Opinião|O colapso das ferrovias


A prioridade dada às rodovias não justifica o abandono das ferrovias, que deveriam ser vistas como o principal meio de transporte de cargas pesadas e de passageiros à longa distância

Por Almir Pazzianotto Pinto

Nos altos escalões da República nada se diz sobre o colapso da malha ferroviária, um dos pontos fracos da nossa precária infraestrutura, responsável pela baixa produtividade do Brasil.

A rede se estende de forma descoordenada ao longo de 30.129 quilômetros (km), distribuídos entre 22 Estados e o Distrito Federal. A maior parte se destina a transporte de cargas, como minério de ferro. É reduzido o número de quilômetros explorados para deslocamento de passageiros. A maior extensão se registrou na década de 1960, quando alcançou 38.287 quilômetros. Na Mensagem ao Congresso Nacional relativa ao ano de 1956, o presidente Juscelino Kubitschek declarava existirem 37.100 quilômetros, “sendo 2.880 km em bitola de 1,60 metro, 33.120 km em bitola de 1,00 metro e 1.060 km em bitolas inferiores a 1 metro”. Também relacionava as ferrovias em fase de construção (página 418).

Passados mais de 60 anos, a quilometragem se reduziu em aproximadamente 7 mil quilômetros, mantendo-se a diversidade de bitolas. Em todo o Brasil, são quatro as medidas entre os trilhos. Temos 4.057 quilômetros em bitola larga, ou irlandesa, de 1,6 metro; 202,4 quilômetros em bitola padrão, ou internacional, de 1,435 metro; 23.489 quilômetros em bitola de 1 metro; e 396 quilômetros em bitola mista. Em pequenos trechos turísticos, sem expressão comercial, são encontradas bitolas de 0,6 metro e 0,763 metro.

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Durante a maior parte do Segundo Império e ao longo da Primeira República, as ferrovias garantiam o transporte do café para os Portos do Rio de Janeiro e de Santos. A partir dos anos 1970, com prejuízos crescentes, bitolas diferentes, falta de interligação com sistemas regionais e ausência de plano ferroviário de amplitude nacional, a malha ferroviária entrou em declínio, beneficiando rodovias e frotas de caminhões movidos por motores a gasolina ou óleo diesel.

Em 27 de setembro de 1825 inaugurou-se na Inglaterra a primeira linha férrea, entre as cidades de Stockton e Darlington. No Brasil, em 31 de outubro de 1835, passados apenas dez anos, o regente Diogo Antônio Feijó assinou o Decreto n.º 101, projetando a criação de ferrovias destinadas a ligar o Rio de Janeiro, capital do Império, a Ouro Preto, capital da província de Minas Gerais, Salvador e Porto Alegre. O projeto não foi concretizado. Morreu no papel. Em 26 de junho de 1852, dom Pedro II procurou retomar a iniciativa com o Decreto n.º 641, cujo destino foi o mesmo.

A primeira ferrovia brasileira foi obra de Irineu Evangelista de Souza, o Barão de Mauá, “seguramente a maior figura do Segundo Reinado, compreendida na sua essência progressista e emancipadora”, na autorizada opinião de Lídia Besouchet. “A inauguração da Estrada de Ferro Mauá ocorreu em 30 de abril de 1854, 22 meses e 18 dias após Mauá haver obtido autorização de dom Pedro II para sua incorporação. O trecho inaugurado ia do Porto de Estrela, passando por Inhomirim, à Estação do Fragoso, num total de 14 quilômetros e 500 metros” (Mauá e seu tempo, Editora Nova Fronteira, Rio de Janeiro, 1978, página 69).

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O Brasil é paupérrimo em ferrovias. Compare-se a nossa malha com a dos Estados Unidos (293.564 km); a da China (124 mil km); a da Rússia (87 mil km); ou a do Canadá (77 mil km). A montanhosa Itália, com área de 301.302 quilômetros quadrados, inferior à do Maranhão, tem 16.627 km de modernas vias férreas, 70% eletrificadas, com trens de passageiros que trafegam à velocidade de 300 quilômetros por hora, os mais rápidos da Europa.

