter uma experiência fluida. Em uma grande empresa, o cliente não quer ‘poucos cliques’. Ele quer controle e escalabilidade”.
O cartão corporativo, por exemplo, permite limites de gastos por moeda, país, estabelecimentos e frequência de operações — os recursos podem até ser vinculados a centros de custo.
Além do cartão, o banco oferece produtos como gestão de cobrança via boleto e Pix, fluxo customizado de aprovação de pagamentos e folha de pagamentos. Com o aporte, a companhia deve oferecer produtos financeiros, como investimentos e linhas de crédito.
“Conforme o ecossistema de startups cresce e empresas tradicionais passam por transformação digital, cresce a demanda por produtos financeiros e soluções personalizadas. Há uma oportunidade bacana para o Stark”, diz Bruno Diniz, especialista em inovação e sócio da Consultoria Spiralem.
“Embora nomes tradicionais, como Itaú BBA e BTG Digital, estejam de olho nesse segmento, as soluções não estão prontas. Para startups, que não têm uma infraestrutura pesada, é mais fácil se mover nessa direção”, diz ele.
X-Men
Os investidores também parecem enxergar as oportunidades. O novo aporte chega apenas quatro meses depois de um cheque de US$ 13 milhões, que teve participação de fundadores do Dropbox, do Rappi, da Wildlife e do Slack. “Nos últimos três meses, triplicamos a receita e o volume transacionado. Estávamos sendo assediados por vários fundos globais”, diz ele sobre os cheques na sequência. O objetivo neste ano é crescer dez vezes.
Entre os 300 clientes, o Stark reúne um time de estrelas, digno de filme dos Vingadores. Na lista estão unicórnios, candidatos a unicórnios e outros nomes promissores do ecossistema nacional: Quinto Andar, Loft, Daki, Buser, Isaac, Flash Benefícios e Pipo Saúde.
A ideia de enfileirar nomes importantes parece se aplicar também aos contratados da startup. O quadro atual de 30 pessoas deve chegar a 60 até o final do ano, mas Stark (o executivo) não embarca no discurso de expansão veloz de time, algo comum quando startups recebem aportes. Ele recorre aos quadrinhos novamente:
“O Stark Bank é tipo os X-Men: eu sou o Charles Xavier, que tenta localizar pessoas excepcionais. Um time com 200 ou mil pessoas não será composto apenas por pessoas excepcionais”, diz
Talvez o Stark nacional esteja buscando profissionais com histórias como as dele. Nascido em 1988 em Goiânia, começou a trabalhar aos 16 anos após a morte do pai (“a família de classe média virou ‘média baixa’”, diz ele). Aos 20, ele foi aprovado no Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), onde se formou em engenharia mecânica aeronáutica. Na reta final do curso, ele passou um ano na Califórnia, onde estudou em Stanford e na Universidade Politécnica Estadual da Califórnia.
Por lá, ele começou a programar, algo que seguiu fazendo na volta ao País até que, em 2018, fundou o Stark Bank, após realizar projetos com a Colgate. O CNPJ “S.A.” do Stark Bank é o mesmo que ele utilizava nos tempos de MEI.
Infraestrutura
Com o aporte, o Stark Bank vai criar também uma nova unidade de negócios, a Stark Infra. Ela vai fornecer infraestrutura para fintechs e instituições financeiras, como APIs para o Pix, emissão de cartão com a marca da empresa e emissão de CCBs (cédula de crédito bancário), o que permite bancarizar operações de crédito.
Segundo especialistas, é mais uma boa oportunidade para a empresa, considerando o momento de ebulição pelo qual o setor financeiro passa diante do trabalho de fintechs.
Com um horizonte aparentemente promissor, agora só falta Stark conhecer de perto Bezos. “Ainda não rolou, mas ele costuma realizar encontros com os fundadores das startups no portfólio”, diz ele, que encerra a conversa com uma frase que jamais sairia da boca do Stark fictício. “Eu valorizo muito o papel de mentores. Quero estar sempre perto dos melhores”.