Opinião|O Líbano merece ser livre


País merece poder tomar suas próprias decisões estratégicas e ser livre para poder negociar a paz com Israel. Enquanto o mundo deixar o imperialismo dos aiatolás reinar, isso não acontecerá

Por André Lajst

Difícil entender o Líbano sem se debruçar sobre décadas de instabilidade política, guerras e crises financeiras e sociais. O país dos cedros, outrora “a Suíça do Oriente Médio”, em muitos aspectos hoje se assemelha a um Estado falido: perdeu sua soberania militar e é incapaz de tomar decisões quanto à sua própria segurança nacional, estando submetido às aventuras do Hezbollah. A organização terrorista tem mais homens e armas do que o exército libanês e é controlada por uma potência estrangeira, o Irã, que quer levar o Líbano a um conflito armado de larga escala com Israel.

O país levantino, cuja distribuição demográfica entre cristãos e muçulmanos é uma incógnita, começou a perder a soberania – e a paz – com a chegada, em 1970, de milhares de palestinos da Organização para a Libertação da Palestina (OLP) expulsos da Jordânia. A “importação” da questão palestina mergulhou o Líbano numa guerra civil, que continuou até 1990 e deixou 150 mil mortos, 1 milhão de refugiados e um país dilacerado.

As milícias palestinas criaram um verdadeiro Estado dentro do Estado, provocando também intervenções estrangeiras. Em 1976, em meio à guerra civil, o Líbano foi invadido pela Síria, que tinha seus próprios interesses na região e ocupou parte do território. Em 1982, os ataques contra Israel desde o sul do país, controlado pela OLP, e a tentativa de assassinato de um diplomata israelense levaram o Estado judeu a iniciar a operação “Paz para a Galileia” e a ocupar Beirute, até a organização palestina abandonar a cidade.

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As guerras passaram, mas o Líbano já não era um país soberano. As facções armadas que cresceram no vácuo do Estado começaram a expandir seu controle. A mais importante – e que ainda conserva seu poder – é o Hezbollah, o “partido de Alá”, organização terrorista xiita financiada pelo Irã desde que a Guarda Revolucionária dos aiatolás, após a revolução islâmica de 1979, começou a expandir suas redes de contatos e influência em outros países do Oriente Médio e patrocinou sua criação. Atualmente, eles têm mais poder do que o governo libanês.

Em 2006, o Hezbollah assassinou três soldados e sequestrou outros dois em território israelense, provocando uma nova guerra de curta duração, à qual se seguiu um status quo de permanente tensão, já que o grupo terrorista é usado até hoje pelo Irã – da mesma forma que o Hamas, a Jihad Islâmica e os houthis – para atacar Israel quando quer, a partir de outros territórios.

Após o atentado de 7 de outubro de 2023, o Hezbollah começou a atacar o norte de Israel sem nenhuma reivindicação clara e sem que Israel tivesse atacado o Líbano, enfurecendo milhões de libaneses que não desejam uma nova guerra. Mais de 7 mil foguetes, mísseis e drones foram lançados contra Israel desde outubro, causando dezenas de mortes, centenas de feridos e o deslocamento forçado de mais de 80 mil israelenses, que ainda não puderam retornar às suas casas.

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Os contra-ataques israelenses, logicamente, têm aumentado e causaram até o momento mais de 500 baixas no Líbano – a gigantesca maioria, membros do Hezbollah e de outros grupos armados. Esta “guerra de atrito” no norte de Israel divide os esforços do Estado judeu na sua campanha contra o Hamas no sul e aumenta a pressão internacional para um cessar-fogo. Mas isso não pode continuar por muito tempo.

A Resolução 1701 do Conselho de Segurança da ONU, adotada no fim da guerra de 2006, determinou que nenhuma força, exceto o exército libanês e as forças da ONU, pode estar presente ao sul do Rio Litani. Tal resolução vem sendo desrespeitada há mais de uma década. Na prática, isso contraria os interesses do Líbano, mas as consequências do que vem acontecendo desde 7 de outubro podem ser devastadoras para o país.

Uma guerra total entre Israel e o Líbano destruiria sua economia e sua infraestrutura. O poder de fogo que os israelenses poderiam empregar contra o Hezbollah nas primeiras 24 horas se iguala ao que utilizaram nos 33 dias da guerra em 2006. Não menos alarmante, o Hezbollah possui hoje um arsenal, construído e financiado pelo Irã, que é superior ao de muitos países: mais de 150 mil mísseis (muitos deles de precisão), uma imensa rede de túneis e mais de 80 mil homens.

