O Brasil é um dos países mais desiguais do mundo e há décadas cresce abaixo da média das grandes economias em desenvolvimento. Entre as alavancas que levaram ao espetacular crescimento da China nas últimas décadas e estão impulsionando a Índia agora, duas são cruciais: o bônus demográfico (a predominância da população ativa sobre a inativa) e a urbanização (a transferência de trabalhadores do campo para o chão de fábrica). Essas alavancas já não são uma opção para o Brasil: o País já foi amplamente urbanizado e é uma das sociedades que envelhecem mais rapidamente no mundo. Para elevar o padrão de vida e reduzir a desigualdade, a única alavanca que resta é acelerar o crescimento da produtividade – mas essa alavanca parece cronicamente emperrada.
Um levantamento da literatura científica sobre a produtividade no Brasil preparado para o Banco Mundial pelo pesquisador da FGV Fernando Veloso mostra que na redemocratização, ao mesmo tempo que o Brasil progrediu na conquista de estabilidade macroeconômica e em reformas nos mercados de produtos e insumos, a perpetuação e introdução de distorções competitivas reduziu a eficiência e prejudicou o crescimento da produtividade. O problema é sistêmico. O ambiente de negócios desestimula a competição e induz a má alocação de recursos. Empresas produtivas crescem pouco e as ineficientes permanecem no mercado, às vezes como zumbis.
O levantamento evidencia deficiências em fatores como escolaridade, gestão empresarial, sistema judicial ou informalidade que também reduziram o impacto das reformas. Mas particularmente relevantes são os retrocessos causados por políticas econômicas retrógradas. O modelo de desenvolvimento baseado na intervenção estatal e no protecionismo à indústria da era Vargas e da ditadura militar segue em grande medida presente e, junto com reformas como a liberalização do comércio e melhorias nas garantias de crédito, foram perpetuados ou criados novos subsídios, isenções e proteções comerciais para favorecer grupos de interesse oligárquicos. O resultado é uma trajetória claudicante, em que, na melhor das hipóteses, a política econômica nacional dá dois passos à frente e um atrás, mas, com exasperante frequência, da um à frente e dois atrás.
Os últimos anos exemplificam essa ciclotimia. Reformas importantes foram aprovadas, como a trabalhista e a da Previdência, a autonomia do Banco Central ou marcos de infraestrutura, como o do saneamento e o das ferrovias. O atual governo teve papel relevante ao apoiar a aprovação no Congresso da reforma tributária, que mitigará distorções alocativas, custos tributários, guerras fiscais ou a cumulatividade dos impostos. O marco de garantias robusteceu a segurança jurídica no mercado de crédito e tende a baixar o custo do capital.
Ao mesmo tempo, fiel aos seus dogmas estatistas, o mesmo governo tenta reverter ou flexibilizar marcos regulatórios para satisfazer suas ambições intervencionistas. Sua nova política industrial já nasceu velha e é um retrocesso em várias dimensões. Ao enfatizar o conteúdo local e a inovação nacional em detrimento da absorção de inovações da fronteira tecnológica, ela vai na direção contrária à liberalização dos anos 90, que, ao facilitar a importação de máquinas e equipamentos, deu impulso à produtividade. O pacote de incentivos sem metas claras, monitoramento e avaliação de impacto tende a reforçar a má alocação de recursos e a perpetuar políticas ineficazes que protegem empresas improdutivas, freiam as produtivas e obliteram inovações.
Para usar outra imagem, a economia brasileira é uma barca furada. Por vezes os governos se esforçam com sofreguidão para jogar a água para fora, dando uma ilusão de aceleração, mas em geral são ineficazes para tapar os buracos e com demasiada frequência introduzem outros. E assim o Brasil vai ficando para trás.
Para destravar a alavanca da produtividade, a condição sine qua non é uma injeção de qualidade no poder público. Ou seja, em última instância, o crescimento sustentável está nas mãos do eleitor.