Opinião|Não podemos dar vantagem ao vírus


Devemos ser cuidadosos para definir quais populações são elegíveis para a terceira dose

Por Luiz Fernando Lima Reis

Recebi de vários colegas perguntas sobre o experimento na cidade de Serrana, no interior de São Paulo, que vacinou toda a população com as duas doses da Coronavac e acompanhou os resultados. A minha resposta foi sempre a mesma: a pesquisa é muito boa, mas não aprendemos nada de novo. Pois o fato é que não tínhamos dúvida de que a vacina era eficiente. O experimento, muito relevante e bem conduzido, só confirmou a efetividade da vacina, com redução significativa dos casos de covid-19 (80%), das hospitalizações (86%) e dos óbitos (95%). Sabíamos que ia funcionar. Experimentos como esse e os dados do mundo real consolidam as vacinas como nossa principal arma para o enfrentamento da covid-19 reforçam o papel do conhecimento como balizador das tomadas de decisão no controle da pandemia.

É assim que deveria ser sempre, com a ciência fundamentando as políticas públicas e a assistência médica, e não esta ambiguidade que vivemos nos dias de hoje. De um lado, como resultado do aumento de vacinados, notamos uma queda significativa nos números de casos, hospitalizações e óbitos. Em paralelo, observamos um movimento forte de abandonar o comportamento seguro, com eventos lotados, estádios cheios, e com público cada vez maior, e uma sensação de que “a pandemia acabou”, até no Brasil. E nesse cenário de queda de casos e mortes e abertura e retomada da vida pré-pandemia, temos a variante Delta, que cresce de forma rápida e, segundo os dados da Organização Mundial da Saúde, já representa cerca de 80% dos novos casos mundo afora.

O surgimento de variantes, consequência do processo natural de mutação do Sars-CoV2, continuará enquanto o vírus se multiplicar em larga escala entre indivíduos não vacinados ou parcialmente vacinados. E os dados no Brasil mostram exatamente isso, que a circulação da variante Delta vem aumentando, em especial na população que não completou seu esquema de imunização. Por isso, vacinar o maior número de indivíduos é nossa melhor, talvez a única, estratégia para evitar que novas variantes, denominadas agora pelas letras do alfabeto grego, continuem a se desenvolver e desafiar nosso dia a dia.

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Os dados de avaliação da efetividade das vacinas no mundo real mostram que para a variante Delta duas doses das vacinas mais amplamente utilizadas continuam efetivas. Quando comparada com a variante Alfa, a redução da efetividade contra casos sintomáticos de covid-19 causadas pela variante Delta foi de 7,5% (de 74,5% para 67%) e de 5,7% (de 93,7% para 88,0%) para as vacinas da AstraZeneca/Oxford e Pfizer/BioNTech, respectivamente, para indivíduos com as duas doses das vacinas. Para indivíduos com uma única dose, a redução da efetividade, de 18%, é significativa (NEJM, DOI: 10.1056/NEJMoa2108891).

Vacinas contra a covid-19 ainda são um bem escasso, no Brasil e na maior parte do mundo. A efetividade delas contra a nova variante está sendo monitorada e avaliada, assim como a duração da proteção conferida e a identificação de grupos mais propensos a apresentar menor resposta à vacinação. E é com base em todas essas informações que deveríamos pautar as recomendações que norteiam as políticas públicas e a discussão de uma terceira dose. Uma dose adicional de vacina pode ser necessária em algumas circunstâncias, para alguns grupos populacionais, em locais com circulação de determinadas variantes, e decorrido determinado tempo após a vacinação com duas doses.

Além disso, não há dúvidas de que uma alta cobertura vacinal da população, com duas doses de qualquer vacina registrada, é mais importante para a proteção das pessoas do que uma terceira dose para determinados indivíduos com esquema já completo.

