Opinião|Quem tem medo do déficit fiscal?


Por que cargas d’água continuamos apegados à velha analogia entre finanças públicas e orçamento familiar?

Por Nilo Alberto Barroso e Nilo Barroso

Pelo visto, toda a gente. Há sempre um economista de plantão vociferando sobre a necessidade de se cumprir a meta fiscal de déficit zero. A rigor, a visão acerca da necessidade do equilíbrio das finanças públicas projetou-se além dos redutos de especialistas para instalar-se no imaginário popular. O motivo por trás disso parece ser a ideia generalizada de que a gestão das finanças do governo se assemelha à do orçamento doméstico. Afinal, uma família que gasta além de suas possibilidades acaba dando com os burros n’água.

Ora, não se pode negar que, além de convincente, tal analogia constitui, pretensamente, um forte apelo ao bom senso. O diabo (cartesiano ou não) é que não se deve confundir modelos e representações mentais com coisas de facto existentes. Ao equipararmos a gestão das contas nacionais à das finanças pessoais, somos levados a raciocinar erroneamente à custa do que a lógica informal chama de falácia argumentum ad populum, referente àquilo que as pessoas pensam que sabem, no caso a crença de que o gasto sem lastro é necessariamente nocivo.

Vamos lá. Ao matricular a filha em dispendiosa escola, um casal de renda média provavelmente terá seu orçamento desequilibrado, o que acarretará adiante diminuição de poupança ou endividamento. Vamos supor, no entanto, que a esse casal fosse concedido o toque dourado do rei Midas. No final das contas, bastaria tocar um objeto a seu alcance para transformá-lo em ouro e cobrir, assim, o saldo devedor. O melhor dos mundos para o casal sortudo, não?

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Mal comparando é o que sucede nos países soberanos monetariamente ou emissores de moeda. À luz da circunstância de que na era digital a representação física da moeda para todos os efeitos foi abolida e por possuírem o poder monopolístico de emitir moeda de curso legal, esses países não precisam tomar emprestado em sua própria moeda para financiar seus gastos. Portanto, o bicho-papão do risco fiscal, ou seja, a insolvência, inexiste num país emissor de sua própria moeda, como o Brasil – conquanto este país não contraia dívida excessiva em moeda estrangeira! Frescas na memória as atribulações da Grécia à época da crise do subprime. Sem soberania monetária, ao abdicar do dracma, o país endividou-se em euro e teve que pagar todos os seus compromissos nessa moeda, tanto os internos quanto os externos.

Mas voltemos à homilia acerca da necessidade de o governo adequar as despesas às receitas ao estilo do orçamento do lar. À vista do que foi dito, nos países monetariamente soberanos a busca a todo custo do rigor contábil não deve sacrificar as possibilidades de desenvolvimento econômico. Então é só acelerar o ritmo de emissão de moeda? Recorrer ao toque dourado de Midas para estimular o crescimento?

Não exatamente. Existe um limite real à expansão da atividade econômica: a inflação! Noutras palavras, o uso dos recursos disponíveis dentro de uma fronteira de produção determina esse limite. Quanto mais próximo do pleno emprego mais limitados serão os efeitos reais dos gastos públicos. Não se trata de incentivar a gastança. Pelo contrário, os gastos públicos devem guiar-se pelos efeitos sobre o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), sobre o nível de emprego e pelo controle da inflação e serem avaliados e reavaliados sistematicamente em termos de custos/benefícios.

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O pulo do gato consiste no emprego de recursos em investimentos produtivos dirigidos a setores estratégicos. Em países dotados de grandes recursos naturais e econômicos a mobilizar, como o Brasil, esses investimentos têm potencial para deslocar as fronteiras de possibilidade de produção e conhecimento, de modo a permitir que os incrementos da oferta agregada superem o nível geral de preços, absorvendo as pressões inflacionárias.

Já que é assim, por que esse bafafá em torno da busca desesperada do equilíbrio orçamentário? Qual a razão da insistência nessa desagradável aritmética orçamentária, que acaba por impor um viés contracionista à gestão macroeconômica? Por que cargas d’água continuamos apegados à velha analogia entre finanças públicas e orçamento familiar? Pelo visto devido ao fato de estarmos falando acerca de vieses cognitivos, de arraigadas representações da realidade. A ajuizar pelo tempo necessário à aceitação da ideia de que a Terra não era o centro do sistema solar ou da revolução darwiniana, não é de estranhar que percepções errôneas possam superar a realidade.

