Democracia não é bem isso


Câmara tem legitimidade não só para manter a criminalização do aborto, como, se quiser, agravar a pena a ele cominada. Mas deve ter a coragem de decidir seguindo o devido rito democrático

Por Notas & Informações

A Câmara aprovou o regime de urgência para um projeto de lei, de autoria do deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), que equipara o aborto ao homicídio simples quando a gestação for interrompida a partir da 22.ª semana. O Poder Legislativo tem legitimidade para, se quiser, não só manter a tipificação penal do aborto, como, no caso do projeto em tela, ainda agravar a pena cominada ao crime. Contudo, é de estarrecer todo genuíno democrata, seja qual for a opinião que possa ter a respeito desse projeto de lei, o rito de tramitação escolhido pela Casa – isto, sim, reprovável por seu espírito claramente antidemocrático.

Convém sublinhar, à guisa de esclarecimento, em quais casos cabe a tramitação de urgência. Prevista no artigo 153 do Regimento Interno da Câmara, a urgência poderá ser requerida quando (i) se tratar de matéria que envolva a defesa da sociedade democrática; (ii) tratar-se de providência para atender a calamidade pública; (iii) visar à prorrogação de prazos legais a se findarem, ou à adoção ou alteração de lei para aplicar-se em época certa e próxima; ou (iv) pretender-se a apreciação da matéria na mesma sessão. Decerto o presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), os líderes dos partidos e o autor do projeto de lei elucubraram alguma contorção interpretativa para fazer a equiparação entre os crimes de aborto e homicídio simples caber numa dessas hipóteses de urgência. Mas a matéria, por óbvio, urgente não é.

Dois objetivos correlatos estão evidentes nesse ardil para atropelar o devido processo democrático de discussão de questões de interesse da sociedade no Congresso Nacional. O primeiro deles é acelerar a tramitação do projeto, ao custo da realização de debates mais aprofundados sobre a pertinência ou não de agravar a pena imposta às mulheres que decidem abortar – em particular àquelas autorizadas a fazê-lo nas três hipóteses previstas para o chamado aborto legal. Quando tramitam em regime de urgência, os projetos de lei não passam pelo crivo das comissões temáticas da Câmara e do Senado, sendo apreciados diretamente pelo plenário de ambas as Casas Legislativas. A qualidade do debate público, naturalmente, é comprometida pela premência do tempo – o que é razoável quando se está diante daquelas hipóteses enumeradas acima.

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O debate sobre o aborto, entretanto, além de não ser urgente – pois “urgente”, ao que parece, é a necessidade da Câmara de se contrapor ao Supremo Tribunal Federal, que está em vias de julgar a constitucionalidade de uma resolução do Conselho Federal de Medicina que proíbe uma prática médica abortiva, mesmo nos casos de aborto legal –, deve ser travado com transparência e, principalmente, coragem republicana. Nesse sentido, só o fato de o requerimento de urgência ter sido aprovado em votação simbólica, quando os deputados não são obrigados a se manifestar publicamente sobre o que estão votando, já não se coaduna com o espírito democrático. Eis o segundo objetivo: blindar os deputados de quaisquer ônus políticos.

Ora, que tenham coragem para defender na tribuna as suas convicções sobre a equiparação entre o aborto e o homicídio simples, apresentando argumentos e votando segundo suas consciências. A democracia representativa funciona assim. E seja qual for a decisão da Câmara, como representante do povo brasileiro, haverá de ser respeitada. O que é descabido é a privação de um debate mais qualificado sobre um tema que é particularmente sensível para grande parte dos cidadãos.

O espírito das leis editadas como “desafio” a outros Poderes não é bom para o Legislativo nem muito menos para a democracia. E fica claro que é esse o espírito que anima Sóstenes Cavalcante quando o deputado diz querer “ver se ele (o presidente Lula da Silva) vai sancionar ou vetar esse projeto sobre aborto”.

