Opinião|Só greves ilegítimas necessitam de barricadas


Na USP, uma minoria visa a alcançar objetivos não diretamente acadêmicos usando a força, e não o poder da argumentação. As barricadas são a cabal demonstração desse fato

Por Fernando Facury Scaff

Diversos estudantes da Universidade de São Paulo (USP) realizaram assembleias que decidiram pela greve estudantil, estabelecendo barricadas nos prédios para impedir o acesso de professores e alunos – este é um fato que contém diversas incongruências e paradoxos.

A primeira é que estudantes não fazem greve, pois são usuários do serviço público de ensino – não o são diretamente da pesquisa e da extensão. Equivale a pacientes que se recusam a usar os serviços do SUS sem que tenham alternativa. Quem faz greve é agente econômico, mesmo que seja prestador de serviço público, como os docentes do ensino público e os médicos do SUS, jamais os usuários desses serviços. Usuários podem fazer paralisação, que não é uma greve, a qual tem outra dimensão.

A segunda é que este específico serviço público de ensino é prestado com exclusividade a quem obteve êxito na etapa dificílima do vestibular. Logo, trata-se de um grupo escolhido por critérios meritocráticos, o que os situa como privilegiados dentro da sociedade, mas que se recusa a ter aulas, isto é, a receber aquilo para o que tanto se esforçou.

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A terceira é que os principais prejudicados são e serão os próprios alunos, pois perderão os ensinamentos que não estão sendo ministrados, e dificilmente serão repostos, pois o tempo não para, como cantava o poeta.

A situação se torna paradoxal com a alegação de que as paralisações são decorrentes de assembleias corretamente convocadas, tendo se sagrado vencedor o grupo a favor de não ter aulas, o que tornaria esse movimento legítimo, devendo ser respeitado. Sendo essa a premissa, por que foram instaladas barricadas em diversos prédios impedindo o acesso dos professores às salas de aula? Se o movimento é verdadeiramente legítimo, qual a razão de impedir o acesso? Os docentes iriam para as salas de aula e os estudantes simplesmente não apareceriam para receber os ensinamentos, pois teria sido a legítima decisão da maioria. Ocorre que as barricadas demonstram a ilegitimidade da paralisação, indicando que as deliberações não foram democráticas, o que pode ter ocorrido por não terem sido amplamente convocadas ou o quórum não foi representativo, impedindo que seu resultado seja legítimo. Não sendo democráticas, sua legitimidade fica abalada e indica não foi obtida maioria numérica a favor da paralisação – ou seja, uma minoria está controlando todo o processo paredista.

As barricadas demonstram a fraqueza do movimento e sua ilegitimidade, que só apresenta resultados pela força do bloqueio do acesso às salas de aula. Medidas legítimas são acatadas sem a força de barricadas.

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Por não haver um comando unificado de greve (corrigindo: um comando unificado do movimento paredista), não se sabe ao certo o que está sendo pleiteado, muito embora algumas das reivindicações que afloram aqui e ali pareçam ser justas. Ocorre que mesmo estas se encontram fora do âmbito de decisão da administração universitária, cuja missão é cuidar do ensino, da pesquisa e da extensão, o que vem sendo feito de modo competente na USP, inclusive reconhecido por rankings internacionais. Como negociar, se não há poder para fazer o que se pede?

Isso indica que o verdadeiro alvo da greve se situa fora dos muros acadêmicos.

Ligando os pontos, constata-se existir uma minoria que visa a alcançar seus objetivos, que não são diretamente acadêmicos, usando a força, e não o poder da argumentação. As barricadas são a demonstração cabal desse fato.

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Isso revela que existe uma maioria de estudantes que deseja retornar às aulas e está sendo impedida pela minoria, que está capturada por algumas pautas justas, mas fora do âmbito de decisão acadêmica. A maioria estudantil assiste a tudo, atônita, violentada pela minoria, que aguarda ser usada uma força contrária à sua para demonstrar que são vítimas. Na verdade, a minoria é algoz da maioria, impedida de ir e vir, direito fundamental obstruído. Não é pela força que esses problemas devem ser resolvidos.

