Opinião|Condenados ao fracasso escolar


O novo programa de alfabetização do MEC consegue ao mesmo tempo ignorar todos os avanços da ciência e repetir todos os erros do passado

Por João Batista Araujo e Oliveira

A história se repete, desta vez como uma tragédia. O novo programa de alfabetização capitaneado pelo Ministério da Educação (MEC) e que recebeu adesão entusiástica das redes estaduais e municipais de ensino contém todos os ingredientes para não dar certo. O programa repete todos os erros de programas anteriores que nem deram nem comprovam resultados. O MEC insiste em rejeitar as evidências científicas sobre o que efetivamente funciona para alfabetizar as crianças.

O relatório da Alfabetiza Brasil, divulgado pelo MEC em 28 de maio, reflete a distância que separa o Brasil dos demais países no que se refere ao entendimento do que seja alfabetização, de como alfabetizar e de como avaliar.

Mais uma vez o MEC e o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) erram de maneira contundente ao ignorar o que dizem as evidências e melhores práticas. É uma vergonha uma escola e um país que não são capazes de alfabetizar os alunos até o final do 1.º ano escolar.

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A alfabetização é a primeira tarefa da educação formal. Dadas as características do sistema alfabético de escrita da língua portuguesa, as crianças deveriam ser e estar alfabetizadas até o final do 1.º ano. Qualquer escola digna deveria assegurar esse resultado. Quem tem filho em escola particular sabe disso – e não abre mão.

A alfabetização é condição necessária – embora não suficiente – para assegurar o progresso escolar. Um aluno do 2.º ano que não é capaz de copiar o dever de casa do quadro, em tempo adequado, já é um analfabeto funcional. Daí para diante é um desastre anunciado.

Atrasos na alfabetização causam danos irrecuperáveis. Um aluno alfabetizado deve ser capaz de ler pelo menos de 60 a 80 palavras por minuto de um texto apropriado, com um nível adequado de fluência que se desenvolve lentamente, com treinamento constante. Ao ler com mais dificuldade, o aluno lê menos; ao ler menos, aprende menos, especialmente novo vocabulário. E isso afeta a compreensão do que lê. São prejuízos cumulativos.

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A alfabetização é a área em que existem mais conhecimentos científicos consolidados. Praticamente todos os países desenvolvidos com sistemas alfabéticos de escrita adotam práticas de alfabetização conhecidas sob o nome de “método fônico”.

Há mais de 20 anos a comunidade científica brasileira vem produzindo relatórios e documentos sobre o tema, como o livro Alfabetização: Método Fônico, de Fernando Capovilla e Alessandra Seabra, no ano de 2000; o relatório Alfabetização Infantil: os Novos Caminhos, pela Câmara dos Deputados em 2003, do qual participaram especialistas de renome mundial como Marilyn Adams e José Morais; o relatório Educação Infantil e Alfabetização, publicado pela Academia Brasileira de Ciências, assinado entre outros por Adele Diamond e James Heckman. Em 2016 um grupo de psicolinguistas apresentou ao MEC críticas e contribuições ao capítulo da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) sobre alfabetização. Sem retorno. Em 2019 o MEC produziu um documento assinado por uma dezena dos melhores cientistas brasileiros que estudam o tema. Foi parar no lixo. Em 2024 um documento divulgado pela Rede Nacional de Ciência para a Educação reiterou as críticas da comunidade científica sobre a BNCC e suas implicações para as concepções equivocadas sobre o tema. Tudo em vão.

De onde vem tanta resistência às evidências científicas? Por que a alfabetização é alvo privilegiado dos embates ideológicos em educação? Na década de 1950 os embates se davam entre dois métodos – global ou silabação, mas quem estava na escola aprendia a ler. Na década de 1960 Paulo Freire associa a alfabetização de adultos ao desenvolvimento da consciência crítica – mas adota o método da silabação. Na década de 1970 a alfabetização e a escola entram em crise, cercadas de teorias estapafúrdias e equivocadas.