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Do ponto de vista do conhecimento sobre vacinas e o sistema imune, duas coisas sempre foram muito bem estabelecidas. Primeiro, sabemos que as vacinas de vírus inativado representam uma tecnologia muito segura, amplamente dominada, mas levam a uma indução de resposta imune não tão robusta e talvez não tão duradoura quanto outras tecnologias desenvolvidas mais recentemente. Outro aspecto importante é o fato de que, com o avanço da idade, o sistema imune perde robustez na capacidade de resposta a estímulos – a chamada imunossenescência. São esses dois aspectos que, juntos, trazem à tona a discussão da necessidade de uma terceira dose na população mais idosa que recebeu vacinas de vírus inativado, diante do avanço da variante Delta.

Essa discussão, que não é restrita ao Brasil, deve, necessariamente, levar em conta as evidências de efetividade das vacinas, as condições de risco de determinadas populações e as condições de espalhamento da covid-19, ante os ganhos de proteção com cada uma das estratégias a serem adotadas. Continuamos com a responsabilidade de reduzir os casos graves, obtidos, e o sofrimento. Diante da aceleração da variante Delta, devemos ser cuidadosos e seletivos para definir quais as populações sob maior risco devem ser elegíveis para uma terceira dose. E para todos permanece a responsabilidade das medidas de distanciamento e uso de máscara. Não podemos dar ao vírus a vantagem de avançar no alfabeto greco.

DOUTOR EM IMUNOLOGIA PELA ESCOLA DE MEDICINA DA UNIVERSIDADE DE NOVA YORK, É DIRETOR DE ENSINO E PESQUISA DO HOSPITAL SÍRIO-LIBANÊS

Recebi de vários colegas perguntas sobre o experimento na cidade de Serrana, no interior de São Paulo, que vacinou toda a população com as duas doses da Coronavac e acompanhou os resultados. A minha resposta foi sempre a mesma: a pesquisa é muito boa, mas não aprendemos nada de novo. Pois o fato é que não tínhamos dúvida de que a vacina era eficiente. O experimento, muito relevante e bem conduzido, só confirmou a efetividade da vacina, com redução significativa dos casos de covid-19 (80%), das hospitalizações (86%) e dos óbitos (95%). Sabíamos que ia funcionar. Experimentos como esse e os dados do mundo real consolidam as vacinas como nossa principal arma para o enfrentamento da covid-19 reforçam o papel do conhecimento como balizador das tomadas de decisão no controle da pandemia.

É assim que deveria ser sempre, com a ciência fundamentando as políticas públicas e a assistência médica, e não esta ambiguidade que vivemos nos dias de hoje. De um lado, como resultado do aumento de vacinados, notamos uma queda significativa nos números de casos, hospitalizações e óbitos. Em paralelo, observamos um movimento forte de abandonar o comportamento seguro, com eventos lotados, estádios cheios, e com público cada vez maior, e uma sensação de que “a pandemia acabou”, até no Brasil. E nesse cenário de queda de casos e mortes e abertura e retomada da vida pré-pandemia, temos a variante Delta, que cresce de forma rápida e, segundo os dados da Organização Mundial da Saúde, já representa cerca de 80% dos novos casos mundo afora.

O surgimento de variantes, consequência do processo natural de mutação do Sars-CoV2, continuará enquanto o vírus se multiplicar em larga escala entre indivíduos não vacinados ou parcialmente vacinados. E os dados no Brasil mostram exatamente isso, que a circulação da variante Delta vem aumentando, em especial na população que não completou seu esquema de imunização. Por isso, vacinar o maior número de indivíduos é nossa melhor, talvez a única, estratégia para evitar que novas variantes, denominadas agora pelas letras do alfabeto grego, continuem a se desenvolver e desafiar nosso dia a dia.

Os dados de avaliação da efetividade das vacinas no mundo real mostram que para a variante Delta duas doses das vacinas mais amplamente utilizadas continuam efetivas. Quando comparada com a variante Alfa, a redução da efetividade contra casos sintomáticos de covid-19 causadas pela variante Delta foi de 7,5% (de 74,5% para 67%) e de 5,7% (de 93,7% para 88,0%) para as vacinas da AstraZeneca/Oxford e Pfizer/BioNTech, respectivamente, para indivíduos com as duas doses das vacinas. Para indivíduos com uma única dose, a redução da efetividade, de 18%, é significativa (NEJM, DOI: 10.1056/NEJMoa2108891).

