Opinião|As ‘Medidas pela Corrupção’


Por Diogo Castor e Carlos Fernando dos Santos

Recentemente, os noticiários deram destaque ao projeto de lei do deputado federal Wadih Damous (PT-RJ) que altera a lei dos recursos especial e extraordinário e o Código de Processo Penal, prevendo que os recursos apresentados pelos réus ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) ou ao Supremo Tribunal Federal (STF) suspendam os efeitos da decisão condenatória e impeçam a execução provisória da pena. O projeto de lei vem como resposta à recente decisão do Supremo Tribunal Federal no julgamento do Habeas Corpus n.º 126.292, quando, em sessão plenária do dia 17 de fevereiro de 2016, foi decidida pela constitucionalidade da execução da pena criminal após a decisão de segundo grau de jurisdição.

Naquela oportunidade, após acirrada discussão, os ministros decidiram pôr fim à chamada “indústria dos recursos protelatórios” que se instaurou no Poder Judiciário brasileiro.

Agora, o que se vê é a vontade do Parlamento de, por via oblíqua, cassar a decisão do Supremo Tribunal Federal, num manifesto ataque à separação dos Poderes.

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Vale lembrar que, na Itália na década de 1990, após a deflagração da Operação Mãos Limpas, o Congresso italiano aprovou a toque de caixa diversas leis de contrainteligência com o inequívoco propósito de frear a possibilidade de avanço das investigações dos crimes do colarinho branco. Entre outras normativas aprovadas na Itália no período entre 1994 e 2006, citem-se o famoso Decreto Salva Ladri, de 13 de julho de 1994 (dia em que a Itália jogava a semifinal da Copa do Mundo contra a Bulgária), que converteu em prisão domiciliar todos os decretos de prisões preventiva da Operação Mãos Limpas; a criação do juízo da instrução em 2001, separando o juiz da investigação do juiz do processo; a lei que declarou a nulidade de provas obtidas por carta rogatória, de 2002; as mudanças etárias da prescrição; e a vedação de recursos pelo Ministério Público em 2005 e 2006.

No presente momento, no Brasil, começam a surgir projetos de lei com a mesma finalidade de embaraçar as investigações dos crimes do colarinho branco.

De início, a Medida Provisória n.º 703/2015, que no apagar das luzes do último ano institucionalizou o “acordão” entre as empreiteiras, prevendo a possibilidade de acordo de leniência sem exigência do real compromisso de autoincriminação, com a facilitação do pagamento pela empresa de indenização em prejuízo da vítima e sem a necessidade do fornecimento de informações de fatos novos.

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Na sequência, a lei da repatriação de ativos não declarados no exterior, que legaliza a propriedade de recursos espúrios mantidos secretamente fora do Brasil (projeto semelhante foi aprovado na Itália na década de 1990).

E, atualmente, ainda se debatem outras iniciativas casuístas, como a que visa a impedir a colaboração premiada de réus presos, ou a que veda os colaboradores de prestar esclarecimentos complementares e, agora, mais recentemente, o supracitado projeto de lei, que intenta perpetuar o indevido processo penal infinito dos réus ricos e poderosos no Brasil.

São todos esses projetos um incentivo à manutenção da cultura da corrupção em nosso país. Poderíamos chamá-los, em contraponto aos projetos de lei popular que alcançaram recentemente mais de 1,5 milhão de assinaturas, de “Medidas em Favor da Corrupção”.

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Especialmente em relação ao último projeto mencionado, do deputado federal Wadih Damous (PT-RJ), a sua justificativa de que o mencionado projeto visa a assegurar o direito constitucional à presunção de inocência não encontra correspondência na realidade fática.

Entre dezenas de exemplos de casos que simplesmente não acabam pela interposição de recursos infinitivos, o ministro Luis Roberto Barroso, no recente julgamento do STF já mencionado, ilustrou de forma prática e objetiva como funcionam os processos criminais dos réus ricos, com recursos para custear caros advogados no Brasil, mencionando no seu voto um crime de homicídio cometido em 1991 em que o réu interpôs: 1) recurso em sentido estrito; 2) apelação; 3) embargos de declaração; 4) recurso especial; 5) novos embargos de declaração; 6) recurso extraordinário; 7) agravo regimental; 8) novos embargos de declaração; 9) embargos de declaração em face dos novos embargos de declaração; 10) embargos de divergência; 11) novo agravo regimental; 12) novos embargos de declaração; 13) novo agravo regimental; e 14) novos embargos de declaração, estes últimos pendentes de apreciação pelo plenário do Supremo, sendo certo que até hoje (25 anos após o crime) a sentença ainda não transitou em julgado.

