O presidente Lula da Silva determinou o fim de um dos principais instrumentos legais para a União e a sociedade brasileira examinarem se as estatais federais continuam a atender aos seus imperativos constitucionais ou se a melhor opção seria privatizá-las. Trata-se das avaliações periódicas de sustentabilidade econômico-financeira dessas empresas pelo Conselho Nacional de Desestatização (CND), eliminadas com uma canetada no Decreto 11.580/2023, publicado na edição do último dia 28 do Diário Oficial da União.
Ao acabar com uma ferramenta de avaliação do desempenho dessas empresas que, por definição, são públicas, o governo não apenas limita a transparência. A medida fere, sobretudo, a capacidade de o CND examinar, de forma técnica e despolitizada, até que ponto as estatais atendem ao artigo 173 da Constituição de 1988. O texto é claro: “A exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos de segurança nacional ou a relevante interesse coletivo”. Sublinhe-se o advérbio “só”.
É certo que as empresas públicas estão obrigadas aos mesmos requisitos de divulgação de seus resultados contábeis e financeiros exigidos da iniciativa privada. A Lei das Estatais (13.303/2016) impõe obrigações adicionais, como as divulgações de demonstrativos financeiros e dados operacionais e de relatório integrado anual, além de prever o acesso irrestrito de órgãos de controle a seus dados, inclusive os sigilosos. No entanto, as duas avaliações periódicas do CND respondiam a uma questão nevrálgica: o status jurídico de uma empresa como estatal é de interesse nacional?
A aversão do governo Lula da Silva à privatização, sobretudo ao programa definido por seu antecessor, Jair Bolsonaro, não gera estranhamento. Sua defesa à preservação das empresas públicas nos palanques eleitorais de 2022 segue o mesmo veio estatista de seus dois mandatos anteriores e da cartilha doutrinária do PT. Surpreendente seria Lula, em seu terceiro mandato, trilhar um caminho liberal nessa seara.
Em abril passado, por meio de outro decreto (11.478/2023), o governo excluiu sete estatais do PND, entre as quais os Correios e a Empresa Brasil de Comunicação (EBC). No mesmo texto, retirou do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI) a Telebras e a Pré-Sal Petróleo (PPSA), além dos armazéns da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). Na ocasião, ao referir-se à retirada dos Correios e da Telebras dessas listas, o governo alegou que seu objetivo era “reforçar o papel destas empresas na oferta de cidadania e ampliar ainda mais os investimentos”.
O argumento oficial não poderia ser mais inconsistente diante dos exíguos recursos do Estado para elevar a competitividade e a missão das estatais. Contrasta ainda com a ampliação da cobertura de serviços de energia e telecomunicações aos cidadãos brasileiros verificada a partir das privatizações dos anos 1990. Quem já esperou anos para comprar uma linha telefônica de uma estatal sabe do que se trata. Mas, nos delírios estatólatras do lulopetismo, isso não tem a menor importância.