Opinião|Celular na escola – um problema mais complexo


A opção simplista de abolir os celulares sem planos ou estímulos explícitos ao seu uso qualificado nas escolas pode ter resultados nefastos e excludentes de toda uma geração

Por Pedro Chaves e Ronaldo Mota

O Congresso Nacional recentemente aprovou o Projeto de Lei n.º 4.932/2024, que regulamenta o uso de aparelhos portáteis, como celulares, por estudantes da educação básica. O próximo passo é a sanção presidencial. Trata-se de uma tentativa de resposta simples às complexas preocupações educacionais associadas.

Os argumentos da iniciativa são consistentes, evidenciados pelo aumento da distração no ambiente educacional, pela exposição descontrolada dos alunos a conteúdos inadequados, pelos prejuízos à sadia interação social, especialmente entre crianças e jovens, e pela ansiedade generalizada decorrente da hiperconectividade, causadora de uma epidemia de transtornos mentais.

Esses elementos estão igualmente presentes em cenas comuns de casais ou famílias realizando suas refeições, com cada qual prestando atenção somente no seu celular, em reuniões de trabalho em ambientes empresariais, com a maioria dos participantes focada em seus próprios aparelhos, e até mesmo no Congresso Nacional, com os parlamentares fixados em suas respectivas telas enquanto um deles discursa.

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A questão, portanto, deixa de ser exclusivamente de mérito formal do projeto de lei, mas sim de pertinência educacional, do processo de implementação e suas consequências em países com o nosso perfil. Educacionalmente, temos sido incapazes até aqui de promovermos uma inclusão digital de qualidade, contemplando as parcelas mais carentes da população, explorando o potencial de aprendizagem, em grande escala, associado aos ambientes virtuais de aprendizagem.

Na prática, podemos estar desobrigando os governos de garantir o prometido acesso digital no ambiente escolar. No caso brasileiro, tal acesso é ausente no ambiente doméstico da maioria dos alunos. Estamos reforçando nossa incapacidade de oferecer repositórios públicos com conteúdo digital educacional de qualidade, incluindo o acesso a laboratórios virtuais portáteis, especialmente aqueles acoplados ao mundo das inteligências artificiais, e demais ferramentas potencialmente promotoras de aprendizagem contemporânea, emancipadora e colaborativa.

Cabe destacar que os exemplos de outros países onde iniciativas similares estão logrando sucesso, na sua totalidade, são contextos em que os alunos têm plena abundância de possibilidades de acesso digital. Tanto em qualidade de sinal quando retornam para casa como em conteúdo digital educacional oferecido, além de maior escolaridade média dos pais, o que facilita a aprendizagem digital. Estabelecer paralelos com o Brasil é, de fato, comparar situações e oportunidades não comparáveis.

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Ainda que formalmente estejam contemplados usos eventuais pedagógicos de celulares em sala de aula, é inegável o recado subjacente de descompromisso crescente com a inclusão digital nas escolas. Estamos tratando, em geral, de gestores educacionais sobrecarregados e de professores sem formação específica para lidar com ambientes virtuais de aprendizagem, permeáveis, portanto, à ilusão de que terão um problema a menos adiante. Provavelmente, passarão a ter desafios maiores ainda, incluindo tentar conter as rebeldias coletivas decorrentes da implantação, sem discussões e esclarecimentos prévios, de soluções advindas de fora do ambiente escolar.

Ainda que o projeto inclua também o setor privado, na prática as escolas privadas, certamente, permanecerão fazendo uso mais intenso das tecnologias digitais, explorando adequadamente as brechas permissivas. A consequência será um cenário de distanciamento ainda maior entre os alunos das escolas privadas, em comparação com os do setor público, em termos de aprendizagem e de preparação para a vida.

