Jornalista e professor da ECA-USP, Eugênio Bucci escreve quinzenalmente na seção Espaço Aberto

Opinião|A greve na USP e seu impasse


Esta greve, do jeito que vai indo, não é contra o governo, como alguns parecem imaginar, mas contra a USP e contra o próprio movimento estudantil

Por Eugênio Bucci

O movimento que paralisou as aulas na Universidade de São Paulo (USP) tropeçou num equívoco, caiu dentro dele e, agora, não sabe como sair. Está na cara. Está evidente. Os grevistas dizem ter duas reivindicações principais: contratar mais docentes e garantir a ajuda financeira dos alunos e das alunas em situação de vulnerabilidade socioeconômica. Ora, essas duas reivindicações chegaram atrasadas ao encontro. Desde o ano passado, a direção da universidade trabalha com as duas prioridades – e trabalha com números grandes.

Em primeiro lugar, a reitoria já tomou todas as providências para admitir 879 novos professores e professoras até 2025. Estamos falando de um aumento da ordem de 15% no corpo docente. Não se tem notícia, na história recente da instituição, de um esforço tão substancial de crescimento.

Em segundo lugar, a permanência estudantil nunca esteve tão bem atendida. De 2022 para 2023, a USP elevou em quase 60% os investimentos para apoiar discentes de famílias com dificuldades econômicas. São cerca de R$ 180 milhões por ano, que contemplam um conjunto de aproximadamente 15 mil estudantes, numa política que tem sido considerada modelar por órgãos ligados à educação.

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Se as coisas são assim – e elas são exatamente assim –, vale perguntar: por que uma retórica tão agressiva? Por que uma greve que promete jogar no tudo ou nada? Há motivos racionais que a justifiquem? Bem sabemos que existem problemas agudos em algumas escolas, que pedem providências, mas por que tentar parar toda a USP dessa maneira? Por que tantas falas acusatórias – e infundadas?

Infelizmente, não há respostas objetivas. Nenhuma explicação racional. E é aí, no vazio deixado pela ausência de respostas, que o equívoco aparece com todas as suas cores. Ao apontar como antagonistas as equipes dirigentes da USP, o movimento grevista cai num erro de pessoa e, inadvertidamente, acabou fortalecendo seus reais oponentes: os que são contra a universidade pública e defendem medidas policiais para reprimir qualquer indisciplina.

Os piquetes, organizados pela minoria da minoria, amontoando cadeiras escolares para bloquear portas e corredores das faculdades, ofendem a comunidade e rendem fotografias impactantes, que só servem para abastecer o discurso contrário à vida intelectual, à ciência e às artes. A extrema direita antidemocrática exulta, agradecida. Essas imagens são tudo o que ela queria para ilustrar sua propaganda mentirosa contra o financiamento do ensino superior gratuito e contra a liberdade acadêmica.

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É inacreditável. Será que as lideranças não viram o passo em falso? Não perceberam o equívoco? Será que saberão sair da armadilha que armaram para si mesmas? Por acaso, ainda acreditam que os “cadeiraços” vão favorecer causas de esquerda?

Esta greve, do jeito que vai indo, não é contra o governo, como alguns parecem imaginar, mas contra a USP e contra o próprio movimento estudantil. É meio suicida, um curto-circuito que vai ferir os mais frágeis e fortalecer os mais truculentos. O movimento precisa refletir. Não pode mais confundir amigos com inimigos. Se não avaliar direito o seu impasse, poderá se isolar ainda mais, cair em descrédito e se esvaziar.

De sua parte, o professorado da USP enfrenta a crise com maturidade e serenidade. A postura altiva dá o tom. Em sua ampla maioria, lida de modo civilizado com os protestos. Sabe perfeitamente que, assim como trabalhadores cruzam os braços e a população carcerária pode fazer greve de fome, estudantes também podem suspender unilateralmente as aulas. Isso é normal. Fora o quê, existe na universidade um entendimento tácito de que a experiência política durante a graduação e a pós-graduação ajuda a formar as novas gerações. Nenhum problema quanto a isso.