O fato é que, em face da pauta não acadêmica que está sendo vislumbrada aqui e ali, a negociação com o movimento paredista deve ser deslocada para fora dos muros da universidade, endereçada aos órgãos políticos do Estado: governo do Estado e Assembleia Legislativa. Eventual dilapidação do patrimônio público deve ficar a cargo das autoridades competentes, igualmente extramuros acadêmicos: Ministério Público, Polícia e Poder Judiciário. A decisão sobre o que e como fazer cabe a tais instituições, não à Universidade, cuja função prioritária é voltada à produção de conhecimento nas áreas das humanidades, tecnologia, biologia, inovação, arte e cultura, entre várias outras.

A USP é forte em razão de seus docentes, discentes e servidores, que atuam em prol da sociedade, mas não tem, e não deve ter, gestão do uso da força, mesmo sendo pressionada de forma ilegítima por quem não compartilha de fato de suas preocupações referentes aos valores fundamentais que norteiam a universidade pública e a democracia, dentro e fora de suas dependências.

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ADVOGADO, É PROFESSOR TITULAR DA FACULDADE DE DIREITO DA USP

Diversos estudantes da Universidade de São Paulo (USP) realizaram assembleias que decidiram pela greve estudantil, estabelecendo barricadas nos prédios para impedir o acesso de professores e alunos – este é um fato que contém diversas incongruências e paradoxos.

A primeira é que estudantes não fazem greve, pois são usuários do serviço público de ensino – não o são diretamente da pesquisa e da extensão. Equivale a pacientes que se recusam a usar os serviços do SUS sem que tenham alternativa. Quem faz greve é agente econômico, mesmo que seja prestador de serviço público, como os docentes do ensino público e os médicos do SUS, jamais os usuários desses serviços. Usuários podem fazer paralisação, que não é uma greve, a qual tem outra dimensão.

A segunda é que este específico serviço público de ensino é prestado com exclusividade a quem obteve êxito na etapa dificílima do vestibular. Logo, trata-se de um grupo escolhido por critérios meritocráticos, o que os situa como privilegiados dentro da sociedade, mas que se recusa a ter aulas, isto é, a receber aquilo para o que tanto se esforçou.

A terceira é que os principais prejudicados são e serão os próprios alunos, pois perderão os ensinamentos que não estão sendo ministrados, e dificilmente serão repostos, pois o tempo não para, como cantava o poeta.

A situação se torna paradoxal com a alegação de que as paralisações são decorrentes de assembleias corretamente convocadas, tendo se sagrado vencedor o grupo a favor de não ter aulas, o que tornaria esse movimento legítimo, devendo ser respeitado. Sendo essa a premissa, por que foram instaladas barricadas em diversos prédios impedindo o acesso dos professores às salas de aula? Se o movimento é verdadeiramente legítimo, qual a razão de impedir o acesso? Os docentes iriam para as salas de aula e os estudantes simplesmente não apareceriam para receber os ensinamentos, pois teria sido a legítima decisão da maioria. Ocorre que as barricadas demonstram a ilegitimidade da paralisação, indicando que as deliberações não foram democráticas, o que pode ter ocorrido por não terem sido amplamente convocadas ou o quórum não foi representativo, impedindo que seu resultado seja legítimo. Não sendo democráticas, sua legitimidade fica abalada e indica não foi obtida maioria numérica a favor da paralisação – ou seja, uma minoria está controlando todo o processo paredista.

As barricadas demonstram a fraqueza do movimento e sua ilegitimidade, que só apresenta resultados pela força do bloqueio do acesso às salas de aula. Medidas legítimas são acatadas sem a força de barricadas.

Por não haver um comando unificado de greve (corrigindo: um comando unificado do movimento paredista), não se sabe ao certo o que está sendo pleiteado, muito embora algumas das reivindicações que afloram aqui e ali pareçam ser justas. Ocorre que mesmo estas se encontram fora do âmbito de decisão da administração universitária, cuja missão é cuidar do ensino, da pesquisa e da extensão, o que vem sendo feito de modo competente na USP, inclusive reconhecido por rankings internacionais. Como negociar, se não há poder para fazer o que se pede?