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Libaneses não são os maiores fãs dos israelenses, porém também não gostam do Hezbollah e percebem os danos que o Irã vem causando ao seu país. O Líbano merece ser livre de grupos armados, livre para tomar suas próprias decisões estratégicas e livre para poder negociar a paz com seu vizinho ao sul.

Enquanto o mundo deixar o imperialismo dos aiatolás reinar, isso não acontecerá.

*

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CIENTISTA POLÍTICO, PRESIDENTE EXECUTIVO DA STANDWITHUS BRASIL, É DOUTORANDO DA UNIVERSIDADE DE CÓRDOBA (ESPANHA), EM CIÊNCIAS POLÍTICAS E SOCIAIS, COM FOCO NO PROCESSO DE PAZ PALESTINO-ISRAELENSE

Difícil entender o Líbano sem se debruçar sobre décadas de instabilidade política, guerras e crises financeiras e sociais. O país dos cedros, outrora “a Suíça do Oriente Médio”, em muitos aspectos hoje se assemelha a um Estado falido: perdeu sua soberania militar e é incapaz de tomar decisões quanto à sua própria segurança nacional, estando submetido às aventuras do Hezbollah. A organização terrorista tem mais homens e armas do que o exército libanês e é controlada por uma potência estrangeira, o Irã, que quer levar o Líbano a um conflito armado de larga escala com Israel.

O país levantino, cuja distribuição demográfica entre cristãos e muçulmanos é uma incógnita, começou a perder a soberania – e a paz – com a chegada, em 1970, de milhares de palestinos da Organização para a Libertação da Palestina (OLP) expulsos da Jordânia. A “importação” da questão palestina mergulhou o Líbano numa guerra civil, que continuou até 1990 e deixou 150 mil mortos, 1 milhão de refugiados e um país dilacerado.

As milícias palestinas criaram um verdadeiro Estado dentro do Estado, provocando também intervenções estrangeiras. Em 1976, em meio à guerra civil, o Líbano foi invadido pela Síria, que tinha seus próprios interesses na região e ocupou parte do território. Em 1982, os ataques contra Israel desde o sul do país, controlado pela OLP, e a tentativa de assassinato de um diplomata israelense levaram o Estado judeu a iniciar a operação “Paz para a Galileia” e a ocupar Beirute, até a organização palestina abandonar a cidade.

As guerras passaram, mas o Líbano já não era um país soberano. As facções armadas que cresceram no vácuo do Estado começaram a expandir seu controle. A mais importante – e que ainda conserva seu poder – é o Hezbollah, o “partido de Alá”, organização terrorista xiita financiada pelo Irã desde que a Guarda Revolucionária dos aiatolás, após a revolução islâmica de 1979, começou a expandir suas redes de contatos e influência em outros países do Oriente Médio e patrocinou sua criação. Atualmente, eles têm mais poder do que o governo libanês.

Em 2006, o Hezbollah assassinou três soldados e sequestrou outros dois em território israelense, provocando uma nova guerra de curta duração, à qual se seguiu um status quo de permanente tensão, já que o grupo terrorista é usado até hoje pelo Irã – da mesma forma que o Hamas, a Jihad Islâmica e os houthis – para atacar Israel quando quer, a partir de outros territórios.

Após o atentado de 7 de outubro de 2023, o Hezbollah começou a atacar o norte de Israel sem nenhuma reivindicação clara e sem que Israel tivesse atacado o Líbano, enfurecendo milhões de libaneses que não desejam uma nova guerra. Mais de 7 mil foguetes, mísseis e drones foram lançados contra Israel desde outubro, causando dezenas de mortes, centenas de feridos e o deslocamento forçado de mais de 80 mil israelenses, que ainda não puderam retornar às suas casas.

Os contra-ataques israelenses, logicamente, têm aumentado e causaram até o momento mais de 500 baixas no Líbano – a gigantesca maioria, membros do Hezbollah e de outros grupos armados. Esta “guerra de atrito” no norte de Israel divide os esforços do Estado judeu na sua campanha contra o Hamas no sul e aumenta a pressão internacional para um cessar-fogo. Mas isso não pode continuar por muito tempo.