A histórica negligência em relação ao transporte ferroviário impede a existência de vias férreas modernas, de extensão nacional, com trens de alta velocidade. Excelente livro sobre o assunto foi editado pela Associação Brasileira da Indústria Ferroviária (Abifer), para comemorar os 45 anos de existência da entidade. Em melancólica frase, a Abifer reflete a situação das nossas ferrovias: “A indústria ferroviária brasileira instalada no Brasil vivencia hoje uma dramática ociosidade de 80% na área de cargas e de 100% na área de passageiros, com reflexos negativos na geração de empregos qualificados que nossa indústria proporciona e que lhe têm sido subtraídos”. Quem desejar conhecer um pouco mais sobre esse segmento industrial, hoje menor do que era na década de 1960, nele encontrará valiosa fonte de informações.

É deplorável que a ligação de Brasília com São Paulo, Curitiba, Florianópolis, Porto Alegre, Rio de Janeiro, Salvador, Recife e Belém dependa de empresas aéreas ou do transporte rodoviário. É inexplicável que, no planejamento da nova capital, inaugurada em 1960, tenha sido ignorada a importância estratégica das estradas ferroviárias.

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O transporte rodoviário é o principal modal logístico do País. Temos 1.721.092 km de rodovias, 12,4% pavimentadas, por onde circulam 65% das cargas movimentadas. A prioridade dada às rodovias não justifica, porém, o abandono das ferrovias, que deveriam ser vistas como meio de transporte prioritário de cargas pesadas e de passageiros à longa distância, como ocorre nos países desenvolvidos.

*

ADVOGADO, FOI MINISTRO DO TRABALHO E PRESIDENTE DO TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO (TST)

Nos altos escalões da República nada se diz sobre o colapso da malha ferroviária, um dos pontos fracos da nossa precária infraestrutura, responsável pela baixa produtividade do Brasil.

A rede se estende de forma descoordenada ao longo de 30.129 quilômetros (km), distribuídos entre 22 Estados e o Distrito Federal. A maior parte se destina a transporte de cargas, como minério de ferro. É reduzido o número de quilômetros explorados para deslocamento de passageiros. A maior extensão se registrou na década de 1960, quando alcançou 38.287 quilômetros. Na Mensagem ao Congresso Nacional relativa ao ano de 1956, o presidente Juscelino Kubitschek declarava existirem 37.100 quilômetros, “sendo 2.880 km em bitola de 1,60 metro, 33.120 km em bitola de 1,00 metro e 1.060 km em bitolas inferiores a 1 metro”. Também relacionava as ferrovias em fase de construção (página 418).

Passados mais de 60 anos, a quilometragem se reduziu em aproximadamente 7 mil quilômetros, mantendo-se a diversidade de bitolas. Em todo o Brasil, são quatro as medidas entre os trilhos. Temos 4.057 quilômetros em bitola larga, ou irlandesa, de 1,6 metro; 202,4 quilômetros em bitola padrão, ou internacional, de 1,435 metro; 23.489 quilômetros em bitola de 1 metro; e 396 quilômetros em bitola mista. Em pequenos trechos turísticos, sem expressão comercial, são encontradas bitolas de 0,6 metro e 0,763 metro.

Durante a maior parte do Segundo Império e ao longo da Primeira República, as ferrovias garantiam o transporte do café para os Portos do Rio de Janeiro e de Santos. A partir dos anos 1970, com prejuízos crescentes, bitolas diferentes, falta de interligação com sistemas regionais e ausência de plano ferroviário de amplitude nacional, a malha ferroviária entrou em declínio, beneficiando rodovias e frotas de caminhões movidos por motores a gasolina ou óleo diesel.

