Opinião|Combustíveis no Brasil: como lidar com variações de preço no mercado internacional


País encontra-se numa encruzilhada onde querer segurar a inflação mantendo o desalinhamento dos preços pode trazer consequências negativas

Por Charles Laganá Putz

A recente escalada de tensões no Oriente Médio, iniciada com o ataque terrorista do Hamas contra Israel em 7 de outubro de 2023, e renovada com a tensão entra Irã e Israel, tem agitado o cenário global e nacional. Contrariando as expectativas de muitos, apesar desses conflitos intensos, o preço do petróleo não disparou, mantendo-se abaixo do que poderiam prever as circunstâncias. Essa estabilidade surpreendente é influenciada por uma complexa interação de fatores, incluindo a transformação da geopolítica e as dinâmicas do setor petrolífero, que têm servido como moderadores dos preços.

Entrando nas mudanças geopolíticas, podemos dizer que, no passado, os Estados Unidos eram os maiores importadores de petróleo. Hoje, embora ainda importem, são os maiores produtores mundiais e contam com o apoio do Canadá, o quarto maior produtor. A China, a principal importadora, mantém sólidas parcerias com a Rússia, segunda maior exportadora de petróleo, e com o Irã. A Arábia Saudita, maior exportadora e produtora de baixo custo, tem capacidade para aumentar rapidamente a oferta e poucos incentivos para permitir um aumento excessivo dos preços, o que poderia acelerar a transição para alternativas ao petróleo.

Diante desse cenário, os preços do petróleo estão significativamente mais baixos do que no passado, quando já estiveram por vários anos consecutivos num patamar que corrigido pela inflação rondaria os US$ 130 o barril e num pico atingiram US$ 200, comparados com um patamar de US$ 85 atualmente. Ou seja, a atual geopolítica e demais mecanismos do mercado têm funcionado como um freio, de modo que, mesmo que os conflitos se intensifiquem, não deveremos enfrentar novos choques de preços como os ocorridos anteriormente, quando os preços chegavam a duplicar ou quase triplicar.

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Embora os preços do petróleo estejam mais contidos do que em épocas anteriores, eles têm subido. No entanto, no Brasil, os preços dos derivados de petróleo permanecem há meses abaixo da paridade internacional. Apesar de ter havido algum alívio no final do ano passado e início deste ano, a defasagem voltou a se acentuar recentemente devido aos preços internacionais do petróleo e à valorização do câmbio. E é aqui que tem morado o perigo.

Recentemente o ex-presidente da Petrobras Jean Paul Prates declarou que a companhia não pretende ajustar agora os preços da gasolina e do diesel. Embora a contenção de preços possa ajudar temporariamente a conter a inflação, o que é louvável, ela carrega riscos significativos de desabastecimento e desestímulo ao investimento em capacidade de refino, além de ser prejudicial ao meio ambiente ao estimular o consumo de um produto altamente poluente e, indiretamente, desencorajar investimentos em energias alternativas.

O Brasil, apesar de ser um exportador de petróleo, não é autossuficiente em gasolina e diesel e precisa importar esses derivados. Quem, então, importará esses produtos a preços internacionais mais elevados para vender por menos no mercado doméstico? Empresas privadas dificilmente assumiriam tal encargo. Isso poderia levar ao desabastecimento de gasolina e diesel, ou forçar a Petrobras a importar esses derivados e revendê-los com prejuízo. Considerando as consequências negativas de um desabastecimento e o controle governamental sobre a Petrobras, é provável que essa última opção seja adotada. Lembrando que, conforme estipulado pela lei e pelo estatuto da Petrobras, a empresa deve operar sob condições de mercado, a menos que compensações sejam providenciadas pelo governo. Até o momento, não há indícios de que tais compensações se materializarão, e nem parece que o governo teria espaço em seu orçamento para fazê-las. Isso poderia levar a Petrobras a ser acionada juridicamente por seus acionistas, que se veriam prejudicados.

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Outra consequência negativa que a contenção de preços pode gerar, talvez até mais grave, apesar de menos perceptível, é a falta de investimentos em refino no Brasil. Naturalmente, ninguém vai querer investir bilhões para refinar petróleo se os preços internos são represados e têm que acompanhar os preços internacionais apenas quando caem, perdendo vendas para importados quando não o fazem. Sem esses investimentos, o País segue dependendo da Petrobras e de importações para atender suas demandas de derivados de petróleo.

