Opinião|Hemorrede de SP: uma história de sucesso


Para manter a estrutura existente e a qualidade do sangue e implementar expansões e novas tecnologias, novos investimentos são imprescindíveis

Por Sara T. Ollala, Rodrigo T. Calado, Vanderson G. Rocha, Cláudio L. Miranda, Renata B. Cardoso e Octavio Ricci Junior

A criação da Hemorrede do Estado de São Paulo, na década de 1980, mudou a história do sangue transfundido aos pacientes do SUS, oferecendo bolsas e hemoderivados da mais alta qualidade e segurança, comparável à Europa e aos EUA. Essa conquista precisa ser reconhecida e não pode ser perdida. Nos últimos anos, a Hemorrede vem sofrendo com a estagnação de seu financiamento. Enquanto boa parte dos insumos para a produção de bolsas de sangue seguras é importada, o real vem se desvalorizando. A conta não fecha e pode comprometer o atendimento aos pacientes.

Nos anos 1980, epidemias de doenças transmitidas pela transfusão de sangue, como a aids e a hepatite C, impuseram uma mudança radical na qualidade das transfusões, sendo estruturada a Hemorrede paulista, composta por seus hemocentros, núcleos e agências. Naquela época, o governo do Estado criou os hemocentros diretamente ligados às melhores universidades da América Latina: USP (São Paulo e Ribeirão Preto), Unicamp (Campinas) e Unesp (Botucatu), além das faculdades de Medicina de Marília e São José do Rio Preto.

Essa articulação foi o segredo para dar qualidade médica e científica à transfusão de sangue e segurança na produção de bolsas de sangue, com a implementação de ações que garantem sua qualidade. Primeiro, a capacitação de profissionais desde a coleta do sangue dos doadores, passando pelo laboratório, enfermeiros e médicos, até o profissional que acompanha a transfusão no paciente. Como exemplo, foram criados dois mestrados profissionais reconhecidos pela Capes e somente no Estado de São Paulo, ligados aos hemocentros e às universidades.

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Segundo, trouxe a ciência das universidades para inovar no desenvolvimento tecnológico do sangue: foram produzidos kits sorológicos, testes moleculares para detecção de doenças, novos métodos de tipagem do sangue. Também foram implementados novos e rígidos protocolos de segurança, como a certificação de qualidade e protocolos de transfusão. O conjunto dessas ações vem garantindo a segurança das transfusões no Estado ao longo de quase 40 anos. Não há notícia, na Hemorrede paulista, de contaminações por transfusão por negligência ou imperícia. Isso se deve à qualidade da triagem de doadores e dos testes realizados nos hemocentros públicos, que não terceirizam suas atividades. Pelo contrário, a Hemorrede pública mantém extremo rigor e controle em todas as etapas do processo de controle do sangue.

Atualmente, são fornecidas pela Hemorrede bolsas de sangue e hemoderivados de qualidade para os pacientes do SUS em cerca de 300 hospitais. Em 2023, foram mais de 270 mil bolsas de sangue produzidas para transfusão. Os números são impressionantes e sem-par, mesmo em outros países, para uma estrutura tão enxuta. São Paulo tornou-se modelo em hemoterapia no Brasil.

A Hemorrede continua crescendo e se beneficiando de sua ligação umbilical com as universidades estaduais paulistas, que permitiu a criação de centros avançados de transplante de medula óssea em hospitais públicos, a tipagem de doadores de órgãos para transplantes com a mais alta segurança, banco público de sangue de cordão umbilical para transplantes, terapia gênica para hemofilias e, mais recentemente, a terapia celular avançada (células CAR-T) contra o câncer para pacientes do SUS.

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A criação da Hemorrede transformou não apenas aspectos técnicos e científicos, mas também a gestão e a lógica do financiamento público, coibindo transfusões desnecessárias, sem indicação médica, ao ressarcir os hemocentros pela coleta e processamento de sangue e não mais por sua transfusão. Essa mudança, gestada em São Paulo e adotada pelo Ministério da Saúde para todo o País, foi estratégica para implementar políticas de transfusões cautelosas e baseadas especificamente no seu benefício médico, sem vieses econômicos. Ainda há aspectos de gestão a serem aprimorados, como a ampliação de transfusões ambulatoriais, ou seja, aquelas em que o paciente não precisa de internação para receber a transfusão, desafogando leitos hospitalares e unidades de pronto-socorro.