Em 27 de setembro de 1825 inaugurou-se na Inglaterra a primeira linha férrea, entre as cidades de Stockton e Darlington. No Brasil, em 31 de outubro de 1835, passados apenas dez anos, o regente Diogo Antônio Feijó assinou o Decreto n.º 101, projetando a criação de ferrovias destinadas a ligar o Rio de Janeiro, capital do Império, a Ouro Preto, capital da província de Minas Gerais, Salvador e Porto Alegre. O projeto não foi concretizado. Morreu no papel. Em 26 de junho de 1852, dom Pedro II procurou retomar a iniciativa com o Decreto n.º 641, cujo destino foi o mesmo.

A primeira ferrovia brasileira foi obra de Irineu Evangelista de Souza, o Barão de Mauá, “seguramente a maior figura do Segundo Reinado, compreendida na sua essência progressista e emancipadora”, na autorizada opinião de Lídia Besouchet. “A inauguração da Estrada de Ferro Mauá ocorreu em 30 de abril de 1854, 22 meses e 18 dias após Mauá haver obtido autorização de dom Pedro II para sua incorporação. O trecho inaugurado ia do Porto de Estrela, passando por Inhomirim, à Estação do Fragoso, num total de 14 quilômetros e 500 metros” (Mauá e seu tempo, Editora Nova Fronteira, Rio de Janeiro, 1978, página 69).

O Brasil é paupérrimo em ferrovias. Compare-se a nossa malha com a dos Estados Unidos (293.564 km); a da China (124 mil km); a da Rússia (87 mil km); ou a do Canadá (77 mil km). A montanhosa Itália, com área de 301.302 quilômetros quadrados, inferior à do Maranhão, tem 16.627 km de modernas vias férreas, 70% eletrificadas, com trens de passageiros que trafegam à velocidade de 300 quilômetros por hora, os mais rápidos da Europa.

A histórica negligência em relação ao transporte ferroviário impede a existência de vias férreas modernas, de extensão nacional, com trens de alta velocidade. Excelente livro sobre o assunto foi editado pela Associação Brasileira da Indústria Ferroviária (Abifer), para comemorar os 45 anos de existência da entidade. Em melancólica frase, a Abifer reflete a situação das nossas ferrovias: “A indústria ferroviária brasileira instalada no Brasil vivencia hoje uma dramática ociosidade de 80% na área de cargas e de 100% na área de passageiros, com reflexos negativos na geração de empregos qualificados que nossa indústria proporciona e que lhe têm sido subtraídos”. Quem desejar conhecer um pouco mais sobre esse segmento industrial, hoje menor do que era na década de 1960, nele encontrará valiosa fonte de informações.

É deplorável que a ligação de Brasília com São Paulo, Curitiba, Florianópolis, Porto Alegre, Rio de Janeiro, Salvador, Recife e Belém dependa de empresas aéreas ou do transporte rodoviário. É inexplicável que, no planejamento da nova capital, inaugurada em 1960, tenha sido ignorada a importância estratégica das estradas ferroviárias.

O transporte rodoviário é o principal modal logístico do País. Temos 1.721.092 km de rodovias, 12,4% pavimentadas, por onde circulam 65% das cargas movimentadas. A prioridade dada às rodovias não justifica, porém, o abandono das ferrovias, que deveriam ser vistas como meio de transporte prioritário de cargas pesadas e de passageiros à longa distância, como ocorre nos países desenvolvidos.

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ADVOGADO, FOI MINISTRO DO TRABALHO E PRESIDENTE DO TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO (TST)

Nos altos escalões da República nada se diz sobre o colapso da malha ferroviária, um dos pontos fracos da nossa precária infraestrutura, responsável pela baixa produtividade do Brasil.

A rede se estende de forma descoordenada ao longo de 30.129 quilômetros (km), distribuídos entre 22 Estados e o Distrito Federal. A maior parte se destina a transporte de cargas, como minério de ferro. É reduzido o número de quilômetros explorados para deslocamento de passageiros. A maior extensão se registrou na década de 1960, quando alcançou 38.287 quilômetros. Na Mensagem ao Congresso Nacional relativa ao ano de 1956, o presidente Juscelino Kubitschek declarava existirem 37.100 quilômetros, “sendo 2.880 km em bitola de 1,60 metro, 33.120 km em bitola de 1,00 metro e 1.060 km em bitolas inferiores a 1 metro”. Também relacionava as ferrovias em fase de construção (página 418).