Existem no Brasil outras centenas de exemplos de casos de abuso no direito recursal, como, por exemplo, o processo do ex-senador Luiz Estevão (que antes de ser preso, em março, já havia ingressado com 21 recursos em face da mesma condenação) ou os dos congressistas Jader Barbalho e Paulo Maluf, que utilizaram do expediente de sucessivos recursos infundados para serem agraciados pela prescrição durante a tramitação dos recursos.

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O que se vê nesses casos não é o exercício legítimo do exercício do direito de defesa pelos réus, mas, sim, o manifesto abuso de direito com a inequívoca finalidade de perpetuar a impunidade dos ricos e poderosos no País, em desrespeito aos direitos constitucionais das vítimas e de toda a sociedade.

No entanto, o que causa mais perplexidade no referido projeto de lei é a insensibilidade de seus idealizadores, que em uma semana se mobilizaram para aprovar uma legislação em sentido diametralmente oposto ao futuro projeto de lei de iniciativa popular que está há um ano coletando assinaturas com o objetivo, entre outros, de possibilitar a execução imediata da sentença condenatória após o julgamento do recurso no tribunal inferior.

Estejamos de olhos bem abertos. Como diria Fabrizinio de André, jornalista que escreveu sobre a Operação Mãos Limpas: “Uma vez um juiz julgou quem havia ditado a lei. Primeiro, mudaram o juiz. Logo em seguida, mudaram a lei”.

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*Diogo Castor e Carlos Fernando dos Santos são procurador da República e procurador regional da República, respectivamente

Recentemente, os noticiários deram destaque ao projeto de lei do deputado federal Wadih Damous (PT-RJ) que altera a lei dos recursos especial e extraordinário e o Código de Processo Penal, prevendo que os recursos apresentados pelos réus ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) ou ao Supremo Tribunal Federal (STF) suspendam os efeitos da decisão condenatória e impeçam a execução provisória da pena. O projeto de lei vem como resposta à recente decisão do Supremo Tribunal Federal no julgamento do Habeas Corpus n.º 126.292, quando, em sessão plenária do dia 17 de fevereiro de 2016, foi decidida pela constitucionalidade da execução da pena criminal após a decisão de segundo grau de jurisdição.

Naquela oportunidade, após acirrada discussão, os ministros decidiram pôr fim à chamada “indústria dos recursos protelatórios” que se instaurou no Poder Judiciário brasileiro.

Agora, o que se vê é a vontade do Parlamento de, por via oblíqua, cassar a decisão do Supremo Tribunal Federal, num manifesto ataque à separação dos Poderes.

Vale lembrar que, na Itália na década de 1990, após a deflagração da Operação Mãos Limpas, o Congresso italiano aprovou a toque de caixa diversas leis de contrainteligência com o inequívoco propósito de frear a possibilidade de avanço das investigações dos crimes do colarinho branco. Entre outras normativas aprovadas na Itália no período entre 1994 e 2006, citem-se o famoso Decreto Salva Ladri, de 13 de julho de 1994 (dia em que a Itália jogava a semifinal da Copa do Mundo contra a Bulgária), que converteu em prisão domiciliar todos os decretos de prisões preventiva da Operação Mãos Limpas; a criação do juízo da instrução em 2001, separando o juiz da investigação do juiz do processo; a lei que declarou a nulidade de provas obtidas por carta rogatória, de 2002; as mudanças etárias da prescrição; e a vedação de recursos pelo Ministério Público em 2005 e 2006.

No presente momento, no Brasil, começam a surgir projetos de lei com a mesma finalidade de embaraçar as investigações dos crimes do colarinho branco.

De início, a Medida Provisória n.º 703/2015, que no apagar das luzes do último ano institucionalizou o “acordão” entre as empreiteiras, prevendo a possibilidade de acordo de leniência sem exigência do real compromisso de autoincriminação, com a facilitação do pagamento pela empresa de indenização em prejuízo da vítima e sem a necessidade do fornecimento de informações de fatos novos.

Na sequência, a lei da repatriação de ativos não declarados no exterior, que legaliza a propriedade de recursos espúrios mantidos secretamente fora do Brasil (projeto semelhante foi aprovado na Itália na década de 1990).

E, atualmente, ainda se debatem outras iniciativas casuístas, como a que visa a impedir a colaboração premiada de réus presos, ou a que veda os colaboradores de prestar esclarecimentos complementares e, agora, mais recentemente, o supracitado projeto de lei, que intenta perpetuar o indevido processo penal infinito dos réus ricos e poderosos no Brasil.