Apesar dos avanços, a Hemorrede enfrenta desafios contínuos. A manutenção de estoques adequados de sangue, principalmente em períodos de baixa doação, é problema a ser superado com melhores estratégias de captação de doadores. A gestão dos estoques articula-se diretamente com redução para o mínimo do descarte de bolsas não transfundidas. Adicionalmente, novos surtos e epidemias de doenças infecciosas que podem ser transmitidas pelo sangue impõem mudanças rápidas e novas metodologias de triagem e testagem do sangue doado.

Mais preocupante é o financiamento da Hemorrede paulista, que está estagnado nos últimos anos enquanto boa parte dos insumos é precificada em moeda estrangeira. Para manter a estrutura existente e a qualidade do sangue e implementar expansões e novas tecnologias, a recomposição e novos investimentos são imprescindíveis. Essa é uma história de sucesso de política de saúde pública do SUS que não pode ser negligenciada.

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SÃO, RESPECTIVAMENTE PROFESSORA TITULAR DA UNICAMP, DIRETORA DO HEMOCENTRO DE CAMPINAS; PROFESSOR TITULAR DA USP, DIRETOR-PRESIDENTE DA FUNDAÇÃO HEMOCENTRO DE RIBEIRÃO PRETO; PROFESSOR TITULAR DA USP, DIRETOR-PRESIDENTE DA FUNDAÇÃO PRÓ-SANGUE; DIRETOR TÉCNICO DO HEMOCENTRO DE BOTUCATU DA UNESP; DIRETORA DO HEMOCENTRO DE MARÍLIA; E DIRETOR ADMINISTRATIVO DO HEMOCENTRO DE SÃO JOSÉ DO RIO PRETO

A criação da Hemorrede do Estado de São Paulo, na década de 1980, mudou a história do sangue transfundido aos pacientes do SUS, oferecendo bolsas e hemoderivados da mais alta qualidade e segurança, comparável à Europa e aos EUA. Essa conquista precisa ser reconhecida e não pode ser perdida. Nos últimos anos, a Hemorrede vem sofrendo com a estagnação de seu financiamento. Enquanto boa parte dos insumos para a produção de bolsas de sangue seguras é importada, o real vem se desvalorizando. A conta não fecha e pode comprometer o atendimento aos pacientes.

Nos anos 1980, epidemias de doenças transmitidas pela transfusão de sangue, como a aids e a hepatite C, impuseram uma mudança radical na qualidade das transfusões, sendo estruturada a Hemorrede paulista, composta por seus hemocentros, núcleos e agências. Naquela época, o governo do Estado criou os hemocentros diretamente ligados às melhores universidades da América Latina: USP (São Paulo e Ribeirão Preto), Unicamp (Campinas) e Unesp (Botucatu), além das faculdades de Medicina de Marília e São José do Rio Preto.

Essa articulação foi o segredo para dar qualidade médica e científica à transfusão de sangue e segurança na produção de bolsas de sangue, com a implementação de ações que garantem sua qualidade. Primeiro, a capacitação de profissionais desde a coleta do sangue dos doadores, passando pelo laboratório, enfermeiros e médicos, até o profissional que acompanha a transfusão no paciente. Como exemplo, foram criados dois mestrados profissionais reconhecidos pela Capes e somente no Estado de São Paulo, ligados aos hemocentros e às universidades.

Segundo, trouxe a ciência das universidades para inovar no desenvolvimento tecnológico do sangue: foram produzidos kits sorológicos, testes moleculares para detecção de doenças, novos métodos de tipagem do sangue. Também foram implementados novos e rígidos protocolos de segurança, como a certificação de qualidade e protocolos de transfusão. O conjunto dessas ações vem garantindo a segurança das transfusões no Estado ao longo de quase 40 anos. Não há notícia, na Hemorrede paulista, de contaminações por transfusão por negligência ou imperícia. Isso se deve à qualidade da triagem de doadores e dos testes realizados nos hemocentros públicos, que não terceirizam suas atividades. Pelo contrário, a Hemorrede pública mantém extremo rigor e controle em todas as etapas do processo de controle do sangue.