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A boa universidade vibra na frequência de sua gente. A nação inteira, com todas as suas contradições, precisa caber dentro de cada campus. Isso não atrapalha, mas tonifica o pensamento e dá mais vida para as aulas e as pesquisas. A fantasia de organizar a universidade como se ela fosse um condomínio fechado, blindado contra os defeitos da sociedade, é uma tolice que não viceja na USP. Que greves eventualmente ocorram não é uma fraqueza da universidade – ao contrário, pode ser um sinal de virtude cívica. A história está cheia de jornadas de lutas estudantis que nos orgulham.

Não é o caso da presente greve, é óbvio. Ela não nos orgulha. Agora, a comunidade espera uma solução por meio do entendimento – e rápida. A USP, com acerto, vem deixando claro que não quer a pedagogia do cassetete e do gás lacrimogêneo. Tudo precisa se resolver na base do diálogo. Mas, para que o diálogo dê certo, os estudantes precisam saber superar o imbroglio que criaram para si mesmos. Não basta que dirigentes da USP respeitem a autonomia do movimento estudantil. É preciso que o movimento estudantil não bombardeie por dentro a autonomia da universidade que o acolhe com respeito. l

Nota: fui membro da diretoria do DCE-Livre da USP e presidente do Centro Acadêmico XI de Agosto, mas isso já faz muito tempo.

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JORNALISTA, É PROFESSOR DA ECA-USP

O movimento que paralisou as aulas na Universidade de São Paulo (USP) tropeçou num equívoco, caiu dentro dele e, agora, não sabe como sair. Está na cara. Está evidente. Os grevistas dizem ter duas reivindicações principais: contratar mais docentes e garantir a ajuda financeira dos alunos e das alunas em situação de vulnerabilidade socioeconômica. Ora, essas duas reivindicações chegaram atrasadas ao encontro. Desde o ano passado, a direção da universidade trabalha com as duas prioridades – e trabalha com números grandes.

Em primeiro lugar, a reitoria já tomou todas as providências para admitir 879 novos professores e professoras até 2025. Estamos falando de um aumento da ordem de 15% no corpo docente. Não se tem notícia, na história recente da instituição, de um esforço tão substancial de crescimento.

Em segundo lugar, a permanência estudantil nunca esteve tão bem atendida. De 2022 para 2023, a USP elevou em quase 60% os investimentos para apoiar discentes de famílias com dificuldades econômicas. São cerca de R$ 180 milhões por ano, que contemplam um conjunto de aproximadamente 15 mil estudantes, numa política que tem sido considerada modelar por órgãos ligados à educação.

Se as coisas são assim – e elas são exatamente assim –, vale perguntar: por que uma retórica tão agressiva? Por que uma greve que promete jogar no tudo ou nada? Há motivos racionais que a justifiquem? Bem sabemos que existem problemas agudos em algumas escolas, que pedem providências, mas por que tentar parar toda a USP dessa maneira? Por que tantas falas acusatórias – e infundadas?

Infelizmente, não há respostas objetivas. Nenhuma explicação racional. E é aí, no vazio deixado pela ausência de respostas, que o equívoco aparece com todas as suas cores. Ao apontar como antagonistas as equipes dirigentes da USP, o movimento grevista cai num erro de pessoa e, inadvertidamente, acabou fortalecendo seus reais oponentes: os que são contra a universidade pública e defendem medidas policiais para reprimir qualquer indisciplina.

Os piquetes, organizados pela minoria da minoria, amontoando cadeiras escolares para bloquear portas e corredores das faculdades, ofendem a comunidade e rendem fotografias impactantes, que só servem para abastecer o discurso contrário à vida intelectual, à ciência e às artes. A extrema direita antidemocrática exulta, agradecida. Essas imagens são tudo o que ela queria para ilustrar sua propaganda mentirosa contra o financiamento do ensino superior gratuito e contra a liberdade acadêmica.

É inacreditável. Será que as lideranças não viram o passo em falso? Não perceberam o equívoco? Será que saberão sair da armadilha que armaram para si mesmas? Por acaso, ainda acreditam que os “cadeiraços” vão favorecer causas de esquerda?

Esta greve, do jeito que vai indo, não é contra o governo, como alguns parecem imaginar, mas contra a USP e contra o próprio movimento estudantil. É meio suicida, um curto-circuito que vai ferir os mais frágeis e fortalecer os mais truculentos. O movimento precisa refletir. Não pode mais confundir amigos com inimigos. Se não avaliar direito o seu impasse, poderá se isolar ainda mais, cair em descrédito e se esvaziar.

