As comunidades sempre existiram, algumas tinham essa bandeira fincada no chão sobre ter a consciência exata de se portar como uma, outras não, embora estivessem ali. Quando me refiro a essa bandeira, quero dizer que faço parte da comunidade do meu bairro, do meu local de trabalho, do meu restaurante favorito, da minha bebida predileta e por aí vai. De forma ativa ou não, todos nós pertencemos a algumas comunidades. Sempre acompanhei marcas pelas quais eu me identificava, principalmente pelo design e seus aspectos visuais gerais e pela narrativa criada em cima do produto com histórias incríveis que representavam aquele todo.
Pertenci, de certa forma, a essas comunidades num modelo bem Web2, o que pra mim significa dizer que produtos estavam sendo construídos de dentro para fora; os estímulos e as recompensas giravam basicamente ao redor de descontos em épocas sazonais e o clássico aniversário. Nossos papéis sempre foram muito passivos com relação à colaboração para criar produtos que fossem sustentados nos interesses da comunidade e do consumidor, e o acesso às lideranças que comandam essas marcas era também algo inacessível.
Ao mergulhar nas definições sobre Web3 e na forma como marcas e creators estabelecem conexão com seu público via plataformas descentralizadas, refleti sobre o meu tempo dedicado ao ser uma apaixonada por cultura sneaker, design e música de forma geral. A conta não fechava, o modelo de construção de comunidade na Web3 parecia mais recíproco, justo e genuíno, e é sobre isso que escrevo hoje.
A Web3 está nos mostrando como as comunidades estão se tornando cada vez mais importantes na construção e promoção de marcas e talentos. A razão para isso é simples: as pessoas estão procurando mais do que simplesmente consumir conteúdo ou produtos, elas querem fazer parte de algo maior.
Pensando no território das marcas, uma comunidade precisa ser portadora e curadora de mensagens que representam essa marca. A comunidade é responsável por transmitir a essência e os valores da marca aos seus membros, e por cultivar uma relação de confiança e lealdade entre todas as partes envolvidas. Isso gera diferenciação, pois ajuda a construir uma base sólida de defensores leais que promoverão a marca de forma espontânea e eficaz. Como poderíamos caracterizar os defensores leais? Defensores leais são membros dedicados de uma comunidade construída em torno de uma marca ou creator. É importante lembrar que creators também podem ser vistos como marcas, pois eles podem gerar o mesmo impacto e importância.
Defensores compartilham valores, interesses e objetivos similares com outros membros da comunidade, e se sentem conectados à marca de uma forma mais profunda do que simplesmente sendo clientes ou consumidores. Sentem-se motivados a promovê-la de forma espontânea. Além disso, os defensores leais também tendem a ser mais tolerantes com as falhas da marca e mais dispostos a trabalhar com a marca para resolver problemas e melhorar a experiência do usuário ou produtos.
Em resumo, os defensores leais da marca são uma fonte valiosa de apoio, e recompensá-los deve ser uma tarefa inquestionável. Isso tudo explica um outro recorte sobre a construção dessa relação, que é a economia da atenção versus economia da intenção.
A economia da atenção, que antes dominava o mercado digital, está cedendo lugar a uma nova economia, a economia de intenção. A primeira é marcada por uma competição excessiva pelos estímulos das redes, levando à produção de conteúdo exaustivo e com foco em venda. Em contrapartida, a economia da intenção se concentra em atender às necessidades reais dos consumidores, ao invés de competir por sua atenção. Vender se torna uma consequência dos elos que foram gerados pensando exatamente no que deve ser útil a uma base de super fãs. Isso reflete num alto nível de reciprocidade.
A economia da intenção valoriza a identificação com grupos e lugares independentemente das redes, levando à produção de conteúdo, produtos e recompensas personalizados para comunidades, ao invés de simplesmente suprir algoritmos. As pessoas estão se tornando mais conscientes de seus objetivos e intenções ao serem defensores e doarem tempo para isso.
Uma marca apresentada ao mundo já não é mais limitada a uma narrativa fabricada em escritórios corporativos e controlada por equipes de marketing. Em vez disso, é composta por uma soma de histórias, conexões humanas, e tem uma abrangência ilimitada. Essas histórias juntas revelam pontos de contato entre as pessoas e a marca, e isso é fundamental para construir relações de confiança e lealdade. Histórias humanizam a marca e tornam as conexões mais autênticas e significativas, isso nunca mudou.
As comunidades Web3 proporcionam um ambiente para que pessoas com valores e crenças semelhantes se conectem, gerando ainda mais valor umas para as outras. Isso está influenciando a forma como as marcas se apresentam e estabelecem relacionamentos com seus públicos. A Web3 tem o potencial de mudar significativamente essa relação. Ainda há desafios, mas há perspectivas positivas.
Cerca de 43 das 100 principais marcas globais já experimentaram a tecnologia Web3, incluindo programas de fidelidade e NFTs, segundo dados da Messari. Embora muitos projetos possam falhar no início, isso não se deve a falhas na equipe, mas sim à falta de um modelo estabelecido sobre o que funciona ou não.
Não existe uma fórmula ideal, é preciso experimentação. Percorrer esta jornada de descoberta aumentará as chances de sucesso para as marcas atuais e fornecerá preciosos conhecimentos para as marcas que ainda vão explorar esse território.
Nunca houve uma oportunidade tão grande de reconhecer e valorizar pessoas que dedicam tempo e esforço para construir algo significativo para uma marca ou criador de forma genuína. Histórias criadas e compartilhadas pela comunidade são muito mais poderosas do que histórias contadas diretamente pela marca, pois são vistas como mais confiáveis e autênticas.
O verdadeiro poder de uma comunidade na Web3 reside em sua capacidade de criar histórias e conexões significativas entre pessoas, permitindo a construção de relações autênticas e recompensadoras que transcendem o digital e se estendem ao mundo real. Nesse jogo, todos ganham e todas as partes geram valor umas para as outras.
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ENGENHEIRA DE PRODUÇÃO,É CHIEF MARKETING OFFICER (CMO) DA LUMX STUDIOS