Podemos citar entre grandes produtores de petróleo que adotam a prática de venda no mercado interno a preços inferiores aos internacionais a Venezuela. Sem entrar em detalhes, não parece ser um exemplo que gostaríamos de seguir. Por outro lado, Canadá e Noruega, apesar de serem grandes exportadores de petróleo, mantêm internamente uma paridade com os preços internacionais. Os EUA, como maior produtor e maior consumidor de petróleo, também. Parece-me que esses países têm um modelo que pode, no curto prazo e em algumas circunstâncias, comprometer a inflação, mas que no longo prazo obtêm resultados geralmente melhores para suas economias.

Em conclusão, o Brasil encontra-se em uma encruzilhada onde querer segurar a inflação mantendo o desalinhamento dos preços dos derivados de petróleo com o mercado global pode trazer consequências muito negativas. A Petrobras, no cerne dessa questão, deve navegar essas águas turbulentas com uma estratégia que concilie interesses públicos e corporativos, sob pena de enfrentar consequências legais e econômicas substanciais. E o Brasil precisa pensar em seu futuro, e não apenas em questões imediatistas.

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MEMBRO DO CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO DO IBEF-SP, DO GRUPO DIERBERGER, DO CHARTERED INSTITUTE OF ARBITRATORS EM LONDRES E DA MAKE-A-WISH, SÓCIO-FUNDADOR DA VERENA VENTURES, FOI PROFESSOR DA FGV EAESP

A recente escalada de tensões no Oriente Médio, iniciada com o ataque terrorista do Hamas contra Israel em 7 de outubro de 2023, e renovada com a tensão entra Irã e Israel, tem agitado o cenário global e nacional. Contrariando as expectativas de muitos, apesar desses conflitos intensos, o preço do petróleo não disparou, mantendo-se abaixo do que poderiam prever as circunstâncias. Essa estabilidade surpreendente é influenciada por uma complexa interação de fatores, incluindo a transformação da geopolítica e as dinâmicas do setor petrolífero, que têm servido como moderadores dos preços.

Entrando nas mudanças geopolíticas, podemos dizer que, no passado, os Estados Unidos eram os maiores importadores de petróleo. Hoje, embora ainda importem, são os maiores produtores mundiais e contam com o apoio do Canadá, o quarto maior produtor. A China, a principal importadora, mantém sólidas parcerias com a Rússia, segunda maior exportadora de petróleo, e com o Irã. A Arábia Saudita, maior exportadora e produtora de baixo custo, tem capacidade para aumentar rapidamente a oferta e poucos incentivos para permitir um aumento excessivo dos preços, o que poderia acelerar a transição para alternativas ao petróleo.

Diante desse cenário, os preços do petróleo estão significativamente mais baixos do que no passado, quando já estiveram por vários anos consecutivos num patamar que corrigido pela inflação rondaria os US$ 130 o barril e num pico atingiram US$ 200, comparados com um patamar de US$ 85 atualmente. Ou seja, a atual geopolítica e demais mecanismos do mercado têm funcionado como um freio, de modo que, mesmo que os conflitos se intensifiquem, não deveremos enfrentar novos choques de preços como os ocorridos anteriormente, quando os preços chegavam a duplicar ou quase triplicar.

Embora os preços do petróleo estejam mais contidos do que em épocas anteriores, eles têm subido. No entanto, no Brasil, os preços dos derivados de petróleo permanecem há meses abaixo da paridade internacional. Apesar de ter havido algum alívio no final do ano passado e início deste ano, a defasagem voltou a se acentuar recentemente devido aos preços internacionais do petróleo e à valorização do câmbio. E é aqui que tem morado o perigo.

Recentemente o ex-presidente da Petrobras Jean Paul Prates declarou que a companhia não pretende ajustar agora os preços da gasolina e do diesel. Embora a contenção de preços possa ajudar temporariamente a conter a inflação, o que é louvável, ela carrega riscos significativos de desabastecimento e desestímulo ao investimento em capacidade de refino, além de ser prejudicial ao meio ambiente ao estimular o consumo de um produto altamente poluente e, indiretamente, desencorajar investimentos em energias alternativas.

O Brasil, apesar de ser um exportador de petróleo, não é autossuficiente em gasolina e diesel e precisa importar esses derivados. Quem, então, importará esses produtos a preços internacionais mais elevados para vender por menos no mercado doméstico? Empresas privadas dificilmente assumiriam tal encargo. Isso poderia levar ao desabastecimento de gasolina e diesel, ou forçar a Petrobras a importar esses derivados e revendê-los com prejuízo. Considerando as consequências negativas de um desabastecimento e o controle governamental sobre a Petrobras, é provável que essa última opção seja adotada. Lembrando que, conforme estipulado pela lei e pelo estatuto da Petrobras, a empresa deve operar sob condições de mercado, a menos que compensações sejam providenciadas pelo governo. Até o momento, não há indícios de que tais compensações se materializarão, e nem parece que o governo teria espaço em seu orçamento para fazê-las. Isso poderia levar a Petrobras a ser acionada juridicamente por seus acionistas, que se veriam prejudicados.