Este complexo problema educacional deveria ser visto como uma oportunidade ímpar de ampliar a capacidade de reflexão sobre a relevância do letramento digital com ênfase no aprender a aprender, por meio de uma educação híbrida, flexível e personalizada. Por outro lado, a implementação precipitada desse projeto resultará, para os educandos, na exclusão definitiva de oportunidades de contato qualificado com as principais ferramentas de aprendizagem permanentes ao longo de toda a vida.

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O mundo do trabalho atual demanda competências digitais em todos os níveis e em todas as áreas de atuação profissional. Sendo a escola um relevante espaço de letramento digital qualificado, qualquer incremento na exclusão digital amplificará ainda mais a discrepância, em termos de oportunidades futuras, entre as diversas camadas sociais de um dos países mais injustos e desiguais do planeta.

Em suma, são pertinentes as preocupações com o uso excessivo e não educacional de celulares em ambientes escolares. No entanto, os celulares são partes integrantes indispensáveis da educação contemporânea, especialmente num país como o Brasil, onde a única possibilidade de inclusão e letramento no mundo digital passa pela escola. A opção simplista de abolir os celulares sem planos ou estímulos explícitos ao seu uso qualificado nas escolas pode ter resultados nefastos e excludentes de toda uma geração.

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SÃO, RESPECTIVAMENTE, SENADOR DA REPÚBLICA/MS (2016-2019), RELATOR DO PROJETO DA BNCC NO SENADO FEDERAL, EX-REITOR DA UNIDERP; E PROFESSOR DA FACULDADE INSTED E EX-SECRETÁRIO NACIONAL DA EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA DO MEC

O Congresso Nacional recentemente aprovou o Projeto de Lei n.º 4.932/2024, que regulamenta o uso de aparelhos portáteis, como celulares, por estudantes da educação básica. O próximo passo é a sanção presidencial. Trata-se de uma tentativa de resposta simples às complexas preocupações educacionais associadas.

Os argumentos da iniciativa são consistentes, evidenciados pelo aumento da distração no ambiente educacional, pela exposição descontrolada dos alunos a conteúdos inadequados, pelos prejuízos à sadia interação social, especialmente entre crianças e jovens, e pela ansiedade generalizada decorrente da hiperconectividade, causadora de uma epidemia de transtornos mentais.

Esses elementos estão igualmente presentes em cenas comuns de casais ou famílias realizando suas refeições, com cada qual prestando atenção somente no seu celular, em reuniões de trabalho em ambientes empresariais, com a maioria dos participantes focada em seus próprios aparelhos, e até mesmo no Congresso Nacional, com os parlamentares fixados em suas respectivas telas enquanto um deles discursa.

A questão, portanto, deixa de ser exclusivamente de mérito formal do projeto de lei, mas sim de pertinência educacional, do processo de implementação e suas consequências em países com o nosso perfil. Educacionalmente, temos sido incapazes até aqui de promovermos uma inclusão digital de qualidade, contemplando as parcelas mais carentes da população, explorando o potencial de aprendizagem, em grande escala, associado aos ambientes virtuais de aprendizagem.

Na prática, podemos estar desobrigando os governos de garantir o prometido acesso digital no ambiente escolar. No caso brasileiro, tal acesso é ausente no ambiente doméstico da maioria dos alunos. Estamos reforçando nossa incapacidade de oferecer repositórios públicos com conteúdo digital educacional de qualidade, incluindo o acesso a laboratórios virtuais portáteis, especialmente aqueles acoplados ao mundo das inteligências artificiais, e demais ferramentas potencialmente promotoras de aprendizagem contemporânea, emancipadora e colaborativa.

Cabe destacar que os exemplos de outros países onde iniciativas similares estão logrando sucesso, na sua totalidade, são contextos em que os alunos têm plena abundância de possibilidades de acesso digital. Tanto em qualidade de sinal quando retornam para casa como em conteúdo digital educacional oferecido, além de maior escolaridade média dos pais, o que facilita a aprendizagem digital. Estabelecer paralelos com o Brasil é, de fato, comparar situações e oportunidades não comparáveis.