Vacinas contra a covid-19 ainda são um bem escasso, no Brasil e na maior parte do mundo. A efetividade delas contra a nova variante está sendo monitorada e avaliada, assim como a duração da proteção conferida e a identificação de grupos mais propensos a apresentar menor resposta à vacinação. E é com base em todas essas informações que deveríamos pautar as recomendações que norteiam as políticas públicas e a discussão de uma terceira dose. Uma dose adicional de vacina pode ser necessária em algumas circunstâncias, para alguns grupos populacionais, em locais com circulação de determinadas variantes, e decorrido determinado tempo após a vacinação com duas doses.

Além disso, não há dúvidas de que uma alta cobertura vacinal da população, com duas doses de qualquer vacina registrada, é mais importante para a proteção das pessoas do que uma terceira dose para determinados indivíduos com esquema já completo.

Do ponto de vista do conhecimento sobre vacinas e o sistema imune, duas coisas sempre foram muito bem estabelecidas. Primeiro, sabemos que as vacinas de vírus inativado representam uma tecnologia muito segura, amplamente dominada, mas levam a uma indução de resposta imune não tão robusta e talvez não tão duradoura quanto outras tecnologias desenvolvidas mais recentemente. Outro aspecto importante é o fato de que, com o avanço da idade, o sistema imune perde robustez na capacidade de resposta a estímulos – a chamada imunossenescência. São esses dois aspectos que, juntos, trazem à tona a discussão da necessidade de uma terceira dose na população mais idosa que recebeu vacinas de vírus inativado, diante do avanço da variante Delta.

Essa discussão, que não é restrita ao Brasil, deve, necessariamente, levar em conta as evidências de efetividade das vacinas, as condições de risco de determinadas populações e as condições de espalhamento da covid-19, ante os ganhos de proteção com cada uma das estratégias a serem adotadas. Continuamos com a responsabilidade de reduzir os casos graves, obtidos, e o sofrimento. Diante da aceleração da variante Delta, devemos ser cuidadosos e seletivos para definir quais as populações sob maior risco devem ser elegíveis para uma terceira dose. E para todos permanece a responsabilidade das medidas de distanciamento e uso de máscara. Não podemos dar ao vírus a vantagem de avançar no alfabeto greco.

DOUTOR EM IMUNOLOGIA PELA ESCOLA DE MEDICINA DA UNIVERSIDADE DE NOVA YORK, É DIRETOR DE ENSINO E PESQUISA DO HOSPITAL SÍRIO-LIBANÊS

Recebi de vários colegas perguntas sobre o experimento na cidade de Serrana, no interior de São Paulo, que vacinou toda a população com as duas doses da Coronavac e acompanhou os resultados. A minha resposta foi sempre a mesma: a pesquisa é muito boa, mas não aprendemos nada de novo. Pois o fato é que não tínhamos dúvida de que a vacina era eficiente. O experimento, muito relevante e bem conduzido, só confirmou a efetividade da vacina, com redução significativa dos casos de covid-19 (80%), das hospitalizações (86%) e dos óbitos (95%). Sabíamos que ia funcionar. Experimentos como esse e os dados do mundo real consolidam as vacinas como nossa principal arma para o enfrentamento da covid-19 reforçam o papel do conhecimento como balizador das tomadas de decisão no controle da pandemia.

É assim que deveria ser sempre, com a ciência fundamentando as políticas públicas e a assistência médica, e não esta ambiguidade que vivemos nos dias de hoje. De um lado, como resultado do aumento de vacinados, notamos uma queda significativa nos números de casos, hospitalizações e óbitos. Em paralelo, observamos um movimento forte de abandonar o comportamento seguro, com eventos lotados, estádios cheios, e com público cada vez maior, e uma sensação de que “a pandemia acabou”, até no Brasil. E nesse cenário de queda de casos e mortes e abertura e retomada da vida pré-pandemia, temos a variante Delta, que cresce de forma rápida e, segundo os dados da Organização Mundial da Saúde, já representa cerca de 80% dos novos casos mundo afora.