A Resolução 1701 do Conselho de Segurança da ONU, adotada no fim da guerra de 2006, determinou que nenhuma força, exceto o exército libanês e as forças da ONU, pode estar presente ao sul do Rio Litani. Tal resolução vem sendo desrespeitada há mais de uma década. Na prática, isso contraria os interesses do Líbano, mas as consequências do que vem acontecendo desde 7 de outubro podem ser devastadoras para o país.

Uma guerra total entre Israel e o Líbano destruiria sua economia e sua infraestrutura. O poder de fogo que os israelenses poderiam empregar contra o Hezbollah nas primeiras 24 horas se iguala ao que utilizaram nos 33 dias da guerra em 2006. Não menos alarmante, o Hezbollah possui hoje um arsenal, construído e financiado pelo Irã, que é superior ao de muitos países: mais de 150 mil mísseis (muitos deles de precisão), uma imensa rede de túneis e mais de 80 mil homens.

Libaneses não são os maiores fãs dos israelenses, porém também não gostam do Hezbollah e percebem os danos que o Irã vem causando ao seu país. O Líbano merece ser livre de grupos armados, livre para tomar suas próprias decisões estratégicas e livre para poder negociar a paz com seu vizinho ao sul.

Enquanto o mundo deixar o imperialismo dos aiatolás reinar, isso não acontecerá.

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CIENTISTA POLÍTICO, PRESIDENTE EXECUTIVO DA STANDWITHUS BRASIL, É DOUTORANDO DA UNIVERSIDADE DE CÓRDOBA (ESPANHA), EM CIÊNCIAS POLÍTICAS E SOCIAIS, COM FOCO NO PROCESSO DE PAZ PALESTINO-ISRAELENSE

Difícil entender o Líbano sem se debruçar sobre décadas de instabilidade política, guerras e crises financeiras e sociais. O país dos cedros, outrora “a Suíça do Oriente Médio”, em muitos aspectos hoje se assemelha a um Estado falido: perdeu sua soberania militar e é incapaz de tomar decisões quanto à sua própria segurança nacional, estando submetido às aventuras do Hezbollah. A organização terrorista tem mais homens e armas do que o exército libanês e é controlada por uma potência estrangeira, o Irã, que quer levar o Líbano a um conflito armado de larga escala com Israel.

O país levantino, cuja distribuição demográfica entre cristãos e muçulmanos é uma incógnita, começou a perder a soberania – e a paz – com a chegada, em 1970, de milhares de palestinos da Organização para a Libertação da Palestina (OLP) expulsos da Jordânia. A “importação” da questão palestina mergulhou o Líbano numa guerra civil, que continuou até 1990 e deixou 150 mil mortos, 1 milhão de refugiados e um país dilacerado.

As milícias palestinas criaram um verdadeiro Estado dentro do Estado, provocando também intervenções estrangeiras. Em 1976, em meio à guerra civil, o Líbano foi invadido pela Síria, que tinha seus próprios interesses na região e ocupou parte do território. Em 1982, os ataques contra Israel desde o sul do país, controlado pela OLP, e a tentativa de assassinato de um diplomata israelense levaram o Estado judeu a iniciar a operação “Paz para a Galileia” e a ocupar Beirute, até a organização palestina abandonar a cidade.

As guerras passaram, mas o Líbano já não era um país soberano. As facções armadas que cresceram no vácuo do Estado começaram a expandir seu controle. A mais importante – e que ainda conserva seu poder – é o Hezbollah, o “partido de Alá”, organização terrorista xiita financiada pelo Irã desde que a Guarda Revolucionária dos aiatolás, após a revolução islâmica de 1979, começou a expandir suas redes de contatos e influência em outros países do Oriente Médio e patrocinou sua criação. Atualmente, eles têm mais poder do que o governo libanês.

Em 2006, o Hezbollah assassinou três soldados e sequestrou outros dois em território israelense, provocando uma nova guerra de curta duração, à qual se seguiu um status quo de permanente tensão, já que o grupo terrorista é usado até hoje pelo Irã – da mesma forma que o Hamas, a Jihad Islâmica e os houthis – para atacar Israel quando quer, a partir de outros territórios.

