Opinião|O pós-Lava Jato no combate à corrupção


Inteligência financeira talvez seja o recurso mais importante, hoje, para detectá-la

Por Martim dela Valle

O fim da Lava Jato teve grande simbolismo: no dia de seu encerramento foi eleito presidente da Câmara dos Deputados um dos primeiros delatados na operação. O “quadrilhão do PP” de 2014 deu-nos em 2021 um chefe de Poder e líderes a quem se atribuem indicações para tribunais superiores. O símbolo pode ser funesto, mas não constitui presságio.

O balanço da Lava Jato está para ser escrito, decantadas as paixões. Na perspectiva do combate à corrupção, constitui importante capítulo de aprendizados e de desenvolvimento de tecnologias jurídico-institucionais. Tal combate evolui de longa data, em marcos como o caso Banestado, inovações legislativas das décadas de 2000 e 2010, o avanço exponencial da inteligência financeira neste século. Nem todos trouxeram vitórias imediatas, houve derrotas expressivas, mas todos trouxeram aprendizados importantes que foram utilizados com sucesso nas etapas posteriores.

A Lava Jato também trouxe avanços importantes. Seus erros e acertos servirão para a continuidade serena de uma luta cujo horizonte se conta em décadas. A mobilização que o tema provoca mostra sua vitalidade na sociedade. A hora é de reagrupamento e definição de prioridades para a próxima fase, com base em premissas que trarão maior maturidade ao tema.

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A primeira é aceitar que a corrupção não é o maior dos males brasileiros. Continuaremos a ter problemas de países de renda média, com escassez de recursos a serem administrada em quase todas as áreas. É importante evitarmos visões messiânicas sobre uma tarefa que é sobretudo de vigilante carpintaria institucional. Elas mobilizam bases, mas se esgotam quando os milagres faltam. Deve-se evitar a tentação do pensamento mágico (balas de prata, salvadores), ao mesmo tempo que se acentuam a dimensão técnica e o caráter comportamental do exemplo.

A segunda é que a luta pela corrupção trouxe melhores resultados no campo técnico, quando conduzidas por profissionais com independência funcional. A transposição de técnicos para o campo da grande política falhou. Salvo a aprovação de medidas pontuais, a transformação de técnicos do Direito em políticos de alto voo não rendeu frutos duradouros. Mesmo governantes eleitos montados em discursos anticorrupção têm causado amplo retrocesso de pauta. Logo, a independência técnica dos órgãos de combate à corrupção deve ser defendida a qualquer custo.

A terceira é o fato (cientificamente provado) de que políticos combatem a corrupção muito menos quando estão na situação do que na oposição. O Brasil é pródigo em zelotes que se tornam “garantistas” no minuto de sua eleição. Situar a luta contra a corrupção em determinado lado do espectro político é um erro grave, que aliena parte importante de apoios na sociedade e afasta o foco da luta mais importante, que é o aprimoramento institucional.

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No rescaldo da Lava Jato, a luta contra a corrupção parece dispersa numa miríade de agendas e instituições. Os projetos variam de uma nova Constituição federal a atividades educacionais. Embora meritórias e indicativas da vitalidade do tema, dissipam energia. É hora de reagrupamento dessas forças em torno de uma pauta mínima conjunta, sem prejuízo de temas específicos seguidos separadamente.

Uma pauta agregadora deveria incluir, como mínimo denominador comum, a preservação do trabalho e a inviolabilidade técnica do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf). A inteligência financeira talvez seja hoje o instrumento mais importante para detecção de corrupção numa economia “bancarizada” como a nossa.

Também deveria incluir incentivos ao setor privado para iniciativas de integridade. Modelos robustos de compliance adequados à realidade brasileira (o que ainda não ocorre), disseminados de forma geral no território nacional, serão o grande vetor para atacar o lado da “oferta” da corrupção. Também o fomento de ações coletivas setoriais para dissuadir e diluir a vingança de agentes públicos contrariados.

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Em vista dos sucessivos “enterros” de operações anticorrupção em tribunais superiores por questões processuais, é imprescindível um alinhamento técnico sobre padrões de prova, delação premiada, acordos de cooperação e leniência. Esse alinhamento deve ser promovido pelo Poder Judiciário e pelo Ministério Público, mas a academia deve ter um papel importante de sistematização e articulação de visões técnico-processuais. Por fim, o setor privado e o terceiro setor precisam manter uma agenda mais fluida e constante de contatos com os órgãos técnicos da administração, tais como Controladoria-Geral da União, Tribunais de Contas e demais controladorias.

A pauta comum não prejudica as iniciativas específicas. Antes pode catalisar esforços hoje dispersos e será tanto mais coesa quanto forem definidos metas e resultados esperados. Trata-se de uma corrida de fundo para os de grande fôlego e muitas vezes lembrará a tarefa de Sísifo.