Atualmente, são fornecidas pela Hemorrede bolsas de sangue e hemoderivados de qualidade para os pacientes do SUS em cerca de 300 hospitais. Em 2023, foram mais de 270 mil bolsas de sangue produzidas para transfusão. Os números são impressionantes e sem-par, mesmo em outros países, para uma estrutura tão enxuta. São Paulo tornou-se modelo em hemoterapia no Brasil.

A Hemorrede continua crescendo e se beneficiando de sua ligação umbilical com as universidades estaduais paulistas, que permitiu a criação de centros avançados de transplante de medula óssea em hospitais públicos, a tipagem de doadores de órgãos para transplantes com a mais alta segurança, banco público de sangue de cordão umbilical para transplantes, terapia gênica para hemofilias e, mais recentemente, a terapia celular avançada (células CAR-T) contra o câncer para pacientes do SUS.

A criação da Hemorrede transformou não apenas aspectos técnicos e científicos, mas também a gestão e a lógica do financiamento público, coibindo transfusões desnecessárias, sem indicação médica, ao ressarcir os hemocentros pela coleta e processamento de sangue e não mais por sua transfusão. Essa mudança, gestada em São Paulo e adotada pelo Ministério da Saúde para todo o País, foi estratégica para implementar políticas de transfusões cautelosas e baseadas especificamente no seu benefício médico, sem vieses econômicos. Ainda há aspectos de gestão a serem aprimorados, como a ampliação de transfusões ambulatoriais, ou seja, aquelas em que o paciente não precisa de internação para receber a transfusão, desafogando leitos hospitalares e unidades de pronto-socorro.

Apesar dos avanços, a Hemorrede enfrenta desafios contínuos. A manutenção de estoques adequados de sangue, principalmente em períodos de baixa doação, é problema a ser superado com melhores estratégias de captação de doadores. A gestão dos estoques articula-se diretamente com redução para o mínimo do descarte de bolsas não transfundidas. Adicionalmente, novos surtos e epidemias de doenças infecciosas que podem ser transmitidas pelo sangue impõem mudanças rápidas e novas metodologias de triagem e testagem do sangue doado.

Mais preocupante é o financiamento da Hemorrede paulista, que está estagnado nos últimos anos enquanto boa parte dos insumos é precificada em moeda estrangeira. Para manter a estrutura existente e a qualidade do sangue e implementar expansões e novas tecnologias, a recomposição e novos investimentos são imprescindíveis. Essa é uma história de sucesso de política de saúde pública do SUS que não pode ser negligenciada.

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SÃO, RESPECTIVAMENTE PROFESSORA TITULAR DA UNICAMP, DIRETORA DO HEMOCENTRO DE CAMPINAS; PROFESSOR TITULAR DA USP, DIRETOR-PRESIDENTE DA FUNDAÇÃO HEMOCENTRO DE RIBEIRÃO PRETO; PROFESSOR TITULAR DA USP, DIRETOR-PRESIDENTE DA FUNDAÇÃO PRÓ-SANGUE; DIRETOR TÉCNICO DO HEMOCENTRO DE BOTUCATU DA UNESP; DIRETORA DO HEMOCENTRO DE MARÍLIA; E DIRETOR ADMINISTRATIVO DO HEMOCENTRO DE SÃO JOSÉ DO RIO PRETO

A criação da Hemorrede do Estado de São Paulo, na década de 1980, mudou a história do sangue transfundido aos pacientes do SUS, oferecendo bolsas e hemoderivados da mais alta qualidade e segurança, comparável à Europa e aos EUA. Essa conquista precisa ser reconhecida e não pode ser perdida. Nos últimos anos, a Hemorrede vem sofrendo com a estagnação de seu financiamento. Enquanto boa parte dos insumos para a produção de bolsas de sangue seguras é importada, o real vem se desvalorizando. A conta não fecha e pode comprometer o atendimento aos pacientes.

Nos anos 1980, epidemias de doenças transmitidas pela transfusão de sangue, como a aids e a hepatite C, impuseram uma mudança radical na qualidade das transfusões, sendo estruturada a Hemorrede paulista, composta por seus hemocentros, núcleos e agências. Naquela época, o governo do Estado criou os hemocentros diretamente ligados às melhores universidades da América Latina: USP (São Paulo e Ribeirão Preto), Unicamp (Campinas) e Unesp (Botucatu), além das faculdades de Medicina de Marília e São José do Rio Preto.