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Uma lei não se presta à revanche. A contaminação da legislatura pelo desejo de desforra nunca deu em bom lugar. Justamente por sua sensibilidade, é preciso discutir o projeto de lei do deputado fluminense com serenidade e, sobretudo, espírito público.

A Câmara aprovou o regime de urgência para um projeto de lei, de autoria do deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), que equipara o aborto ao homicídio simples quando a gestação for interrompida a partir da 22.ª semana. O Poder Legislativo tem legitimidade para, se quiser, não só manter a tipificação penal do aborto, como, no caso do projeto em tela, ainda agravar a pena cominada ao crime. Contudo, é de estarrecer todo genuíno democrata, seja qual for a opinião que possa ter a respeito desse projeto de lei, o rito de tramitação escolhido pela Casa – isto, sim, reprovável por seu espírito claramente antidemocrático.

Convém sublinhar, à guisa de esclarecimento, em quais casos cabe a tramitação de urgência. Prevista no artigo 153 do Regimento Interno da Câmara, a urgência poderá ser requerida quando (i) se tratar de matéria que envolva a defesa da sociedade democrática; (ii) tratar-se de providência para atender a calamidade pública; (iii) visar à prorrogação de prazos legais a se findarem, ou à adoção ou alteração de lei para aplicar-se em época certa e próxima; ou (iv) pretender-se a apreciação da matéria na mesma sessão. Decerto o presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), os líderes dos partidos e o autor do projeto de lei elucubraram alguma contorção interpretativa para fazer a equiparação entre os crimes de aborto e homicídio simples caber numa dessas hipóteses de urgência. Mas a matéria, por óbvio, urgente não é.

Dois objetivos correlatos estão evidentes nesse ardil para atropelar o devido processo democrático de discussão de questões de interesse da sociedade no Congresso Nacional. O primeiro deles é acelerar a tramitação do projeto, ao custo da realização de debates mais aprofundados sobre a pertinência ou não de agravar a pena imposta às mulheres que decidem abortar – em particular àquelas autorizadas a fazê-lo nas três hipóteses previstas para o chamado aborto legal. Quando tramitam em regime de urgência, os projetos de lei não passam pelo crivo das comissões temáticas da Câmara e do Senado, sendo apreciados diretamente pelo plenário de ambas as Casas Legislativas. A qualidade do debate público, naturalmente, é comprometida pela premência do tempo – o que é razoável quando se está diante daquelas hipóteses enumeradas acima.

O debate sobre o aborto, entretanto, além de não ser urgente – pois “urgente”, ao que parece, é a necessidade da Câmara de se contrapor ao Supremo Tribunal Federal, que está em vias de julgar a constitucionalidade de uma resolução do Conselho Federal de Medicina que proíbe uma prática médica abortiva, mesmo nos casos de aborto legal –, deve ser travado com transparência e, principalmente, coragem republicana. Nesse sentido, só o fato de o requerimento de urgência ter sido aprovado em votação simbólica, quando os deputados não são obrigados a se manifestar publicamente sobre o que estão votando, já não se coaduna com o espírito democrático. Eis o segundo objetivo: blindar os deputados de quaisquer ônus políticos.

Ora, que tenham coragem para defender na tribuna as suas convicções sobre a equiparação entre o aborto e o homicídio simples, apresentando argumentos e votando segundo suas consciências. A democracia representativa funciona assim. E seja qual for a decisão da Câmara, como representante do povo brasileiro, haverá de ser respeitada. O que é descabido é a privação de um debate mais qualificado sobre um tema que é particularmente sensível para grande parte dos cidadãos.

O espírito das leis editadas como “desafio” a outros Poderes não é bom para o Legislativo nem muito menos para a democracia. E fica claro que é esse o espírito que anima Sóstenes Cavalcante quando o deputado diz querer “ver se ele (o presidente Lula da Silva) vai sancionar ou vetar esse projeto sobre aborto”.

Uma lei não se presta à revanche. A contaminação da legislatura pelo desejo de desforra nunca deu em bom lugar. Justamente por sua sensibilidade, é preciso discutir o projeto de lei do deputado fluminense com serenidade e, sobretudo, espírito público.