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O novo programa lançado pelo MEC consegue ao mesmo tempo ignorar todos os avanços da ciência e repetir todos os erros do passado. Não apresenta qualquer evidência empírica ou resultados para fundamentar e justificar o que propõe. Apresenta um conjunto de livros com os mesmos conteúdos, mas que recebe capas diferentes em cada Estado, nos quais apenas acrescenta ou retira o nome de um ou dois autores para dar uma “cara regional”; incentivando a maquiagem de materiais didáticos amadorísticos.

Propõe um treinamento em cascata e as capacitações vão sendo retransmitidas em cursos que chegam ao professor dados pelo profissional menos qualificado para a tarefa. Isso em tempos de internet e inteligência artificial. E tudo carregado de benefícios para assegurar a adesão.

Mais estranha é a participação e patrocínio de renomadas instituições não governamentais financiadas por fortes grupos econômicos. Esses empresários utilizam conhecimentos científicos e padronizam suas ações para assegurar lucros. Por que, ao investir em projetos educacionais duvidosos, abrem mão desses princípios?

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Finalmente, cabe indagar: por que nenhum Estado da Federação exercita as prerrogativas de sua autonomia e levanta a voz, em nome de milhões de alunos que vêm sendo prejudicados por mais este equivocado e anticientífico empreendimento do MEC?

*

PRESIDENTE DO INSTITUTO ALFA E BETO

A história se repete, desta vez como uma tragédia. O novo programa de alfabetização capitaneado pelo Ministério da Educação (MEC) e que recebeu adesão entusiástica das redes estaduais e municipais de ensino contém todos os ingredientes para não dar certo. O programa repete todos os erros de programas anteriores que nem deram nem comprovam resultados. O MEC insiste em rejeitar as evidências científicas sobre o que efetivamente funciona para alfabetizar as crianças.

O relatório da Alfabetiza Brasil, divulgado pelo MEC em 28 de maio, reflete a distância que separa o Brasil dos demais países no que se refere ao entendimento do que seja alfabetização, de como alfabetizar e de como avaliar.

Mais uma vez o MEC e o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) erram de maneira contundente ao ignorar o que dizem as evidências e melhores práticas. É uma vergonha uma escola e um país que não são capazes de alfabetizar os alunos até o final do 1.º ano escolar.

A alfabetização é a primeira tarefa da educação formal. Dadas as características do sistema alfabético de escrita da língua portuguesa, as crianças deveriam ser e estar alfabetizadas até o final do 1.º ano. Qualquer escola digna deveria assegurar esse resultado. Quem tem filho em escola particular sabe disso – e não abre mão.

A alfabetização é condição necessária – embora não suficiente – para assegurar o progresso escolar. Um aluno do 2.º ano que não é capaz de copiar o dever de casa do quadro, em tempo adequado, já é um analfabeto funcional. Daí para diante é um desastre anunciado.

Atrasos na alfabetização causam danos irrecuperáveis. Um aluno alfabetizado deve ser capaz de ler pelo menos de 60 a 80 palavras por minuto de um texto apropriado, com um nível adequado de fluência que se desenvolve lentamente, com treinamento constante. Ao ler com mais dificuldade, o aluno lê menos; ao ler menos, aprende menos, especialmente novo vocabulário. E isso afeta a compreensão do que lê. São prejuízos cumulativos.

A alfabetização é a área em que existem mais conhecimentos científicos consolidados. Praticamente todos os países desenvolvidos com sistemas alfabéticos de escrita adotam práticas de alfabetização conhecidas sob o nome de “método fônico”.

