Opinião|Bye bye democracia


Estamos em pleno pesadelo de Rui Barbosa. E não há a quem recorrer

Por Fernão Lara Mesquita

Na antidemocracia brasileira o povo vem sempre em último lugar: manda nada quem tem muito voto, pensa que manda quem tem uns poucos e manda em tudo quem não tem nenhum. E são estes os únicos que duram para além do que o povo quiser que durem. Bolsonaro late, mas quem morde é “o Leviatã”. Sem que haja, aqui ou no mundo, qualquer lei ou definição do que seja isso, o STF, de cujas atribuições legais está expressamente excluída a de fazer inquéritos, com apoio unânime da “grande imprensa”, decretou por 10 a 1 a “legalidade” do “inquérito das fake news” que iniciou 15 meses atrás sem provocação, outra violação da ordem constitucional, com um ato de censura à imprensa, a terceira violação. 

As contradições insanáveis desse enunciado atestam a condição terminal da nossa “democracia”. Como uma aberração lógica, jurídica e formal como está venceu a vergonha de ser afirmada em público pelos papas do formalismo eu não sei. Mas é o único meio de derrubar com a mesma cajadada Jair Bolsonaro e seu vice general de Exército, possivelmente antes que ele possa nomear os ministros que teriam vagas no Supremo ao longo do seu mandato, a “cereja no bolo” prometida nos primeiros dias de maio pelo caudaloso ministro Celso de Mello ao anunciar o rito sumário para essa tentativa (e o STF vazar para a imprensa os “planos B e C” publicados no mesmo dia, nos mesmos termos, em todos os jornais). 

Desde que o STF se autoatribuiu a função de legislar, legalizar a ilegalidade ou criminalizar o que estava na lei - seja para prender, seja para soltar - virou “o novo normal”. Opera como aquelas máquinas chinesas de construir pontes e ferrovias: tira da frente e atira no abismo as leis que não servem à sua agenda política e lança, do vagão de trás para a frente da locomotiva, vestidinhas de regimento interno ou o que for, as que necessita para avançar o próximo metro, antes ou até mesmo depois de fazê-lo. Estamos em pleno pesadelo de Rui Barbosa. Nada mais é certo e sabido, senão que cada porta do inferno que o STF resolver abrir só o STF poderá fechar - ou voltar a abrir - se e quando quiser. Não há a quem recorrer.

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Os queirozes são outra (velhíssima) história. Mas, no Brasil como em todo país civilizado, ninguém pode ser punido por NADA do que disser (ou pensar), a não ser pelas figuras tipificadas no Código Penal. Muito menos representantes eleitos do povo no exercício dos seus mandatos. Ainda assim o Congresso Nacional manteve um silêncio sepulcral diante da devassa fiscal, telefônica e de internet (!!) de deputados e senadores eleitos culpados de “apoiadores de Jair Bolsonaro”. O farisaísmo das associações de classe e “de defesa dos direitos do cidadão”, então, há muito, já, que “é de lei”. Até o indisfarçado júbilo que perpassava na cobertura de algumas das televisões de notícias dos pogroms do dr. Moraes, com “buscas e apreensões” sucessivas e até prisões por crime de opinião como não se via desde os “anos chumbo”, era de se esperar. Mas ver nos canais da imprensa profissional jornalistas interrogando jornalistas ao vivo para cobrar-lhes as “afirmações antidemocráticas” escritas ou proferidas foi “um avanço” chocante e deprimente para quem ainda se esforça por manter o orgulho da profissão e a esperança no Brasil.

Joseph Pulitzer, um dos inventores do jornalismo democrático, dizia que “é impossível matar mesmo uma democracia muito imperfeita se sua imprensa estiver minimamente saudável. Assim, se uma democracia estiver dando sinais irreversíveis de que está caminhando para a morte é porque sua imprensa já tinha morrido antes dela”. 