DOUTOR EM DIREITO PELA USP, PROFESSOR DA INTERNATIONAL ANTI-CORRUPTION ACADEMY (VIENA), É SÓCIO DE MARCHINI, BOTELHO E CASELTA ADVOGADOS

O fim da Lava Jato teve grande simbolismo: no dia de seu encerramento foi eleito presidente da Câmara dos Deputados um dos primeiros delatados na operação. O “quadrilhão do PP” de 2014 deu-nos em 2021 um chefe de Poder e líderes a quem se atribuem indicações para tribunais superiores. O símbolo pode ser funesto, mas não constitui presságio.

O balanço da Lava Jato está para ser escrito, decantadas as paixões. Na perspectiva do combate à corrupção, constitui importante capítulo de aprendizados e de desenvolvimento de tecnologias jurídico-institucionais. Tal combate evolui de longa data, em marcos como o caso Banestado, inovações legislativas das décadas de 2000 e 2010, o avanço exponencial da inteligência financeira neste século. Nem todos trouxeram vitórias imediatas, houve derrotas expressivas, mas todos trouxeram aprendizados importantes que foram utilizados com sucesso nas etapas posteriores.

A Lava Jato também trouxe avanços importantes. Seus erros e acertos servirão para a continuidade serena de uma luta cujo horizonte se conta em décadas. A mobilização que o tema provoca mostra sua vitalidade na sociedade. A hora é de reagrupamento e definição de prioridades para a próxima fase, com base em premissas que trarão maior maturidade ao tema.

A primeira é aceitar que a corrupção não é o maior dos males brasileiros. Continuaremos a ter problemas de países de renda média, com escassez de recursos a serem administrada em quase todas as áreas. É importante evitarmos visões messiânicas sobre uma tarefa que é sobretudo de vigilante carpintaria institucional. Elas mobilizam bases, mas se esgotam quando os milagres faltam. Deve-se evitar a tentação do pensamento mágico (balas de prata, salvadores), ao mesmo tempo que se acentuam a dimensão técnica e o caráter comportamental do exemplo.

A segunda é que a luta pela corrupção trouxe melhores resultados no campo técnico, quando conduzidas por profissionais com independência funcional. A transposição de técnicos para o campo da grande política falhou. Salvo a aprovação de medidas pontuais, a transformação de técnicos do Direito em políticos de alto voo não rendeu frutos duradouros. Mesmo governantes eleitos montados em discursos anticorrupção têm causado amplo retrocesso de pauta. Logo, a independência técnica dos órgãos de combate à corrupção deve ser defendida a qualquer custo.

A terceira é o fato (cientificamente provado) de que políticos combatem a corrupção muito menos quando estão na situação do que na oposição. O Brasil é pródigo em zelotes que se tornam “garantistas” no minuto de sua eleição. Situar a luta contra a corrupção em determinado lado do espectro político é um erro grave, que aliena parte importante de apoios na sociedade e afasta o foco da luta mais importante, que é o aprimoramento institucional.

No rescaldo da Lava Jato, a luta contra a corrupção parece dispersa numa miríade de agendas e instituições. Os projetos variam de uma nova Constituição federal a atividades educacionais. Embora meritórias e indicativas da vitalidade do tema, dissipam energia. É hora de reagrupamento dessas forças em torno de uma pauta mínima conjunta, sem prejuízo de temas específicos seguidos separadamente.

Uma pauta agregadora deveria incluir, como mínimo denominador comum, a preservação do trabalho e a inviolabilidade técnica do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf). A inteligência financeira talvez seja hoje o instrumento mais importante para detecção de corrupção numa economia “bancarizada” como a nossa.

Também deveria incluir incentivos ao setor privado para iniciativas de integridade. Modelos robustos de compliance adequados à realidade brasileira (o que ainda não ocorre), disseminados de forma geral no território nacional, serão o grande vetor para atacar o lado da “oferta” da corrupção. Também o fomento de ações coletivas setoriais para dissuadir e diluir a vingança de agentes públicos contrariados.

Em vista dos sucessivos “enterros” de operações anticorrupção em tribunais superiores por questões processuais, é imprescindível um alinhamento técnico sobre padrões de prova, delação premiada, acordos de cooperação e leniência. Esse alinhamento deve ser promovido pelo Poder Judiciário e pelo Ministério Público, mas a academia deve ter um papel importante de sistematização e articulação de visões técnico-processuais. Por fim, o setor privado e o terceiro setor precisam manter uma agenda mais fluida e constante de contatos com os órgãos técnicos da administração, tais como Controladoria-Geral da União, Tribunais de Contas e demais controladorias.

A pauta comum não prejudica as iniciativas específicas. Antes pode catalisar esforços hoje dispersos e será tanto mais coesa quanto forem definidos metas e resultados esperados. Trata-se de uma corrida de fundo para os de grande fôlego e muitas vezes lembrará a tarefa de Sísifo.

