Opinião|O Direito analógico sai de cena


Numa sociedade que sofreu mutação radical e virou tecno-informacional contemporânea, o Direito analógico se esforça para ao menos manter o ‘status quo’ da era analógica

Por Neuza Sanches

Recentemente, o professor da Universidade de São Paulo (USP) Tercio Sampaio Ferraz Júnior escreveu em Introdução ao Estudo do Direito um capítulo dedicado ao impacto da tecnologia na ciência dogmática do Direito. Disse ele: “O jurista, além de sistematizador e intérprete, passa a ser também um teórico do aconselhamento, das opções e das oportunidades, conforme um cálculo de custo-benefício”.

Bingo. As ciências ocupavam, até o século passado, um lugar central nas sociedades modernas, especialmente a partir do Iluminismo e da Revolução Industrial. Parecia que tudo o que levava ao progresso era uma questão das ciências. No entanto, como resultado da Revolução Industrial que se desdobrou nos últimos dois séculos, surgiu uma sociedade contemporânea baseada em relações sociais cada vez mais orientadas por valores econômicos. Até então, as diversas atividades profissionais do Direito nadavam de braçada: eram bem remuneradas, tinham oportunidade de trabalho e poder sobre a sociedade.

De lá para cá, o que se tem visto na atuação profissional do Direito é o surgimento de um novo mercado global de serviços jurídicos. O jurista tem deixado de ser um mero intérprete e sistematizador do Direito. Ele passou a ser um prestador de serviços de consultoria sobre oportunidades jurídicas, visando a estratégias eficientes de custo/benefício na redução dos conflitos sociais como vantagens e perdas contratuais, planejamento sucessório, cálculos de benefícios previdenciários, alternativas para os processos judiciais etc. Na prática, o jurista é, agora, um tipo de tecnólogo. Um executivo jurídico, que trocou o enfoque científico pelo tecnológico, prestando serviços de toda sorte a empresas públicas e privadas.

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As novas ferramentas tecnológicas, como a inteligência artificial (IA), têm acelerado ainda mais essa revolução silenciosa no meio. O lume jurídico-analógico – do Vade Mecum às pilhas de papéis dos escritórios de advocacia, dos gabinetes de juristas e magistrados do setor público e livros mofando em estantes – passou a ser digital. E se tornou um auxílio indispensável na interpretação de textos do Direito positivado, com processos ágeis e eficientes. Sejam lá quais forem as vicissitudes dos novos desafios da carreira, exemplos não faltam. As votações virtuais dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), tão questionadas por alguns retrógrados defensores do universo analógico da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), são um desses exemplos. Outro diz respeito às audiências públicas jurídicas via plataformas de transmissões online. Isso fez com que o honorário do advogado ficasse mais em conta para as classes sociais com menor poder aquisitivo.

Sem fazer alarde, a inteligência artificial já tem sido capaz de analisar grandes volumes de documentos legais de forma rápida e precisa, poupando juristas e advogados de horas de trabalhos manuais. Além disso, tem auxiliado na previsão de resultados legais e na tomada de decisões em casos processuais. Também melhorou a pesquisa jurídica, tornando-a abrangente – nacional e internacionalmente, seja nas famílias Civil Law e Common Law ou nos países muçulmanos. Auxilia em qualquer língua escrita, com tradução em tempo real, localizando casos relevantes e importantes, economizando tempo e melhorando a qualidade da pesquisa. Isso tem conferido maior amplitude, agilidade e segurança à pesquisa necessária para a atuação do profissional do Direito Comparado. Tudo sob o guarda-chuva do blockchain, para conferir confiabilidade e segurança aos registros jurídicos.

Mais: o impacto da tecnologia jogou também uma pá de cal sobre os modelos tradicionais de análises jurídicas elaborados por acadêmicos há 200 anos para interpretar o Direito como uma ciência. Autor da teoria que mudaria o mundo jurídico – A Teoria Pura do Direito –, Hans Kelsen já previa que sua contribuição pudesse se tornar obsoleta. “Seu fim terá sido alcançado se for considerada merecedora de tal desenvolvimento – por outros que não o presente autor, já a atingir o limite dos seus dias”, escreveu ele, no prefácio de sua obra revisada, em Berkeley, Califórnia, em abril de 1960.

