Economista-chefe e sócio da Warren Investimentos, professor do IDP, foi secretário da Fazenda e Planejamento do Estado de São Paulo e o primeiro diretor executivo da IFI. Felipe Scudeler Salto escreve quinzenalmente na seção Espaço Aberto

Opinião|São Tomé e o pacote fiscal do governo


Um bom programa consolidaria a boa gestão de Haddad e a ideia de que governos de esquerda não precisam ser fiscalmente irresponsáveis

Por Felipe Salto

As nossas avaliações na Warren Investimentos indicam que é preciso um corte de gastos de mais de R$ 40 bilhões para cumprir a meta fiscal de 2025. Isso, no entanto, levando em conta a banda inferior da meta e as despesas não consideradas para fins do compromisso legal. O pacote fiscal precisa sair logo e em bases relevantes. Muitos ainda seguem como São Tomé, aguardando para pôr as mãos nas chagas e comprovar a nova realidade.

A saber, a meta de resultado primário (receitas menos despesas sem considerar os gastos com juros) é igual a zero para 2025. Há uma banda inferior, de R$ 31 bilhões, espécie de permissão para entregar um déficit primário e mesmo assim não romper a lei. Na verdade, essa banda deveria ser usada apenas em casos excepcionais.

Além da banda, há um volume de precatórios que podem ser contabilizados por fora da meta fiscal. Trata-se de R$ 44,1 bilhões. Explica-se pela decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), ao declarar inconstitucional o limite criado no governo passado para o pagamento desse tipo de despesa judicial. Determinou-se que, até 2027, as despesas com precatórios excedentes ao antigo limite poderiam ser pagas sem que a meta fosse comprometida.

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Assim, o governo poderá entregar um déficit primário de até R$ 75,1 bilhões (31 + 44,1) em 2025. Para ter claro, esse déficit, se confirmado, não representaria rompimento do compromisso legal no bojo do novo arcabouço fiscal. Mesmo assim, para chegar a esse déficit, as nossas contas indicam que o governo teria de bloquear ou contingenciar gastos discricionários (não obrigatórios) em mais de R$ 40 bilhões.

O recente projeto aprovado para as emendas parlamentares dificultará esse processo. Garantiu-se um crescimento real permanente para as emendas, que já estão em nível historicamente alto, representando quase um quarto da pizza das despesas discricionárias pulverizadas e em nada relacionadas aos objetivos de desenvolvimento econômico, social e regional.

Mais um problema para a equipe do ministro Fernando Haddad. Isso porque as emendas poderiam, após a decisão do ministro Flávio Dino, do STF (de bloquear as execuções das emendas impositivas, especialmente as emendas Pix), colaborar para o ajuste fiscal. Já estamos vendo, com o projeto de lei aprovado nesta semana, que nada disso vai ocorrer, infelizmente.

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Resta ao governo promover medidas de ajuste que colaborem para controlar o avanço das despesas obrigatórias. Nos últimos dias, a imprensa e os especialistas têm debatido o conjunto de ações no possível cardápio do pacote fiscal. O Benefício de Prestação Continuada (BPC), o abono salarial, o seguro-desemprego, o Fundeb (fundação da educação), os supersalários e a Previdência Social são os fortes candidatos.

Encontra-se resistência dentro do próprio governo. Em que pese essa força contrária preocupante, Haddad e Simone Tebet estão promovendo o discurso dos cortes estruturais de despesas e de um programa de contenção do crescimento do gasto federal. Não se está falando numa revolução na despesa pública, mas de ajustes para que seu crescimento se adeque à restrição orçamentária.

A ideia de estabelecer o crescimento de despesas dado pelo novo arcabouço fiscal (Lei Complementar n.º 200/2023) como referência maior é positiva. O diabo, entretanto, está sempre sentado sobre os detalhes, com um sorriso irônico.

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Não adianta apenas dizer que o abono salarial, por exemplo, terá de crescer no máximo a 2,5%, em termos reais, limite máximo do novo arcabouço fiscal, hoje incidente sobre o total das despesas (com as exceções legais, vale dizer). Será preciso mudar as regras de concessão e critérios de elegibilidade ao benefício específico.