Há mais de 20 anos a comunidade científica brasileira vem produzindo relatórios e documentos sobre o tema, como o livro Alfabetização: Método Fônico, de Fernando Capovilla e Alessandra Seabra, no ano de 2000; o relatório Alfabetização Infantil: os Novos Caminhos, pela Câmara dos Deputados em 2003, do qual participaram especialistas de renome mundial como Marilyn Adams e José Morais; o relatório Educação Infantil e Alfabetização, publicado pela Academia Brasileira de Ciências, assinado entre outros por Adele Diamond e James Heckman. Em 2016 um grupo de psicolinguistas apresentou ao MEC críticas e contribuições ao capítulo da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) sobre alfabetização. Sem retorno. Em 2019 o MEC produziu um documento assinado por uma dezena dos melhores cientistas brasileiros que estudam o tema. Foi parar no lixo. Em 2024 um documento divulgado pela Rede Nacional de Ciência para a Educação reiterou as críticas da comunidade científica sobre a BNCC e suas implicações para as concepções equivocadas sobre o tema. Tudo em vão.

De onde vem tanta resistência às evidências científicas? Por que a alfabetização é alvo privilegiado dos embates ideológicos em educação? Na década de 1950 os embates se davam entre dois métodos – global ou silabação, mas quem estava na escola aprendia a ler. Na década de 1960 Paulo Freire associa a alfabetização de adultos ao desenvolvimento da consciência crítica – mas adota o método da silabação. Na década de 1970 a alfabetização e a escola entram em crise, cercadas de teorias estapafúrdias e equivocadas.

O novo programa lançado pelo MEC consegue ao mesmo tempo ignorar todos os avanços da ciência e repetir todos os erros do passado. Não apresenta qualquer evidência empírica ou resultados para fundamentar e justificar o que propõe. Apresenta um conjunto de livros com os mesmos conteúdos, mas que recebe capas diferentes em cada Estado, nos quais apenas acrescenta ou retira o nome de um ou dois autores para dar uma “cara regional”; incentivando a maquiagem de materiais didáticos amadorísticos.

Propõe um treinamento em cascata e as capacitações vão sendo retransmitidas em cursos que chegam ao professor dados pelo profissional menos qualificado para a tarefa. Isso em tempos de internet e inteligência artificial. E tudo carregado de benefícios para assegurar a adesão.

Mais estranha é a participação e patrocínio de renomadas instituições não governamentais financiadas por fortes grupos econômicos. Esses empresários utilizam conhecimentos científicos e padronizam suas ações para assegurar lucros. Por que, ao investir em projetos educacionais duvidosos, abrem mão desses princípios?

Finalmente, cabe indagar: por que nenhum Estado da Federação exercita as prerrogativas de sua autonomia e levanta a voz, em nome de milhões de alunos que vêm sendo prejudicados por mais este equivocado e anticientífico empreendimento do MEC?

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PRESIDENTE DO INSTITUTO ALFA E BETO

A história se repete, desta vez como uma tragédia. O novo programa de alfabetização capitaneado pelo Ministério da Educação (MEC) e que recebeu adesão entusiástica das redes estaduais e municipais de ensino contém todos os ingredientes para não dar certo. O programa repete todos os erros de programas anteriores que nem deram nem comprovam resultados. O MEC insiste em rejeitar as evidências científicas sobre o que efetivamente funciona para alfabetizar as crianças.

O relatório da Alfabetiza Brasil, divulgado pelo MEC em 28 de maio, reflete a distância que separa o Brasil dos demais países no que se refere ao entendimento do que seja alfabetização, de como alfabetizar e de como avaliar.

Mais uma vez o MEC e o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) erram de maneira contundente ao ignorar o que dizem as evidências e melhores práticas. É uma vergonha uma escola e um país que não são capazes de alfabetizar os alunos até o final do 1.º ano escolar.

A alfabetização é a primeira tarefa da educação formal. Dadas as características do sistema alfabético de escrita da língua portuguesa, as crianças deveriam ser e estar alfabetizadas até o final do 1.º ano. Qualquer escola digna deveria assegurar esse resultado. Quem tem filho em escola particular sabe disso – e não abre mão.