Essa articulação foi o segredo para dar qualidade médica e científica à transfusão de sangue e segurança na produção de bolsas de sangue, com a implementação de ações que garantem sua qualidade. Primeiro, a capacitação de profissionais desde a coleta do sangue dos doadores, passando pelo laboratório, enfermeiros e médicos, até o profissional que acompanha a transfusão no paciente. Como exemplo, foram criados dois mestrados profissionais reconhecidos pela Capes e somente no Estado de São Paulo, ligados aos hemocentros e às universidades.

Segundo, trouxe a ciência das universidades para inovar no desenvolvimento tecnológico do sangue: foram produzidos kits sorológicos, testes moleculares para detecção de doenças, novos métodos de tipagem do sangue. Também foram implementados novos e rígidos protocolos de segurança, como a certificação de qualidade e protocolos de transfusão. O conjunto dessas ações vem garantindo a segurança das transfusões no Estado ao longo de quase 40 anos. Não há notícia, na Hemorrede paulista, de contaminações por transfusão por negligência ou imperícia. Isso se deve à qualidade da triagem de doadores e dos testes realizados nos hemocentros públicos, que não terceirizam suas atividades. Pelo contrário, a Hemorrede pública mantém extremo rigor e controle em todas as etapas do processo de controle do sangue.

Atualmente, são fornecidas pela Hemorrede bolsas de sangue e hemoderivados de qualidade para os pacientes do SUS em cerca de 300 hospitais. Em 2023, foram mais de 270 mil bolsas de sangue produzidas para transfusão. Os números são impressionantes e sem-par, mesmo em outros países, para uma estrutura tão enxuta. São Paulo tornou-se modelo em hemoterapia no Brasil.

A Hemorrede continua crescendo e se beneficiando de sua ligação umbilical com as universidades estaduais paulistas, que permitiu a criação de centros avançados de transplante de medula óssea em hospitais públicos, a tipagem de doadores de órgãos para transplantes com a mais alta segurança, banco público de sangue de cordão umbilical para transplantes, terapia gênica para hemofilias e, mais recentemente, a terapia celular avançada (células CAR-T) contra o câncer para pacientes do SUS.

A criação da Hemorrede transformou não apenas aspectos técnicos e científicos, mas também a gestão e a lógica do financiamento público, coibindo transfusões desnecessárias, sem indicação médica, ao ressarcir os hemocentros pela coleta e processamento de sangue e não mais por sua transfusão. Essa mudança, gestada em São Paulo e adotada pelo Ministério da Saúde para todo o País, foi estratégica para implementar políticas de transfusões cautelosas e baseadas especificamente no seu benefício médico, sem vieses econômicos. Ainda há aspectos de gestão a serem aprimorados, como a ampliação de transfusões ambulatoriais, ou seja, aquelas em que o paciente não precisa de internação para receber a transfusão, desafogando leitos hospitalares e unidades de pronto-socorro.

Apesar dos avanços, a Hemorrede enfrenta desafios contínuos. A manutenção de estoques adequados de sangue, principalmente em períodos de baixa doação, é problema a ser superado com melhores estratégias de captação de doadores. A gestão dos estoques articula-se diretamente com redução para o mínimo do descarte de bolsas não transfundidas. Adicionalmente, novos surtos e epidemias de doenças infecciosas que podem ser transmitidas pelo sangue impõem mudanças rápidas e novas metodologias de triagem e testagem do sangue doado.

Mais preocupante é o financiamento da Hemorrede paulista, que está estagnado nos últimos anos enquanto boa parte dos insumos é precificada em moeda estrangeira. Para manter a estrutura existente e a qualidade do sangue e implementar expansões e novas tecnologias, a recomposição e novos investimentos são imprescindíveis. Essa é uma história de sucesso de política de saúde pública do SUS que não pode ser negligenciada.