Seja como for, no caso brasileiro, uma coisa é certa: com essa lenga-lenga de equilíbrio fiscal a qualquer preço, com um Orçamento tributário em que os gastos obrigatórios representam 94% do total, o investimento público apenas 2% e juros nas alturas, dificilmente conseguiremos sair da dita armadilha da renda média. Não é à toa que o País permanece estagnado economicamente desde 1980, a despeito da grande disponibilidade de recursos econômicos e naturais. E, no entanto, seguimos a medicar o paciente com placebos, como a “taxa das blusinhas” para reforçar o caixa. Durma-se com um barulho desses!

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SÃO, RESPECTIVAMENTE, ADVOGADO, ECONOMISTA, AUTOR DO LIVRO ‘POLÍTICAS ANTICÍCLICAS E PROGRESSO ECONÔMICO’, MESTRE EM ECONOMIA PELA UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA (MG); E ESCRITOR, DIPLOMATA, AUTOR DO LIVRO ‘TRÊS FALTAS E VOCÊ SERÁ FORACLUÍDO’, MESTRE EM ARTES LIBERAIS PELA UNIVERSIDADE GEORGETOWN, D.C.

Pelo visto, toda a gente. Há sempre um economista de plantão vociferando sobre a necessidade de se cumprir a meta fiscal de déficit zero. A rigor, a visão acerca da necessidade do equilíbrio das finanças públicas projetou-se além dos redutos de especialistas para instalar-se no imaginário popular. O motivo por trás disso parece ser a ideia generalizada de que a gestão das finanças do governo se assemelha à do orçamento doméstico. Afinal, uma família que gasta além de suas possibilidades acaba dando com os burros n’água.

Ora, não se pode negar que, além de convincente, tal analogia constitui, pretensamente, um forte apelo ao bom senso. O diabo (cartesiano ou não) é que não se deve confundir modelos e representações mentais com coisas de facto existentes. Ao equipararmos a gestão das contas nacionais à das finanças pessoais, somos levados a raciocinar erroneamente à custa do que a lógica informal chama de falácia argumentum ad populum, referente àquilo que as pessoas pensam que sabem, no caso a crença de que o gasto sem lastro é necessariamente nocivo.

Vamos lá. Ao matricular a filha em dispendiosa escola, um casal de renda média provavelmente terá seu orçamento desequilibrado, o que acarretará adiante diminuição de poupança ou endividamento. Vamos supor, no entanto, que a esse casal fosse concedido o toque dourado do rei Midas. No final das contas, bastaria tocar um objeto a seu alcance para transformá-lo em ouro e cobrir, assim, o saldo devedor. O melhor dos mundos para o casal sortudo, não?

Mal comparando é o que sucede nos países soberanos monetariamente ou emissores de moeda. À luz da circunstância de que na era digital a representação física da moeda para todos os efeitos foi abolida e por possuírem o poder monopolístico de emitir moeda de curso legal, esses países não precisam tomar emprestado em sua própria moeda para financiar seus gastos. Portanto, o bicho-papão do risco fiscal, ou seja, a insolvência, inexiste num país emissor de sua própria moeda, como o Brasil – conquanto este país não contraia dívida excessiva em moeda estrangeira! Frescas na memória as atribulações da Grécia à época da crise do subprime. Sem soberania monetária, ao abdicar do dracma, o país endividou-se em euro e teve que pagar todos os seus compromissos nessa moeda, tanto os internos quanto os externos.

Mas voltemos à homilia acerca da necessidade de o governo adequar as despesas às receitas ao estilo do orçamento do lar. À vista do que foi dito, nos países monetariamente soberanos a busca a todo custo do rigor contábil não deve sacrificar as possibilidades de desenvolvimento econômico. Então é só acelerar o ritmo de emissão de moeda? Recorrer ao toque dourado de Midas para estimular o crescimento?

Não exatamente. Existe um limite real à expansão da atividade econômica: a inflação! Noutras palavras, o uso dos recursos disponíveis dentro de uma fronteira de produção determina esse limite. Quanto mais próximo do pleno emprego mais limitados serão os efeitos reais dos gastos públicos. Não se trata de incentivar a gastança. Pelo contrário, os gastos públicos devem guiar-se pelos efeitos sobre o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), sobre o nível de emprego e pelo controle da inflação e serem avaliados e reavaliados sistematicamente em termos de custos/benefícios.