O mesmo vale para o BPC, o seguro-desemprego e todas as outras despesas obrigatórias. O risco é incorrer no mesmo problema do antigo teto de gastos (Emenda Constitucional n.º 95/2016), cuja limitação do crescimento da despesa à inflação simplesmente não se viabilizou. Claro, motivou a reforma da previdência, mas se desmanchou no ar com poucos anos de vida.

É preciso incorporar esse aprendizado na formulação do novo pacote fiscal. O corte de despesas não é fruto da veleidade de especialistas ou de gente cruel. Ao contrário, deriva do diagnóstico amplo, mantido por muitos economistas e especialistas e, agora, também pelo próprio governo ou, pelo menos, pela sua área econômica, com respaldo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

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É preciso, nestes momentos, vestir a carapuça de São Tomé e aguardar. Depois de tantos desencontros, só podemos acreditar, realmente, quando virmos o pacote e suas minúcias.

Meu vaticínio: será um programa muito bom, com potencial para melhorar as perspectivas sobre a economia, o dólar e os juros. Consolidaria, assim, a boa gestão do ministro Fernando Haddad e a ideia de que governos de esquerda não precisam ser fiscalmente irresponsáveis.

*

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MESTRE E ECONOMISTA PELA FGV-SP, ECONOMISTA-CHEFE DA WARREN INVESTIMENTOS, MEMBRO DO CONSELHO SUPERIOR DE ECONOMIA DA FIESP, FOI SECRETÁRIO DA FAZENDA E PLANEJAMENTO DO ESTADO DE SÃO PAULO, O PRIMEIRO DIRETOR-EXECUTIVO DA IFI E ELEITO ECONOMISTA DO ANO PELA ORDEM DOS ECONOMISTAS DO BRASIL EM 2023

As nossas avaliações na Warren Investimentos indicam que é preciso um corte de gastos de mais de R$ 40 bilhões para cumprir a meta fiscal de 2025. Isso, no entanto, levando em conta a banda inferior da meta e as despesas não consideradas para fins do compromisso legal. O pacote fiscal precisa sair logo e em bases relevantes. Muitos ainda seguem como São Tomé, aguardando para pôr as mãos nas chagas e comprovar a nova realidade.

A saber, a meta de resultado primário (receitas menos despesas sem considerar os gastos com juros) é igual a zero para 2025. Há uma banda inferior, de R$ 31 bilhões, espécie de permissão para entregar um déficit primário e mesmo assim não romper a lei. Na verdade, essa banda deveria ser usada apenas em casos excepcionais.

Além da banda, há um volume de precatórios que podem ser contabilizados por fora da meta fiscal. Trata-se de R$ 44,1 bilhões. Explica-se pela decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), ao declarar inconstitucional o limite criado no governo passado para o pagamento desse tipo de despesa judicial. Determinou-se que, até 2027, as despesas com precatórios excedentes ao antigo limite poderiam ser pagas sem que a meta fosse comprometida.

Assim, o governo poderá entregar um déficit primário de até R$ 75,1 bilhões (31 + 44,1) em 2025. Para ter claro, esse déficit, se confirmado, não representaria rompimento do compromisso legal no bojo do novo arcabouço fiscal. Mesmo assim, para chegar a esse déficit, as nossas contas indicam que o governo teria de bloquear ou contingenciar gastos discricionários (não obrigatórios) em mais de R$ 40 bilhões.

O recente projeto aprovado para as emendas parlamentares dificultará esse processo. Garantiu-se um crescimento real permanente para as emendas, que já estão em nível historicamente alto, representando quase um quarto da pizza das despesas discricionárias pulverizadas e em nada relacionadas aos objetivos de desenvolvimento econômico, social e regional.

Mais um problema para a equipe do ministro Fernando Haddad. Isso porque as emendas poderiam, após a decisão do ministro Flávio Dino, do STF (de bloquear as execuções das emendas impositivas, especialmente as emendas Pix), colaborar para o ajuste fiscal. Já estamos vendo, com o projeto de lei aprovado nesta semana, que nada disso vai ocorrer, infelizmente.