O surgimento de variantes, consequência do processo natural de mutação do Sars-CoV2, continuará enquanto o vírus se multiplicar em larga escala entre indivíduos não vacinados ou parcialmente vacinados. E os dados no Brasil mostram exatamente isso, que a circulação da variante Delta vem aumentando, em especial na população que não completou seu esquema de imunização. Por isso, vacinar o maior número de indivíduos é nossa melhor, talvez a única, estratégia para evitar que novas variantes, denominadas agora pelas letras do alfabeto grego, continuem a se desenvolver e desafiar nosso dia a dia.

Os dados de avaliação da efetividade das vacinas no mundo real mostram que para a variante Delta duas doses das vacinas mais amplamente utilizadas continuam efetivas. Quando comparada com a variante Alfa, a redução da efetividade contra casos sintomáticos de covid-19 causadas pela variante Delta foi de 7,5% (de 74,5% para 67%) e de 5,7% (de 93,7% para 88,0%) para as vacinas da AstraZeneca/Oxford e Pfizer/BioNTech, respectivamente, para indivíduos com as duas doses das vacinas. Para indivíduos com uma única dose, a redução da efetividade, de 18%, é significativa (NEJM, DOI: 10.1056/NEJMoa2108891).

Vacinas contra a covid-19 ainda são um bem escasso, no Brasil e na maior parte do mundo. A efetividade delas contra a nova variante está sendo monitorada e avaliada, assim como a duração da proteção conferida e a identificação de grupos mais propensos a apresentar menor resposta à vacinação. E é com base em todas essas informações que deveríamos pautar as recomendações que norteiam as políticas públicas e a discussão de uma terceira dose. Uma dose adicional de vacina pode ser necessária em algumas circunstâncias, para alguns grupos populacionais, em locais com circulação de determinadas variantes, e decorrido determinado tempo após a vacinação com duas doses.

Além disso, não há dúvidas de que uma alta cobertura vacinal da população, com duas doses de qualquer vacina registrada, é mais importante para a proteção das pessoas do que uma terceira dose para determinados indivíduos com esquema já completo.

Do ponto de vista do conhecimento sobre vacinas e o sistema imune, duas coisas sempre foram muito bem estabelecidas. Primeiro, sabemos que as vacinas de vírus inativado representam uma tecnologia muito segura, amplamente dominada, mas levam a uma indução de resposta imune não tão robusta e talvez não tão duradoura quanto outras tecnologias desenvolvidas mais recentemente. Outro aspecto importante é o fato de que, com o avanço da idade, o sistema imune perde robustez na capacidade de resposta a estímulos – a chamada imunossenescência. São esses dois aspectos que, juntos, trazem à tona a discussão da necessidade de uma terceira dose na população mais idosa que recebeu vacinas de vírus inativado, diante do avanço da variante Delta.

Essa discussão, que não é restrita ao Brasil, deve, necessariamente, levar em conta as evidências de efetividade das vacinas, as condições de risco de determinadas populações e as condições de espalhamento da covid-19, ante os ganhos de proteção com cada uma das estratégias a serem adotadas. Continuamos com a responsabilidade de reduzir os casos graves, obtidos, e o sofrimento. Diante da aceleração da variante Delta, devemos ser cuidadosos e seletivos para definir quais as populações sob maior risco devem ser elegíveis para uma terceira dose. E para todos permanece a responsabilidade das medidas de distanciamento e uso de máscara. Não podemos dar ao vírus a vantagem de avançar no alfabeto greco.

DOUTOR EM IMUNOLOGIA PELA ESCOLA DE MEDICINA DA UNIVERSIDADE DE NOVA YORK, É DIRETOR DE ENSINO E PESQUISA DO HOSPITAL SÍRIO-LIBANÊS

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