Opinião|A venda casada dos planos de saúde


Operadoras clamam por uma repaginação da legislação, de forma que se possa reequilibrar a operação de saúde, com um modelo atualizado, talvez mais segmentado, e certamente mais acessível

Por Elano Figueiredo

O Código de Defesa do Consumidor proíbe qualquer tipo de manobra comercial que implique venda casada, que consiste em atrelar o fornecimento de um produto ou serviço a outro (usualmente vendido separado). Mas e quando o próprio governo obriga que a venda seja casada? Pode isso? É como acontece nos planos de saúde: venda casada obrigada por lei.

Hoje, a operadora não pode oferecer para o beneficiário um atendimento apenas de consultas e exames simples, por exemplo. Ainda que isso signifique um serviço bem mais barato e acessível à população brasileira. É que, por lei, os planos de saúde devem vender atendimento sempre integral.

Para se ter ideia, o tipo de produto chamado pela lei como “plano referência” (artigo 10 da Lei 9.656/1998) obriga a operadora a manter na sua prateleira um contrato com serviços conjuntos e casados, ambulatoriais e hospitalares, incluindo obstetrícia. É mais que um casal de serviços. É o trisal da saúde, em que o mínimo já é o máximo.

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Isso ocorre porque o legislador, ao conceber a lei dos planos, adotou a mesma premissa do sistema público, de que a assistência deveria ser integral. Então, novamente, assim como acontece no ressarcimento ao Sistema Único de Saúde (SUS), impôs aos particulares o ônus que deveria ser do público.

Certamente, renomados defensores do sanitarismo vão criticar este texto. Mas o objetivo aqui não é, de forma alguma, atacar o sistema único, mas sim defender a suplementariedade do privado. Eles não têm que ser idênticos. O privado deve servir como suplemento ao público. É o que diz a Constituição federal.

Basta verificar os números para entender se o desenho atual concebido é viável. Vale apontar especialmente três situações. Antes da lei, existiam cerca de 1.500 operadoras, enquanto hoje são 700. No ano de 2023 a operação de saúde (receitas das mensalidades menos despesas com assistência) foi negativa em quase R$ 6 bilhões. E os planos individuais, que antes eram maioria, hoje atendem 17% dos beneficiários, porque as operadoras fogem da regulação, via plano coletivo.

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No momento, os próprios operadores de saúde clamam por uma repaginação da legislação junto ao Congresso Nacional, de forma que se possa reequilibrar a operação, com um modelo de assistência atualizado, talvez mais segmentado, e certamente mais acessível.

Todavia, já se vê manchetes pesadas dando a entender que as empresas querem se livrar das internações hospitalares; sem destacar, contudo, que isso será uma opção para o consumidor, de pagar menos se assim quiser. Ora bolas, será que realmente o consumidor não pode escolher a assistência à saúde que quer ter?

Ok, ok, o cidadão é presumidamente hipossuficiente e pode ser enganado pelas empresas malvadas. Mas não seria melhor compensar essa fragilidade jurídica de uma outra forma, com proteção regulatória, ao invés de engessamento da oferta dos serviços?

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Bem, se a alteração do marco legal não for possível, pelo menos que se lembrem de regular a coparticipação e a franquia, como meios de racionalizar o uso da assistência. Tornando-se sócio também do sinistro, o consumidor poderá ajudar mais no gerenciamento da boa utilização do seu plano.

Enfim, como está não dá para ficar.

*

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ESPECIALISTA EM SISTEMA DE SAÚDE, VICE-PRESIDENTE DA COMISSÃO NACIONAL DE SAÚDE SUPLEMENTAR DA OAB, FOI DIRETOR DA ANS

O Código de Defesa do Consumidor proíbe qualquer tipo de manobra comercial que implique venda casada, que consiste em atrelar o fornecimento de um produto ou serviço a outro (usualmente vendido separado). Mas e quando o próprio governo obriga que a venda seja casada? Pode isso? É como acontece nos planos de saúde: venda casada obrigada por lei.

Hoje, a operadora não pode oferecer para o beneficiário um atendimento apenas de consultas e exames simples, por exemplo. Ainda que isso signifique um serviço bem mais barato e acessível à população brasileira. É que, por lei, os planos de saúde devem vender atendimento sempre integral.

Para se ter ideia, o tipo de produto chamado pela lei como “plano referência” (artigo 10 da Lei 9.656/1998) obriga a operadora a manter na sua prateleira um contrato com serviços conjuntos e casados, ambulatoriais e hospitalares, incluindo obstetrícia. É mais que um casal de serviços. É o trisal da saúde, em que o mínimo já é o máximo.