O pulo do gato consiste no emprego de recursos em investimentos produtivos dirigidos a setores estratégicos. Em países dotados de grandes recursos naturais e econômicos a mobilizar, como o Brasil, esses investimentos têm potencial para deslocar as fronteiras de possibilidade de produção e conhecimento, de modo a permitir que os incrementos da oferta agregada superem o nível geral de preços, absorvendo as pressões inflacionárias.

Já que é assim, por que esse bafafá em torno da busca desesperada do equilíbrio orçamentário? Qual a razão da insistência nessa desagradável aritmética orçamentária, que acaba por impor um viés contracionista à gestão macroeconômica? Por que cargas d’água continuamos apegados à velha analogia entre finanças públicas e orçamento familiar? Pelo visto devido ao fato de estarmos falando acerca de vieses cognitivos, de arraigadas representações da realidade. A ajuizar pelo tempo necessário à aceitação da ideia de que a Terra não era o centro do sistema solar ou da revolução darwiniana, não é de estranhar que percepções errôneas possam superar a realidade.

Seja como for, no caso brasileiro, uma coisa é certa: com essa lenga-lenga de equilíbrio fiscal a qualquer preço, com um Orçamento tributário em que os gastos obrigatórios representam 94% do total, o investimento público apenas 2% e juros nas alturas, dificilmente conseguiremos sair da dita armadilha da renda média. Não é à toa que o País permanece estagnado economicamente desde 1980, a despeito da grande disponibilidade de recursos econômicos e naturais. E, no entanto, seguimos a medicar o paciente com placebos, como a “taxa das blusinhas” para reforçar o caixa. Durma-se com um barulho desses!

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SÃO, RESPECTIVAMENTE, ADVOGADO, ECONOMISTA, AUTOR DO LIVRO ‘POLÍTICAS ANTICÍCLICAS E PROGRESSO ECONÔMICO’, MESTRE EM ECONOMIA PELA UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA (MG); E ESCRITOR, DIPLOMATA, AUTOR DO LIVRO ‘TRÊS FALTAS E VOCÊ SERÁ FORACLUÍDO’, MESTRE EM ARTES LIBERAIS PELA UNIVERSIDADE GEORGETOWN, D.C.

Pelo visto, toda a gente. Há sempre um economista de plantão vociferando sobre a necessidade de se cumprir a meta fiscal de déficit zero. A rigor, a visão acerca da necessidade do equilíbrio das finanças públicas projetou-se além dos redutos de especialistas para instalar-se no imaginário popular. O motivo por trás disso parece ser a ideia generalizada de que a gestão das finanças do governo se assemelha à do orçamento doméstico. Afinal, uma família que gasta além de suas possibilidades acaba dando com os burros n’água.

Ora, não se pode negar que, além de convincente, tal analogia constitui, pretensamente, um forte apelo ao bom senso. O diabo (cartesiano ou não) é que não se deve confundir modelos e representações mentais com coisas de facto existentes. Ao equipararmos a gestão das contas nacionais à das finanças pessoais, somos levados a raciocinar erroneamente à custa do que a lógica informal chama de falácia argumentum ad populum, referente àquilo que as pessoas pensam que sabem, no caso a crença de que o gasto sem lastro é necessariamente nocivo.

Vamos lá. Ao matricular a filha em dispendiosa escola, um casal de renda média provavelmente terá seu orçamento desequilibrado, o que acarretará adiante diminuição de poupança ou endividamento. Vamos supor, no entanto, que a esse casal fosse concedido o toque dourado do rei Midas. No final das contas, bastaria tocar um objeto a seu alcance para transformá-lo em ouro e cobrir, assim, o saldo devedor. O melhor dos mundos para o casal sortudo, não?

Mal comparando é o que sucede nos países soberanos monetariamente ou emissores de moeda. À luz da circunstância de que na era digital a representação física da moeda para todos os efeitos foi abolida e por possuírem o poder monopolístico de emitir moeda de curso legal, esses países não precisam tomar emprestado em sua própria moeda para financiar seus gastos. Portanto, o bicho-papão do risco fiscal, ou seja, a insolvência, inexiste num país emissor de sua própria moeda, como o Brasil – conquanto este país não contraia dívida excessiva em moeda estrangeira! Frescas na memória as atribulações da Grécia à época da crise do subprime. Sem soberania monetária, ao abdicar do dracma, o país endividou-se em euro e teve que pagar todos os seus compromissos nessa moeda, tanto os internos quanto os externos.