São todos esses projetos um incentivo à manutenção da cultura da corrupção em nosso país. Poderíamos chamá-los, em contraponto aos projetos de lei popular que alcançaram recentemente mais de 1,5 milhão de assinaturas, de “Medidas em Favor da Corrupção”.

Especialmente em relação ao último projeto mencionado, do deputado federal Wadih Damous (PT-RJ), a sua justificativa de que o mencionado projeto visa a assegurar o direito constitucional à presunção de inocência não encontra correspondência na realidade fática.

Entre dezenas de exemplos de casos que simplesmente não acabam pela interposição de recursos infinitivos, o ministro Luis Roberto Barroso, no recente julgamento do STF já mencionado, ilustrou de forma prática e objetiva como funcionam os processos criminais dos réus ricos, com recursos para custear caros advogados no Brasil, mencionando no seu voto um crime de homicídio cometido em 1991 em que o réu interpôs: 1) recurso em sentido estrito; 2) apelação; 3) embargos de declaração; 4) recurso especial; 5) novos embargos de declaração; 6) recurso extraordinário; 7) agravo regimental; 8) novos embargos de declaração; 9) embargos de declaração em face dos novos embargos de declaração; 10) embargos de divergência; 11) novo agravo regimental; 12) novos embargos de declaração; 13) novo agravo regimental; e 14) novos embargos de declaração, estes últimos pendentes de apreciação pelo plenário do Supremo, sendo certo que até hoje (25 anos após o crime) a sentença ainda não transitou em julgado.

Existem no Brasil outras centenas de exemplos de casos de abuso no direito recursal, como, por exemplo, o processo do ex-senador Luiz Estevão (que antes de ser preso, em março, já havia ingressado com 21 recursos em face da mesma condenação) ou os dos congressistas Jader Barbalho e Paulo Maluf, que utilizaram do expediente de sucessivos recursos infundados para serem agraciados pela prescrição durante a tramitação dos recursos.

O que se vê nesses casos não é o exercício legítimo do exercício do direito de defesa pelos réus, mas, sim, o manifesto abuso de direito com a inequívoca finalidade de perpetuar a impunidade dos ricos e poderosos no País, em desrespeito aos direitos constitucionais das vítimas e de toda a sociedade.

No entanto, o que causa mais perplexidade no referido projeto de lei é a insensibilidade de seus idealizadores, que em uma semana se mobilizaram para aprovar uma legislação em sentido diametralmente oposto ao futuro projeto de lei de iniciativa popular que está há um ano coletando assinaturas com o objetivo, entre outros, de possibilitar a execução imediata da sentença condenatória após o julgamento do recurso no tribunal inferior.

Estejamos de olhos bem abertos. Como diria Fabrizinio de André, jornalista que escreveu sobre a Operação Mãos Limpas: “Uma vez um juiz julgou quem havia ditado a lei. Primeiro, mudaram o juiz. Logo em seguida, mudaram a lei”.

*Diogo Castor e Carlos Fernando dos Santos são procurador da República e procurador regional da República, respectivamente

Recentemente, os noticiários deram destaque ao projeto de lei do deputado federal Wadih Damous (PT-RJ) que altera a lei dos recursos especial e extraordinário e o Código de Processo Penal, prevendo que os recursos apresentados pelos réus ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) ou ao Supremo Tribunal Federal (STF) suspendam os efeitos da decisão condenatória e impeçam a execução provisória da pena. O projeto de lei vem como resposta à recente decisão do Supremo Tribunal Federal no julgamento do Habeas Corpus n.º 126.292, quando, em sessão plenária do dia 17 de fevereiro de 2016, foi decidida pela constitucionalidade da execução da pena criminal após a decisão de segundo grau de jurisdição.

Naquela oportunidade, após acirrada discussão, os ministros decidiram pôr fim à chamada “indústria dos recursos protelatórios” que se instaurou no Poder Judiciário brasileiro.

Agora, o que se vê é a vontade do Parlamento de, por via oblíqua, cassar a decisão do Supremo Tribunal Federal, num manifesto ataque à separação dos Poderes.

Vale lembrar que, na Itália na década de 1990, após a deflagração da Operação Mãos Limpas, o Congresso italiano aprovou a toque de caixa diversas leis de contrainteligência com o inequívoco propósito de frear a possibilidade de avanço das investigações dos crimes do colarinho branco. Entre outras normativas aprovadas na Itália no período entre 1994 e 2006, citem-se o famoso Decreto Salva Ladri, de 13 de julho de 1994 (dia em que a Itália jogava a semifinal da Copa do Mundo contra a Bulgária), que converteu em prisão domiciliar todos os decretos de prisões preventiva da Operação Mãos Limpas; a criação do juízo da instrução em 2001, separando o juiz da investigação do juiz do processo; a lei que declarou a nulidade de provas obtidas por carta rogatória, de 2002; as mudanças etárias da prescrição; e a vedação de recursos pelo Ministério Público em 2005 e 2006.

