A Daki, startup de entregas de mercado em até 15 minutos, juntou-se aos “unicórnios” (empresas de tecnologia de avaliação superior a US$ 1 bilhão) que realizaram demissões nos últimos meses. O movimento é resultado da crise que se instalou sobre o setor de inovação do País, cuja escassez de capital pressiona as startups por maior rentabilidade.
Concorrente de iFood e Rappi no setor de delivery, a companhia demitiu, pelo menos, 119 funcionários desde janeiro, como confirmou a startup ao Estadão nesta quinta-feira, 7. Ao todo, a Daki diz ter agora o mesmo número de funcionários do início de 2022: 800. A startup alega que os desligamentos fazem parte de um movimento de substituição e não de encolhimento de equipe.
Nos cortes, 16 pessoas foram demitidas na sexta-feira, 1.º, no que a companhia chamou de “movimento pontual de uma empresa com pouco tempo de vida”. “Temos ciclos naturais de avaliação duas vezes ao ano. Podem ter havido algumas demissões pontuais como forma de avaliação (desde janeiro). O importante é que a gente não fez uma reorganização ou reestruturação de operação”, afirma Rafael Vasto, fundador e CEO da Daki.
No entanto, ex-funcionários ouvidos pela reportagem afirmaram que a empresa justificou aos demitidos que os cortes se deram por questões financeiras e que as vagas foram fechadas. Além disso, ajustes na operação foram realizados nos últimos meses.
As áreas impactadas pelos cortes nos últimos meses, segundo apurou o Estadão, incluem quase todos os setores da companhia: finanças, produto, marketing, experiência do consumidor, recursos humanos e operações. Ainda, a Daki demitiu os “shoppers”, profissionais que operam nas darkstores (lojas ocultas do cliente, sem fachadas nem balcões e instaladas em pontos-chave nos bairros) e essenciais para o despacho dos pedidos ultrarrápidos.
Os ex-funcionários vão receber mais um mês de salário, ajuda na recolocação no mercado de trabalho e extensão de três meses do plano de saúde. Atualmente, a Daki oferece serviços de entregas de produtos de mercado em bairros selecionados de São Paulo, Campinas (SP), Rio de Janeiro, Niterói (RJ) e, recentemente, chegou a Belo Horizonte (MG).
No fim do ano passado, a startup afirmou ao Estadão que o plano era abrir operação em Minas Gerais e contar com 150 dark stores nos três Estados em que atua. No momento, a Daki tem 90 dark stores no Brasil.
Unicórnio mais veloz do Brasil
A Daki ocupa o posto de ter se tornado o unicórnio mais rápido do Brasil: fundada em fevereiro de 2021, a startup recebeu a avaliação de mercado de US$ 1,2 bilhão em dezembro do mesmo ano ao levantar rodada de US$ 260 milhões, com participação de grandes fundos do mercado de investimento, como Tiger Global, Kaszek e Monashees.
Na ocasião, a Daki se posicionava como a alternativa “verde” aos líderes do mercado de entregas, iFood e Rappi, ao reduzir uso de plástico nas entregas e investir em bicicletas (e não motos movidas a combustão) para os entregadores parceiros, que, assim como nas concorrentes, não têm vínculo empregatício com a startup.
Apesar disso, a startup tem utilizado motocicletas para fazer entregas. O transporte, segundo ex-funcionários, foi adotado para agilizar o tempo entre as lojas e os consumidores. Ao Estadão, a empresa disse que adotou as motos por segurança, em “regiões em que a geografia local tem muita inclinação, considerando o bem estar e a segurança dos entregadores parceiros”.
Além disso, a Daki aposta em dark stores, nas quais estabelecimentos funcionam como galpões com produtos para pronta retirada — depois que clientes realizam o pedido por aplicativo, entregadores dirigem-se aos galpões mais próximos e, em poucos minutos, fazem a entrega no domicílio.
‘Irmã’ sai dos Estados Unidos
O movimento de cortes no Brasil acontece após a “irmã” da Daki, a mexicana Jokr (ambas do mesmo grupo), anunciar a saída do mercado dos EUA para “focar na América Latina”, conforme comunicado do grupo. Nos EUA, foram demitidas 50 pessoas.
“Decidimos interromper por agora nossas atividades nos EUA, que corresponde a cerca de 5% do nosso negócio”, afirmou o CEO da Jokr, Ralf Wenzel, em nota de 16 de junho. “Dada a nossa posição única na América Latina, decidimos aumentar organicamente os investimentos na região para se tornar líderes no serviço de entrega de produtos pela América Latina.”
O setor de entregas, porém, enfrenta um reajuste em 2022, depois de ser impulsionado pela pandemia de covid-19. Diversos nomes do mercado reveem projeções com o fim do isolamento social, quando entregas de refeições e mercado na porta das pessoas eram mais comuns.
No exterior, nomes do setor como a americana Gopuff, a alemã Gorillas e a turca Getir reduziram equipes. No Brasil, o líder iFood também vem fazendo demissões para se reajustar ao novo período, disse a companhia ao Estadão.
Além disso, o novo cenário inflacionário global e de guerra da Ucrânia, que desorganiza as cadeias produtivas e pressiona ainda mais os preços, corrói o poder de compra do consumidor — afetando diretamente essas companhias de entregas de mercado.