Quem caminha pela região da Faria Lima, pelas ruas da Vila Madalena, nos bairros nobres de São Paulo, nos saguões de embarque dos aeroportos ou pelos pontos turísticos de países da Europa já deve ter cruzado com pessoas carregando nas costas uma mochila com símbolo de uma “raposinha”, com um nome quase impronunciável em português: a Fjallräven (lê-se fyell reven), uma marca sueca de produtos voltados para atividades físicas em contato com a natureza, mas que ganhou espaço mesmo nas ruas das grandes cidades.
Depois de se transformar na queridinha dos jovens “hipsters” mundo afora, aparecer em séries da Netflix, como em Heartstopper, e virar o “hit” do verão europeu, a companhia sueca prepara o terreno para expandir os negócios no Brasil com a abertura das suas primeiras lojas físicas no País.
Apesar do design minimalista, o preço do produto pode “assustar” os mais desavisados. Por se tratar de um produto posicionado no mercado de alta renda, o modelo clássico de mochila Kanken vendido pela Fjallraven pode custar de R$ 699 a R$ 1,7 mil, no site da marca. Mas os preços não param por aí. Uma mochila do tipo Bergatagen, para a prática de montanhismo, com estrutura de madeira e tecido impermeável, não sai por menos de R$ 2,6 mil.
Fabricio Luzzi , presidente da Core Company - que detém a operação da marca no Brasil-, conta que a diferença de preço se justifica devido à qualidade do material e a durabilidade do produto. “Nós não queremos que as pessoas comprem uma mochila nova todo ano. A ideia é que o cliente tenha uma só que dure a vida toda. É um consumo sustentável”, diz ele. “É sustentável porque é atemporal e porque vai durar anos”, complementa.
Katherine Sresnewsky, especialista em mercado de luxo da ESPM, vê o sucesso e o “hype” da marca da “raposinha” no Brasil e no mundo como parte de uma junção de fatores, que passa por uma construção de marca atrelada ao propósito ESG (sigla em inglês para questões ambiental, social e governança) e a percepção que os itens são posicionados no segmento premium, além é claro, de um plano de marketing que engloba todos os mercados em que a companhia atua.
Por aqui, a adesão da Faria Lima aos produtos da marca sueca não está ligada apenas a uma questão de poder aquisitivo, mas também à identificação dos integrantes do principal centro financeiro do País com o ideal da marca, ao estilo de vida ligado à natureza e às atividades de aventura, à exemplo de outra marca queridinha deste grupo, a Patagônia, um dos principais nomes da moda sustentável, cujo fundador anunciou recentemente a doação de todo o seu valor de mercado para o planeta Terra.
Muito longe das montanhas, picos nevados ou áreas de natureza pouco explorada, dentro dos arranha-céus da Faria Lima outros nomes deste segmento como The North Face e Patagônia - ambos do segmento premium e de luxo - também já foram integrados ao “dress code” dos executivos, mesmo sendo inicialmente marcas de roupas casuais e esportivas. Com isso, não é difícil encontrar no cruzamento da Brigadeiro Faria Lima com a Presidente Juscelino Kubitscheck pessoas vestindo camisas sociais com gravatas, cobertos por um colete corta vento e uma mochila de alpinismo da Fjallraven.
Para a professora, outro ponto que justifica os investimentos da marca sueca no País está ligado ao potencial de crescimento de mercados latino-americanos para itens de luxo e do mercado premium, que tem atraído gigantes do setor para a região, a exemplo de nomes como Prada, Chanel, Hermés que abriram as portas de seus e-commerces de luxo no País recentemente. “A América Latina tem demonstrado um crescimento sólido neste segmento, puxado pelo Brasil e México. As marcas internacionais querem vender para nós”, avalia Katherine.
O executivo da Fjallraven conta que a expectativa do negócio no Brasil é manter o crescimento anual em dois dígitos, variando entre 10% e 20%. Para isso, a estratégia escolhida pela marca sueca tem sido a ampliação do portfólio de itens que são comercializados no e-commerce brasileiro. “Nós não queremos vender milhões de mochilas Kanken, nós queremos vender um estilo de vida, com uma estratégia de longo prazo, aumentando o consumo do brasileiro sobre o outdoor.” Ainda segundo Luzzi, o Brasil também tem um papel importante para a empresa na expansão da operação em outros mercados da América Latina.
Atualmente, a Fjallraven tem no Brasil cerca de 60 revendedores - lojas selecionadas que distribuem os produtos em shopping pelo País afora. Mas, segundo Luzzio, 80% do faturamento no mercado brasileiro ocorre por meio do e-commerce próprio, implementado nos últimos anos.
Para o próximo ano, em 2024, a expansão da companhia passa por abrir suas primeiras lojas físicas próprias no País, em São Paulo e no Rio de Janeiro. O investimento para a nova etapa, no entanto, não foi divulgado.
Da Suécia para o Brasil
Fabricio Luzzi explica que o “namoro” com o Brasil começou ainda em 2017, quando a Fjallräven iniciou os estudos de viabilidade do mercado brasileiro. Em 2019, às vésperas da pandemia, o negócio desembarcou de vez no País.
Inicialmente, as vendas eram feitas via marketplaces como Iguatemi 365 e ShopTogether, mas em seguida, a companhia introduziu o seu e-commerce. Apesar de ter ganhado notoriedade e entrada no dia a dia dos brasileiros através da sua mochila mais famosa, a Kanken, a marca sueca não ficou apenas na produção de bolsas e expandiu sua carteira de produtos vendidos no País.
Luzzi conta que o foco da marca é ser uma marca que ofereça todos os produtos para a prática de atividades “outdoor” (como trilhas, escalada, trekking, rapel, hiking e outros), por isso, negócio expandiu a linha de produtos vendidos no Brasil. Hoje, a Fjallraven comercializa calças térmicas, blusas do tipo “corta vento”, toucas, e outros itens ligados à prática esportiva na natureza.
História
Ainda que a marca tenha ganhado notoriedade nos últimos anos, no pós pandemia, a história da Fjallraven começou há mais de tempo, em 1960, na cidade de Örnsköldsvik, na Suécia. A ideia inicial era criar uma marca de roupas e equipamentos outdoor que ajudasse as pessoas na prática esportiva na natureza.
Com o avanço do negócio pelo mundo, a marca foi se aproximando principalmente dos consumidores que viajam para destinos exóticos, cujas atividades turísticas principais são trilhas, escalada, entre outros. “Nós queremos inspirar os nossos clientes a visitar esses destinos, para caminhar na natureza”, diz Luzzi
O modelo mais tradicional da marca, a Kanken, nasceu em 1978 como uma alternativa para uso nas escolas, para ajudar as crianças a carregar o material escolar sem machucar as costas.
Barreira linguística?
Conforme explicado pela Fjallraven, por se tratar de uma palavra sueca, o nome da marca precisou ser trabalhado com o público brasileiro. “Fjällräven é pronunciado ‘fyell reven’ e significa raposa ártica em sueco”, explica a companhia em uma aba do seu e-commerce brasileiro.
Segundo Luzzi, da Core Company, no Brasil, apesar do trabalho de divulgação do nome, as pesquisas internas da companhia mostram que o termo “a mochila da raposinha” virou comum entre os consumidores brasileiros em detrimento ao nome oficial que carrega em si consoantes demais para um falante de língua portuguesa.