Isso indica que o verdadeiro alvo da greve se situa fora dos muros acadêmicos.

Ligando os pontos, constata-se existir uma minoria que visa a alcançar seus objetivos, que não são diretamente acadêmicos, usando a força, e não o poder da argumentação. As barricadas são a demonstração cabal desse fato.

Isso revela que existe uma maioria de estudantes que deseja retornar às aulas e está sendo impedida pela minoria, que está capturada por algumas pautas justas, mas fora do âmbito de decisão acadêmica. A maioria estudantil assiste a tudo, atônita, violentada pela minoria, que aguarda ser usada uma força contrária à sua para demonstrar que são vítimas. Na verdade, a minoria é algoz da maioria, impedida de ir e vir, direito fundamental obstruído. Não é pela força que esses problemas devem ser resolvidos.

O fato é que, em face da pauta não acadêmica que está sendo vislumbrada aqui e ali, a negociação com o movimento paredista deve ser deslocada para fora dos muros da universidade, endereçada aos órgãos políticos do Estado: governo do Estado e Assembleia Legislativa. Eventual dilapidação do patrimônio público deve ficar a cargo das autoridades competentes, igualmente extramuros acadêmicos: Ministério Público, Polícia e Poder Judiciário. A decisão sobre o que e como fazer cabe a tais instituições, não à Universidade, cuja função prioritária é voltada à produção de conhecimento nas áreas das humanidades, tecnologia, biologia, inovação, arte e cultura, entre várias outras.

A USP é forte em razão de seus docentes, discentes e servidores, que atuam em prol da sociedade, mas não tem, e não deve ter, gestão do uso da força, mesmo sendo pressionada de forma ilegítima por quem não compartilha de fato de suas preocupações referentes aos valores fundamentais que norteiam a universidade pública e a democracia, dentro e fora de suas dependências.

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ADVOGADO, É PROFESSOR TITULAR DA FACULDADE DE DIREITO DA USP

Diversos estudantes da Universidade de São Paulo (USP) realizaram assembleias que decidiram pela greve estudantil, estabelecendo barricadas nos prédios para impedir o acesso de professores e alunos – este é um fato que contém diversas incongruências e paradoxos.

A primeira é que estudantes não fazem greve, pois são usuários do serviço público de ensino – não o são diretamente da pesquisa e da extensão. Equivale a pacientes que se recusam a usar os serviços do SUS sem que tenham alternativa. Quem faz greve é agente econômico, mesmo que seja prestador de serviço público, como os docentes do ensino público e os médicos do SUS, jamais os usuários desses serviços. Usuários podem fazer paralisação, que não é uma greve, a qual tem outra dimensão.

A segunda é que este específico serviço público de ensino é prestado com exclusividade a quem obteve êxito na etapa dificílima do vestibular. Logo, trata-se de um grupo escolhido por critérios meritocráticos, o que os situa como privilegiados dentro da sociedade, mas que se recusa a ter aulas, isto é, a receber aquilo para o que tanto se esforçou.

A terceira é que os principais prejudicados são e serão os próprios alunos, pois perderão os ensinamentos que não estão sendo ministrados, e dificilmente serão repostos, pois o tempo não para, como cantava o poeta.

A situação se torna paradoxal com a alegação de que as paralisações são decorrentes de assembleias corretamente convocadas, tendo se sagrado vencedor o grupo a favor de não ter aulas, o que tornaria esse movimento legítimo, devendo ser respeitado. Sendo essa a premissa, por que foram instaladas barricadas em diversos prédios impedindo o acesso dos professores às salas de aula? Se o movimento é verdadeiramente legítimo, qual a razão de impedir o acesso? Os docentes iriam para as salas de aula e os estudantes simplesmente não apareceriam para receber os ensinamentos, pois teria sido a legítima decisão da maioria. Ocorre que as barricadas demonstram a ilegitimidade da paralisação, indicando que as deliberações não foram democráticas, o que pode ter ocorrido por não terem sido amplamente convocadas ou o quórum não foi representativo, impedindo que seu resultado seja legítimo. Não sendo democráticas, sua legitimidade fica abalada e indica não foi obtida maioria numérica a favor da paralisação – ou seja, uma minoria está controlando todo o processo paredista.

