Opinião|Cobrar não é resolver


A cada reconhecimento de ‘ocupação consolidada’, é um número incalculável de viventes e nascituros que não terão como sobreviver em terras paulistanas

Por José Renato Nalini

Problemas recorrentes são o atestado de que a sociedade brasileira está muito longe de um estágio civilizatório compatível com os anseios nacionais. A catástrofe do Rio Grande do Sul mostrou que as mudanças climáticas estão aí. Fenômenos semelhantes poderão acontecer em qualquer outro lugar. O poder público, por si só, é impotente para resolver todas as questões.

Primeiro: reverter o estágio atual do planeta, esfriando-o, ainda é missão impossível. Ainda que a emissão de dióxido de carbono e dos demais gases e partículas venenosas que empesteiam a atmosfera e causam o efeito estufa zerasse hoje, o mundo continuaria doente. O acúmulo das emissões demoraria décadas – ou até séculos – para fazer com que a Terra se tornasse novamente saudável.

Existe cobrança da mídia e dos órgãos de fiscalização e controle. Mas cobrar é insuficiente. Será que o papel desses organismos é só exigir, criticar e sancionar? É-lhes vedado contribuir com propostas factíveis?

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Algumas situações ensejariam uma serena reflexão por parte de toda a sociedade. Não apenas Ministério Público, Tribunais de Contas, mídia espontânea. Mas também a universidade, o terceiro setor, o empresariado, as associações beneméritas, a inteligência e a lucidez brasileira a serviço das soluções, muito além das reclamações.

Somos pródigos em normatizar. Existe um Plano Municipal de Redução de Riscos (PMRR). Sua elaboração tardou porque existem espaços em que a Prefeitura não pode entrar, porque dominados pela criminalidade organizada. A municipalidade ofertou ao Tribunal de Justiça a relação dos territórios em que a pesquisa foi inviabilizada. Esse documento está de posse da corte bandeirante, acionada pelo Ministério Público.

Nós, da área jurídica, sabemos bem o que significa o princípio ad impossibilia nemo tenetur. O que fazer para enfrentar tal situação?

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Profissionais técnicos municipais, como engenheiros e geólogos, foram hostilizados e sofreram com a desconfiança da população em alguns lugares. Em outros, os voos de drones foram cancelados, por oposição dos moradores. Será que os detratores, os cobradores, os fiscalizadores têm algum plano B, que enfrente a dificuldade da Prefeitura?

Técnicos que foram plantar em uma área cinzenta, desprovida de verde, também foram obstaculizados por pessoas que impediram o plantio. Essa “ojeriza pelo verde” é mais disseminada do que se possa supor. Qual o remédio para isso, embora se saiba que a cidade de São Paulo perdeu 2 milhões de árvores no extremo sul, onde está a região dos mananciais mais ameaçados?

Não se desconhece que as invasões naquela região onde ainda existe resíduo da Mata Atlântica exterminam as nascentes, destroem a cobertura vegetal, constituem concreto e grave risco de ocorrência de outra crise hídrica, esta mais severa do que a de 2014. Qual a proposta que a sociedade e seus órgãos fiscalizadores oferecem para o município?

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A chamada Operação Integrada de Defesa das Águas (Oida) luta com dificuldades de efetivo e esbarra na incompreensão daqueles que não conseguem distinguir a hierarquia ontológica do direito à moradia, que é fundamental, sim, mas se subordina à essencialidade do direito à vida. Análise tópica de cada caso, a tendência magnânima de premiar quem não tem casa coloca em risco concreto uma legião de seres humanos que ficarão sem água. Há porções de solo paulistano que são insuscetíveis de sediar habitação. Muito simples assim.

A cada transigência, a cada reconhecimento de “ocupação consolidada”, a cada tese do “fato consumado”, é um número incalculável de viventes e de nascituros que não terão como sobreviver em terras paulistanas.

Nas inspeções que os sacrificados partícipes da Oida fazem aos espaços sob crescente e incessante ocupação, com empreendimentos irregulares, clandestinos e criminosos, verifica-se a redução da área verde, imprescindível à saúde das nascentes. A contaminação do sistema Guarapiranga-Billings já é um fato. Será insolúvel esse conflito entre o direito e a ilicitude? Serão invencíveis os infratores que persistem no extermínio do que resta de floresta e na eliminação dos mananciais?