De sua parte, o professorado da USP enfrenta a crise com maturidade e serenidade. A postura altiva dá o tom. Em sua ampla maioria, lida de modo civilizado com os protestos. Sabe perfeitamente que, assim como trabalhadores cruzam os braços e a população carcerária pode fazer greve de fome, estudantes também podem suspender unilateralmente as aulas. Isso é normal. Fora o quê, existe na universidade um entendimento tácito de que a experiência política durante a graduação e a pós-graduação ajuda a formar as novas gerações. Nenhum problema quanto a isso.

A boa universidade vibra na frequência de sua gente. A nação inteira, com todas as suas contradições, precisa caber dentro de cada campus. Isso não atrapalha, mas tonifica o pensamento e dá mais vida para as aulas e as pesquisas. A fantasia de organizar a universidade como se ela fosse um condomínio fechado, blindado contra os defeitos da sociedade, é uma tolice que não viceja na USP. Que greves eventualmente ocorram não é uma fraqueza da universidade – ao contrário, pode ser um sinal de virtude cívica. A história está cheia de jornadas de lutas estudantis que nos orgulham.

Não é o caso da presente greve, é óbvio. Ela não nos orgulha. Agora, a comunidade espera uma solução por meio do entendimento – e rápida. A USP, com acerto, vem deixando claro que não quer a pedagogia do cassetete e do gás lacrimogêneo. Tudo precisa se resolver na base do diálogo. Mas, para que o diálogo dê certo, os estudantes precisam saber superar o imbroglio que criaram para si mesmos. Não basta que dirigentes da USP respeitem a autonomia do movimento estudantil. É preciso que o movimento estudantil não bombardeie por dentro a autonomia da universidade que o acolhe com respeito. l

Nota: fui membro da diretoria do DCE-Livre da USP e presidente do Centro Acadêmico XI de Agosto, mas isso já faz muito tempo.

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JORNALISTA, É PROFESSOR DA ECA-USP

O movimento que paralisou as aulas na Universidade de São Paulo (USP) tropeçou num equívoco, caiu dentro dele e, agora, não sabe como sair. Está na cara. Está evidente. Os grevistas dizem ter duas reivindicações principais: contratar mais docentes e garantir a ajuda financeira dos alunos e das alunas em situação de vulnerabilidade socioeconômica. Ora, essas duas reivindicações chegaram atrasadas ao encontro. Desde o ano passado, a direção da universidade trabalha com as duas prioridades – e trabalha com números grandes.

Em primeiro lugar, a reitoria já tomou todas as providências para admitir 879 novos professores e professoras até 2025. Estamos falando de um aumento da ordem de 15% no corpo docente. Não se tem notícia, na história recente da instituição, de um esforço tão substancial de crescimento.

Em segundo lugar, a permanência estudantil nunca esteve tão bem atendida. De 2022 para 2023, a USP elevou em quase 60% os investimentos para apoiar discentes de famílias com dificuldades econômicas. São cerca de R$ 180 milhões por ano, que contemplam um conjunto de aproximadamente 15 mil estudantes, numa política que tem sido considerada modelar por órgãos ligados à educação.

Se as coisas são assim – e elas são exatamente assim –, vale perguntar: por que uma retórica tão agressiva? Por que uma greve que promete jogar no tudo ou nada? Há motivos racionais que a justifiquem? Bem sabemos que existem problemas agudos em algumas escolas, que pedem providências, mas por que tentar parar toda a USP dessa maneira? Por que tantas falas acusatórias – e infundadas?

Infelizmente, não há respostas objetivas. Nenhuma explicação racional. E é aí, no vazio deixado pela ausência de respostas, que o equívoco aparece com todas as suas cores. Ao apontar como antagonistas as equipes dirigentes da USP, o movimento grevista cai num erro de pessoa e, inadvertidamente, acabou fortalecendo seus reais oponentes: os que são contra a universidade pública e defendem medidas policiais para reprimir qualquer indisciplina.

Os piquetes, organizados pela minoria da minoria, amontoando cadeiras escolares para bloquear portas e corredores das faculdades, ofendem a comunidade e rendem fotografias impactantes, que só servem para abastecer o discurso contrário à vida intelectual, à ciência e às artes. A extrema direita antidemocrática exulta, agradecida. Essas imagens são tudo o que ela queria para ilustrar sua propaganda mentirosa contra o financiamento do ensino superior gratuito e contra a liberdade acadêmica.