Outra consequência negativa que a contenção de preços pode gerar, talvez até mais grave, apesar de menos perceptível, é a falta de investimentos em refino no Brasil. Naturalmente, ninguém vai querer investir bilhões para refinar petróleo se os preços internos são represados e têm que acompanhar os preços internacionais apenas quando caem, perdendo vendas para importados quando não o fazem. Sem esses investimentos, o País segue dependendo da Petrobras e de importações para atender suas demandas de derivados de petróleo.

Podemos citar entre grandes produtores de petróleo que adotam a prática de venda no mercado interno a preços inferiores aos internacionais a Venezuela. Sem entrar em detalhes, não parece ser um exemplo que gostaríamos de seguir. Por outro lado, Canadá e Noruega, apesar de serem grandes exportadores de petróleo, mantêm internamente uma paridade com os preços internacionais. Os EUA, como maior produtor e maior consumidor de petróleo, também. Parece-me que esses países têm um modelo que pode, no curto prazo e em algumas circunstâncias, comprometer a inflação, mas que no longo prazo obtêm resultados geralmente melhores para suas economias.

Em conclusão, o Brasil encontra-se em uma encruzilhada onde querer segurar a inflação mantendo o desalinhamento dos preços dos derivados de petróleo com o mercado global pode trazer consequências muito negativas. A Petrobras, no cerne dessa questão, deve navegar essas águas turbulentas com uma estratégia que concilie interesses públicos e corporativos, sob pena de enfrentar consequências legais e econômicas substanciais. E o Brasil precisa pensar em seu futuro, e não apenas em questões imediatistas.

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MEMBRO DO CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO DO IBEF-SP, DO GRUPO DIERBERGER, DO CHARTERED INSTITUTE OF ARBITRATORS EM LONDRES E DA MAKE-A-WISH, SÓCIO-FUNDADOR DA VERENA VENTURES, FOI PROFESSOR DA FGV EAESP

A recente escalada de tensões no Oriente Médio, iniciada com o ataque terrorista do Hamas contra Israel em 7 de outubro de 2023, e renovada com a tensão entra Irã e Israel, tem agitado o cenário global e nacional. Contrariando as expectativas de muitos, apesar desses conflitos intensos, o preço do petróleo não disparou, mantendo-se abaixo do que poderiam prever as circunstâncias. Essa estabilidade surpreendente é influenciada por uma complexa interação de fatores, incluindo a transformação da geopolítica e as dinâmicas do setor petrolífero, que têm servido como moderadores dos preços.

Entrando nas mudanças geopolíticas, podemos dizer que, no passado, os Estados Unidos eram os maiores importadores de petróleo. Hoje, embora ainda importem, são os maiores produtores mundiais e contam com o apoio do Canadá, o quarto maior produtor. A China, a principal importadora, mantém sólidas parcerias com a Rússia, segunda maior exportadora de petróleo, e com o Irã. A Arábia Saudita, maior exportadora e produtora de baixo custo, tem capacidade para aumentar rapidamente a oferta e poucos incentivos para permitir um aumento excessivo dos preços, o que poderia acelerar a transição para alternativas ao petróleo.

Diante desse cenário, os preços do petróleo estão significativamente mais baixos do que no passado, quando já estiveram por vários anos consecutivos num patamar que corrigido pela inflação rondaria os US$ 130 o barril e num pico atingiram US$ 200, comparados com um patamar de US$ 85 atualmente. Ou seja, a atual geopolítica e demais mecanismos do mercado têm funcionado como um freio, de modo que, mesmo que os conflitos se intensifiquem, não deveremos enfrentar novos choques de preços como os ocorridos anteriormente, quando os preços chegavam a duplicar ou quase triplicar.

Embora os preços do petróleo estejam mais contidos do que em épocas anteriores, eles têm subido. No entanto, no Brasil, os preços dos derivados de petróleo permanecem há meses abaixo da paridade internacional. Apesar de ter havido algum alívio no final do ano passado e início deste ano, a defasagem voltou a se acentuar recentemente devido aos preços internacionais do petróleo e à valorização do câmbio. E é aqui que tem morado o perigo.