Após o atentado de 7 de outubro de 2023, o Hezbollah começou a atacar o norte de Israel sem nenhuma reivindicação clara e sem que Israel tivesse atacado o Líbano, enfurecendo milhões de libaneses que não desejam uma nova guerra. Mais de 7 mil foguetes, mísseis e drones foram lançados contra Israel desde outubro, causando dezenas de mortes, centenas de feridos e o deslocamento forçado de mais de 80 mil israelenses, que ainda não puderam retornar às suas casas.

Os contra-ataques israelenses, logicamente, têm aumentado e causaram até o momento mais de 500 baixas no Líbano – a gigantesca maioria, membros do Hezbollah e de outros grupos armados. Esta “guerra de atrito” no norte de Israel divide os esforços do Estado judeu na sua campanha contra o Hamas no sul e aumenta a pressão internacional para um cessar-fogo. Mas isso não pode continuar por muito tempo.

A Resolução 1701 do Conselho de Segurança da ONU, adotada no fim da guerra de 2006, determinou que nenhuma força, exceto o exército libanês e as forças da ONU, pode estar presente ao sul do Rio Litani. Tal resolução vem sendo desrespeitada há mais de uma década. Na prática, isso contraria os interesses do Líbano, mas as consequências do que vem acontecendo desde 7 de outubro podem ser devastadoras para o país.

Uma guerra total entre Israel e o Líbano destruiria sua economia e sua infraestrutura. O poder de fogo que os israelenses poderiam empregar contra o Hezbollah nas primeiras 24 horas se iguala ao que utilizaram nos 33 dias da guerra em 2006. Não menos alarmante, o Hezbollah possui hoje um arsenal, construído e financiado pelo Irã, que é superior ao de muitos países: mais de 150 mil mísseis (muitos deles de precisão), uma imensa rede de túneis e mais de 80 mil homens.

Libaneses não são os maiores fãs dos israelenses, porém também não gostam do Hezbollah e percebem os danos que o Irã vem causando ao seu país. O Líbano merece ser livre de grupos armados, livre para tomar suas próprias decisões estratégicas e livre para poder negociar a paz com seu vizinho ao sul.

Enquanto o mundo deixar o imperialismo dos aiatolás reinar, isso não acontecerá.

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CIENTISTA POLÍTICO, PRESIDENTE EXECUTIVO DA STANDWITHUS BRASIL, É DOUTORANDO DA UNIVERSIDADE DE CÓRDOBA (ESPANHA), EM CIÊNCIAS POLÍTICAS E SOCIAIS, COM FOCO NO PROCESSO DE PAZ PALESTINO-ISRAELENSE

Difícil entender o Líbano sem se debruçar sobre décadas de instabilidade política, guerras e crises financeiras e sociais. O país dos cedros, outrora “a Suíça do Oriente Médio”, em muitos aspectos hoje se assemelha a um Estado falido: perdeu sua soberania militar e é incapaz de tomar decisões quanto à sua própria segurança nacional, estando submetido às aventuras do Hezbollah. A organização terrorista tem mais homens e armas do que o exército libanês e é controlada por uma potência estrangeira, o Irã, que quer levar o Líbano a um conflito armado de larga escala com Israel.

O país levantino, cuja distribuição demográfica entre cristãos e muçulmanos é uma incógnita, começou a perder a soberania – e a paz – com a chegada, em 1970, de milhares de palestinos da Organização para a Libertação da Palestina (OLP) expulsos da Jordânia. A “importação” da questão palestina mergulhou o Líbano numa guerra civil, que continuou até 1990 e deixou 150 mil mortos, 1 milhão de refugiados e um país dilacerado.

As milícias palestinas criaram um verdadeiro Estado dentro do Estado, provocando também intervenções estrangeiras. Em 1976, em meio à guerra civil, o Líbano foi invadido pela Síria, que tinha seus próprios interesses na região e ocupou parte do território. Em 1982, os ataques contra Israel desde o sul do país, controlado pela OLP, e a tentativa de assassinato de um diplomata israelense levaram o Estado judeu a iniciar a operação “Paz para a Galileia” e a ocupar Beirute, até a organização palestina abandonar a cidade.