A brasileira está gritando desesperadamente esses sinais. Há uma lógica - perversa, mas lógica - no egoísmo, no férreo apego aos privilégios e na olímpica alienação das corporações da privilegiatura. Afinal, elas vivem de fato no Olimpo, e isso faz muuuito tempo. No Brasil deles não tem pandemia, não tem desemprego, não tem falência, não tem desespero. E isso sabidamente vicia e deforma irreversivelmente. Por isso só O Poder, de onde todos esses privilégios se dependuram, interessa. Mas é suicida o alinhamento automático da imprensa com elas e contra a multidão dos constrangidos “debaixo de vara” a arrancar da sua miséria as lagostas e os vinhos tetracampeões das “excelências” enquanto estrebucha na pandemia. 

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Sexta-feira passada este jornal dizia em editorial que “o Brasil deveria parar para refletir por que razão (…) a política se tornou um permanente caso de polícia” e que “está mais que na hora de mudar sem esperar a vinda de outro messias de quermesse”. Certíssimo! Só a imprensa poderia induzir a operação desse milagre. Mas ele será impossível enquanto ela continuar aplaudindo coisas como os 75 a 0 de aprovação que o Senado deu às reduções de 25%, 50% ou até 75% dos salários do setor privado enquanto o paisano dr. Moraes “prendia e arrebentava”, na mesma página em que grita que fazer a mesma coisa com os salários da privilegiatura ou exigir que o povo eleja (e deseleja por recall) todos quantos hoje ela nomeia (para “rachar”) é ferir de morte a “autonomia” das “instituições do estado democrático de direito”.

JORNALISTA, ESCREVE EM WWW.VESPEIRO.COM

Na antidemocracia brasileira o povo vem sempre em último lugar: manda nada quem tem muito voto, pensa que manda quem tem uns poucos e manda em tudo quem não tem nenhum. E são estes os únicos que duram para além do que o povo quiser que durem. Bolsonaro late, mas quem morde é “o Leviatã”. Sem que haja, aqui ou no mundo, qualquer lei ou definição do que seja isso, o STF, de cujas atribuições legais está expressamente excluída a de fazer inquéritos, com apoio unânime da “grande imprensa”, decretou por 10 a 1 a “legalidade” do “inquérito das fake news” que iniciou 15 meses atrás sem provocação, outra violação da ordem constitucional, com um ato de censura à imprensa, a terceira violação. 

As contradições insanáveis desse enunciado atestam a condição terminal da nossa “democracia”. Como uma aberração lógica, jurídica e formal como está venceu a vergonha de ser afirmada em público pelos papas do formalismo eu não sei. Mas é o único meio de derrubar com a mesma cajadada Jair Bolsonaro e seu vice general de Exército, possivelmente antes que ele possa nomear os ministros que teriam vagas no Supremo ao longo do seu mandato, a “cereja no bolo” prometida nos primeiros dias de maio pelo caudaloso ministro Celso de Mello ao anunciar o rito sumário para essa tentativa (e o STF vazar para a imprensa os “planos B e C” publicados no mesmo dia, nos mesmos termos, em todos os jornais). 

Desde que o STF se autoatribuiu a função de legislar, legalizar a ilegalidade ou criminalizar o que estava na lei - seja para prender, seja para soltar - virou “o novo normal”. Opera como aquelas máquinas chinesas de construir pontes e ferrovias: tira da frente e atira no abismo as leis que não servem à sua agenda política e lança, do vagão de trás para a frente da locomotiva, vestidinhas de regimento interno ou o que for, as que necessita para avançar o próximo metro, antes ou até mesmo depois de fazê-lo. Estamos em pleno pesadelo de Rui Barbosa. Nada mais é certo e sabido, senão que cada porta do inferno que o STF resolver abrir só o STF poderá fechar - ou voltar a abrir - se e quando quiser. Não há a quem recorrer.