A Câmara aprovou o regime de urgência para um projeto de lei, de autoria do deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), que equipara o aborto ao homicídio simples quando a gestação for interrompida a partir da 22.ª semana. O Poder Legislativo tem legitimidade para, se quiser, não só manter a tipificação penal do aborto, como, no caso do projeto em tela, ainda agravar a pena cominada ao crime. Contudo, é de estarrecer todo genuíno democrata, seja qual for a opinião que possa ter a respeito desse projeto de lei, o rito de tramitação escolhido pela Casa – isto, sim, reprovável por seu espírito claramente antidemocrático.

Convém sublinhar, à guisa de esclarecimento, em quais casos cabe a tramitação de urgência. Prevista no artigo 153 do Regimento Interno da Câmara, a urgência poderá ser requerida quando (i) se tratar de matéria que envolva a defesa da sociedade democrática; (ii) tratar-se de providência para atender a calamidade pública; (iii) visar à prorrogação de prazos legais a se findarem, ou à adoção ou alteração de lei para aplicar-se em época certa e próxima; ou (iv) pretender-se a apreciação da matéria na mesma sessão. Decerto o presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), os líderes dos partidos e o autor do projeto de lei elucubraram alguma contorção interpretativa para fazer a equiparação entre os crimes de aborto e homicídio simples caber numa dessas hipóteses de urgência. Mas a matéria, por óbvio, urgente não é.

Dois objetivos correlatos estão evidentes nesse ardil para atropelar o devido processo democrático de discussão de questões de interesse da sociedade no Congresso Nacional. O primeiro deles é acelerar a tramitação do projeto, ao custo da realização de debates mais aprofundados sobre a pertinência ou não de agravar a pena imposta às mulheres que decidem abortar – em particular àquelas autorizadas a fazê-lo nas três hipóteses previstas para o chamado aborto legal. Quando tramitam em regime de urgência, os projetos de lei não passam pelo crivo das comissões temáticas da Câmara e do Senado, sendo apreciados diretamente pelo plenário de ambas as Casas Legislativas. A qualidade do debate público, naturalmente, é comprometida pela premência do tempo – o que é razoável quando se está diante daquelas hipóteses enumeradas acima.

O debate sobre o aborto, entretanto, além de não ser urgente – pois “urgente”, ao que parece, é a necessidade da Câmara de se contrapor ao Supremo Tribunal Federal, que está em vias de julgar a constitucionalidade de uma resolução do Conselho Federal de Medicina que proíbe uma prática médica abortiva, mesmo nos casos de aborto legal –, deve ser travado com transparência e, principalmente, coragem republicana. Nesse sentido, só o fato de o requerimento de urgência ter sido aprovado em votação simbólica, quando os deputados não são obrigados a se manifestar publicamente sobre o que estão votando, já não se coaduna com o espírito democrático. Eis o segundo objetivo: blindar os deputados de quaisquer ônus políticos.

Ora, que tenham coragem para defender na tribuna as suas convicções sobre a equiparação entre o aborto e o homicídio simples, apresentando argumentos e votando segundo suas consciências. A democracia representativa funciona assim. E seja qual for a decisão da Câmara, como representante do povo brasileiro, haverá de ser respeitada. O que é descabido é a privação de um debate mais qualificado sobre um tema que é particularmente sensível para grande parte dos cidadãos.

O espírito das leis editadas como “desafio” a outros Poderes não é bom para o Legislativo nem muito menos para a democracia. E fica claro que é esse o espírito que anima Sóstenes Cavalcante quando o deputado diz querer “ver se ele (o presidente Lula da Silva) vai sancionar ou vetar esse projeto sobre aborto”.

Uma lei não se presta à revanche. A contaminação da legislatura pelo desejo de desforra nunca deu em bom lugar. Justamente por sua sensibilidade, é preciso discutir o projeto de lei do deputado fluminense com serenidade e, sobretudo, espírito público.