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SÃO, RESPECTIVAMENTE PROFESSORA TITULAR DA UNICAMP, DIRETORA DO HEMOCENTRO DE CAMPINAS; PROFESSOR TITULAR DA USP, DIRETOR-PRESIDENTE DA FUNDAÇÃO HEMOCENTRO DE RIBEIRÃO PRETO; PROFESSOR TITULAR DA USP, DIRETOR-PRESIDENTE DA FUNDAÇÃO PRÓ-SANGUE; DIRETOR TÉCNICO DO HEMOCENTRO DE BOTUCATU DA UNESP; DIRETORA DO HEMOCENTRO DE MARÍLIA; E DIRETOR ADMINISTRATIVO DO HEMOCENTRO DE SÃO JOSÉ DO RIO PRETO

A criação da Hemorrede do Estado de São Paulo, na década de 1980, mudou a história do sangue transfundido aos pacientes do SUS, oferecendo bolsas e hemoderivados da mais alta qualidade e segurança, comparável à Europa e aos EUA. Essa conquista precisa ser reconhecida e não pode ser perdida. Nos últimos anos, a Hemorrede vem sofrendo com a estagnação de seu financiamento. Enquanto boa parte dos insumos para a produção de bolsas de sangue seguras é importada, o real vem se desvalorizando. A conta não fecha e pode comprometer o atendimento aos pacientes.

Nos anos 1980, epidemias de doenças transmitidas pela transfusão de sangue, como a aids e a hepatite C, impuseram uma mudança radical na qualidade das transfusões, sendo estruturada a Hemorrede paulista, composta por seus hemocentros, núcleos e agências. Naquela época, o governo do Estado criou os hemocentros diretamente ligados às melhores universidades da América Latina: USP (São Paulo e Ribeirão Preto), Unicamp (Campinas) e Unesp (Botucatu), além das faculdades de Medicina de Marília e São José do Rio Preto.

Essa articulação foi o segredo para dar qualidade médica e científica à transfusão de sangue e segurança na produção de bolsas de sangue, com a implementação de ações que garantem sua qualidade. Primeiro, a capacitação de profissionais desde a coleta do sangue dos doadores, passando pelo laboratório, enfermeiros e médicos, até o profissional que acompanha a transfusão no paciente. Como exemplo, foram criados dois mestrados profissionais reconhecidos pela Capes e somente no Estado de São Paulo, ligados aos hemocentros e às universidades.

Segundo, trouxe a ciência das universidades para inovar no desenvolvimento tecnológico do sangue: foram produzidos kits sorológicos, testes moleculares para detecção de doenças, novos métodos de tipagem do sangue. Também foram implementados novos e rígidos protocolos de segurança, como a certificação de qualidade e protocolos de transfusão. O conjunto dessas ações vem garantindo a segurança das transfusões no Estado ao longo de quase 40 anos. Não há notícia, na Hemorrede paulista, de contaminações por transfusão por negligência ou imperícia. Isso se deve à qualidade da triagem de doadores e dos testes realizados nos hemocentros públicos, que não terceirizam suas atividades. Pelo contrário, a Hemorrede pública mantém extremo rigor e controle em todas as etapas do processo de controle do sangue.

Atualmente, são fornecidas pela Hemorrede bolsas de sangue e hemoderivados de qualidade para os pacientes do SUS em cerca de 300 hospitais. Em 2023, foram mais de 270 mil bolsas de sangue produzidas para transfusão. Os números são impressionantes e sem-par, mesmo em outros países, para uma estrutura tão enxuta. São Paulo tornou-se modelo em hemoterapia no Brasil.

A Hemorrede continua crescendo e se beneficiando de sua ligação umbilical com as universidades estaduais paulistas, que permitiu a criação de centros avançados de transplante de medula óssea em hospitais públicos, a tipagem de doadores de órgãos para transplantes com a mais alta segurança, banco público de sangue de cordão umbilical para transplantes, terapia gênica para hemofilias e, mais recentemente, a terapia celular avançada (células CAR-T) contra o câncer para pacientes do SUS.