É inacreditável. Será que as lideranças não viram o passo em falso? Não perceberam o equívoco? Será que saberão sair da armadilha que armaram para si mesmas? Por acaso, ainda acreditam que os “cadeiraços” vão favorecer causas de esquerda?

Esta greve, do jeito que vai indo, não é contra o governo, como alguns parecem imaginar, mas contra a USP e contra o próprio movimento estudantil. É meio suicida, um curto-circuito que vai ferir os mais frágeis e fortalecer os mais truculentos. O movimento precisa refletir. Não pode mais confundir amigos com inimigos. Se não avaliar direito o seu impasse, poderá se isolar ainda mais, cair em descrédito e se esvaziar.

De sua parte, o professorado da USP enfrenta a crise com maturidade e serenidade. A postura altiva dá o tom. Em sua ampla maioria, lida de modo civilizado com os protestos. Sabe perfeitamente que, assim como trabalhadores cruzam os braços e a população carcerária pode fazer greve de fome, estudantes também podem suspender unilateralmente as aulas. Isso é normal. Fora o quê, existe na universidade um entendimento tácito de que a experiência política durante a graduação e a pós-graduação ajuda a formar as novas gerações. Nenhum problema quanto a isso.

A boa universidade vibra na frequência de sua gente. A nação inteira, com todas as suas contradições, precisa caber dentro de cada campus. Isso não atrapalha, mas tonifica o pensamento e dá mais vida para as aulas e as pesquisas. A fantasia de organizar a universidade como se ela fosse um condomínio fechado, blindado contra os defeitos da sociedade, é uma tolice que não viceja na USP. Que greves eventualmente ocorram não é uma fraqueza da universidade – ao contrário, pode ser um sinal de virtude cívica. A história está cheia de jornadas de lutas estudantis que nos orgulham.

Não é o caso da presente greve, é óbvio. Ela não nos orgulha. Agora, a comunidade espera uma solução por meio do entendimento – e rápida. A USP, com acerto, vem deixando claro que não quer a pedagogia do cassetete e do gás lacrimogêneo. Tudo precisa se resolver na base do diálogo. Mas, para que o diálogo dê certo, os estudantes precisam saber superar o imbroglio que criaram para si mesmos. Não basta que dirigentes da USP respeitem a autonomia do movimento estudantil. É preciso que o movimento estudantil não bombardeie por dentro a autonomia da universidade que o acolhe com respeito. l

Nota: fui membro da diretoria do DCE-Livre da USP e presidente do Centro Acadêmico XI de Agosto, mas isso já faz muito tempo.

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JORNALISTA, É PROFESSOR DA ECA-USP

O movimento que paralisou as aulas na Universidade de São Paulo (USP) tropeçou num equívoco, caiu dentro dele e, agora, não sabe como sair. Está na cara. Está evidente. Os grevistas dizem ter duas reivindicações principais: contratar mais docentes e garantir a ajuda financeira dos alunos e das alunas em situação de vulnerabilidade socioeconômica. Ora, essas duas reivindicações chegaram atrasadas ao encontro. Desde o ano passado, a direção da universidade trabalha com as duas prioridades – e trabalha com números grandes.

Em primeiro lugar, a reitoria já tomou todas as providências para admitir 879 novos professores e professoras até 2025. Estamos falando de um aumento da ordem de 15% no corpo docente. Não se tem notícia, na história recente da instituição, de um esforço tão substancial de crescimento.

Em segundo lugar, a permanência estudantil nunca esteve tão bem atendida. De 2022 para 2023, a USP elevou em quase 60% os investimentos para apoiar discentes de famílias com dificuldades econômicas. São cerca de R$ 180 milhões por ano, que contemplam um conjunto de aproximadamente 15 mil estudantes, numa política que tem sido considerada modelar por órgãos ligados à educação.

Se as coisas são assim – e elas são exatamente assim –, vale perguntar: por que uma retórica tão agressiva? Por que uma greve que promete jogar no tudo ou nada? Há motivos racionais que a justifiquem? Bem sabemos que existem problemas agudos em algumas escolas, que pedem providências, mas por que tentar parar toda a USP dessa maneira? Por que tantas falas acusatórias – e infundadas?

