Com reajuste fixado acima da inflação por imposição legal, o salário mínimo dita o crescimento dos gastos com aposentadorias e benefícios do INSS, que marcham velozmente para a marca de R$ 1 trilhão. O piso nacional de R$ 1.502 proposto pelo governo para o ano que vem, por exemplo, vai elevar para R$ 980,9 bilhões os gastos previdenciários em 2025, isso sem contar os gastos com servidores públicos e militares. Como a arrecadação nem de longe atinge o mesmo montante, a progressão do déficit dá sinais claros de que a Reforma da Previdência, que em maio completa três anos e meio, precisa ser revisitada.
A variação do salário mínimo, que atrela diversos gastos públicos, entre eles as despesas com pagamento de aposentadorias e pensões, é o maior fator de pressão do déficit previdenciário, mas não o único. A reforma de 2019, embora longe do ideal, foi um importante agente de contenção no ritmo de crescimento do rombo previdenciário. E, é bom ressaltar, sem nenhum apoio do PT, cuja bancada votou em peso contra o que qualificava como perda de direitos dos trabalhadores, desconsiderando que mudanças como o aumento do tempo mínimo de contribuição são necessárias diante da transformação social e demográfica.
O Brasil é um país que está envelhecendo. Após a exceção do período de pandemia, a expectativa de vida voltou a subir, chegando a 75,5 anos em 2022. O mercado de trabalho também passa por mudanças estruturais e não há como ignorar que os bons resultados, como a manutenção do índice de desemprego na casa de um dígito e o recorde de mais de 100 milhões de ocupados, estão sendo acompanhados do aumento da informalidade e do fenômeno de expansão de microempreendedores individuais (MEIs). Por consequência, a fonte de arrecadação previdenciária tem diminuído, enquanto cresce o dispêndio com as aposentadorias.
Em 2009, primeiro ano de vigência do regime MEI, criado para formalizar trabalhadores autônomos, apenas 8,4% das empresas abertas estavam inscritas nesse sistema; em 2023, já representavam 74,6% do total. Atualmente, os MEIs descontam contribuição previdenciária mensal de R$ 70,60 para terem direito a uma aposentadoria de um salário mínimo. Não é preciso ser especialista em cálculo atuarial – que o ministro da Previdência, Carlos Lupi, diz ignorar, assim como nega o próprio déficit da Previdência – para verificar de cara que a conta não fecha.
Recente reportagem do Estadão mostrou que a explosão de MEIs se dá por um fenômeno que está sendo chamado de “empreendedorismo por necessidade”, que inclui, em sua maioria, os excluídos do trabalho formal que buscam uma forma de permanecer no mercado com direitos mínimos. Foi esse tipo de empreendedorismo a principal causa da alta de 168% de MEIs em apenas quatro anos. Não demorará até que essa multidão de “trabalhadores-empresas” pressione as despesas da Previdência Social, a principal despesa da União.
É preciso desarmar essa bomba com novas reformas e garantir, ao mesmo tempo, a viabilidade do sistema previdenciário e o equilíbrio fiscal. O problema é que são questões para as quais o lulopetismo reserva o mais solene desprezo. O governo de Lula da Silva se mostra mais preocupado com medidas que tragam dividendos eleitoreiros. É o caso da legislação que estabeleceu a política de reajuste do salário mínimo acima da inflação medida pelo INPC. Por tabela, as aposentadorias e pensões terão de ser corrigidas, obrigatoriamente, acima da inflação.
Ao menos para corrigir os erros do governo de Jair Bolsonaro – que, além de não estender aos militares as exigências impostas ao regime geral do INSS, ainda ampliou vantagens dessa categoria –, Lula da Silva deveria tentar corrigir as desigualdades do sistema. No ano passado, o rombo da Previdência estava em R$ 394,7 bilhões (acumulado de 12 meses até novembro), e R$ 290,3 bilhões eram referentes a benefícios de 28 milhões de trabalhadores da iniciativa privada, enquanto R$ 104,3 bilhões diziam respeito a apenas 1 milhão de militares e servidores públicos. A disparidade fala por si.