A Câmara aprovou o regime de urgência para um projeto de lei, de autoria do deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), que equipara o aborto ao homicídio simples quando a gestação for interrompida a partir da 22.ª semana. O Poder Legislativo tem legitimidade para, se quiser, não só manter a tipificação penal do aborto, como, no caso do projeto em tela, ainda agravar a pena cominada ao crime. Contudo, é de estarrecer todo genuíno democrata, seja qual for a opinião que possa ter a respeito desse projeto de lei, o rito de tramitação escolhido pela Casa – isto, sim, reprovável por seu espírito claramente antidemocrático.

Convém sublinhar, à guisa de esclarecimento, em quais casos cabe a tramitação de urgência. Prevista no artigo 153 do Regimento Interno da Câmara, a urgência poderá ser requerida quando (i) se tratar de matéria que envolva a defesa da sociedade democrática; (ii) tratar-se de providência para atender a calamidade pública; (iii) visar à prorrogação de prazos legais a se findarem, ou à adoção ou alteração de lei para aplicar-se em época certa e próxima; ou (iv) pretender-se a apreciação da matéria na mesma sessão. Decerto o presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), os líderes dos partidos e o autor do projeto de lei elucubraram alguma contorção interpretativa para fazer a equiparação entre os crimes de aborto e homicídio simples caber numa dessas hipóteses de urgência. Mas a matéria, por óbvio, urgente não é.

Dois objetivos correlatos estão evidentes nesse ardil para atropelar o devido processo democrático de discussão de questões de interesse da sociedade no Congresso Nacional. O primeiro deles é acelerar a tramitação do projeto, ao custo da realização de debates mais aprofundados sobre a pertinência ou não de agravar a pena imposta às mulheres que decidem abortar – em particular àquelas autorizadas a fazê-lo nas três hipóteses previstas para o chamado aborto legal. Quando tramitam em regime de urgência, os projetos de lei não passam pelo crivo das comissões temáticas da Câmara e do Senado, sendo apreciados diretamente pelo plenário de ambas as Casas Legislativas. A qualidade do debate público, naturalmente, é comprometida pela premência do tempo – o que é razoável quando se está diante daquelas hipóteses enumeradas acima.

O debate sobre o aborto, entretanto, além de não ser urgente – pois “urgente”, ao que parece, é a necessidade da Câmara de se contrapor ao Supremo Tribunal Federal, que está em vias de julgar a constitucionalidade de uma resolução do Conselho Federal de Medicina que proíbe uma prática médica abortiva, mesmo nos casos de aborto legal –, deve ser travado com transparência e, principalmente, coragem republicana. Nesse sentido, só o fato de o requerimento de urgência ter sido aprovado em votação simbólica, quando os deputados não são obrigados a se manifestar publicamente sobre o que estão votando, já não se coaduna com o espírito democrático. Eis o segundo objetivo: blindar os deputados de quaisquer ônus políticos.

Ora, que tenham coragem para defender na tribuna as suas convicções sobre a equiparação entre o aborto e o homicídio simples, apresentando argumentos e votando segundo suas consciências. A democracia representativa funciona assim. E seja qual for a decisão da Câmara, como representante do povo brasileiro, haverá de ser respeitada. O que é descabido é a privação de um debate mais qualificado sobre um tema que é particularmente sensível para grande parte dos cidadãos.

O espírito das leis editadas como “desafio” a outros Poderes não é bom para o Legislativo nem muito menos para a democracia. E fica claro que é esse o espírito que anima Sóstenes Cavalcante quando o deputado diz querer “ver se ele (o presidente Lula da Silva) vai sancionar ou vetar esse projeto sobre aborto”.

Uma lei não se presta à revanche. A contaminação da legislatura pelo desejo de desforra nunca deu em bom lugar. Justamente por sua sensibilidade, é preciso discutir o projeto de lei do deputado fluminense com serenidade e, sobretudo, espírito público.

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