A criação da Hemorrede transformou não apenas aspectos técnicos e científicos, mas também a gestão e a lógica do financiamento público, coibindo transfusões desnecessárias, sem indicação médica, ao ressarcir os hemocentros pela coleta e processamento de sangue e não mais por sua transfusão. Essa mudança, gestada em São Paulo e adotada pelo Ministério da Saúde para todo o País, foi estratégica para implementar políticas de transfusões cautelosas e baseadas especificamente no seu benefício médico, sem vieses econômicos. Ainda há aspectos de gestão a serem aprimorados, como a ampliação de transfusões ambulatoriais, ou seja, aquelas em que o paciente não precisa de internação para receber a transfusão, desafogando leitos hospitalares e unidades de pronto-socorro.

Apesar dos avanços, a Hemorrede enfrenta desafios contínuos. A manutenção de estoques adequados de sangue, principalmente em períodos de baixa doação, é problema a ser superado com melhores estratégias de captação de doadores. A gestão dos estoques articula-se diretamente com redução para o mínimo do descarte de bolsas não transfundidas. Adicionalmente, novos surtos e epidemias de doenças infecciosas que podem ser transmitidas pelo sangue impõem mudanças rápidas e novas metodologias de triagem e testagem do sangue doado.

Mais preocupante é o financiamento da Hemorrede paulista, que está estagnado nos últimos anos enquanto boa parte dos insumos é precificada em moeda estrangeira. Para manter a estrutura existente e a qualidade do sangue e implementar expansões e novas tecnologias, a recomposição e novos investimentos são imprescindíveis. Essa é uma história de sucesso de política de saúde pública do SUS que não pode ser negligenciada.

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SÃO, RESPECTIVAMENTE PROFESSORA TITULAR DA UNICAMP, DIRETORA DO HEMOCENTRO DE CAMPINAS; PROFESSOR TITULAR DA USP, DIRETOR-PRESIDENTE DA FUNDAÇÃO HEMOCENTRO DE RIBEIRÃO PRETO; PROFESSOR TITULAR DA USP, DIRETOR-PRESIDENTE DA FUNDAÇÃO PRÓ-SANGUE; DIRETOR TÉCNICO DO HEMOCENTRO DE BOTUCATU DA UNESP; DIRETORA DO HEMOCENTRO DE MARÍLIA; E DIRETOR ADMINISTRATIVO DO HEMOCENTRO DE SÃO JOSÉ DO RIO PRETO

A criação da Hemorrede do Estado de São Paulo, na década de 1980, mudou a história do sangue transfundido aos pacientes do SUS, oferecendo bolsas e hemoderivados da mais alta qualidade e segurança, comparável à Europa e aos EUA. Essa conquista precisa ser reconhecida e não pode ser perdida. Nos últimos anos, a Hemorrede vem sofrendo com a estagnação de seu financiamento. Enquanto boa parte dos insumos para a produção de bolsas de sangue seguras é importada, o real vem se desvalorizando. A conta não fecha e pode comprometer o atendimento aos pacientes.

Nos anos 1980, epidemias de doenças transmitidas pela transfusão de sangue, como a aids e a hepatite C, impuseram uma mudança radical na qualidade das transfusões, sendo estruturada a Hemorrede paulista, composta por seus hemocentros, núcleos e agências. Naquela época, o governo do Estado criou os hemocentros diretamente ligados às melhores universidades da América Latina: USP (São Paulo e Ribeirão Preto), Unicamp (Campinas) e Unesp (Botucatu), além das faculdades de Medicina de Marília e São José do Rio Preto.

Essa articulação foi o segredo para dar qualidade médica e científica à transfusão de sangue e segurança na produção de bolsas de sangue, com a implementação de ações que garantem sua qualidade. Primeiro, a capacitação de profissionais desde a coleta do sangue dos doadores, passando pelo laboratório, enfermeiros e médicos, até o profissional que acompanha a transfusão no paciente. Como exemplo, foram criados dois mestrados profissionais reconhecidos pela Capes e somente no Estado de São Paulo, ligados aos hemocentros e às universidades.

Segundo, trouxe a ciência das universidades para inovar no desenvolvimento tecnológico do sangue: foram produzidos kits sorológicos, testes moleculares para detecção de doenças, novos métodos de tipagem do sangue. Também foram implementados novos e rígidos protocolos de segurança, como a certificação de qualidade e protocolos de transfusão. O conjunto dessas ações vem garantindo a segurança das transfusões no Estado ao longo de quase 40 anos. Não há notícia, na Hemorrede paulista, de contaminações por transfusão por negligência ou imperícia. Isso se deve à qualidade da triagem de doadores e dos testes realizados nos hemocentros públicos, que não terceirizam suas atividades. Pelo contrário, a Hemorrede pública mantém extremo rigor e controle em todas as etapas do processo de controle do sangue.