Os queirozes são outra (velhíssima) história. Mas, no Brasil como em todo país civilizado, ninguém pode ser punido por NADA do que disser (ou pensar), a não ser pelas figuras tipificadas no Código Penal. Muito menos representantes eleitos do povo no exercício dos seus mandatos. Ainda assim o Congresso Nacional manteve um silêncio sepulcral diante da devassa fiscal, telefônica e de internet (!!) de deputados e senadores eleitos culpados de “apoiadores de Jair Bolsonaro”. O farisaísmo das associações de classe e “de defesa dos direitos do cidadão”, então, há muito, já, que “é de lei”. Até o indisfarçado júbilo que perpassava na cobertura de algumas das televisões de notícias dos pogroms do dr. Moraes, com “buscas e apreensões” sucessivas e até prisões por crime de opinião como não se via desde os “anos chumbo”, era de se esperar. Mas ver nos canais da imprensa profissional jornalistas interrogando jornalistas ao vivo para cobrar-lhes as “afirmações antidemocráticas” escritas ou proferidas foi “um avanço” chocante e deprimente para quem ainda se esforça por manter o orgulho da profissão e a esperança no Brasil.

Joseph Pulitzer, um dos inventores do jornalismo democrático, dizia que “é impossível matar mesmo uma democracia muito imperfeita se sua imprensa estiver minimamente saudável. Assim, se uma democracia estiver dando sinais irreversíveis de que está caminhando para a morte é porque sua imprensa já tinha morrido antes dela”. 

A brasileira está gritando desesperadamente esses sinais. Há uma lógica - perversa, mas lógica - no egoísmo, no férreo apego aos privilégios e na olímpica alienação das corporações da privilegiatura. Afinal, elas vivem de fato no Olimpo, e isso faz muuuito tempo. No Brasil deles não tem pandemia, não tem desemprego, não tem falência, não tem desespero. E isso sabidamente vicia e deforma irreversivelmente. Por isso só O Poder, de onde todos esses privilégios se dependuram, interessa. Mas é suicida o alinhamento automático da imprensa com elas e contra a multidão dos constrangidos “debaixo de vara” a arrancar da sua miséria as lagostas e os vinhos tetracampeões das “excelências” enquanto estrebucha na pandemia. 

Sexta-feira passada este jornal dizia em editorial que “o Brasil deveria parar para refletir por que razão (…) a política se tornou um permanente caso de polícia” e que “está mais que na hora de mudar sem esperar a vinda de outro messias de quermesse”. Certíssimo! Só a imprensa poderia induzir a operação desse milagre. Mas ele será impossível enquanto ela continuar aplaudindo coisas como os 75 a 0 de aprovação que o Senado deu às reduções de 25%, 50% ou até 75% dos salários do setor privado enquanto o paisano dr. Moraes “prendia e arrebentava”, na mesma página em que grita que fazer a mesma coisa com os salários da privilegiatura ou exigir que o povo eleja (e deseleja por recall) todos quantos hoje ela nomeia (para “rachar”) é ferir de morte a “autonomia” das “instituições do estado democrático de direito”.

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Na antidemocracia brasileira o povo vem sempre em último lugar: manda nada quem tem muito voto, pensa que manda quem tem uns poucos e manda em tudo quem não tem nenhum. E são estes os únicos que duram para além do que o povo quiser que durem. Bolsonaro late, mas quem morde é “o Leviatã”. Sem que haja, aqui ou no mundo, qualquer lei ou definição do que seja isso, o STF, de cujas atribuições legais está expressamente excluída a de fazer inquéritos, com apoio unânime da “grande imprensa”, decretou por 10 a 1 a “legalidade” do “inquérito das fake news” que iniciou 15 meses atrás sem provocação, outra violação da ordem constitucional, com um ato de censura à imprensa, a terceira violação. 

As contradições insanáveis desse enunciado atestam a condição terminal da nossa “democracia”. Como uma aberração lógica, jurídica e formal como está venceu a vergonha de ser afirmada em público pelos papas do formalismo eu não sei. Mas é o único meio de derrubar com a mesma cajadada Jair Bolsonaro e seu vice general de Exército, possivelmente antes que ele possa nomear os ministros que teriam vagas no Supremo ao longo do seu mandato, a “cereja no bolo” prometida nos primeiros dias de maio pelo caudaloso ministro Celso de Mello ao anunciar o rito sumário para essa tentativa (e o STF vazar para a imprensa os “planos B e C” publicados no mesmo dia, nos mesmos termos, em todos os jornais). 