As guerras passaram, mas o Líbano já não era um país soberano. As facções armadas que cresceram no vácuo do Estado começaram a expandir seu controle. A mais importante – e que ainda conserva seu poder – é o Hezbollah, o “partido de Alá”, organização terrorista xiita financiada pelo Irã desde que a Guarda Revolucionária dos aiatolás, após a revolução islâmica de 1979, começou a expandir suas redes de contatos e influência em outros países do Oriente Médio e patrocinou sua criação. Atualmente, eles têm mais poder do que o governo libanês.

Em 2006, o Hezbollah assassinou três soldados e sequestrou outros dois em território israelense, provocando uma nova guerra de curta duração, à qual se seguiu um status quo de permanente tensão, já que o grupo terrorista é usado até hoje pelo Irã – da mesma forma que o Hamas, a Jihad Islâmica e os houthis – para atacar Israel quando quer, a partir de outros territórios.

Após o atentado de 7 de outubro de 2023, o Hezbollah começou a atacar o norte de Israel sem nenhuma reivindicação clara e sem que Israel tivesse atacado o Líbano, enfurecendo milhões de libaneses que não desejam uma nova guerra. Mais de 7 mil foguetes, mísseis e drones foram lançados contra Israel desde outubro, causando dezenas de mortes, centenas de feridos e o deslocamento forçado de mais de 80 mil israelenses, que ainda não puderam retornar às suas casas.

Os contra-ataques israelenses, logicamente, têm aumentado e causaram até o momento mais de 500 baixas no Líbano – a gigantesca maioria, membros do Hezbollah e de outros grupos armados. Esta “guerra de atrito” no norte de Israel divide os esforços do Estado judeu na sua campanha contra o Hamas no sul e aumenta a pressão internacional para um cessar-fogo. Mas isso não pode continuar por muito tempo.

A Resolução 1701 do Conselho de Segurança da ONU, adotada no fim da guerra de 2006, determinou que nenhuma força, exceto o exército libanês e as forças da ONU, pode estar presente ao sul do Rio Litani. Tal resolução vem sendo desrespeitada há mais de uma década. Na prática, isso contraria os interesses do Líbano, mas as consequências do que vem acontecendo desde 7 de outubro podem ser devastadoras para o país.

Uma guerra total entre Israel e o Líbano destruiria sua economia e sua infraestrutura. O poder de fogo que os israelenses poderiam empregar contra o Hezbollah nas primeiras 24 horas se iguala ao que utilizaram nos 33 dias da guerra em 2006. Não menos alarmante, o Hezbollah possui hoje um arsenal, construído e financiado pelo Irã, que é superior ao de muitos países: mais de 150 mil mísseis (muitos deles de precisão), uma imensa rede de túneis e mais de 80 mil homens.

Libaneses não são os maiores fãs dos israelenses, porém também não gostam do Hezbollah e percebem os danos que o Irã vem causando ao seu país. O Líbano merece ser livre de grupos armados, livre para tomar suas próprias decisões estratégicas e livre para poder negociar a paz com seu vizinho ao sul.

Enquanto o mundo deixar o imperialismo dos aiatolás reinar, isso não acontecerá.

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CIENTISTA POLÍTICO, PRESIDENTE EXECUTIVO DA STANDWITHUS BRASIL, É DOUTORANDO DA UNIVERSIDADE DE CÓRDOBA (ESPANHA), EM CIÊNCIAS POLÍTICAS E SOCIAIS, COM FOCO NO PROCESSO DE PAZ PALESTINO-ISRAELENSE

Difícil entender o Líbano sem se debruçar sobre décadas de instabilidade política, guerras e crises financeiras e sociais. O país dos cedros, outrora “a Suíça do Oriente Médio”, em muitos aspectos hoje se assemelha a um Estado falido: perdeu sua soberania militar e é incapaz de tomar decisões quanto à sua própria segurança nacional, estando submetido às aventuras do Hezbollah. A organização terrorista tem mais homens e armas do que o exército libanês e é controlada por uma potência estrangeira, o Irã, que quer levar o Líbano a um conflito armado de larga escala com Israel.

O país levantino, cuja distribuição demográfica entre cristãos e muçulmanos é uma incógnita, começou a perder a soberania – e a paz – com a chegada, em 1970, de milhares de palestinos da Organização para a Libertação da Palestina (OLP) expulsos da Jordânia. A “importação” da questão palestina mergulhou o Líbano numa guerra civil, que continuou até 1990 e deixou 150 mil mortos, 1 milhão de refugiados e um país dilacerado.