Recentemente o ex-presidente da Petrobras Jean Paul Prates declarou que a companhia não pretende ajustar agora os preços da gasolina e do diesel. Embora a contenção de preços possa ajudar temporariamente a conter a inflação, o que é louvável, ela carrega riscos significativos de desabastecimento e desestímulo ao investimento em capacidade de refino, além de ser prejudicial ao meio ambiente ao estimular o consumo de um produto altamente poluente e, indiretamente, desencorajar investimentos em energias alternativas.

O Brasil, apesar de ser um exportador de petróleo, não é autossuficiente em gasolina e diesel e precisa importar esses derivados. Quem, então, importará esses produtos a preços internacionais mais elevados para vender por menos no mercado doméstico? Empresas privadas dificilmente assumiriam tal encargo. Isso poderia levar ao desabastecimento de gasolina e diesel, ou forçar a Petrobras a importar esses derivados e revendê-los com prejuízo. Considerando as consequências negativas de um desabastecimento e o controle governamental sobre a Petrobras, é provável que essa última opção seja adotada. Lembrando que, conforme estipulado pela lei e pelo estatuto da Petrobras, a empresa deve operar sob condições de mercado, a menos que compensações sejam providenciadas pelo governo. Até o momento, não há indícios de que tais compensações se materializarão, e nem parece que o governo teria espaço em seu orçamento para fazê-las. Isso poderia levar a Petrobras a ser acionada juridicamente por seus acionistas, que se veriam prejudicados.

Outra consequência negativa que a contenção de preços pode gerar, talvez até mais grave, apesar de menos perceptível, é a falta de investimentos em refino no Brasil. Naturalmente, ninguém vai querer investir bilhões para refinar petróleo se os preços internos são represados e têm que acompanhar os preços internacionais apenas quando caem, perdendo vendas para importados quando não o fazem. Sem esses investimentos, o País segue dependendo da Petrobras e de importações para atender suas demandas de derivados de petróleo.

Podemos citar entre grandes produtores de petróleo que adotam a prática de venda no mercado interno a preços inferiores aos internacionais a Venezuela. Sem entrar em detalhes, não parece ser um exemplo que gostaríamos de seguir. Por outro lado, Canadá e Noruega, apesar de serem grandes exportadores de petróleo, mantêm internamente uma paridade com os preços internacionais. Os EUA, como maior produtor e maior consumidor de petróleo, também. Parece-me que esses países têm um modelo que pode, no curto prazo e em algumas circunstâncias, comprometer a inflação, mas que no longo prazo obtêm resultados geralmente melhores para suas economias.

Em conclusão, o Brasil encontra-se em uma encruzilhada onde querer segurar a inflação mantendo o desalinhamento dos preços dos derivados de petróleo com o mercado global pode trazer consequências muito negativas. A Petrobras, no cerne dessa questão, deve navegar essas águas turbulentas com uma estratégia que concilie interesses públicos e corporativos, sob pena de enfrentar consequências legais e econômicas substanciais. E o Brasil precisa pensar em seu futuro, e não apenas em questões imediatistas.

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MEMBRO DO CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO DO IBEF-SP, DO GRUPO DIERBERGER, DO CHARTERED INSTITUTE OF ARBITRATORS EM LONDRES E DA MAKE-A-WISH, SÓCIO-FUNDADOR DA VERENA VENTURES, FOI PROFESSOR DA FGV EAESP

A recente escalada de tensões no Oriente Médio, iniciada com o ataque terrorista do Hamas contra Israel em 7 de outubro de 2023, e renovada com a tensão entra Irã e Israel, tem agitado o cenário global e nacional. Contrariando as expectativas de muitos, apesar desses conflitos intensos, o preço do petróleo não disparou, mantendo-se abaixo do que poderiam prever as circunstâncias. Essa estabilidade surpreendente é influenciada por uma complexa interação de fatores, incluindo a transformação da geopolítica e as dinâmicas do setor petrolífero, que têm servido como moderadores dos preços.

Entrando nas mudanças geopolíticas, podemos dizer que, no passado, os Estados Unidos eram os maiores importadores de petróleo. Hoje, embora ainda importem, são os maiores produtores mundiais e contam com o apoio do Canadá, o quarto maior produtor. A China, a principal importadora, mantém sólidas parcerias com a Rússia, segunda maior exportadora de petróleo, e com o Irã. A Arábia Saudita, maior exportadora e produtora de baixo custo, tem capacidade para aumentar rapidamente a oferta e poucos incentivos para permitir um aumento excessivo dos preços, o que poderia acelerar a transição para alternativas ao petróleo.