Passados mais de 60 anos, a quilometragem se reduziu em aproximadamente 7 mil quilômetros, mantendo-se a diversidade de bitolas. Em todo o Brasil, são quatro as medidas entre os trilhos. Temos 4.057 quilômetros em bitola larga, ou irlandesa, de 1,6 metro; 202,4 quilômetros em bitola padrão, ou internacional, de 1,435 metro; 23.489 quilômetros em bitola de 1 metro; e 396 quilômetros em bitola mista. Em pequenos trechos turísticos, sem expressão comercial, são encontradas bitolas de 0,6 metro e 0,763 metro.

Durante a maior parte do Segundo Império e ao longo da Primeira República, as ferrovias garantiam o transporte do café para os Portos do Rio de Janeiro e de Santos. A partir dos anos 1970, com prejuízos crescentes, bitolas diferentes, falta de interligação com sistemas regionais e ausência de plano ferroviário de amplitude nacional, a malha ferroviária entrou em declínio, beneficiando rodovias e frotas de caminhões movidos por motores a gasolina ou óleo diesel.

Em 27 de setembro de 1825 inaugurou-se na Inglaterra a primeira linha férrea, entre as cidades de Stockton e Darlington. No Brasil, em 31 de outubro de 1835, passados apenas dez anos, o regente Diogo Antônio Feijó assinou o Decreto n.º 101, projetando a criação de ferrovias destinadas a ligar o Rio de Janeiro, capital do Império, a Ouro Preto, capital da província de Minas Gerais, Salvador e Porto Alegre. O projeto não foi concretizado. Morreu no papel. Em 26 de junho de 1852, dom Pedro II procurou retomar a iniciativa com o Decreto n.º 641, cujo destino foi o mesmo.

A primeira ferrovia brasileira foi obra de Irineu Evangelista de Souza, o Barão de Mauá, “seguramente a maior figura do Segundo Reinado, compreendida na sua essência progressista e emancipadora”, na autorizada opinião de Lídia Besouchet. “A inauguração da Estrada de Ferro Mauá ocorreu em 30 de abril de 1854, 22 meses e 18 dias após Mauá haver obtido autorização de dom Pedro II para sua incorporação. O trecho inaugurado ia do Porto de Estrela, passando por Inhomirim, à Estação do Fragoso, num total de 14 quilômetros e 500 metros” (Mauá e seu tempo, Editora Nova Fronteira, Rio de Janeiro, 1978, página 69).

O Brasil é paupérrimo em ferrovias. Compare-se a nossa malha com a dos Estados Unidos (293.564 km); a da China (124 mil km); a da Rússia (87 mil km); ou a do Canadá (77 mil km). A montanhosa Itália, com área de 301.302 quilômetros quadrados, inferior à do Maranhão, tem 16.627 km de modernas vias férreas, 70% eletrificadas, com trens de passageiros que trafegam à velocidade de 300 quilômetros por hora, os mais rápidos da Europa.

A histórica negligência em relação ao transporte ferroviário impede a existência de vias férreas modernas, de extensão nacional, com trens de alta velocidade. Excelente livro sobre o assunto foi editado pela Associação Brasileira da Indústria Ferroviária (Abifer), para comemorar os 45 anos de existência da entidade. Em melancólica frase, a Abifer reflete a situação das nossas ferrovias: “A indústria ferroviária brasileira instalada no Brasil vivencia hoje uma dramática ociosidade de 80% na área de cargas e de 100% na área de passageiros, com reflexos negativos na geração de empregos qualificados que nossa indústria proporciona e que lhe têm sido subtraídos”. Quem desejar conhecer um pouco mais sobre esse segmento industrial, hoje menor do que era na década de 1960, nele encontrará valiosa fonte de informações.