Isso ocorre porque o legislador, ao conceber a lei dos planos, adotou a mesma premissa do sistema público, de que a assistência deveria ser integral. Então, novamente, assim como acontece no ressarcimento ao Sistema Único de Saúde (SUS), impôs aos particulares o ônus que deveria ser do público.

Certamente, renomados defensores do sanitarismo vão criticar este texto. Mas o objetivo aqui não é, de forma alguma, atacar o sistema único, mas sim defender a suplementariedade do privado. Eles não têm que ser idênticos. O privado deve servir como suplemento ao público. É o que diz a Constituição federal.

Basta verificar os números para entender se o desenho atual concebido é viável. Vale apontar especialmente três situações. Antes da lei, existiam cerca de 1.500 operadoras, enquanto hoje são 700. No ano de 2023 a operação de saúde (receitas das mensalidades menos despesas com assistência) foi negativa em quase R$ 6 bilhões. E os planos individuais, que antes eram maioria, hoje atendem 17% dos beneficiários, porque as operadoras fogem da regulação, via plano coletivo.

No momento, os próprios operadores de saúde clamam por uma repaginação da legislação junto ao Congresso Nacional, de forma que se possa reequilibrar a operação, com um modelo de assistência atualizado, talvez mais segmentado, e certamente mais acessível.

Todavia, já se vê manchetes pesadas dando a entender que as empresas querem se livrar das internações hospitalares; sem destacar, contudo, que isso será uma opção para o consumidor, de pagar menos se assim quiser. Ora bolas, será que realmente o consumidor não pode escolher a assistência à saúde que quer ter?

Ok, ok, o cidadão é presumidamente hipossuficiente e pode ser enganado pelas empresas malvadas. Mas não seria melhor compensar essa fragilidade jurídica de uma outra forma, com proteção regulatória, ao invés de engessamento da oferta dos serviços?

Bem, se a alteração do marco legal não for possível, pelo menos que se lembrem de regular a coparticipação e a franquia, como meios de racionalizar o uso da assistência. Tornando-se sócio também do sinistro, o consumidor poderá ajudar mais no gerenciamento da boa utilização do seu plano.

Enfim, como está não dá para ficar.

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ESPECIALISTA EM SISTEMA DE SAÚDE, VICE-PRESIDENTE DA COMISSÃO NACIONAL DE SAÚDE SUPLEMENTAR DA OAB, FOI DIRETOR DA ANS

O Código de Defesa do Consumidor proíbe qualquer tipo de manobra comercial que implique venda casada, que consiste em atrelar o fornecimento de um produto ou serviço a outro (usualmente vendido separado). Mas e quando o próprio governo obriga que a venda seja casada? Pode isso? É como acontece nos planos de saúde: venda casada obrigada por lei.

Hoje, a operadora não pode oferecer para o beneficiário um atendimento apenas de consultas e exames simples, por exemplo. Ainda que isso signifique um serviço bem mais barato e acessível à população brasileira. É que, por lei, os planos de saúde devem vender atendimento sempre integral.

Para se ter ideia, o tipo de produto chamado pela lei como “plano referência” (artigo 10 da Lei 9.656/1998) obriga a operadora a manter na sua prateleira um contrato com serviços conjuntos e casados, ambulatoriais e hospitalares, incluindo obstetrícia. É mais que um casal de serviços. É o trisal da saúde, em que o mínimo já é o máximo.

Isso ocorre porque o legislador, ao conceber a lei dos planos, adotou a mesma premissa do sistema público, de que a assistência deveria ser integral. Então, novamente, assim como acontece no ressarcimento ao Sistema Único de Saúde (SUS), impôs aos particulares o ônus que deveria ser do público.

Certamente, renomados defensores do sanitarismo vão criticar este texto. Mas o objetivo aqui não é, de forma alguma, atacar o sistema único, mas sim defender a suplementariedade do privado. Eles não têm que ser idênticos. O privado deve servir como suplemento ao público. É o que diz a Constituição federal.

Basta verificar os números para entender se o desenho atual concebido é viável. Vale apontar especialmente três situações. Antes da lei, existiam cerca de 1.500 operadoras, enquanto hoje são 700. No ano de 2023 a operação de saúde (receitas das mensalidades menos despesas com assistência) foi negativa em quase R$ 6 bilhões. E os planos individuais, que antes eram maioria, hoje atendem 17% dos beneficiários, porque as operadoras fogem da regulação, via plano coletivo.

No momento, os próprios operadores de saúde clamam por uma repaginação da legislação junto ao Congresso Nacional, de forma que se possa reequilibrar a operação, com um modelo de assistência atualizado, talvez mais segmentado, e certamente mais acessível.