Ainda que formalmente estejam contemplados usos eventuais pedagógicos de celulares em sala de aula, é inegável o recado subjacente de descompromisso crescente com a inclusão digital nas escolas. Estamos tratando, em geral, de gestores educacionais sobrecarregados e de professores sem formação específica para lidar com ambientes virtuais de aprendizagem, permeáveis, portanto, à ilusão de que terão um problema a menos adiante. Provavelmente, passarão a ter desafios maiores ainda, incluindo tentar conter as rebeldias coletivas decorrentes da implantação, sem discussões e esclarecimentos prévios, de soluções advindas de fora do ambiente escolar.

Ainda que o projeto inclua também o setor privado, na prática as escolas privadas, certamente, permanecerão fazendo uso mais intenso das tecnologias digitais, explorando adequadamente as brechas permissivas. A consequência será um cenário de distanciamento ainda maior entre os alunos das escolas privadas, em comparação com os do setor público, em termos de aprendizagem e de preparação para a vida.

Este complexo problema educacional deveria ser visto como uma oportunidade ímpar de ampliar a capacidade de reflexão sobre a relevância do letramento digital com ênfase no aprender a aprender, por meio de uma educação híbrida, flexível e personalizada. Por outro lado, a implementação precipitada desse projeto resultará, para os educandos, na exclusão definitiva de oportunidades de contato qualificado com as principais ferramentas de aprendizagem permanentes ao longo de toda a vida.

O mundo do trabalho atual demanda competências digitais em todos os níveis e em todas as áreas de atuação profissional. Sendo a escola um relevante espaço de letramento digital qualificado, qualquer incremento na exclusão digital amplificará ainda mais a discrepância, em termos de oportunidades futuras, entre as diversas camadas sociais de um dos países mais injustos e desiguais do planeta.

Em suma, são pertinentes as preocupações com o uso excessivo e não educacional de celulares em ambientes escolares. No entanto, os celulares são partes integrantes indispensáveis da educação contemporânea, especialmente num país como o Brasil, onde a única possibilidade de inclusão e letramento no mundo digital passa pela escola. A opção simplista de abolir os celulares sem planos ou estímulos explícitos ao seu uso qualificado nas escolas pode ter resultados nefastos e excludentes de toda uma geração.

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SÃO, RESPECTIVAMENTE, SENADOR DA REPÚBLICA/MS (2016-2019), RELATOR DO PROJETO DA BNCC NO SENADO FEDERAL, EX-REITOR DA UNIDERP; E PROFESSOR DA FACULDADE INSTED E EX-SECRETÁRIO NACIONAL DA EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA DO MEC

O Congresso Nacional recentemente aprovou o Projeto de Lei n.º 4.932/2024, que regulamenta o uso de aparelhos portáteis, como celulares, por estudantes da educação básica. O próximo passo é a sanção presidencial. Trata-se de uma tentativa de resposta simples às complexas preocupações educacionais associadas.

Os argumentos da iniciativa são consistentes, evidenciados pelo aumento da distração no ambiente educacional, pela exposição descontrolada dos alunos a conteúdos inadequados, pelos prejuízos à sadia interação social, especialmente entre crianças e jovens, e pela ansiedade generalizada decorrente da hiperconectividade, causadora de uma epidemia de transtornos mentais.

Esses elementos estão igualmente presentes em cenas comuns de casais ou famílias realizando suas refeições, com cada qual prestando atenção somente no seu celular, em reuniões de trabalho em ambientes empresariais, com a maioria dos participantes focada em seus próprios aparelhos, e até mesmo no Congresso Nacional, com os parlamentares fixados em suas respectivas telas enquanto um deles discursa.

A questão, portanto, deixa de ser exclusivamente de mérito formal do projeto de lei, mas sim de pertinência educacional, do processo de implementação e suas consequências em países com o nosso perfil. Educacionalmente, temos sido incapazes até aqui de promovermos uma inclusão digital de qualidade, contemplando as parcelas mais carentes da população, explorando o potencial de aprendizagem, em grande escala, associado aos ambientes virtuais de aprendizagem.