Infelizmente, não há respostas objetivas. Nenhuma explicação racional. E é aí, no vazio deixado pela ausência de respostas, que o equívoco aparece com todas as suas cores. Ao apontar como antagonistas as equipes dirigentes da USP, o movimento grevista cai num erro de pessoa e, inadvertidamente, acabou fortalecendo seus reais oponentes: os que são contra a universidade pública e defendem medidas policiais para reprimir qualquer indisciplina.

Os piquetes, organizados pela minoria da minoria, amontoando cadeiras escolares para bloquear portas e corredores das faculdades, ofendem a comunidade e rendem fotografias impactantes, que só servem para abastecer o discurso contrário à vida intelectual, à ciência e às artes. A extrema direita antidemocrática exulta, agradecida. Essas imagens são tudo o que ela queria para ilustrar sua propaganda mentirosa contra o financiamento do ensino superior gratuito e contra a liberdade acadêmica.

É inacreditável. Será que as lideranças não viram o passo em falso? Não perceberam o equívoco? Será que saberão sair da armadilha que armaram para si mesmas? Por acaso, ainda acreditam que os “cadeiraços” vão favorecer causas de esquerda?

Esta greve, do jeito que vai indo, não é contra o governo, como alguns parecem imaginar, mas contra a USP e contra o próprio movimento estudantil. É meio suicida, um curto-circuito que vai ferir os mais frágeis e fortalecer os mais truculentos. O movimento precisa refletir. Não pode mais confundir amigos com inimigos. Se não avaliar direito o seu impasse, poderá se isolar ainda mais, cair em descrédito e se esvaziar.

De sua parte, o professorado da USP enfrenta a crise com maturidade e serenidade. A postura altiva dá o tom. Em sua ampla maioria, lida de modo civilizado com os protestos. Sabe perfeitamente que, assim como trabalhadores cruzam os braços e a população carcerária pode fazer greve de fome, estudantes também podem suspender unilateralmente as aulas. Isso é normal. Fora o quê, existe na universidade um entendimento tácito de que a experiência política durante a graduação e a pós-graduação ajuda a formar as novas gerações. Nenhum problema quanto a isso.

A boa universidade vibra na frequência de sua gente. A nação inteira, com todas as suas contradições, precisa caber dentro de cada campus. Isso não atrapalha, mas tonifica o pensamento e dá mais vida para as aulas e as pesquisas. A fantasia de organizar a universidade como se ela fosse um condomínio fechado, blindado contra os defeitos da sociedade, é uma tolice que não viceja na USP. Que greves eventualmente ocorram não é uma fraqueza da universidade – ao contrário, pode ser um sinal de virtude cívica. A história está cheia de jornadas de lutas estudantis que nos orgulham.

Não é o caso da presente greve, é óbvio. Ela não nos orgulha. Agora, a comunidade espera uma solução por meio do entendimento – e rápida. A USP, com acerto, vem deixando claro que não quer a pedagogia do cassetete e do gás lacrimogêneo. Tudo precisa se resolver na base do diálogo. Mas, para que o diálogo dê certo, os estudantes precisam saber superar o imbroglio que criaram para si mesmos. Não basta que dirigentes da USP respeitem a autonomia do movimento estudantil. É preciso que o movimento estudantil não bombardeie por dentro a autonomia da universidade que o acolhe com respeito. l

Nota: fui membro da diretoria do DCE-Livre da USP e presidente do Centro Acadêmico XI de Agosto, mas isso já faz muito tempo.

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JORNALISTA, É PROFESSOR DA ECA-USP

O movimento que paralisou as aulas na Universidade de São Paulo (USP) tropeçou num equívoco, caiu dentro dele e, agora, não sabe como sair. Está na cara. Está evidente. Os grevistas dizem ter duas reivindicações principais: contratar mais docentes e garantir a ajuda financeira dos alunos e das alunas em situação de vulnerabilidade socioeconômica. Ora, essas duas reivindicações chegaram atrasadas ao encontro. Desde o ano passado, a direção da universidade trabalha com as duas prioridades – e trabalha com números grandes.

Em primeiro lugar, a reitoria já tomou todas as providências para admitir 879 novos professores e professoras até 2025. Estamos falando de um aumento da ordem de 15% no corpo docente. Não se tem notícia, na história recente da instituição, de um esforço tão substancial de crescimento.