Todavia, já se vê manchetes pesadas dando a entender que as empresas querem se livrar das internações hospitalares; sem destacar, contudo, que isso será uma opção para o consumidor, de pagar menos se assim quiser. Ora bolas, será que realmente o consumidor não pode escolher a assistência à saúde que quer ter?

Ok, ok, o cidadão é presumidamente hipossuficiente e pode ser enganado pelas empresas malvadas. Mas não seria melhor compensar essa fragilidade jurídica de uma outra forma, com proteção regulatória, ao invés de engessamento da oferta dos serviços?

Bem, se a alteração do marco legal não for possível, pelo menos que se lembrem de regular a coparticipação e a franquia, como meios de racionalizar o uso da assistência. Tornando-se sócio também do sinistro, o consumidor poderá ajudar mais no gerenciamento da boa utilização do seu plano.

Enfim, como está não dá para ficar.

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ESPECIALISTA EM SISTEMA DE SAÚDE, VICE-PRESIDENTE DA COMISSÃO NACIONAL DE SAÚDE SUPLEMENTAR DA OAB, FOI DIRETOR DA ANS

O Código de Defesa do Consumidor proíbe qualquer tipo de manobra comercial que implique venda casada, que consiste em atrelar o fornecimento de um produto ou serviço a outro (usualmente vendido separado). Mas e quando o próprio governo obriga que a venda seja casada? Pode isso? É como acontece nos planos de saúde: venda casada obrigada por lei.

Hoje, a operadora não pode oferecer para o beneficiário um atendimento apenas de consultas e exames simples, por exemplo. Ainda que isso signifique um serviço bem mais barato e acessível à população brasileira. É que, por lei, os planos de saúde devem vender atendimento sempre integral.

Para se ter ideia, o tipo de produto chamado pela lei como “plano referência” (artigo 10 da Lei 9.656/1998) obriga a operadora a manter na sua prateleira um contrato com serviços conjuntos e casados, ambulatoriais e hospitalares, incluindo obstetrícia. É mais que um casal de serviços. É o trisal da saúde, em que o mínimo já é o máximo.

Isso ocorre porque o legislador, ao conceber a lei dos planos, adotou a mesma premissa do sistema público, de que a assistência deveria ser integral. Então, novamente, assim como acontece no ressarcimento ao Sistema Único de Saúde (SUS), impôs aos particulares o ônus que deveria ser do público.

Certamente, renomados defensores do sanitarismo vão criticar este texto. Mas o objetivo aqui não é, de forma alguma, atacar o sistema único, mas sim defender a suplementariedade do privado. Eles não têm que ser idênticos. O privado deve servir como suplemento ao público. É o que diz a Constituição federal.

Basta verificar os números para entender se o desenho atual concebido é viável. Vale apontar especialmente três situações. Antes da lei, existiam cerca de 1.500 operadoras, enquanto hoje são 700. No ano de 2023 a operação de saúde (receitas das mensalidades menos despesas com assistência) foi negativa em quase R$ 6 bilhões. E os planos individuais, que antes eram maioria, hoje atendem 17% dos beneficiários, porque as operadoras fogem da regulação, via plano coletivo.

No momento, os próprios operadores de saúde clamam por uma repaginação da legislação junto ao Congresso Nacional, de forma que se possa reequilibrar a operação, com um modelo de assistência atualizado, talvez mais segmentado, e certamente mais acessível.

Todavia, já se vê manchetes pesadas dando a entender que as empresas querem se livrar das internações hospitalares; sem destacar, contudo, que isso será uma opção para o consumidor, de pagar menos se assim quiser. Ora bolas, será que realmente o consumidor não pode escolher a assistência à saúde que quer ter?

Ok, ok, o cidadão é presumidamente hipossuficiente e pode ser enganado pelas empresas malvadas. Mas não seria melhor compensar essa fragilidade jurídica de uma outra forma, com proteção regulatória, ao invés de engessamento da oferta dos serviços?

Bem, se a alteração do marco legal não for possível, pelo menos que se lembrem de regular a coparticipação e a franquia, como meios de racionalizar o uso da assistência. Tornando-se sócio também do sinistro, o consumidor poderá ajudar mais no gerenciamento da boa utilização do seu plano.

Enfim, como está não dá para ficar.

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ESPECIALISTA EM SISTEMA DE SAÚDE, VICE-PRESIDENTE DA COMISSÃO NACIONAL DE SAÚDE SUPLEMENTAR DA OAB, FOI DIRETOR DA ANS

Opinião por Elano Figueiredo

Especialista em sistema de saúde, vice-presidente da Comissão Nacional de Saúde Suplementar da OAB, foi diretor da ANS

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