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Se a situação atingiu tal estágio de inobservância do sofisticado acervo normativo que deriva do artigo 225 da Constituição da República, não seria o caso de uma arregimentação de todos os interessados e da elaboração de algo mais viável do que requerer, denunciar, peticionar, recorrer, reiterar, ameaçar, sancionar?

O Plano Preventivo de Chuvas de Verão (PPCV) da Prefeitura de São Paulo funcionou. É iniciativa exitosa. Já a Oida, em defesa das águas, precisa de reforço. E seria conveniente que a atuação tópica das instituições que demandam se conjugasse num projeto abrangente, que também propiciasse os instrumentos imprescindíveis ao enfrentamento de um perigo concreto, gravíssimo e que afeta a todos.

Denunciar, reclamar, exigir soluções não é o bastante. É preciso resolver. Para isso, o chamamento à razão e a participação de todos, inclusive os que não se consideram parte do problema, é mais do que urgente.

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REITOR DA UNIREGISTRAL, DOCENTE DA PÓS-GRADUAÇÃO DA UNINOVE, É SECRETÁRIO-EXECUTIVO DAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS DE SÃO PAULO

Problemas recorrentes são o atestado de que a sociedade brasileira está muito longe de um estágio civilizatório compatível com os anseios nacionais. A catástrofe do Rio Grande do Sul mostrou que as mudanças climáticas estão aí. Fenômenos semelhantes poderão acontecer em qualquer outro lugar. O poder público, por si só, é impotente para resolver todas as questões.

Primeiro: reverter o estágio atual do planeta, esfriando-o, ainda é missão impossível. Ainda que a emissão de dióxido de carbono e dos demais gases e partículas venenosas que empesteiam a atmosfera e causam o efeito estufa zerasse hoje, o mundo continuaria doente. O acúmulo das emissões demoraria décadas – ou até séculos – para fazer com que a Terra se tornasse novamente saudável.

Existe cobrança da mídia e dos órgãos de fiscalização e controle. Mas cobrar é insuficiente. Será que o papel desses organismos é só exigir, criticar e sancionar? É-lhes vedado contribuir com propostas factíveis?

Algumas situações ensejariam uma serena reflexão por parte de toda a sociedade. Não apenas Ministério Público, Tribunais de Contas, mídia espontânea. Mas também a universidade, o terceiro setor, o empresariado, as associações beneméritas, a inteligência e a lucidez brasileira a serviço das soluções, muito além das reclamações.

Somos pródigos em normatizar. Existe um Plano Municipal de Redução de Riscos (PMRR). Sua elaboração tardou porque existem espaços em que a Prefeitura não pode entrar, porque dominados pela criminalidade organizada. A municipalidade ofertou ao Tribunal de Justiça a relação dos territórios em que a pesquisa foi inviabilizada. Esse documento está de posse da corte bandeirante, acionada pelo Ministério Público.

Nós, da área jurídica, sabemos bem o que significa o princípio ad impossibilia nemo tenetur. O que fazer para enfrentar tal situação?

Profissionais técnicos municipais, como engenheiros e geólogos, foram hostilizados e sofreram com a desconfiança da população em alguns lugares. Em outros, os voos de drones foram cancelados, por oposição dos moradores. Será que os detratores, os cobradores, os fiscalizadores têm algum plano B, que enfrente a dificuldade da Prefeitura?

Técnicos que foram plantar em uma área cinzenta, desprovida de verde, também foram obstaculizados por pessoas que impediram o plantio. Essa “ojeriza pelo verde” é mais disseminada do que se possa supor. Qual o remédio para isso, embora se saiba que a cidade de São Paulo perdeu 2 milhões de árvores no extremo sul, onde está a região dos mananciais mais ameaçados?

Não se desconhece que as invasões naquela região onde ainda existe resíduo da Mata Atlântica exterminam as nascentes, destroem a cobertura vegetal, constituem concreto e grave risco de ocorrência de outra crise hídrica, esta mais severa do que a de 2014. Qual a proposta que a sociedade e seus órgãos fiscalizadores oferecem para o município?

A chamada Operação Integrada de Defesa das Águas (Oida) luta com dificuldades de efetivo e esbarra na incompreensão daqueles que não conseguem distinguir a hierarquia ontológica do direito à moradia, que é fundamental, sim, mas se subordina à essencialidade do direito à vida. Análise tópica de cada caso, a tendência magnânima de premiar quem não tem casa coloca em risco concreto uma legião de seres humanos que ficarão sem água. Há porções de solo paulistano que são insuscetíveis de sediar habitação. Muito simples assim.