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Ele tinha razão. O modelo de análise jurídica, o normativista por exemplo – distinção entre “ser” e “dever ser” das normas jurídicas –, envelhece a olhos vistos. Virou analógico. Esse modelo de análise estrutural da norma que foca na imputação, ou seja, o que é obrigatório, proibido e/ou permitido pela norma jurídica, sofre impacto demasiado da tecnologia. A IA tem facilitado, por exemplo, o diálogo entre as fontes normativistas por meio de algoritmos. Também tem sido capaz de identificar inconsistências e contradições nas normas jurídicas, podendo colocar em xeque a coerência sistêmica pretendida pelo modelo estrutural normativista ao acompanhar as mudanças das normas jurídicas em tempo real. Ao fim e ao cabo, numa sociedade que sofreu mutação radical e virou tecno-informacional contemporânea, o Direito analógico sai de cena à francesa, desce do pedestal e se esforça para ao menos manter o status quo da era analógica.

*

JORNALISTA, AUTORA DE CELULAR: DEMOCRÁTICO OU AUTORITÁRIO?, COLUNISTA DE ECONOMIA E NEGÓCIOS NA REVISTA VEJA, É DISCENTE DE DIREITO NA FAAP

Recentemente, o professor da Universidade de São Paulo (USP) Tercio Sampaio Ferraz Júnior escreveu em Introdução ao Estudo do Direito um capítulo dedicado ao impacto da tecnologia na ciência dogmática do Direito. Disse ele: “O jurista, além de sistematizador e intérprete, passa a ser também um teórico do aconselhamento, das opções e das oportunidades, conforme um cálculo de custo-benefício”.

Bingo. As ciências ocupavam, até o século passado, um lugar central nas sociedades modernas, especialmente a partir do Iluminismo e da Revolução Industrial. Parecia que tudo o que levava ao progresso era uma questão das ciências. No entanto, como resultado da Revolução Industrial que se desdobrou nos últimos dois séculos, surgiu uma sociedade contemporânea baseada em relações sociais cada vez mais orientadas por valores econômicos. Até então, as diversas atividades profissionais do Direito nadavam de braçada: eram bem remuneradas, tinham oportunidade de trabalho e poder sobre a sociedade.

De lá para cá, o que se tem visto na atuação profissional do Direito é o surgimento de um novo mercado global de serviços jurídicos. O jurista tem deixado de ser um mero intérprete e sistematizador do Direito. Ele passou a ser um prestador de serviços de consultoria sobre oportunidades jurídicas, visando a estratégias eficientes de custo/benefício na redução dos conflitos sociais como vantagens e perdas contratuais, planejamento sucessório, cálculos de benefícios previdenciários, alternativas para os processos judiciais etc. Na prática, o jurista é, agora, um tipo de tecnólogo. Um executivo jurídico, que trocou o enfoque científico pelo tecnológico, prestando serviços de toda sorte a empresas públicas e privadas.

As novas ferramentas tecnológicas, como a inteligência artificial (IA), têm acelerado ainda mais essa revolução silenciosa no meio. O lume jurídico-analógico – do Vade Mecum às pilhas de papéis dos escritórios de advocacia, dos gabinetes de juristas e magistrados do setor público e livros mofando em estantes – passou a ser digital. E se tornou um auxílio indispensável na interpretação de textos do Direito positivado, com processos ágeis e eficientes. Sejam lá quais forem as vicissitudes dos novos desafios da carreira, exemplos não faltam. As votações virtuais dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), tão questionadas por alguns retrógrados defensores do universo analógico da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), são um desses exemplos. Outro diz respeito às audiências públicas jurídicas via plataformas de transmissões online. Isso fez com que o honorário do advogado ficasse mais em conta para as classes sociais com menor poder aquisitivo.

Sem fazer alarde, a inteligência artificial já tem sido capaz de analisar grandes volumes de documentos legais de forma rápida e precisa, poupando juristas e advogados de horas de trabalhos manuais. Além disso, tem auxiliado na previsão de resultados legais e na tomada de decisões em casos processuais. Também melhorou a pesquisa jurídica, tornando-a abrangente – nacional e internacionalmente, seja nas famílias Civil Law e Common Law ou nos países muçulmanos. Auxilia em qualquer língua escrita, com tradução em tempo real, localizando casos relevantes e importantes, economizando tempo e melhorando a qualidade da pesquisa. Isso tem conferido maior amplitude, agilidade e segurança à pesquisa necessária para a atuação do profissional do Direito Comparado. Tudo sob o guarda-chuva do blockchain, para conferir confiabilidade e segurança aos registros jurídicos.