Atualmente, são fornecidas pela Hemorrede bolsas de sangue e hemoderivados de qualidade para os pacientes do SUS em cerca de 300 hospitais. Em 2023, foram mais de 270 mil bolsas de sangue produzidas para transfusão. Os números são impressionantes e sem-par, mesmo em outros países, para uma estrutura tão enxuta. São Paulo tornou-se modelo em hemoterapia no Brasil.

A Hemorrede continua crescendo e se beneficiando de sua ligação umbilical com as universidades estaduais paulistas, que permitiu a criação de centros avançados de transplante de medula óssea em hospitais públicos, a tipagem de doadores de órgãos para transplantes com a mais alta segurança, banco público de sangue de cordão umbilical para transplantes, terapia gênica para hemofilias e, mais recentemente, a terapia celular avançada (células CAR-T) contra o câncer para pacientes do SUS.

A criação da Hemorrede transformou não apenas aspectos técnicos e científicos, mas também a gestão e a lógica do financiamento público, coibindo transfusões desnecessárias, sem indicação médica, ao ressarcir os hemocentros pela coleta e processamento de sangue e não mais por sua transfusão. Essa mudança, gestada em São Paulo e adotada pelo Ministério da Saúde para todo o País, foi estratégica para implementar políticas de transfusões cautelosas e baseadas especificamente no seu benefício médico, sem vieses econômicos. Ainda há aspectos de gestão a serem aprimorados, como a ampliação de transfusões ambulatoriais, ou seja, aquelas em que o paciente não precisa de internação para receber a transfusão, desafogando leitos hospitalares e unidades de pronto-socorro.

Apesar dos avanços, a Hemorrede enfrenta desafios contínuos. A manutenção de estoques adequados de sangue, principalmente em períodos de baixa doação, é problema a ser superado com melhores estratégias de captação de doadores. A gestão dos estoques articula-se diretamente com redução para o mínimo do descarte de bolsas não transfundidas. Adicionalmente, novos surtos e epidemias de doenças infecciosas que podem ser transmitidas pelo sangue impõem mudanças rápidas e novas metodologias de triagem e testagem do sangue doado.

Mais preocupante é o financiamento da Hemorrede paulista, que está estagnado nos últimos anos enquanto boa parte dos insumos é precificada em moeda estrangeira. Para manter a estrutura existente e a qualidade do sangue e implementar expansões e novas tecnologias, a recomposição e novos investimentos são imprescindíveis. Essa é uma história de sucesso de política de saúde pública do SUS que não pode ser negligenciada.

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SÃO, RESPECTIVAMENTE PROFESSORA TITULAR DA UNICAMP, DIRETORA DO HEMOCENTRO DE CAMPINAS; PROFESSOR TITULAR DA USP, DIRETOR-PRESIDENTE DA FUNDAÇÃO HEMOCENTRO DE RIBEIRÃO PRETO; PROFESSOR TITULAR DA USP, DIRETOR-PRESIDENTE DA FUNDAÇÃO PRÓ-SANGUE; DIRETOR TÉCNICO DO HEMOCENTRO DE BOTUCATU DA UNESP; DIRETORA DO HEMOCENTRO DE MARÍLIA; E DIRETOR ADMINISTRATIVO DO HEMOCENTRO DE SÃO JOSÉ DO RIO PRETO

Opinião por Sara T. Ollala

Professora titular da Unicamp, é diretora do Hemocentro de Campinas

Rodrigo T. Calado

Professor titular da USP, é diretor-presidente da Fundação Hemocentro de Ribeirão Preto

Vanderson G. Rocha

Professor titular da USP, é diretor-presidente da Fundação Pró-Sangue

Cláudio L. Miranda

Diretor técnico do Hemocentro de Botucatu da Unesp

Renata B. Cardoso

Diretora do Hemocentro de Marília

Octavio Ricci Junior

Diretor administrativo do Hemocentro de São José do Rio Preto

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