Resta ao governo promover medidas de ajuste que colaborem para controlar o avanço das despesas obrigatórias. Nos últimos dias, a imprensa e os especialistas têm debatido o conjunto de ações no possível cardápio do pacote fiscal. O Benefício de Prestação Continuada (BPC), o abono salarial, o seguro-desemprego, o Fundeb (fundação da educação), os supersalários e a Previdência Social são os fortes candidatos.

Encontra-se resistência dentro do próprio governo. Em que pese essa força contrária preocupante, Haddad e Simone Tebet estão promovendo o discurso dos cortes estruturais de despesas e de um programa de contenção do crescimento do gasto federal. Não se está falando numa revolução na despesa pública, mas de ajustes para que seu crescimento se adeque à restrição orçamentária.

A ideia de estabelecer o crescimento de despesas dado pelo novo arcabouço fiscal (Lei Complementar n.º 200/2023) como referência maior é positiva. O diabo, entretanto, está sempre sentado sobre os detalhes, com um sorriso irônico.

Não adianta apenas dizer que o abono salarial, por exemplo, terá de crescer no máximo a 2,5%, em termos reais, limite máximo do novo arcabouço fiscal, hoje incidente sobre o total das despesas (com as exceções legais, vale dizer). Será preciso mudar as regras de concessão e critérios de elegibilidade ao benefício específico.

O mesmo vale para o BPC, o seguro-desemprego e todas as outras despesas obrigatórias. O risco é incorrer no mesmo problema do antigo teto de gastos (Emenda Constitucional n.º 95/2016), cuja limitação do crescimento da despesa à inflação simplesmente não se viabilizou. Claro, motivou a reforma da previdência, mas se desmanchou no ar com poucos anos de vida.

É preciso incorporar esse aprendizado na formulação do novo pacote fiscal. O corte de despesas não é fruto da veleidade de especialistas ou de gente cruel. Ao contrário, deriva do diagnóstico amplo, mantido por muitos economistas e especialistas e, agora, também pelo próprio governo ou, pelo menos, pela sua área econômica, com respaldo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

É preciso, nestes momentos, vestir a carapuça de São Tomé e aguardar. Depois de tantos desencontros, só podemos acreditar, realmente, quando virmos o pacote e suas minúcias.

Meu vaticínio: será um programa muito bom, com potencial para melhorar as perspectivas sobre a economia, o dólar e os juros. Consolidaria, assim, a boa gestão do ministro Fernando Haddad e a ideia de que governos de esquerda não precisam ser fiscalmente irresponsáveis.

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MESTRE E ECONOMISTA PELA FGV-SP, ECONOMISTA-CHEFE DA WARREN INVESTIMENTOS, MEMBRO DO CONSELHO SUPERIOR DE ECONOMIA DA FIESP, FOI SECRETÁRIO DA FAZENDA E PLANEJAMENTO DO ESTADO DE SÃO PAULO, O PRIMEIRO DIRETOR-EXECUTIVO DA IFI E ELEITO ECONOMISTA DO ANO PELA ORDEM DOS ECONOMISTAS DO BRASIL EM 2023

As nossas avaliações na Warren Investimentos indicam que é preciso um corte de gastos de mais de R$ 40 bilhões para cumprir a meta fiscal de 2025. Isso, no entanto, levando em conta a banda inferior da meta e as despesas não consideradas para fins do compromisso legal. O pacote fiscal precisa sair logo e em bases relevantes. Muitos ainda seguem como São Tomé, aguardando para pôr as mãos nas chagas e comprovar a nova realidade.

A saber, a meta de resultado primário (receitas menos despesas sem considerar os gastos com juros) é igual a zero para 2025. Há uma banda inferior, de R$ 31 bilhões, espécie de permissão para entregar um déficit primário e mesmo assim não romper a lei. Na verdade, essa banda deveria ser usada apenas em casos excepcionais.

Além da banda, há um volume de precatórios que podem ser contabilizados por fora da meta fiscal. Trata-se de R$ 44,1 bilhões. Explica-se pela decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), ao declarar inconstitucional o limite criado no governo passado para o pagamento desse tipo de despesa judicial. Determinou-se que, até 2027, as despesas com precatórios excedentes ao antigo limite poderiam ser pagas sem que a meta fosse comprometida.