As barricadas demonstram a fraqueza do movimento e sua ilegitimidade, que só apresenta resultados pela força do bloqueio do acesso às salas de aula. Medidas legítimas são acatadas sem a força de barricadas.

Por não haver um comando unificado de greve (corrigindo: um comando unificado do movimento paredista), não se sabe ao certo o que está sendo pleiteado, muito embora algumas das reivindicações que afloram aqui e ali pareçam ser justas. Ocorre que mesmo estas se encontram fora do âmbito de decisão da administração universitária, cuja missão é cuidar do ensino, da pesquisa e da extensão, o que vem sendo feito de modo competente na USP, inclusive reconhecido por rankings internacionais. Como negociar, se não há poder para fazer o que se pede?

Isso indica que o verdadeiro alvo da greve se situa fora dos muros acadêmicos.

Ligando os pontos, constata-se existir uma minoria que visa a alcançar seus objetivos, que não são diretamente acadêmicos, usando a força, e não o poder da argumentação. As barricadas são a demonstração cabal desse fato.

Isso revela que existe uma maioria de estudantes que deseja retornar às aulas e está sendo impedida pela minoria, que está capturada por algumas pautas justas, mas fora do âmbito de decisão acadêmica. A maioria estudantil assiste a tudo, atônita, violentada pela minoria, que aguarda ser usada uma força contrária à sua para demonstrar que são vítimas. Na verdade, a minoria é algoz da maioria, impedida de ir e vir, direito fundamental obstruído. Não é pela força que esses problemas devem ser resolvidos.

O fato é que, em face da pauta não acadêmica que está sendo vislumbrada aqui e ali, a negociação com o movimento paredista deve ser deslocada para fora dos muros da universidade, endereçada aos órgãos políticos do Estado: governo do Estado e Assembleia Legislativa. Eventual dilapidação do patrimônio público deve ficar a cargo das autoridades competentes, igualmente extramuros acadêmicos: Ministério Público, Polícia e Poder Judiciário. A decisão sobre o que e como fazer cabe a tais instituições, não à Universidade, cuja função prioritária é voltada à produção de conhecimento nas áreas das humanidades, tecnologia, biologia, inovação, arte e cultura, entre várias outras.

A USP é forte em razão de seus docentes, discentes e servidores, que atuam em prol da sociedade, mas não tem, e não deve ter, gestão do uso da força, mesmo sendo pressionada de forma ilegítima por quem não compartilha de fato de suas preocupações referentes aos valores fundamentais que norteiam a universidade pública e a democracia, dentro e fora de suas dependências.

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Diversos estudantes da Universidade de São Paulo (USP) realizaram assembleias que decidiram pela greve estudantil, estabelecendo barricadas nos prédios para impedir o acesso de professores e alunos – este é um fato que contém diversas incongruências e paradoxos.

A primeira é que estudantes não fazem greve, pois são usuários do serviço público de ensino – não o são diretamente da pesquisa e da extensão. Equivale a pacientes que se recusam a usar os serviços do SUS sem que tenham alternativa. Quem faz greve é agente econômico, mesmo que seja prestador de serviço público, como os docentes do ensino público e os médicos do SUS, jamais os usuários desses serviços. Usuários podem fazer paralisação, que não é uma greve, a qual tem outra dimensão.

A segunda é que este específico serviço público de ensino é prestado com exclusividade a quem obteve êxito na etapa dificílima do vestibular. Logo, trata-se de um grupo escolhido por critérios meritocráticos, o que os situa como privilegiados dentro da sociedade, mas que se recusa a ter aulas, isto é, a receber aquilo para o que tanto se esforçou.