A alfabetização é condição necessária – embora não suficiente – para assegurar o progresso escolar. Um aluno do 2.º ano que não é capaz de copiar o dever de casa do quadro, em tempo adequado, já é um analfabeto funcional. Daí para diante é um desastre anunciado.

Atrasos na alfabetização causam danos irrecuperáveis. Um aluno alfabetizado deve ser capaz de ler pelo menos de 60 a 80 palavras por minuto de um texto apropriado, com um nível adequado de fluência que se desenvolve lentamente, com treinamento constante. Ao ler com mais dificuldade, o aluno lê menos; ao ler menos, aprende menos, especialmente novo vocabulário. E isso afeta a compreensão do que lê. São prejuízos cumulativos.

A alfabetização é a área em que existem mais conhecimentos científicos consolidados. Praticamente todos os países desenvolvidos com sistemas alfabéticos de escrita adotam práticas de alfabetização conhecidas sob o nome de “método fônico”.

Há mais de 20 anos a comunidade científica brasileira vem produzindo relatórios e documentos sobre o tema, como o livro Alfabetização: Método Fônico, de Fernando Capovilla e Alessandra Seabra, no ano de 2000; o relatório Alfabetização Infantil: os Novos Caminhos, pela Câmara dos Deputados em 2003, do qual participaram especialistas de renome mundial como Marilyn Adams e José Morais; o relatório Educação Infantil e Alfabetização, publicado pela Academia Brasileira de Ciências, assinado entre outros por Adele Diamond e James Heckman. Em 2016 um grupo de psicolinguistas apresentou ao MEC críticas e contribuições ao capítulo da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) sobre alfabetização. Sem retorno. Em 2019 o MEC produziu um documento assinado por uma dezena dos melhores cientistas brasileiros que estudam o tema. Foi parar no lixo. Em 2024 um documento divulgado pela Rede Nacional de Ciência para a Educação reiterou as críticas da comunidade científica sobre a BNCC e suas implicações para as concepções equivocadas sobre o tema. Tudo em vão.

De onde vem tanta resistência às evidências científicas? Por que a alfabetização é alvo privilegiado dos embates ideológicos em educação? Na década de 1950 os embates se davam entre dois métodos – global ou silabação, mas quem estava na escola aprendia a ler. Na década de 1960 Paulo Freire associa a alfabetização de adultos ao desenvolvimento da consciência crítica – mas adota o método da silabação. Na década de 1970 a alfabetização e a escola entram em crise, cercadas de teorias estapafúrdias e equivocadas.

O novo programa lançado pelo MEC consegue ao mesmo tempo ignorar todos os avanços da ciência e repetir todos os erros do passado. Não apresenta qualquer evidência empírica ou resultados para fundamentar e justificar o que propõe. Apresenta um conjunto de livros com os mesmos conteúdos, mas que recebe capas diferentes em cada Estado, nos quais apenas acrescenta ou retira o nome de um ou dois autores para dar uma “cara regional”; incentivando a maquiagem de materiais didáticos amadorísticos.

Propõe um treinamento em cascata e as capacitações vão sendo retransmitidas em cursos que chegam ao professor dados pelo profissional menos qualificado para a tarefa. Isso em tempos de internet e inteligência artificial. E tudo carregado de benefícios para assegurar a adesão.

Mais estranha é a participação e patrocínio de renomadas instituições não governamentais financiadas por fortes grupos econômicos. Esses empresários utilizam conhecimentos científicos e padronizam suas ações para assegurar lucros. Por que, ao investir em projetos educacionais duvidosos, abrem mão desses princípios?

Finalmente, cabe indagar: por que nenhum Estado da Federação exercita as prerrogativas de sua autonomia e levanta a voz, em nome de milhões de alunos que vêm sendo prejudicados por mais este equivocado e anticientífico empreendimento do MEC?

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