Desde que o STF se autoatribuiu a função de legislar, legalizar a ilegalidade ou criminalizar o que estava na lei - seja para prender, seja para soltar - virou “o novo normal”. Opera como aquelas máquinas chinesas de construir pontes e ferrovias: tira da frente e atira no abismo as leis que não servem à sua agenda política e lança, do vagão de trás para a frente da locomotiva, vestidinhas de regimento interno ou o que for, as que necessita para avançar o próximo metro, antes ou até mesmo depois de fazê-lo. Estamos em pleno pesadelo de Rui Barbosa. Nada mais é certo e sabido, senão que cada porta do inferno que o STF resolver abrir só o STF poderá fechar - ou voltar a abrir - se e quando quiser. Não há a quem recorrer.

Os queirozes são outra (velhíssima) história. Mas, no Brasil como em todo país civilizado, ninguém pode ser punido por NADA do que disser (ou pensar), a não ser pelas figuras tipificadas no Código Penal. Muito menos representantes eleitos do povo no exercício dos seus mandatos. Ainda assim o Congresso Nacional manteve um silêncio sepulcral diante da devassa fiscal, telefônica e de internet (!!) de deputados e senadores eleitos culpados de “apoiadores de Jair Bolsonaro”. O farisaísmo das associações de classe e “de defesa dos direitos do cidadão”, então, há muito, já, que “é de lei”. Até o indisfarçado júbilo que perpassava na cobertura de algumas das televisões de notícias dos pogroms do dr. Moraes, com “buscas e apreensões” sucessivas e até prisões por crime de opinião como não se via desde os “anos chumbo”, era de se esperar. Mas ver nos canais da imprensa profissional jornalistas interrogando jornalistas ao vivo para cobrar-lhes as “afirmações antidemocráticas” escritas ou proferidas foi “um avanço” chocante e deprimente para quem ainda se esforça por manter o orgulho da profissão e a esperança no Brasil.

Joseph Pulitzer, um dos inventores do jornalismo democrático, dizia que “é impossível matar mesmo uma democracia muito imperfeita se sua imprensa estiver minimamente saudável. Assim, se uma democracia estiver dando sinais irreversíveis de que está caminhando para a morte é porque sua imprensa já tinha morrido antes dela”. 

A brasileira está gritando desesperadamente esses sinais. Há uma lógica - perversa, mas lógica - no egoísmo, no férreo apego aos privilégios e na olímpica alienação das corporações da privilegiatura. Afinal, elas vivem de fato no Olimpo, e isso faz muuuito tempo. No Brasil deles não tem pandemia, não tem desemprego, não tem falência, não tem desespero. E isso sabidamente vicia e deforma irreversivelmente. Por isso só O Poder, de onde todos esses privilégios se dependuram, interessa. Mas é suicida o alinhamento automático da imprensa com elas e contra a multidão dos constrangidos “debaixo de vara” a arrancar da sua miséria as lagostas e os vinhos tetracampeões das “excelências” enquanto estrebucha na pandemia. 

Sexta-feira passada este jornal dizia em editorial que “o Brasil deveria parar para refletir por que razão (…) a política se tornou um permanente caso de polícia” e que “está mais que na hora de mudar sem esperar a vinda de outro messias de quermesse”. Certíssimo! Só a imprensa poderia induzir a operação desse milagre. Mas ele será impossível enquanto ela continuar aplaudindo coisas como os 75 a 0 de aprovação que o Senado deu às reduções de 25%, 50% ou até 75% dos salários do setor privado enquanto o paisano dr. Moraes “prendia e arrebentava”, na mesma página em que grita que fazer a mesma coisa com os salários da privilegiatura ou exigir que o povo eleja (e deseleja por recall) todos quantos hoje ela nomeia (para “rachar”) é ferir de morte a “autonomia” das “instituições do estado democrático de direito”.

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