Aparelhos da Apple formaram um consumidor mais atento ao design
Por Barão Di Sarno, sócio da agência de design estratégico Nó Design e professor do Instituto Europeu de Design de São Paulo
Apesar de não ser sua profissão, é possível afirmar que Steve Jobs é a pessoa mais importante para o design dos últimos trinta anos. Ao longo de sua trajetória, ele modificou definitivamente suas principais áreas de atuação.
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Foi através do lançamento do Macintosh, o primeiro computador de sucesso a utilizar a interface gráfica, o mundo passou a clicar em ícones para interagir com a máquina em vez de escrever linhas de comando. Essa inovação impactou profunda e definitivamente duas áreas.
A forma de lidar com a tipografia, a facilidade de manipular imagens e fazer composições transformou completamente a vida dos artistas gráficos.
Percorrendo a tela do computador com o mouse, as pessoas passaram a habitar um espaço virtual e o designer de interação se tornou o arquiteto desse mundo digital. Muito tempo depois, o lançamento do iPhone modificou novamente a forma de interação e popularizou o desenvolvimento de aplicativos móveis.
Os designers de animação e do cinema também devem muito a Jobs por causa da Pixar, estúdio que é referencia mundial em animação computadorizada, do qual ele foi um dos sócios. Jobs também exerceu grande influência no design de produtos, principalmente a partir do primeiro iMac, lançado no final da década de 1990.
Sob clara influencia dos designers funcionalistas alemães como Dieter Rams, Steve Jobs e um de seus braços-direitos, o chefe de design da Apple Jonathan Ive, criaram muitos objetos que se tornaram, além de sinônimo de qualidade, verdadeiros arquétipos em suas categorias.
Depois de anos sofrendo duvidosas mutações, deixando de ser telefones celulares para virarem smartphones, esses aparelhos finalmente ganharam uma resposta definitiva com a chegada do iPhone.
O lançamento do iPad como resposta à evidente demanda de um computador móvel conectado à rede evidenciou de imediato a fragilidade de concepção dos netbooks, uma espécie de laptop anão que teve sua morte precoce decretada desde então. Mas a grande colaboração de Jobs não foram as revoluções do design gráfico, do design de interação, de animação ou de produtos. Podemos inclusive afirmar que sua maior contribuição para o design, na verdade, desmente essas outras revoluções, pois evidencia que essa atividade não tem áreas nem fronteiras definidas.
Seu grande legado foi fazer o mundo perceber o design como uma ferramenta capaz de transformar as pessoas, os negócios e a cultura. Um conhecimento multidisciplinar que integra razão e emoção, arte e técnica e está presente em todas as esferas da Apple.
Aparece nos softwares e hardwares, é evidente nas embalagens, nos manuais de instrução e até na forma como a marca vende cada um de seus produtos.
Ao mexer na rodinha de um iPod ou virar a página passando o dedo sobre a tela de um iPad, um usuário outrora leigo sobre design é capaz de reconhecer sua importância percebendo a inteligência por trás da solução.
Gestos podem comunicar mais do que palavras. Um aparelho que é usado de maneira intuitiva e amigável impacta diretamente o indivíduo, que se torna mais exigente. E passa a querer produtos que se adaptem a suas necessidades em vez de ter que, ele, ficar se adaptando aos produtos, como costuma acontecer com frequência – e acontecia com frequência ainda maior antes dos aparelhos propostos por Jobs.
Não podemos dizer que a Apple detenha tecnologias mais evoluídas que as outras grandes empresas do setor, como as gigantes japonesas e coreanas.
Não é a detenção de tecnologia que faz dela a empresa mais inovadora do mundo. Seu maior trunfo é a capacidade de utilizar o design como uma argamassa que integra tudo o que ela faz – inclusive, aí sim, os avanços tecnológicos propriamente ditos–, gerando soluções coesas e coerentes.
Jobs regia a Apple sob a gestão do design. Uma forma de gerir um negocio não somente através de modelos administrativos convencionais, mas acrescentando a força transformadora da intuição e da emoção.
O uso do design sobre esta perspectiva não é aplicado somente para o projeto de criação de produtos, mas também no desenvolvimento de novos serviços, na gestão de uma empresa, na concepção de políticas públicas e qualquer coisa que envolva a necessidade de planejar e implementar.
Dentro desta perspectiva, é possível afirmar que, em todos estes anos, Steve Jobs sempre foi um grande designer.
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