A cada transigência, a cada reconhecimento de “ocupação consolidada”, a cada tese do “fato consumado”, é um número incalculável de viventes e de nascituros que não terão como sobreviver em terras paulistanas.

Nas inspeções que os sacrificados partícipes da Oida fazem aos espaços sob crescente e incessante ocupação, com empreendimentos irregulares, clandestinos e criminosos, verifica-se a redução da área verde, imprescindível à saúde das nascentes. A contaminação do sistema Guarapiranga-Billings já é um fato. Será insolúvel esse conflito entre o direito e a ilicitude? Serão invencíveis os infratores que persistem no extermínio do que resta de floresta e na eliminação dos mananciais?

Se a situação atingiu tal estágio de inobservância do sofisticado acervo normativo que deriva do artigo 225 da Constituição da República, não seria o caso de uma arregimentação de todos os interessados e da elaboração de algo mais viável do que requerer, denunciar, peticionar, recorrer, reiterar, ameaçar, sancionar?

O Plano Preventivo de Chuvas de Verão (PPCV) da Prefeitura de São Paulo funcionou. É iniciativa exitosa. Já a Oida, em defesa das águas, precisa de reforço. E seria conveniente que a atuação tópica das instituições que demandam se conjugasse num projeto abrangente, que também propiciasse os instrumentos imprescindíveis ao enfrentamento de um perigo concreto, gravíssimo e que afeta a todos.

Denunciar, reclamar, exigir soluções não é o bastante. É preciso resolver. Para isso, o chamamento à razão e a participação de todos, inclusive os que não se consideram parte do problema, é mais do que urgente.

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REITOR DA UNIREGISTRAL, DOCENTE DA PÓS-GRADUAÇÃO DA UNINOVE, É SECRETÁRIO-EXECUTIVO DAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS DE SÃO PAULO

Problemas recorrentes são o atestado de que a sociedade brasileira está muito longe de um estágio civilizatório compatível com os anseios nacionais. A catástrofe do Rio Grande do Sul mostrou que as mudanças climáticas estão aí. Fenômenos semelhantes poderão acontecer em qualquer outro lugar. O poder público, por si só, é impotente para resolver todas as questões.

Primeiro: reverter o estágio atual do planeta, esfriando-o, ainda é missão impossível. Ainda que a emissão de dióxido de carbono e dos demais gases e partículas venenosas que empesteiam a atmosfera e causam o efeito estufa zerasse hoje, o mundo continuaria doente. O acúmulo das emissões demoraria décadas – ou até séculos – para fazer com que a Terra se tornasse novamente saudável.

Existe cobrança da mídia e dos órgãos de fiscalização e controle. Mas cobrar é insuficiente. Será que o papel desses organismos é só exigir, criticar e sancionar? É-lhes vedado contribuir com propostas factíveis?

Algumas situações ensejariam uma serena reflexão por parte de toda a sociedade. Não apenas Ministério Público, Tribunais de Contas, mídia espontânea. Mas também a universidade, o terceiro setor, o empresariado, as associações beneméritas, a inteligência e a lucidez brasileira a serviço das soluções, muito além das reclamações.

Somos pródigos em normatizar. Existe um Plano Municipal de Redução de Riscos (PMRR). Sua elaboração tardou porque existem espaços em que a Prefeitura não pode entrar, porque dominados pela criminalidade organizada. A municipalidade ofertou ao Tribunal de Justiça a relação dos territórios em que a pesquisa foi inviabilizada. Esse documento está de posse da corte bandeirante, acionada pelo Ministério Público.

Nós, da área jurídica, sabemos bem o que significa o princípio ad impossibilia nemo tenetur. O que fazer para enfrentar tal situação?

Profissionais técnicos municipais, como engenheiros e geólogos, foram hostilizados e sofreram com a desconfiança da população em alguns lugares. Em outros, os voos de drones foram cancelados, por oposição dos moradores. Será que os detratores, os cobradores, os fiscalizadores têm algum plano B, que enfrente a dificuldade da Prefeitura?

Técnicos que foram plantar em uma área cinzenta, desprovida de verde, também foram obstaculizados por pessoas que impediram o plantio. Essa “ojeriza pelo verde” é mais disseminada do que se possa supor. Qual o remédio para isso, embora se saiba que a cidade de São Paulo perdeu 2 milhões de árvores no extremo sul, onde está a região dos mananciais mais ameaçados?