Mas voltemos à homilia acerca da necessidade de o governo adequar as despesas às receitas ao estilo do orçamento do lar. À vista do que foi dito, nos países monetariamente soberanos a busca a todo custo do rigor contábil não deve sacrificar as possibilidades de desenvolvimento econômico. Então é só acelerar o ritmo de emissão de moeda? Recorrer ao toque dourado de Midas para estimular o crescimento?

Não exatamente. Existe um limite real à expansão da atividade econômica: a inflação! Noutras palavras, o uso dos recursos disponíveis dentro de uma fronteira de produção determina esse limite. Quanto mais próximo do pleno emprego mais limitados serão os efeitos reais dos gastos públicos. Não se trata de incentivar a gastança. Pelo contrário, os gastos públicos devem guiar-se pelos efeitos sobre o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), sobre o nível de emprego e pelo controle da inflação e serem avaliados e reavaliados sistematicamente em termos de custos/benefícios.

O pulo do gato consiste no emprego de recursos em investimentos produtivos dirigidos a setores estratégicos. Em países dotados de grandes recursos naturais e econômicos a mobilizar, como o Brasil, esses investimentos têm potencial para deslocar as fronteiras de possibilidade de produção e conhecimento, de modo a permitir que os incrementos da oferta agregada superem o nível geral de preços, absorvendo as pressões inflacionárias.

Já que é assim, por que esse bafafá em torno da busca desesperada do equilíbrio orçamentário? Qual a razão da insistência nessa desagradável aritmética orçamentária, que acaba por impor um viés contracionista à gestão macroeconômica? Por que cargas d’água continuamos apegados à velha analogia entre finanças públicas e orçamento familiar? Pelo visto devido ao fato de estarmos falando acerca de vieses cognitivos, de arraigadas representações da realidade. A ajuizar pelo tempo necessário à aceitação da ideia de que a Terra não era o centro do sistema solar ou da revolução darwiniana, não é de estranhar que percepções errôneas possam superar a realidade.

Seja como for, no caso brasileiro, uma coisa é certa: com essa lenga-lenga de equilíbrio fiscal a qualquer preço, com um Orçamento tributário em que os gastos obrigatórios representam 94% do total, o investimento público apenas 2% e juros nas alturas, dificilmente conseguiremos sair da dita armadilha da renda média. Não é à toa que o País permanece estagnado economicamente desde 1980, a despeito da grande disponibilidade de recursos econômicos e naturais. E, no entanto, seguimos a medicar o paciente com placebos, como a “taxa das blusinhas” para reforçar o caixa. Durma-se com um barulho desses!

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SÃO, RESPECTIVAMENTE, ADVOGADO, ECONOMISTA, AUTOR DO LIVRO ‘POLÍTICAS ANTICÍCLICAS E PROGRESSO ECONÔMICO’, MESTRE EM ECONOMIA PELA UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA (MG); E ESCRITOR, DIPLOMATA, AUTOR DO LIVRO ‘TRÊS FALTAS E VOCÊ SERÁ FORACLUÍDO’, MESTRE EM ARTES LIBERAIS PELA UNIVERSIDADE GEORGETOWN, D.C.

Pelo visto, toda a gente. Há sempre um economista de plantão vociferando sobre a necessidade de se cumprir a meta fiscal de déficit zero. A rigor, a visão acerca da necessidade do equilíbrio das finanças públicas projetou-se além dos redutos de especialistas para instalar-se no imaginário popular. O motivo por trás disso parece ser a ideia generalizada de que a gestão das finanças do governo se assemelha à do orçamento doméstico. Afinal, uma família que gasta além de suas possibilidades acaba dando com os burros n’água.

Ora, não se pode negar que, além de convincente, tal analogia constitui, pretensamente, um forte apelo ao bom senso. O diabo (cartesiano ou não) é que não se deve confundir modelos e representações mentais com coisas de facto existentes. Ao equipararmos a gestão das contas nacionais à das finanças pessoais, somos levados a raciocinar erroneamente à custa do que a lógica informal chama de falácia argumentum ad populum, referente àquilo que as pessoas pensam que sabem, no caso a crença de que o gasto sem lastro é necessariamente nocivo.

Vamos lá. Ao matricular a filha em dispendiosa escola, um casal de renda média provavelmente terá seu orçamento desequilibrado, o que acarretará adiante diminuição de poupança ou endividamento. Vamos supor, no entanto, que a esse casal fosse concedido o toque dourado do rei Midas. No final das contas, bastaria tocar um objeto a seu alcance para transformá-lo em ouro e cobrir, assim, o saldo devedor. O melhor dos mundos para o casal sortudo, não?