A terceira é que os principais prejudicados são e serão os próprios alunos, pois perderão os ensinamentos que não estão sendo ministrados, e dificilmente serão repostos, pois o tempo não para, como cantava o poeta.

A situação se torna paradoxal com a alegação de que as paralisações são decorrentes de assembleias corretamente convocadas, tendo se sagrado vencedor o grupo a favor de não ter aulas, o que tornaria esse movimento legítimo, devendo ser respeitado. Sendo essa a premissa, por que foram instaladas barricadas em diversos prédios impedindo o acesso dos professores às salas de aula? Se o movimento é verdadeiramente legítimo, qual a razão de impedir o acesso? Os docentes iriam para as salas de aula e os estudantes simplesmente não apareceriam para receber os ensinamentos, pois teria sido a legítima decisão da maioria. Ocorre que as barricadas demonstram a ilegitimidade da paralisação, indicando que as deliberações não foram democráticas, o que pode ter ocorrido por não terem sido amplamente convocadas ou o quórum não foi representativo, impedindo que seu resultado seja legítimo. Não sendo democráticas, sua legitimidade fica abalada e indica não foi obtida maioria numérica a favor da paralisação – ou seja, uma minoria está controlando todo o processo paredista.

As barricadas demonstram a fraqueza do movimento e sua ilegitimidade, que só apresenta resultados pela força do bloqueio do acesso às salas de aula. Medidas legítimas são acatadas sem a força de barricadas.

Por não haver um comando unificado de greve (corrigindo: um comando unificado do movimento paredista), não se sabe ao certo o que está sendo pleiteado, muito embora algumas das reivindicações que afloram aqui e ali pareçam ser justas. Ocorre que mesmo estas se encontram fora do âmbito de decisão da administração universitária, cuja missão é cuidar do ensino, da pesquisa e da extensão, o que vem sendo feito de modo competente na USP, inclusive reconhecido por rankings internacionais. Como negociar, se não há poder para fazer o que se pede?

Isso indica que o verdadeiro alvo da greve se situa fora dos muros acadêmicos.

Ligando os pontos, constata-se existir uma minoria que visa a alcançar seus objetivos, que não são diretamente acadêmicos, usando a força, e não o poder da argumentação. As barricadas são a demonstração cabal desse fato.

Isso revela que existe uma maioria de estudantes que deseja retornar às aulas e está sendo impedida pela minoria, que está capturada por algumas pautas justas, mas fora do âmbito de decisão acadêmica. A maioria estudantil assiste a tudo, atônita, violentada pela minoria, que aguarda ser usada uma força contrária à sua para demonstrar que são vítimas. Na verdade, a minoria é algoz da maioria, impedida de ir e vir, direito fundamental obstruído. Não é pela força que esses problemas devem ser resolvidos.

O fato é que, em face da pauta não acadêmica que está sendo vislumbrada aqui e ali, a negociação com o movimento paredista deve ser deslocada para fora dos muros da universidade, endereçada aos órgãos políticos do Estado: governo do Estado e Assembleia Legislativa. Eventual dilapidação do patrimônio público deve ficar a cargo das autoridades competentes, igualmente extramuros acadêmicos: Ministério Público, Polícia e Poder Judiciário. A decisão sobre o que e como fazer cabe a tais instituições, não à Universidade, cuja função prioritária é voltada à produção de conhecimento nas áreas das humanidades, tecnologia, biologia, inovação, arte e cultura, entre várias outras.

A USP é forte em razão de seus docentes, discentes e servidores, que atuam em prol da sociedade, mas não tem, e não deve ter, gestão do uso da força, mesmo sendo pressionada de forma ilegítima por quem não compartilha de fato de suas preocupações referentes aos valores fundamentais que norteiam a universidade pública e a democracia, dentro e fora de suas dependências.

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ADVOGADO, É PROFESSOR TITULAR DA FACULDADE DE DIREITO DA USP

Diversos estudantes da Universidade de São Paulo (USP) realizaram assembleias que decidiram pela greve estudantil, estabelecendo barricadas nos prédios para impedir o acesso de professores e alunos – este é um fato que contém diversas incongruências e paradoxos.