Não se desconhece que as invasões naquela região onde ainda existe resíduo da Mata Atlântica exterminam as nascentes, destroem a cobertura vegetal, constituem concreto e grave risco de ocorrência de outra crise hídrica, esta mais severa do que a de 2014. Qual a proposta que a sociedade e seus órgãos fiscalizadores oferecem para o município?

A chamada Operação Integrada de Defesa das Águas (Oida) luta com dificuldades de efetivo e esbarra na incompreensão daqueles que não conseguem distinguir a hierarquia ontológica do direito à moradia, que é fundamental, sim, mas se subordina à essencialidade do direito à vida. Análise tópica de cada caso, a tendência magnânima de premiar quem não tem casa coloca em risco concreto uma legião de seres humanos que ficarão sem água. Há porções de solo paulistano que são insuscetíveis de sediar habitação. Muito simples assim.

A cada transigência, a cada reconhecimento de “ocupação consolidada”, a cada tese do “fato consumado”, é um número incalculável de viventes e de nascituros que não terão como sobreviver em terras paulistanas.

Nas inspeções que os sacrificados partícipes da Oida fazem aos espaços sob crescente e incessante ocupação, com empreendimentos irregulares, clandestinos e criminosos, verifica-se a redução da área verde, imprescindível à saúde das nascentes. A contaminação do sistema Guarapiranga-Billings já é um fato. Será insolúvel esse conflito entre o direito e a ilicitude? Serão invencíveis os infratores que persistem no extermínio do que resta de floresta e na eliminação dos mananciais?

Se a situação atingiu tal estágio de inobservância do sofisticado acervo normativo que deriva do artigo 225 da Constituição da República, não seria o caso de uma arregimentação de todos os interessados e da elaboração de algo mais viável do que requerer, denunciar, peticionar, recorrer, reiterar, ameaçar, sancionar?

O Plano Preventivo de Chuvas de Verão (PPCV) da Prefeitura de São Paulo funcionou. É iniciativa exitosa. Já a Oida, em defesa das águas, precisa de reforço. E seria conveniente que a atuação tópica das instituições que demandam se conjugasse num projeto abrangente, que também propiciasse os instrumentos imprescindíveis ao enfrentamento de um perigo concreto, gravíssimo e que afeta a todos.

Denunciar, reclamar, exigir soluções não é o bastante. É preciso resolver. Para isso, o chamamento à razão e a participação de todos, inclusive os que não se consideram parte do problema, é mais do que urgente.

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REITOR DA UNIREGISTRAL, DOCENTE DA PÓS-GRADUAÇÃO DA UNINOVE, É SECRETÁRIO-EXECUTIVO DAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS DE SÃO PAULO

Problemas recorrentes são o atestado de que a sociedade brasileira está muito longe de um estágio civilizatório compatível com os anseios nacionais. A catástrofe do Rio Grande do Sul mostrou que as mudanças climáticas estão aí. Fenômenos semelhantes poderão acontecer em qualquer outro lugar. O poder público, por si só, é impotente para resolver todas as questões.

Primeiro: reverter o estágio atual do planeta, esfriando-o, ainda é missão impossível. Ainda que a emissão de dióxido de carbono e dos demais gases e partículas venenosas que empesteiam a atmosfera e causam o efeito estufa zerasse hoje, o mundo continuaria doente. O acúmulo das emissões demoraria décadas – ou até séculos – para fazer com que a Terra se tornasse novamente saudável.

Existe cobrança da mídia e dos órgãos de fiscalização e controle. Mas cobrar é insuficiente. Será que o papel desses organismos é só exigir, criticar e sancionar? É-lhes vedado contribuir com propostas factíveis?

Algumas situações ensejariam uma serena reflexão por parte de toda a sociedade. Não apenas Ministério Público, Tribunais de Contas, mídia espontânea. Mas também a universidade, o terceiro setor, o empresariado, as associações beneméritas, a inteligência e a lucidez brasileira a serviço das soluções, muito além das reclamações.

Somos pródigos em normatizar. Existe um Plano Municipal de Redução de Riscos (PMRR). Sua elaboração tardou porque existem espaços em que a Prefeitura não pode entrar, porque dominados pela criminalidade organizada. A municipalidade ofertou ao Tribunal de Justiça a relação dos territórios em que a pesquisa foi inviabilizada. Esse documento está de posse da corte bandeirante, acionada pelo Ministério Público.