Mais: o impacto da tecnologia jogou também uma pá de cal sobre os modelos tradicionais de análises jurídicas elaborados por acadêmicos há 200 anos para interpretar o Direito como uma ciência. Autor da teoria que mudaria o mundo jurídico – A Teoria Pura do Direito –, Hans Kelsen já previa que sua contribuição pudesse se tornar obsoleta. “Seu fim terá sido alcançado se for considerada merecedora de tal desenvolvimento – por outros que não o presente autor, já a atingir o limite dos seus dias”, escreveu ele, no prefácio de sua obra revisada, em Berkeley, Califórnia, em abril de 1960.

Ele tinha razão. O modelo de análise jurídica, o normativista por exemplo – distinção entre “ser” e “dever ser” das normas jurídicas –, envelhece a olhos vistos. Virou analógico. Esse modelo de análise estrutural da norma que foca na imputação, ou seja, o que é obrigatório, proibido e/ou permitido pela norma jurídica, sofre impacto demasiado da tecnologia. A IA tem facilitado, por exemplo, o diálogo entre as fontes normativistas por meio de algoritmos. Também tem sido capaz de identificar inconsistências e contradições nas normas jurídicas, podendo colocar em xeque a coerência sistêmica pretendida pelo modelo estrutural normativista ao acompanhar as mudanças das normas jurídicas em tempo real. Ao fim e ao cabo, numa sociedade que sofreu mutação radical e virou tecno-informacional contemporânea, o Direito analógico sai de cena à francesa, desce do pedestal e se esforça para ao menos manter o status quo da era analógica.

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JORNALISTA, AUTORA DE CELULAR: DEMOCRÁTICO OU AUTORITÁRIO?, COLUNISTA DE ECONOMIA E NEGÓCIOS NA REVISTA VEJA, É DISCENTE DE DIREITO NA FAAP

Recentemente, o professor da Universidade de São Paulo (USP) Tercio Sampaio Ferraz Júnior escreveu em Introdução ao Estudo do Direito um capítulo dedicado ao impacto da tecnologia na ciência dogmática do Direito. Disse ele: “O jurista, além de sistematizador e intérprete, passa a ser também um teórico do aconselhamento, das opções e das oportunidades, conforme um cálculo de custo-benefício”.

Bingo. As ciências ocupavam, até o século passado, um lugar central nas sociedades modernas, especialmente a partir do Iluminismo e da Revolução Industrial. Parecia que tudo o que levava ao progresso era uma questão das ciências. No entanto, como resultado da Revolução Industrial que se desdobrou nos últimos dois séculos, surgiu uma sociedade contemporânea baseada em relações sociais cada vez mais orientadas por valores econômicos. Até então, as diversas atividades profissionais do Direito nadavam de braçada: eram bem remuneradas, tinham oportunidade de trabalho e poder sobre a sociedade.

De lá para cá, o que se tem visto na atuação profissional do Direito é o surgimento de um novo mercado global de serviços jurídicos. O jurista tem deixado de ser um mero intérprete e sistematizador do Direito. Ele passou a ser um prestador de serviços de consultoria sobre oportunidades jurídicas, visando a estratégias eficientes de custo/benefício na redução dos conflitos sociais como vantagens e perdas contratuais, planejamento sucessório, cálculos de benefícios previdenciários, alternativas para os processos judiciais etc. Na prática, o jurista é, agora, um tipo de tecnólogo. Um executivo jurídico, que trocou o enfoque científico pelo tecnológico, prestando serviços de toda sorte a empresas públicas e privadas.