DOUTOR EM DIREITO PELA USP, PROFESSOR DA INTERNATIONAL ANTI-CORRUPTION ACADEMY (VIENA), É SÓCIO DE MARCHINI, BOTELHO E CASELTA ADVOGADOS

O fim da Lava Jato teve grande simbolismo: no dia de seu encerramento foi eleito presidente da Câmara dos Deputados um dos primeiros delatados na operação. O “quadrilhão do PP” de 2014 deu-nos em 2021 um chefe de Poder e líderes a quem se atribuem indicações para tribunais superiores. O símbolo pode ser funesto, mas não constitui presságio.

O balanço da Lava Jato está para ser escrito, decantadas as paixões. Na perspectiva do combate à corrupção, constitui importante capítulo de aprendizados e de desenvolvimento de tecnologias jurídico-institucionais. Tal combate evolui de longa data, em marcos como o caso Banestado, inovações legislativas das décadas de 2000 e 2010, o avanço exponencial da inteligência financeira neste século. Nem todos trouxeram vitórias imediatas, houve derrotas expressivas, mas todos trouxeram aprendizados importantes que foram utilizados com sucesso nas etapas posteriores.

A Lava Jato também trouxe avanços importantes. Seus erros e acertos servirão para a continuidade serena de uma luta cujo horizonte se conta em décadas. A mobilização que o tema provoca mostra sua vitalidade na sociedade. A hora é de reagrupamento e definição de prioridades para a próxima fase, com base em premissas que trarão maior maturidade ao tema.

A primeira é aceitar que a corrupção não é o maior dos males brasileiros. Continuaremos a ter problemas de países de renda média, com escassez de recursos a serem administrada em quase todas as áreas. É importante evitarmos visões messiânicas sobre uma tarefa que é sobretudo de vigilante carpintaria institucional. Elas mobilizam bases, mas se esgotam quando os milagres faltam. Deve-se evitar a tentação do pensamento mágico (balas de prata, salvadores), ao mesmo tempo que se acentuam a dimensão técnica e o caráter comportamental do exemplo.

A segunda é que a luta pela corrupção trouxe melhores resultados no campo técnico, quando conduzidas por profissionais com independência funcional. A transposição de técnicos para o campo da grande política falhou. Salvo a aprovação de medidas pontuais, a transformação de técnicos do Direito em políticos de alto voo não rendeu frutos duradouros. Mesmo governantes eleitos montados em discursos anticorrupção têm causado amplo retrocesso de pauta. Logo, a independência técnica dos órgãos de combate à corrupção deve ser defendida a qualquer custo.

A terceira é o fato (cientificamente provado) de que políticos combatem a corrupção muito menos quando estão na situação do que na oposição. O Brasil é pródigo em zelotes que se tornam “garantistas” no minuto de sua eleição. Situar a luta contra a corrupção em determinado lado do espectro político é um erro grave, que aliena parte importante de apoios na sociedade e afasta o foco da luta mais importante, que é o aprimoramento institucional.

No rescaldo da Lava Jato, a luta contra a corrupção parece dispersa numa miríade de agendas e instituições. Os projetos variam de uma nova Constituição federal a atividades educacionais. Embora meritórias e indicativas da vitalidade do tema, dissipam energia. É hora de reagrupamento dessas forças em torno de uma pauta mínima conjunta, sem prejuízo de temas específicos seguidos separadamente.

Uma pauta agregadora deveria incluir, como mínimo denominador comum, a preservação do trabalho e a inviolabilidade técnica do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf). A inteligência financeira talvez seja hoje o instrumento mais importante para detecção de corrupção numa economia “bancarizada” como a nossa.

Também deveria incluir incentivos ao setor privado para iniciativas de integridade. Modelos robustos de compliance adequados à realidade brasileira (o que ainda não ocorre), disseminados de forma geral no território nacional, serão o grande vetor para atacar o lado da “oferta” da corrupção. Também o fomento de ações coletivas setoriais para dissuadir e diluir a vingança de agentes públicos contrariados.

Em vista dos sucessivos “enterros” de operações anticorrupção em tribunais superiores por questões processuais, é imprescindível um alinhamento técnico sobre padrões de prova, delação premiada, acordos de cooperação e leniência. Esse alinhamento deve ser promovido pelo Poder Judiciário e pelo Ministério Público, mas a academia deve ter um papel importante de sistematização e articulação de visões técnico-processuais. Por fim, o setor privado e o terceiro setor precisam manter uma agenda mais fluida e constante de contatos com os órgãos técnicos da administração, tais como Controladoria-Geral da União, Tribunais de Contas e demais controladorias.

A pauta comum não prejudica as iniciativas específicas. Antes pode catalisar esforços hoje dispersos e será tanto mais coesa quanto forem definidos metas e resultados esperados. Trata-se de uma corrida de fundo para os de grande fôlego e muitas vezes lembrará a tarefa de Sísifo.

DOUTOR EM DIREITO PELA USP, PROFESSOR DA INTERNATIONAL ANTI-CORRUPTION ACADEMY (VIENA), É SÓCIO DE MARCHINI, BOTELHO E CASELTA ADVOGADOS

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