Nós, da área jurídica, sabemos bem o que significa o princípio ad impossibilia nemo tenetur. O que fazer para enfrentar tal situação?

Profissionais técnicos municipais, como engenheiros e geólogos, foram hostilizados e sofreram com a desconfiança da população em alguns lugares. Em outros, os voos de drones foram cancelados, por oposição dos moradores. Será que os detratores, os cobradores, os fiscalizadores têm algum plano B, que enfrente a dificuldade da Prefeitura?

Técnicos que foram plantar em uma área cinzenta, desprovida de verde, também foram obstaculizados por pessoas que impediram o plantio. Essa “ojeriza pelo verde” é mais disseminada do que se possa supor. Qual o remédio para isso, embora se saiba que a cidade de São Paulo perdeu 2 milhões de árvores no extremo sul, onde está a região dos mananciais mais ameaçados?

Não se desconhece que as invasões naquela região onde ainda existe resíduo da Mata Atlântica exterminam as nascentes, destroem a cobertura vegetal, constituem concreto e grave risco de ocorrência de outra crise hídrica, esta mais severa do que a de 2014. Qual a proposta que a sociedade e seus órgãos fiscalizadores oferecem para o município?

A chamada Operação Integrada de Defesa das Águas (Oida) luta com dificuldades de efetivo e esbarra na incompreensão daqueles que não conseguem distinguir a hierarquia ontológica do direito à moradia, que é fundamental, sim, mas se subordina à essencialidade do direito à vida. Análise tópica de cada caso, a tendência magnânima de premiar quem não tem casa coloca em risco concreto uma legião de seres humanos que ficarão sem água. Há porções de solo paulistano que são insuscetíveis de sediar habitação. Muito simples assim.

A cada transigência, a cada reconhecimento de “ocupação consolidada”, a cada tese do “fato consumado”, é um número incalculável de viventes e de nascituros que não terão como sobreviver em terras paulistanas.

Nas inspeções que os sacrificados partícipes da Oida fazem aos espaços sob crescente e incessante ocupação, com empreendimentos irregulares, clandestinos e criminosos, verifica-se a redução da área verde, imprescindível à saúde das nascentes. A contaminação do sistema Guarapiranga-Billings já é um fato. Será insolúvel esse conflito entre o direito e a ilicitude? Serão invencíveis os infratores que persistem no extermínio do que resta de floresta e na eliminação dos mananciais?

Se a situação atingiu tal estágio de inobservância do sofisticado acervo normativo que deriva do artigo 225 da Constituição da República, não seria o caso de uma arregimentação de todos os interessados e da elaboração de algo mais viável do que requerer, denunciar, peticionar, recorrer, reiterar, ameaçar, sancionar?

O Plano Preventivo de Chuvas de Verão (PPCV) da Prefeitura de São Paulo funcionou. É iniciativa exitosa. Já a Oida, em defesa das águas, precisa de reforço. E seria conveniente que a atuação tópica das instituições que demandam se conjugasse num projeto abrangente, que também propiciasse os instrumentos imprescindíveis ao enfrentamento de um perigo concreto, gravíssimo e que afeta a todos.

Denunciar, reclamar, exigir soluções não é o bastante. É preciso resolver. Para isso, o chamamento à razão e a participação de todos, inclusive os que não se consideram parte do problema, é mais do que urgente.

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REITOR DA UNIREGISTRAL, DOCENTE DA PÓS-GRADUAÇÃO DA UNINOVE, É SECRETÁRIO-EXECUTIVO DAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS DE SÃO PAULO

Problemas recorrentes são o atestado de que a sociedade brasileira está muito longe de um estágio civilizatório compatível com os anseios nacionais. A catástrofe do Rio Grande do Sul mostrou que as mudanças climáticas estão aí. Fenômenos semelhantes poderão acontecer em qualquer outro lugar. O poder público, por si só, é impotente para resolver todas as questões.

Primeiro: reverter o estágio atual do planeta, esfriando-o, ainda é missão impossível. Ainda que a emissão de dióxido de carbono e dos demais gases e partículas venenosas que empesteiam a atmosfera e causam o efeito estufa zerasse hoje, o mundo continuaria doente. O acúmulo das emissões demoraria décadas – ou até séculos – para fazer com que a Terra se tornasse novamente saudável.

Existe cobrança da mídia e dos órgãos de fiscalização e controle. Mas cobrar é insuficiente. Será que o papel desses organismos é só exigir, criticar e sancionar? É-lhes vedado contribuir com propostas factíveis?