As novas ferramentas tecnológicas, como a inteligência artificial (IA), têm acelerado ainda mais essa revolução silenciosa no meio. O lume jurídico-analógico – do Vade Mecum às pilhas de papéis dos escritórios de advocacia, dos gabinetes de juristas e magistrados do setor público e livros mofando em estantes – passou a ser digital. E se tornou um auxílio indispensável na interpretação de textos do Direito positivado, com processos ágeis e eficientes. Sejam lá quais forem as vicissitudes dos novos desafios da carreira, exemplos não faltam. As votações virtuais dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), tão questionadas por alguns retrógrados defensores do universo analógico da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), são um desses exemplos. Outro diz respeito às audiências públicas jurídicas via plataformas de transmissões online. Isso fez com que o honorário do advogado ficasse mais em conta para as classes sociais com menor poder aquisitivo.

Sem fazer alarde, a inteligência artificial já tem sido capaz de analisar grandes volumes de documentos legais de forma rápida e precisa, poupando juristas e advogados de horas de trabalhos manuais. Além disso, tem auxiliado na previsão de resultados legais e na tomada de decisões em casos processuais. Também melhorou a pesquisa jurídica, tornando-a abrangente – nacional e internacionalmente, seja nas famílias Civil Law e Common Law ou nos países muçulmanos. Auxilia em qualquer língua escrita, com tradução em tempo real, localizando casos relevantes e importantes, economizando tempo e melhorando a qualidade da pesquisa. Isso tem conferido maior amplitude, agilidade e segurança à pesquisa necessária para a atuação do profissional do Direito Comparado. Tudo sob o guarda-chuva do blockchain, para conferir confiabilidade e segurança aos registros jurídicos.

Mais: o impacto da tecnologia jogou também uma pá de cal sobre os modelos tradicionais de análises jurídicas elaborados por acadêmicos há 200 anos para interpretar o Direito como uma ciência. Autor da teoria que mudaria o mundo jurídico – A Teoria Pura do Direito –, Hans Kelsen já previa que sua contribuição pudesse se tornar obsoleta. “Seu fim terá sido alcançado se for considerada merecedora de tal desenvolvimento – por outros que não o presente autor, já a atingir o limite dos seus dias”, escreveu ele, no prefácio de sua obra revisada, em Berkeley, Califórnia, em abril de 1960.

Ele tinha razão. O modelo de análise jurídica, o normativista por exemplo – distinção entre “ser” e “dever ser” das normas jurídicas –, envelhece a olhos vistos. Virou analógico. Esse modelo de análise estrutural da norma que foca na imputação, ou seja, o que é obrigatório, proibido e/ou permitido pela norma jurídica, sofre impacto demasiado da tecnologia. A IA tem facilitado, por exemplo, o diálogo entre as fontes normativistas por meio de algoritmos. Também tem sido capaz de identificar inconsistências e contradições nas normas jurídicas, podendo colocar em xeque a coerência sistêmica pretendida pelo modelo estrutural normativista ao acompanhar as mudanças das normas jurídicas em tempo real. Ao fim e ao cabo, numa sociedade que sofreu mutação radical e virou tecno-informacional contemporânea, o Direito analógico sai de cena à francesa, desce do pedestal e se esforça para ao menos manter o status quo da era analógica.

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JORNALISTA, AUTORA DE CELULAR: DEMOCRÁTICO OU AUTORITÁRIO?, COLUNISTA DE ECONOMIA E NEGÓCIOS NA REVISTA VEJA, É DISCENTE DE DIREITO NA FAAP

Recentemente, o professor da Universidade de São Paulo (USP) Tercio Sampaio Ferraz Júnior escreveu em Introdução ao Estudo do Direito um capítulo dedicado ao impacto da tecnologia na ciência dogmática do Direito. Disse ele: “O jurista, além de sistematizador e intérprete, passa a ser também um teórico do aconselhamento, das opções e das oportunidades, conforme um cálculo de custo-benefício”.

Bingo. As ciências ocupavam, até o século passado, um lugar central nas sociedades modernas, especialmente a partir do Iluminismo e da Revolução Industrial. Parecia que tudo o que levava ao progresso era uma questão das ciências. No entanto, como resultado da Revolução Industrial que se desdobrou nos últimos dois séculos, surgiu uma sociedade contemporânea baseada em relações sociais cada vez mais orientadas por valores econômicos. Até então, as diversas atividades profissionais do Direito nadavam de braçada: eram bem remuneradas, tinham oportunidade de trabalho e poder sobre a sociedade.