É deplorável que a ligação de Brasília com São Paulo, Curitiba, Florianópolis, Porto Alegre, Rio de Janeiro, Salvador, Recife e Belém dependa de empresas aéreas ou do transporte rodoviário. É inexplicável que, no planejamento da nova capital, inaugurada em 1960, tenha sido ignorada a importância estratégica das estradas ferroviárias.

O transporte rodoviário é o principal modal logístico do País. Temos 1.721.092 km de rodovias, 12,4% pavimentadas, por onde circulam 65% das cargas movimentadas. A prioridade dada às rodovias não justifica, porém, o abandono das ferrovias, que deveriam ser vistas como meio de transporte prioritário de cargas pesadas e de passageiros à longa distância, como ocorre nos países desenvolvidos.

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ADVOGADO, FOI MINISTRO DO TRABALHO E PRESIDENTE DO TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO (TST)

Nos altos escalões da República nada se diz sobre o colapso da malha ferroviária, um dos pontos fracos da nossa precária infraestrutura, responsável pela baixa produtividade do Brasil.

A rede se estende de forma descoordenada ao longo de 30.129 quilômetros (km), distribuídos entre 22 Estados e o Distrito Federal. A maior parte se destina a transporte de cargas, como minério de ferro. É reduzido o número de quilômetros explorados para deslocamento de passageiros. A maior extensão se registrou na década de 1960, quando alcançou 38.287 quilômetros. Na Mensagem ao Congresso Nacional relativa ao ano de 1956, o presidente Juscelino Kubitschek declarava existirem 37.100 quilômetros, “sendo 2.880 km em bitola de 1,60 metro, 33.120 km em bitola de 1,00 metro e 1.060 km em bitolas inferiores a 1 metro”. Também relacionava as ferrovias em fase de construção (página 418).

Passados mais de 60 anos, a quilometragem se reduziu em aproximadamente 7 mil quilômetros, mantendo-se a diversidade de bitolas. Em todo o Brasil, são quatro as medidas entre os trilhos. Temos 4.057 quilômetros em bitola larga, ou irlandesa, de 1,6 metro; 202,4 quilômetros em bitola padrão, ou internacional, de 1,435 metro; 23.489 quilômetros em bitola de 1 metro; e 396 quilômetros em bitola mista. Em pequenos trechos turísticos, sem expressão comercial, são encontradas bitolas de 0,6 metro e 0,763 metro.

Durante a maior parte do Segundo Império e ao longo da Primeira República, as ferrovias garantiam o transporte do café para os Portos do Rio de Janeiro e de Santos. A partir dos anos 1970, com prejuízos crescentes, bitolas diferentes, falta de interligação com sistemas regionais e ausência de plano ferroviário de amplitude nacional, a malha ferroviária entrou em declínio, beneficiando rodovias e frotas de caminhões movidos por motores a gasolina ou óleo diesel.

Em 27 de setembro de 1825 inaugurou-se na Inglaterra a primeira linha férrea, entre as cidades de Stockton e Darlington. No Brasil, em 31 de outubro de 1835, passados apenas dez anos, o regente Diogo Antônio Feijó assinou o Decreto n.º 101, projetando a criação de ferrovias destinadas a ligar o Rio de Janeiro, capital do Império, a Ouro Preto, capital da província de Minas Gerais, Salvador e Porto Alegre. O projeto não foi concretizado. Morreu no papel. Em 26 de junho de 1852, dom Pedro II procurou retomar a iniciativa com o Decreto n.º 641, cujo destino foi o mesmo.

A primeira ferrovia brasileira foi obra de Irineu Evangelista de Souza, o Barão de Mauá, “seguramente a maior figura do Segundo Reinado, compreendida na sua essência progressista e emancipadora”, na autorizada opinião de Lídia Besouchet. “A inauguração da Estrada de Ferro Mauá ocorreu em 30 de abril de 1854, 22 meses e 18 dias após Mauá haver obtido autorização de dom Pedro II para sua incorporação. O trecho inaugurado ia do Porto de Estrela, passando por Inhomirim, à Estação do Fragoso, num total de 14 quilômetros e 500 metros” (Mauá e seu tempo, Editora Nova Fronteira, Rio de Janeiro, 1978, página 69).