Em segundo lugar, a permanência estudantil nunca esteve tão bem atendida. De 2022 para 2023, a USP elevou em quase 60% os investimentos para apoiar discentes de famílias com dificuldades econômicas. São cerca de R$ 180 milhões por ano, que contemplam um conjunto de aproximadamente 15 mil estudantes, numa política que tem sido considerada modelar por órgãos ligados à educação.

Se as coisas são assim – e elas são exatamente assim –, vale perguntar: por que uma retórica tão agressiva? Por que uma greve que promete jogar no tudo ou nada? Há motivos racionais que a justifiquem? Bem sabemos que existem problemas agudos em algumas escolas, que pedem providências, mas por que tentar parar toda a USP dessa maneira? Por que tantas falas acusatórias – e infundadas?

Infelizmente, não há respostas objetivas. Nenhuma explicação racional. E é aí, no vazio deixado pela ausência de respostas, que o equívoco aparece com todas as suas cores. Ao apontar como antagonistas as equipes dirigentes da USP, o movimento grevista cai num erro de pessoa e, inadvertidamente, acabou fortalecendo seus reais oponentes: os que são contra a universidade pública e defendem medidas policiais para reprimir qualquer indisciplina.

Os piquetes, organizados pela minoria da minoria, amontoando cadeiras escolares para bloquear portas e corredores das faculdades, ofendem a comunidade e rendem fotografias impactantes, que só servem para abastecer o discurso contrário à vida intelectual, à ciência e às artes. A extrema direita antidemocrática exulta, agradecida. Essas imagens são tudo o que ela queria para ilustrar sua propaganda mentirosa contra o financiamento do ensino superior gratuito e contra a liberdade acadêmica.

É inacreditável. Será que as lideranças não viram o passo em falso? Não perceberam o equívoco? Será que saberão sair da armadilha que armaram para si mesmas? Por acaso, ainda acreditam que os “cadeiraços” vão favorecer causas de esquerda?

Esta greve, do jeito que vai indo, não é contra o governo, como alguns parecem imaginar, mas contra a USP e contra o próprio movimento estudantil. É meio suicida, um curto-circuito que vai ferir os mais frágeis e fortalecer os mais truculentos. O movimento precisa refletir. Não pode mais confundir amigos com inimigos. Se não avaliar direito o seu impasse, poderá se isolar ainda mais, cair em descrédito e se esvaziar.

De sua parte, o professorado da USP enfrenta a crise com maturidade e serenidade. A postura altiva dá o tom. Em sua ampla maioria, lida de modo civilizado com os protestos. Sabe perfeitamente que, assim como trabalhadores cruzam os braços e a população carcerária pode fazer greve de fome, estudantes também podem suspender unilateralmente as aulas. Isso é normal. Fora o quê, existe na universidade um entendimento tácito de que a experiência política durante a graduação e a pós-graduação ajuda a formar as novas gerações. Nenhum problema quanto a isso.

A boa universidade vibra na frequência de sua gente. A nação inteira, com todas as suas contradições, precisa caber dentro de cada campus. Isso não atrapalha, mas tonifica o pensamento e dá mais vida para as aulas e as pesquisas. A fantasia de organizar a universidade como se ela fosse um condomínio fechado, blindado contra os defeitos da sociedade, é uma tolice que não viceja na USP. Que greves eventualmente ocorram não é uma fraqueza da universidade – ao contrário, pode ser um sinal de virtude cívica. A história está cheia de jornadas de lutas estudantis que nos orgulham.

Não é o caso da presente greve, é óbvio. Ela não nos orgulha. Agora, a comunidade espera uma solução por meio do entendimento – e rápida. A USP, com acerto, vem deixando claro que não quer a pedagogia do cassetete e do gás lacrimogêneo. Tudo precisa se resolver na base do diálogo. Mas, para que o diálogo dê certo, os estudantes precisam saber superar o imbroglio que criaram para si mesmos. Não basta que dirigentes da USP respeitem a autonomia do movimento estudantil. É preciso que o movimento estudantil não bombardeie por dentro a autonomia da universidade que o acolhe com respeito. l

Nota: fui membro da diretoria do DCE-Livre da USP e presidente do Centro Acadêmico XI de Agosto, mas isso já faz muito tempo.

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Opinião por Eugênio Bucci

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