De lá para cá, o que se tem visto na atuação profissional do Direito é o surgimento de um novo mercado global de serviços jurídicos. O jurista tem deixado de ser um mero intérprete e sistematizador do Direito. Ele passou a ser um prestador de serviços de consultoria sobre oportunidades jurídicas, visando a estratégias eficientes de custo/benefício na redução dos conflitos sociais como vantagens e perdas contratuais, planejamento sucessório, cálculos de benefícios previdenciários, alternativas para os processos judiciais etc. Na prática, o jurista é, agora, um tipo de tecnólogo. Um executivo jurídico, que trocou o enfoque científico pelo tecnológico, prestando serviços de toda sorte a empresas públicas e privadas.

As novas ferramentas tecnológicas, como a inteligência artificial (IA), têm acelerado ainda mais essa revolução silenciosa no meio. O lume jurídico-analógico – do Vade Mecum às pilhas de papéis dos escritórios de advocacia, dos gabinetes de juristas e magistrados do setor público e livros mofando em estantes – passou a ser digital. E se tornou um auxílio indispensável na interpretação de textos do Direito positivado, com processos ágeis e eficientes. Sejam lá quais forem as vicissitudes dos novos desafios da carreira, exemplos não faltam. As votações virtuais dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), tão questionadas por alguns retrógrados defensores do universo analógico da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), são um desses exemplos. Outro diz respeito às audiências públicas jurídicas via plataformas de transmissões online. Isso fez com que o honorário do advogado ficasse mais em conta para as classes sociais com menor poder aquisitivo.

Sem fazer alarde, a inteligência artificial já tem sido capaz de analisar grandes volumes de documentos legais de forma rápida e precisa, poupando juristas e advogados de horas de trabalhos manuais. Além disso, tem auxiliado na previsão de resultados legais e na tomada de decisões em casos processuais. Também melhorou a pesquisa jurídica, tornando-a abrangente – nacional e internacionalmente, seja nas famílias Civil Law e Common Law ou nos países muçulmanos. Auxilia em qualquer língua escrita, com tradução em tempo real, localizando casos relevantes e importantes, economizando tempo e melhorando a qualidade da pesquisa. Isso tem conferido maior amplitude, agilidade e segurança à pesquisa necessária para a atuação do profissional do Direito Comparado. Tudo sob o guarda-chuva do blockchain, para conferir confiabilidade e segurança aos registros jurídicos.

Mais: o impacto da tecnologia jogou também uma pá de cal sobre os modelos tradicionais de análises jurídicas elaborados por acadêmicos há 200 anos para interpretar o Direito como uma ciência. Autor da teoria que mudaria o mundo jurídico – A Teoria Pura do Direito –, Hans Kelsen já previa que sua contribuição pudesse se tornar obsoleta. “Seu fim terá sido alcançado se for considerada merecedora de tal desenvolvimento – por outros que não o presente autor, já a atingir o limite dos seus dias”, escreveu ele, no prefácio de sua obra revisada, em Berkeley, Califórnia, em abril de 1960.

Ele tinha razão. O modelo de análise jurídica, o normativista por exemplo – distinção entre “ser” e “dever ser” das normas jurídicas –, envelhece a olhos vistos. Virou analógico. Esse modelo de análise estrutural da norma que foca na imputação, ou seja, o que é obrigatório, proibido e/ou permitido pela norma jurídica, sofre impacto demasiado da tecnologia. A IA tem facilitado, por exemplo, o diálogo entre as fontes normativistas por meio de algoritmos. Também tem sido capaz de identificar inconsistências e contradições nas normas jurídicas, podendo colocar em xeque a coerência sistêmica pretendida pelo modelo estrutural normativista ao acompanhar as mudanças das normas jurídicas em tempo real. Ao fim e ao cabo, numa sociedade que sofreu mutação radical e virou tecno-informacional contemporânea, o Direito analógico sai de cena à francesa, desce do pedestal e se esforça para ao menos manter o status quo da era analógica.

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JORNALISTA, AUTORA DE CELULAR: DEMOCRÁTICO OU AUTORITÁRIO?, COLUNISTA DE ECONOMIA E NEGÓCIOS NA REVISTA VEJA, É DISCENTE DE DIREITO NA FAAP

Opinião por Neuza Sanches

Jornalista, autora de ‘Celular: democrático ou autoritário?’, colunista de Economia e Negócios na revista 'Veja', é discente de Direito na FAAP.

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