Algumas situações ensejariam uma serena reflexão por parte de toda a sociedade. Não apenas Ministério Público, Tribunais de Contas, mídia espontânea. Mas também a universidade, o terceiro setor, o empresariado, as associações beneméritas, a inteligência e a lucidez brasileira a serviço das soluções, muito além das reclamações.

Somos pródigos em normatizar. Existe um Plano Municipal de Redução de Riscos (PMRR). Sua elaboração tardou porque existem espaços em que a Prefeitura não pode entrar, porque dominados pela criminalidade organizada. A municipalidade ofertou ao Tribunal de Justiça a relação dos territórios em que a pesquisa foi inviabilizada. Esse documento está de posse da corte bandeirante, acionada pelo Ministério Público.

Nós, da área jurídica, sabemos bem o que significa o princípio ad impossibilia nemo tenetur. O que fazer para enfrentar tal situação?

Profissionais técnicos municipais, como engenheiros e geólogos, foram hostilizados e sofreram com a desconfiança da população em alguns lugares. Em outros, os voos de drones foram cancelados, por oposição dos moradores. Será que os detratores, os cobradores, os fiscalizadores têm algum plano B, que enfrente a dificuldade da Prefeitura?

Técnicos que foram plantar em uma área cinzenta, desprovida de verde, também foram obstaculizados por pessoas que impediram o plantio. Essa “ojeriza pelo verde” é mais disseminada do que se possa supor. Qual o remédio para isso, embora se saiba que a cidade de São Paulo perdeu 2 milhões de árvores no extremo sul, onde está a região dos mananciais mais ameaçados?

Não se desconhece que as invasões naquela região onde ainda existe resíduo da Mata Atlântica exterminam as nascentes, destroem a cobertura vegetal, constituem concreto e grave risco de ocorrência de outra crise hídrica, esta mais severa do que a de 2014. Qual a proposta que a sociedade e seus órgãos fiscalizadores oferecem para o município?

A chamada Operação Integrada de Defesa das Águas (Oida) luta com dificuldades de efetivo e esbarra na incompreensão daqueles que não conseguem distinguir a hierarquia ontológica do direito à moradia, que é fundamental, sim, mas se subordina à essencialidade do direito à vida. Análise tópica de cada caso, a tendência magnânima de premiar quem não tem casa coloca em risco concreto uma legião de seres humanos que ficarão sem água. Há porções de solo paulistano que são insuscetíveis de sediar habitação. Muito simples assim.

A cada transigência, a cada reconhecimento de “ocupação consolidada”, a cada tese do “fato consumado”, é um número incalculável de viventes e de nascituros que não terão como sobreviver em terras paulistanas.

Nas inspeções que os sacrificados partícipes da Oida fazem aos espaços sob crescente e incessante ocupação, com empreendimentos irregulares, clandestinos e criminosos, verifica-se a redução da área verde, imprescindível à saúde das nascentes. A contaminação do sistema Guarapiranga-Billings já é um fato. Será insolúvel esse conflito entre o direito e a ilicitude? Serão invencíveis os infratores que persistem no extermínio do que resta de floresta e na eliminação dos mananciais?

Se a situação atingiu tal estágio de inobservância do sofisticado acervo normativo que deriva do artigo 225 da Constituição da República, não seria o caso de uma arregimentação de todos os interessados e da elaboração de algo mais viável do que requerer, denunciar, peticionar, recorrer, reiterar, ameaçar, sancionar?

O Plano Preventivo de Chuvas de Verão (PPCV) da Prefeitura de São Paulo funcionou. É iniciativa exitosa. Já a Oida, em defesa das águas, precisa de reforço. E seria conveniente que a atuação tópica das instituições que demandam se conjugasse num projeto abrangente, que também propiciasse os instrumentos imprescindíveis ao enfrentamento de um perigo concreto, gravíssimo e que afeta a todos.

Denunciar, reclamar, exigir soluções não é o bastante. É preciso resolver. Para isso, o chamamento à razão e a participação de todos, inclusive os que não se consideram parte do problema, é mais do que urgente.

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REITOR DA UNIREGISTRAL, DOCENTE DA PÓS-GRADUAÇÃO DA UNINOVE, É SECRETÁRIO-EXECUTIVO DAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS DE SÃO PAULO

Opinião por José Renato Nalini

Reitor da Uniregistral, docente da pós-graduação da Uninove, é secretário-executivo das Mudanças Climáticas de São Paulo

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