A primeira é que estudantes não fazem greve, pois são usuários do serviço público de ensino – não o são diretamente da pesquisa e da extensão. Equivale a pacientes que se recusam a usar os serviços do SUS sem que tenham alternativa. Quem faz greve é agente econômico, mesmo que seja prestador de serviço público, como os docentes do ensino público e os médicos do SUS, jamais os usuários desses serviços. Usuários podem fazer paralisação, que não é uma greve, a qual tem outra dimensão.

A segunda é que este específico serviço público de ensino é prestado com exclusividade a quem obteve êxito na etapa dificílima do vestibular. Logo, trata-se de um grupo escolhido por critérios meritocráticos, o que os situa como privilegiados dentro da sociedade, mas que se recusa a ter aulas, isto é, a receber aquilo para o que tanto se esforçou.

A terceira é que os principais prejudicados são e serão os próprios alunos, pois perderão os ensinamentos que não estão sendo ministrados, e dificilmente serão repostos, pois o tempo não para, como cantava o poeta.

A situação se torna paradoxal com a alegação de que as paralisações são decorrentes de assembleias corretamente convocadas, tendo se sagrado vencedor o grupo a favor de não ter aulas, o que tornaria esse movimento legítimo, devendo ser respeitado. Sendo essa a premissa, por que foram instaladas barricadas em diversos prédios impedindo o acesso dos professores às salas de aula? Se o movimento é verdadeiramente legítimo, qual a razão de impedir o acesso? Os docentes iriam para as salas de aula e os estudantes simplesmente não apareceriam para receber os ensinamentos, pois teria sido a legítima decisão da maioria. Ocorre que as barricadas demonstram a ilegitimidade da paralisação, indicando que as deliberações não foram democráticas, o que pode ter ocorrido por não terem sido amplamente convocadas ou o quórum não foi representativo, impedindo que seu resultado seja legítimo. Não sendo democráticas, sua legitimidade fica abalada e indica não foi obtida maioria numérica a favor da paralisação – ou seja, uma minoria está controlando todo o processo paredista.

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Isso indica que o verdadeiro alvo da greve se situa fora dos muros acadêmicos.

Ligando os pontos, constata-se existir uma minoria que visa a alcançar seus objetivos, que não são diretamente acadêmicos, usando a força, e não o poder da argumentação. As barricadas são a demonstração cabal desse fato.

Isso revela que existe uma maioria de estudantes que deseja retornar às aulas e está sendo impedida pela minoria, que está capturada por algumas pautas justas, mas fora do âmbito de decisão acadêmica. A maioria estudantil assiste a tudo, atônita, violentada pela minoria, que aguarda ser usada uma força contrária à sua para demonstrar que são vítimas. Na verdade, a minoria é algoz da maioria, impedida de ir e vir, direito fundamental obstruído. Não é pela força que esses problemas devem ser resolvidos.

O fato é que, em face da pauta não acadêmica que está sendo vislumbrada aqui e ali, a negociação com o movimento paredista deve ser deslocada para fora dos muros da universidade, endereçada aos órgãos políticos do Estado: governo do Estado e Assembleia Legislativa. Eventual dilapidação do patrimônio público deve ficar a cargo das autoridades competentes, igualmente extramuros acadêmicos: Ministério Público, Polícia e Poder Judiciário. A decisão sobre o que e como fazer cabe a tais instituições, não à Universidade, cuja função prioritária é voltada à produção de conhecimento nas áreas das humanidades, tecnologia, biologia, inovação, arte e cultura, entre várias outras.

A USP é forte em razão de seus docentes, discentes e servidores, que atuam em prol da sociedade, mas não tem, e não deve ter, gestão do uso da força, mesmo sendo pressionada de forma ilegítima por quem não compartilha de fato de suas preocupações referentes aos valores fundamentais que norteiam a universidade pública e a democracia, dentro e fora de suas dependências.

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Opinião por Fernando Facury Scaff

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