Mal comparando é o que sucede nos países soberanos monetariamente ou emissores de moeda. À luz da circunstância de que na era digital a representação física da moeda para todos os efeitos foi abolida e por possuírem o poder monopolístico de emitir moeda de curso legal, esses países não precisam tomar emprestado em sua própria moeda para financiar seus gastos. Portanto, o bicho-papão do risco fiscal, ou seja, a insolvência, inexiste num país emissor de sua própria moeda, como o Brasil – conquanto este país não contraia dívida excessiva em moeda estrangeira! Frescas na memória as atribulações da Grécia à época da crise do subprime. Sem soberania monetária, ao abdicar do dracma, o país endividou-se em euro e teve que pagar todos os seus compromissos nessa moeda, tanto os internos quanto os externos.

Mas voltemos à homilia acerca da necessidade de o governo adequar as despesas às receitas ao estilo do orçamento do lar. À vista do que foi dito, nos países monetariamente soberanos a busca a todo custo do rigor contábil não deve sacrificar as possibilidades de desenvolvimento econômico. Então é só acelerar o ritmo de emissão de moeda? Recorrer ao toque dourado de Midas para estimular o crescimento?

Não exatamente. Existe um limite real à expansão da atividade econômica: a inflação! Noutras palavras, o uso dos recursos disponíveis dentro de uma fronteira de produção determina esse limite. Quanto mais próximo do pleno emprego mais limitados serão os efeitos reais dos gastos públicos. Não se trata de incentivar a gastança. Pelo contrário, os gastos públicos devem guiar-se pelos efeitos sobre o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), sobre o nível de emprego e pelo controle da inflação e serem avaliados e reavaliados sistematicamente em termos de custos/benefícios.

O pulo do gato consiste no emprego de recursos em investimentos produtivos dirigidos a setores estratégicos. Em países dotados de grandes recursos naturais e econômicos a mobilizar, como o Brasil, esses investimentos têm potencial para deslocar as fronteiras de possibilidade de produção e conhecimento, de modo a permitir que os incrementos da oferta agregada superem o nível geral de preços, absorvendo as pressões inflacionárias.

Já que é assim, por que esse bafafá em torno da busca desesperada do equilíbrio orçamentário? Qual a razão da insistência nessa desagradável aritmética orçamentária, que acaba por impor um viés contracionista à gestão macroeconômica? Por que cargas d’água continuamos apegados à velha analogia entre finanças públicas e orçamento familiar? Pelo visto devido ao fato de estarmos falando acerca de vieses cognitivos, de arraigadas representações da realidade. A ajuizar pelo tempo necessário à aceitação da ideia de que a Terra não era o centro do sistema solar ou da revolução darwiniana, não é de estranhar que percepções errôneas possam superar a realidade.

Seja como for, no caso brasileiro, uma coisa é certa: com essa lenga-lenga de equilíbrio fiscal a qualquer preço, com um Orçamento tributário em que os gastos obrigatórios representam 94% do total, o investimento público apenas 2% e juros nas alturas, dificilmente conseguiremos sair da dita armadilha da renda média. Não é à toa que o País permanece estagnado economicamente desde 1980, a despeito da grande disponibilidade de recursos econômicos e naturais. E, no entanto, seguimos a medicar o paciente com placebos, como a “taxa das blusinhas” para reforçar o caixa. Durma-se com um barulho desses!

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SÃO, RESPECTIVAMENTE, ADVOGADO, ECONOMISTA, AUTOR DO LIVRO ‘POLÍTICAS ANTICÍCLICAS E PROGRESSO ECONÔMICO’, MESTRE EM ECONOMIA PELA UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA (MG); E ESCRITOR, DIPLOMATA, AUTOR DO LIVRO ‘TRÊS FALTAS E VOCÊ SERÁ FORACLUÍDO’, MESTRE EM ARTES LIBERAIS PELA UNIVERSIDADE GEORGETOWN, D.C.

Opinião por Nilo Alberto Barroso

Advogado, economista, autor do livro 'Políticas Anticíclicas e Progresso Econômico', é mestre em Economia pela Universidade Federal de Viçosa (MG)

Nilo Barroso

Escritor, diplomata, autor do livro 'Três Faltas e Você Será Foracluído', é mestre em Artes Liberais pela Universidade Georgetown, D.C.

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