No presente momento, no Brasil, começam a surgir projetos de lei com a mesma finalidade de embaraçar as investigações dos crimes do colarinho branco.

De início, a Medida Provisória n.º 703/2015, que no apagar das luzes do último ano institucionalizou o “acordão” entre as empreiteiras, prevendo a possibilidade de acordo de leniência sem exigência do real compromisso de autoincriminação, com a facilitação do pagamento pela empresa de indenização em prejuízo da vítima e sem a necessidade do fornecimento de informações de fatos novos.

Na sequência, a lei da repatriação de ativos não declarados no exterior, que legaliza a propriedade de recursos espúrios mantidos secretamente fora do Brasil (projeto semelhante foi aprovado na Itália na década de 1990).

E, atualmente, ainda se debatem outras iniciativas casuístas, como a que visa a impedir a colaboração premiada de réus presos, ou a que veda os colaboradores de prestar esclarecimentos complementares e, agora, mais recentemente, o supracitado projeto de lei, que intenta perpetuar o indevido processo penal infinito dos réus ricos e poderosos no Brasil.

São todos esses projetos um incentivo à manutenção da cultura da corrupção em nosso país. Poderíamos chamá-los, em contraponto aos projetos de lei popular que alcançaram recentemente mais de 1,5 milhão de assinaturas, de “Medidas em Favor da Corrupção”.

Especialmente em relação ao último projeto mencionado, do deputado federal Wadih Damous (PT-RJ), a sua justificativa de que o mencionado projeto visa a assegurar o direito constitucional à presunção de inocência não encontra correspondência na realidade fática.

Entre dezenas de exemplos de casos que simplesmente não acabam pela interposição de recursos infinitivos, o ministro Luis Roberto Barroso, no recente julgamento do STF já mencionado, ilustrou de forma prática e objetiva como funcionam os processos criminais dos réus ricos, com recursos para custear caros advogados no Brasil, mencionando no seu voto um crime de homicídio cometido em 1991 em que o réu interpôs: 1) recurso em sentido estrito; 2) apelação; 3) embargos de declaração; 4) recurso especial; 5) novos embargos de declaração; 6) recurso extraordinário; 7) agravo regimental; 8) novos embargos de declaração; 9) embargos de declaração em face dos novos embargos de declaração; 10) embargos de divergência; 11) novo agravo regimental; 12) novos embargos de declaração; 13) novo agravo regimental; e 14) novos embargos de declaração, estes últimos pendentes de apreciação pelo plenário do Supremo, sendo certo que até hoje (25 anos após o crime) a sentença ainda não transitou em julgado.

Existem no Brasil outras centenas de exemplos de casos de abuso no direito recursal, como, por exemplo, o processo do ex-senador Luiz Estevão (que antes de ser preso, em março, já havia ingressado com 21 recursos em face da mesma condenação) ou os dos congressistas Jader Barbalho e Paulo Maluf, que utilizaram do expediente de sucessivos recursos infundados para serem agraciados pela prescrição durante a tramitação dos recursos.

O que se vê nesses casos não é o exercício legítimo do exercício do direito de defesa pelos réus, mas, sim, o manifesto abuso de direito com a inequívoca finalidade de perpetuar a impunidade dos ricos e poderosos no País, em desrespeito aos direitos constitucionais das vítimas e de toda a sociedade.

No entanto, o que causa mais perplexidade no referido projeto de lei é a insensibilidade de seus idealizadores, que em uma semana se mobilizaram para aprovar uma legislação em sentido diametralmente oposto ao futuro projeto de lei de iniciativa popular que está há um ano coletando assinaturas com o objetivo, entre outros, de possibilitar a execução imediata da sentença condenatória após o julgamento do recurso no tribunal inferior.

Estejamos de olhos bem abertos. Como diria Fabrizinio de André, jornalista que escreveu sobre a Operação Mãos Limpas: “Uma vez um juiz julgou quem havia ditado a lei. Primeiro, mudaram o juiz. Logo em seguida, mudaram a lei”.

*Diogo Castor e Carlos Fernando dos Santos são procurador da República e procurador regional da República, respectivamente

Opinião por Diogo Castor
Carlos Fernando dos Santos

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