Na prática, podemos estar desobrigando os governos de garantir o prometido acesso digital no ambiente escolar. No caso brasileiro, tal acesso é ausente no ambiente doméstico da maioria dos alunos. Estamos reforçando nossa incapacidade de oferecer repositórios públicos com conteúdo digital educacional de qualidade, incluindo o acesso a laboratórios virtuais portáteis, especialmente aqueles acoplados ao mundo das inteligências artificiais, e demais ferramentas potencialmente promotoras de aprendizagem contemporânea, emancipadora e colaborativa.

Cabe destacar que os exemplos de outros países onde iniciativas similares estão logrando sucesso, na sua totalidade, são contextos em que os alunos têm plena abundância de possibilidades de acesso digital. Tanto em qualidade de sinal quando retornam para casa como em conteúdo digital educacional oferecido, além de maior escolaridade média dos pais, o que facilita a aprendizagem digital. Estabelecer paralelos com o Brasil é, de fato, comparar situações e oportunidades não comparáveis.

Ainda que formalmente estejam contemplados usos eventuais pedagógicos de celulares em sala de aula, é inegável o recado subjacente de descompromisso crescente com a inclusão digital nas escolas. Estamos tratando, em geral, de gestores educacionais sobrecarregados e de professores sem formação específica para lidar com ambientes virtuais de aprendizagem, permeáveis, portanto, à ilusão de que terão um problema a menos adiante. Provavelmente, passarão a ter desafios maiores ainda, incluindo tentar conter as rebeldias coletivas decorrentes da implantação, sem discussões e esclarecimentos prévios, de soluções advindas de fora do ambiente escolar.

Ainda que o projeto inclua também o setor privado, na prática as escolas privadas, certamente, permanecerão fazendo uso mais intenso das tecnologias digitais, explorando adequadamente as brechas permissivas. A consequência será um cenário de distanciamento ainda maior entre os alunos das escolas privadas, em comparação com os do setor público, em termos de aprendizagem e de preparação para a vida.

Este complexo problema educacional deveria ser visto como uma oportunidade ímpar de ampliar a capacidade de reflexão sobre a relevância do letramento digital com ênfase no aprender a aprender, por meio de uma educação híbrida, flexível e personalizada. Por outro lado, a implementação precipitada desse projeto resultará, para os educandos, na exclusão definitiva de oportunidades de contato qualificado com as principais ferramentas de aprendizagem permanentes ao longo de toda a vida.

O mundo do trabalho atual demanda competências digitais em todos os níveis e em todas as áreas de atuação profissional. Sendo a escola um relevante espaço de letramento digital qualificado, qualquer incremento na exclusão digital amplificará ainda mais a discrepância, em termos de oportunidades futuras, entre as diversas camadas sociais de um dos países mais injustos e desiguais do planeta.

Em suma, são pertinentes as preocupações com o uso excessivo e não educacional de celulares em ambientes escolares. No entanto, os celulares são partes integrantes indispensáveis da educação contemporânea, especialmente num país como o Brasil, onde a única possibilidade de inclusão e letramento no mundo digital passa pela escola. A opção simplista de abolir os celulares sem planos ou estímulos explícitos ao seu uso qualificado nas escolas pode ter resultados nefastos e excludentes de toda uma geração.

*

SÃO, RESPECTIVAMENTE, SENADOR DA REPÚBLICA/MS (2016-2019), RELATOR DO PROJETO DA BNCC NO SENADO FEDERAL, EX-REITOR DA UNIDERP; E PROFESSOR DA FACULDADE INSTED E EX-SECRETÁRIO NACIONAL DA EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA DO MEC

Opinião por Pedro Chaves

Senador da República/MS (2016-2019), relator do Projeto da BNCC no Senado Federal, foi reitor da Uniderp

Ronaldo Mota

Professor da Faculdade Insted, foi secretário nacional da Educação a Distância do MEC

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