Diante desse cenário, os preços do petróleo estão significativamente mais baixos do que no passado, quando já estiveram por vários anos consecutivos num patamar que corrigido pela inflação rondaria os US$ 130 o barril e num pico atingiram US$ 200, comparados com um patamar de US$ 85 atualmente. Ou seja, a atual geopolítica e demais mecanismos do mercado têm funcionado como um freio, de modo que, mesmo que os conflitos se intensifiquem, não deveremos enfrentar novos choques de preços como os ocorridos anteriormente, quando os preços chegavam a duplicar ou quase triplicar.

Embora os preços do petróleo estejam mais contidos do que em épocas anteriores, eles têm subido. No entanto, no Brasil, os preços dos derivados de petróleo permanecem há meses abaixo da paridade internacional. Apesar de ter havido algum alívio no final do ano passado e início deste ano, a defasagem voltou a se acentuar recentemente devido aos preços internacionais do petróleo e à valorização do câmbio. E é aqui que tem morado o perigo.

Recentemente o ex-presidente da Petrobras Jean Paul Prates declarou que a companhia não pretende ajustar agora os preços da gasolina e do diesel. Embora a contenção de preços possa ajudar temporariamente a conter a inflação, o que é louvável, ela carrega riscos significativos de desabastecimento e desestímulo ao investimento em capacidade de refino, além de ser prejudicial ao meio ambiente ao estimular o consumo de um produto altamente poluente e, indiretamente, desencorajar investimentos em energias alternativas.

O Brasil, apesar de ser um exportador de petróleo, não é autossuficiente em gasolina e diesel e precisa importar esses derivados. Quem, então, importará esses produtos a preços internacionais mais elevados para vender por menos no mercado doméstico? Empresas privadas dificilmente assumiriam tal encargo. Isso poderia levar ao desabastecimento de gasolina e diesel, ou forçar a Petrobras a importar esses derivados e revendê-los com prejuízo. Considerando as consequências negativas de um desabastecimento e o controle governamental sobre a Petrobras, é provável que essa última opção seja adotada. Lembrando que, conforme estipulado pela lei e pelo estatuto da Petrobras, a empresa deve operar sob condições de mercado, a menos que compensações sejam providenciadas pelo governo. Até o momento, não há indícios de que tais compensações se materializarão, e nem parece que o governo teria espaço em seu orçamento para fazê-las. Isso poderia levar a Petrobras a ser acionada juridicamente por seus acionistas, que se veriam prejudicados.

Outra consequência negativa que a contenção de preços pode gerar, talvez até mais grave, apesar de menos perceptível, é a falta de investimentos em refino no Brasil. Naturalmente, ninguém vai querer investir bilhões para refinar petróleo se os preços internos são represados e têm que acompanhar os preços internacionais apenas quando caem, perdendo vendas para importados quando não o fazem. Sem esses investimentos, o País segue dependendo da Petrobras e de importações para atender suas demandas de derivados de petróleo.

Podemos citar entre grandes produtores de petróleo que adotam a prática de venda no mercado interno a preços inferiores aos internacionais a Venezuela. Sem entrar em detalhes, não parece ser um exemplo que gostaríamos de seguir. Por outro lado, Canadá e Noruega, apesar de serem grandes exportadores de petróleo, mantêm internamente uma paridade com os preços internacionais. Os EUA, como maior produtor e maior consumidor de petróleo, também. Parece-me que esses países têm um modelo que pode, no curto prazo e em algumas circunstâncias, comprometer a inflação, mas que no longo prazo obtêm resultados geralmente melhores para suas economias.

Em conclusão, o Brasil encontra-se em uma encruzilhada onde querer segurar a inflação mantendo o desalinhamento dos preços dos derivados de petróleo com o mercado global pode trazer consequências muito negativas. A Petrobras, no cerne dessa questão, deve navegar essas águas turbulentas com uma estratégia que concilie interesses públicos e corporativos, sob pena de enfrentar consequências legais e econômicas substanciais. E o Brasil precisa pensar em seu futuro, e não apenas em questões imediatistas.

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MEMBRO DO CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO DO IBEF-SP, DO GRUPO DIERBERGER, DO CHARTERED INSTITUTE OF ARBITRATORS EM LONDRES E DA MAKE-A-WISH, SÓCIO-FUNDADOR DA VERENA VENTURES, FOI PROFESSOR DA FGV EAESP

Opinião por Charles Laganá Putz

Membro do Conselho de Administração do IBEF-SP, do Grupo Dierberger, do Chartered Institute of Arbitrators em Londres e da Make-A-Wish, sócio-fundador da Verena Ventures, foi professor da FGV Eaesp

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