Uma das marcas que 2022 vai deixar é o desmonte da imagem de Elon Musk, o principal acionista da Tesla, criador da SpaceX e atual dono do Twitter. Desmonte talvez não seja o termo mais adequado — reconstrução. Readequação. Quem sabe, realocação. E é bem possível que a mudança da percepção pública o afete profundamente.
Musk era, antes da aquisição do Twitter, um dos muitos bilionários produzidos pelo Vale do Silício. São conhecidos pelo nome, mas, por quem era desinteressado em tecnologia, não muito mais do que isso. Seu produto de maior sucesso é, indiscutivelmente, o carro Tesla.
Nos EUA, antes de a Tesla explodir, o sinônimo de automóvel elétrico era o Toyota Prius — na verdade, um veículo híbrido, com tanque de gasolina, mas que, em boa parte do tempo, opera por eletricidade. Um típico carro de família, definitivamente nada sexy.
O que a Tesla fez foi transformar carros elétricos em produtos de consumo atraentes para a classe média alta de lá. O que a Tesla não mudou foi o público que busca primordialmente carros elétricos. Trata-se de um consumidor muito consciente a respeito do problema das mudanças climáticas e engajado com o tema de um mundo de baixo carbono. Ter um Tesla diz muitas coisas. É um símbolo de status, é um carro para quem busca alta tecnologia e é uma afirmação política.
O Musk que a compra do Twitter revelou é outro. Ele posta fotografias de sua mesa de cabeceira com réplicas de armas, recomendou voto no Partido Republicano, acusa o Twitter antigo de perseguir a direita, queixa-se da cultura do politicamente correto. Em sua última edição, a revista Wired já dá o sinal no título: “A trumpização de Elon Musk”.
Existe um movimento político real de direita nos EUA e em boa parte do Ocidente. O que Musk pensa, fala e manifesta por suas ações encontra eco e público. Ocorre que seus ideais estão em franco contraste com os valores dos compradores dos carros elétricos que vende. E isso, justamente, quando a Tesla começa a ganhar concorrentes de peso. Afinal, a eletrificação da frota deve se impor nesta década na qual ainda estamos entrando.
Acaso o ambiente no Twitter se radicalize à direita, a rede que já é meio de nicho pode ter alcance ainda mais limitado. É bom deixar claro: há números que indicam, sim, que o discurso de ódio aumentou em número na rede. Mas não há qualquer indício de que o alcance deste tipo de mensagem tenha sido ampliado.
O mundo está conhecendo quem Elon Musk é. Isso pode não ser bom para Musk.