O Brasil é paupérrimo em ferrovias. Compare-se a nossa malha com a dos Estados Unidos (293.564 km); a da China (124 mil km); a da Rússia (87 mil km); ou a do Canadá (77 mil km). A montanhosa Itália, com área de 301.302 quilômetros quadrados, inferior à do Maranhão, tem 16.627 km de modernas vias férreas, 70% eletrificadas, com trens de passageiros que trafegam à velocidade de 300 quilômetros por hora, os mais rápidos da Europa.

A histórica negligência em relação ao transporte ferroviário impede a existência de vias férreas modernas, de extensão nacional, com trens de alta velocidade. Excelente livro sobre o assunto foi editado pela Associação Brasileira da Indústria Ferroviária (Abifer), para comemorar os 45 anos de existência da entidade. Em melancólica frase, a Abifer reflete a situação das nossas ferrovias: “A indústria ferroviária brasileira instalada no Brasil vivencia hoje uma dramática ociosidade de 80% na área de cargas e de 100% na área de passageiros, com reflexos negativos na geração de empregos qualificados que nossa indústria proporciona e que lhe têm sido subtraídos”. Quem desejar conhecer um pouco mais sobre esse segmento industrial, hoje menor do que era na década de 1960, nele encontrará valiosa fonte de informações.

É deplorável que a ligação de Brasília com São Paulo, Curitiba, Florianópolis, Porto Alegre, Rio de Janeiro, Salvador, Recife e Belém dependa de empresas aéreas ou do transporte rodoviário. É inexplicável que, no planejamento da nova capital, inaugurada em 1960, tenha sido ignorada a importância estratégica das estradas ferroviárias.

O transporte rodoviário é o principal modal logístico do País. Temos 1.721.092 km de rodovias, 12,4% pavimentadas, por onde circulam 65% das cargas movimentadas. A prioridade dada às rodovias não justifica, porém, o abandono das ferrovias, que deveriam ser vistas como meio de transporte prioritário de cargas pesadas e de passageiros à longa distância, como ocorre nos países desenvolvidos.

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ADVOGADO, FOI MINISTRO DO TRABALHO E PRESIDENTE DO TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO (TST)

Nos altos escalões da República nada se diz sobre o colapso da malha ferroviária, um dos pontos fracos da nossa precária infraestrutura, responsável pela baixa produtividade do Brasil.

A rede se estende de forma descoordenada ao longo de 30.129 quilômetros (km), distribuídos entre 22 Estados e o Distrito Federal. A maior parte se destina a transporte de cargas, como minério de ferro. É reduzido o número de quilômetros explorados para deslocamento de passageiros. A maior extensão se registrou na década de 1960, quando alcançou 38.287 quilômetros. Na Mensagem ao Congresso Nacional relativa ao ano de 1956, o presidente Juscelino Kubitschek declarava existirem 37.100 quilômetros, “sendo 2.880 km em bitola de 1,60 metro, 33.120 km em bitola de 1,00 metro e 1.060 km em bitolas inferiores a 1 metro”. Também relacionava as ferrovias em fase de construção (página 418).

Passados mais de 60 anos, a quilometragem se reduziu em aproximadamente 7 mil quilômetros, mantendo-se a diversidade de bitolas. Em todo o Brasil, são quatro as medidas entre os trilhos. Temos 4.057 quilômetros em bitola larga, ou irlandesa, de 1,6 metro; 202,4 quilômetros em bitola padrão, ou internacional, de 1,435 metro; 23.489 quilômetros em bitola de 1 metro; e 396 quilômetros em bitola mista. Em pequenos trechos turísticos, sem expressão comercial, são encontradas bitolas de 0,6 metro e 0,763 metro.