Assim, o governo poderá entregar um déficit primário de até R$ 75,1 bilhões (31 + 44,1) em 2025. Para ter claro, esse déficit, se confirmado, não representaria rompimento do compromisso legal no bojo do novo arcabouço fiscal. Mesmo assim, para chegar a esse déficit, as nossas contas indicam que o governo teria de bloquear ou contingenciar gastos discricionários (não obrigatórios) em mais de R$ 40 bilhões.

O recente projeto aprovado para as emendas parlamentares dificultará esse processo. Garantiu-se um crescimento real permanente para as emendas, que já estão em nível historicamente alto, representando quase um quarto da pizza das despesas discricionárias pulverizadas e em nada relacionadas aos objetivos de desenvolvimento econômico, social e regional.

Mais um problema para a equipe do ministro Fernando Haddad. Isso porque as emendas poderiam, após a decisão do ministro Flávio Dino, do STF (de bloquear as execuções das emendas impositivas, especialmente as emendas Pix), colaborar para o ajuste fiscal. Já estamos vendo, com o projeto de lei aprovado nesta semana, que nada disso vai ocorrer, infelizmente.

Resta ao governo promover medidas de ajuste que colaborem para controlar o avanço das despesas obrigatórias. Nos últimos dias, a imprensa e os especialistas têm debatido o conjunto de ações no possível cardápio do pacote fiscal. O Benefício de Prestação Continuada (BPC), o abono salarial, o seguro-desemprego, o Fundeb (fundação da educação), os supersalários e a Previdência Social são os fortes candidatos.

Encontra-se resistência dentro do próprio governo. Em que pese essa força contrária preocupante, Haddad e Simone Tebet estão promovendo o discurso dos cortes estruturais de despesas e de um programa de contenção do crescimento do gasto federal. Não se está falando numa revolução na despesa pública, mas de ajustes para que seu crescimento se adeque à restrição orçamentária.

A ideia de estabelecer o crescimento de despesas dado pelo novo arcabouço fiscal (Lei Complementar n.º 200/2023) como referência maior é positiva. O diabo, entretanto, está sempre sentado sobre os detalhes, com um sorriso irônico.

Não adianta apenas dizer que o abono salarial, por exemplo, terá de crescer no máximo a 2,5%, em termos reais, limite máximo do novo arcabouço fiscal, hoje incidente sobre o total das despesas (com as exceções legais, vale dizer). Será preciso mudar as regras de concessão e critérios de elegibilidade ao benefício específico.

O mesmo vale para o BPC, o seguro-desemprego e todas as outras despesas obrigatórias. O risco é incorrer no mesmo problema do antigo teto de gastos (Emenda Constitucional n.º 95/2016), cuja limitação do crescimento da despesa à inflação simplesmente não se viabilizou. Claro, motivou a reforma da previdência, mas se desmanchou no ar com poucos anos de vida.

É preciso incorporar esse aprendizado na formulação do novo pacote fiscal. O corte de despesas não é fruto da veleidade de especialistas ou de gente cruel. Ao contrário, deriva do diagnóstico amplo, mantido por muitos economistas e especialistas e, agora, também pelo próprio governo ou, pelo menos, pela sua área econômica, com respaldo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

É preciso, nestes momentos, vestir a carapuça de São Tomé e aguardar. Depois de tantos desencontros, só podemos acreditar, realmente, quando virmos o pacote e suas minúcias.

Meu vaticínio: será um programa muito bom, com potencial para melhorar as perspectivas sobre a economia, o dólar e os juros. Consolidaria, assim, a boa gestão do ministro Fernando Haddad e a ideia de que governos de esquerda não precisam ser fiscalmente irresponsáveis.

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MESTRE E ECONOMISTA PELA FGV-SP, ECONOMISTA-CHEFE DA WARREN INVESTIMENTOS, MEMBRO DO CONSELHO SUPERIOR DE ECONOMIA DA FIESP, FOI SECRETÁRIO DA FAZENDA E PLANEJAMENTO DO ESTADO DE SÃO PAULO, O PRIMEIRO DIRETOR-EXECUTIVO DA IFI E ELEITO ECONOMISTA DO ANO PELA ORDEM DOS ECONOMISTAS DO BRASIL EM 2023

Opinião por Felipe Salto

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