As milícias palestinas criaram um verdadeiro Estado dentro do Estado, provocando também intervenções estrangeiras. Em 1976, em meio à guerra civil, o Líbano foi invadido pela Síria, que tinha seus próprios interesses na região e ocupou parte do território. Em 1982, os ataques contra Israel desde o sul do país, controlado pela OLP, e a tentativa de assassinato de um diplomata israelense levaram o Estado judeu a iniciar a operação “Paz para a Galileia” e a ocupar Beirute, até a organização palestina abandonar a cidade.

As guerras passaram, mas o Líbano já não era um país soberano. As facções armadas que cresceram no vácuo do Estado começaram a expandir seu controle. A mais importante – e que ainda conserva seu poder – é o Hezbollah, o “partido de Alá”, organização terrorista xiita financiada pelo Irã desde que a Guarda Revolucionária dos aiatolás, após a revolução islâmica de 1979, começou a expandir suas redes de contatos e influência em outros países do Oriente Médio e patrocinou sua criação. Atualmente, eles têm mais poder do que o governo libanês.

Em 2006, o Hezbollah assassinou três soldados e sequestrou outros dois em território israelense, provocando uma nova guerra de curta duração, à qual se seguiu um status quo de permanente tensão, já que o grupo terrorista é usado até hoje pelo Irã – da mesma forma que o Hamas, a Jihad Islâmica e os houthis – para atacar Israel quando quer, a partir de outros territórios.

Após o atentado de 7 de outubro de 2023, o Hezbollah começou a atacar o norte de Israel sem nenhuma reivindicação clara e sem que Israel tivesse atacado o Líbano, enfurecendo milhões de libaneses que não desejam uma nova guerra. Mais de 7 mil foguetes, mísseis e drones foram lançados contra Israel desde outubro, causando dezenas de mortes, centenas de feridos e o deslocamento forçado de mais de 80 mil israelenses, que ainda não puderam retornar às suas casas.

Os contra-ataques israelenses, logicamente, têm aumentado e causaram até o momento mais de 500 baixas no Líbano – a gigantesca maioria, membros do Hezbollah e de outros grupos armados. Esta “guerra de atrito” no norte de Israel divide os esforços do Estado judeu na sua campanha contra o Hamas no sul e aumenta a pressão internacional para um cessar-fogo. Mas isso não pode continuar por muito tempo.

A Resolução 1701 do Conselho de Segurança da ONU, adotada no fim da guerra de 2006, determinou que nenhuma força, exceto o exército libanês e as forças da ONU, pode estar presente ao sul do Rio Litani. Tal resolução vem sendo desrespeitada há mais de uma década. Na prática, isso contraria os interesses do Líbano, mas as consequências do que vem acontecendo desde 7 de outubro podem ser devastadoras para o país.

Uma guerra total entre Israel e o Líbano destruiria sua economia e sua infraestrutura. O poder de fogo que os israelenses poderiam empregar contra o Hezbollah nas primeiras 24 horas se iguala ao que utilizaram nos 33 dias da guerra em 2006. Não menos alarmante, o Hezbollah possui hoje um arsenal, construído e financiado pelo Irã, que é superior ao de muitos países: mais de 150 mil mísseis (muitos deles de precisão), uma imensa rede de túneis e mais de 80 mil homens.

Libaneses não são os maiores fãs dos israelenses, porém também não gostam do Hezbollah e percebem os danos que o Irã vem causando ao seu país. O Líbano merece ser livre de grupos armados, livre para tomar suas próprias decisões estratégicas e livre para poder negociar a paz com seu vizinho ao sul.

Enquanto o mundo deixar o imperialismo dos aiatolás reinar, isso não acontecerá.

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CIENTISTA POLÍTICO, PRESIDENTE EXECUTIVO DA STANDWITHUS BRASIL, É DOUTORANDO DA UNIVERSIDADE DE CÓRDOBA (ESPANHA), EM CIÊNCIAS POLÍTICAS E SOCIAIS, COM FOCO NO PROCESSO DE PAZ PALESTINO-ISRAELENSE

Opinião por André Lajst

Cientista político, presidente executivo da StandWithUs Brasil, é doutorando da Universidade de Córdoba (Espanha), em Ciências Políticas e Sociais, com foco no processo de paz palestino-israelense.

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