Durante a maior parte do Segundo Império e ao longo da Primeira República, as ferrovias garantiam o transporte do café para os Portos do Rio de Janeiro e de Santos. A partir dos anos 1970, com prejuízos crescentes, bitolas diferentes, falta de interligação com sistemas regionais e ausência de plano ferroviário de amplitude nacional, a malha ferroviária entrou em declínio, beneficiando rodovias e frotas de caminhões movidos por motores a gasolina ou óleo diesel.

Em 27 de setembro de 1825 inaugurou-se na Inglaterra a primeira linha férrea, entre as cidades de Stockton e Darlington. No Brasil, em 31 de outubro de 1835, passados apenas dez anos, o regente Diogo Antônio Feijó assinou o Decreto n.º 101, projetando a criação de ferrovias destinadas a ligar o Rio de Janeiro, capital do Império, a Ouro Preto, capital da província de Minas Gerais, Salvador e Porto Alegre. O projeto não foi concretizado. Morreu no papel. Em 26 de junho de 1852, dom Pedro II procurou retomar a iniciativa com o Decreto n.º 641, cujo destino foi o mesmo.

A primeira ferrovia brasileira foi obra de Irineu Evangelista de Souza, o Barão de Mauá, “seguramente a maior figura do Segundo Reinado, compreendida na sua essência progressista e emancipadora”, na autorizada opinião de Lídia Besouchet. “A inauguração da Estrada de Ferro Mauá ocorreu em 30 de abril de 1854, 22 meses e 18 dias após Mauá haver obtido autorização de dom Pedro II para sua incorporação. O trecho inaugurado ia do Porto de Estrela, passando por Inhomirim, à Estação do Fragoso, num total de 14 quilômetros e 500 metros” (Mauá e seu tempo, Editora Nova Fronteira, Rio de Janeiro, 1978, página 69).

O Brasil é paupérrimo em ferrovias. Compare-se a nossa malha com a dos Estados Unidos (293.564 km); a da China (124 mil km); a da Rússia (87 mil km); ou a do Canadá (77 mil km). A montanhosa Itália, com área de 301.302 quilômetros quadrados, inferior à do Maranhão, tem 16.627 km de modernas vias férreas, 70% eletrificadas, com trens de passageiros que trafegam à velocidade de 300 quilômetros por hora, os mais rápidos da Europa.

A histórica negligência em relação ao transporte ferroviário impede a existência de vias férreas modernas, de extensão nacional, com trens de alta velocidade. Excelente livro sobre o assunto foi editado pela Associação Brasileira da Indústria Ferroviária (Abifer), para comemorar os 45 anos de existência da entidade. Em melancólica frase, a Abifer reflete a situação das nossas ferrovias: “A indústria ferroviária brasileira instalada no Brasil vivencia hoje uma dramática ociosidade de 80% na área de cargas e de 100% na área de passageiros, com reflexos negativos na geração de empregos qualificados que nossa indústria proporciona e que lhe têm sido subtraídos”. Quem desejar conhecer um pouco mais sobre esse segmento industrial, hoje menor do que era na década de 1960, nele encontrará valiosa fonte de informações.

É deplorável que a ligação de Brasília com São Paulo, Curitiba, Florianópolis, Porto Alegre, Rio de Janeiro, Salvador, Recife e Belém dependa de empresas aéreas ou do transporte rodoviário. É inexplicável que, no planejamento da nova capital, inaugurada em 1960, tenha sido ignorada a importância estratégica das estradas ferroviárias.

O transporte rodoviário é o principal modal logístico do País. Temos 1.721.092 km de rodovias, 12,4% pavimentadas, por onde circulam 65% das cargas movimentadas. A prioridade dada às rodovias não justifica, porém, o abandono das ferrovias, que deveriam ser vistas como meio de transporte prioritário de cargas pesadas e de passageiros à longa distância, como ocorre nos países desenvolvidos.

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ADVOGADO, FOI MINISTRO DO TRABALHO E PRESIDENTE DO TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO (TST)

Opinião por Almir Pazzianotto Pinto

Advogado, foi ministro do Trabalho e presidente do Tribunal Superior do Trabalho

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