Opinião|Melhor, mas ainda muito desigual


Programas de transferência de renda têm sido eficazes na redução emergencial das desigualdades, mas não bastam para combater problemas que o País acumulou ao longo do tempo

Por Jorge J. Okubaro

O impacto da melhora do mercado de trabalho e do aumento do número de beneficiários dos programas sociais do governo federal sobre o rendimento dos brasileiros foi nítido no ano passado. Vários indicadores atingiram o maior valor da série histórica que o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) vem construindo desde 2012 por meio da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua. Há mais pessoas trabalhando e as pessoas estão recebendo mais de todas as fontes (trabalho remunerado, programas sociais, aposentadoria, pensão e outras).

Há dados que impressionam. A massa de rendimento mensal domiciliar per capita alcançou R$ 398,3 bilhões, o maior valor da série histórica. O crescimento sobre 2022 foi de 12,2%; sobre o resultado de 2019, que era o recorde anterior, o aumento foi de 9,1%. O rendimento médio mensal real domiciliar per capita alcançou R$ 1.848, também o maior valor da série histórica, com aumento de 11,5% sobre o resultado de 2022 e de 6,0% sobre o recorde anterior, de R$ 1.744 em 2019.

O IBGE destaca outro recorde alcançado em 2023, o da proporção da população com rendimento habitualmente recebido do trabalho. Era de 44,5% (ou 95,2 milhões de pessoas) em 2022 e passou para 46,0% (ou 99,2 milhões) em 2023. Em 2020, no auge da pandemia, a proporção era de 40,1%, ou 84,7 milhões de pessoas. Em três anos, praticamente 15 milhões de brasileiros puderam voltar ao mercado de trabalho.

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Além da absorção desse grande contingente de trabalhadores pelo mercado, a proporção de domicílios com algum beneficiário do programa Bolsa Família aumentou de 16,9%, em 2022, para 19,0%, em 2023. O rendimento per capita do grupo de domicílios que recebiam Bolsa Família passou de R$ 446 para R$ 635 (aumento de 42,4%) entre 2019 e 2023. Esses números mostram a importância do Bolsa Família na melhora das estatísticas de rendimento da população no ano passado.

Em 2012, a proporção de domicílios com algum benefício do Bolsa Família era de 16,6%. Em 2019, primeiro ano do governo Bolsonaro, a proporção diminuiu para 14,3%. No ano seguinte, com a pandemia, parte de seus beneficiários passou a receber o auxílio emergencial criado para enfrentar os novos problemas sanitários, razão pela qual a proporção caiu para 7,2%. Outros programas sociais passaram a atender as famílias. Esses programas, que atendiam a 0,7% dos domicílios em 2019, passaram a beneficiar 23,7% em 2020. No final de 2021, o Bolsa Família foi substituído pelo Auxílio Brasil, que atingiu 16,9% dos domicílios. Com sua recriação em 2023, o Bolsa Família passou a atender 19% dos domicílios, a maior proporção desde sua instituição.

Ainda assim, como observou o IBGE, “a desigualdade permaneceu bastante acentuada no País”. Talvez coubesse fortalecer essa expressão: a desigualdade continuou vergonhosamente acentuada no Brasil. Este é um dos países mais desiguais do mundo, melhor apenas do que alguns da África. Em 2023, o rendimento per capita médio do 1% de mais ricos do Brasil, de R$ 20.664 por mês, correspondia a 39,2 vezes o rendimento dos que compõem o grupo dos 40% mais pobres, de R$ 527. Se comparado com o rendimento per capita dos 5% mais pobres, o do 1% de mais ricos corresponde a 164 vezes.

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Embora maior do que a de 2022, a desigualdade observada em 2023 é menos intensa do que a de anos anteriores. Mas o que os números mostram é a persistência, com variações entre um ano e outro, de um problema histórico que o Brasil não soube vencer, ou não enfrentou com a devida coragem e competência.

Programas de transferência de renda vêm mostrando eficácia na redução emergencial das desigualdades, como mostram os resultados sobre a evolução do rendimento da população nos últimos anos. Sem eles, este seria um país ainda mais desigual. Mas eles não bastam para combater problemas que o País acumulou – e consolidou? – ao longo do tempo.

Só um sistema educacional eficiente, sobretudo nos primeiros anos do ensino, é capaz de preparar todos duradoura e adequadamente, sem distinção de classes de renda, para os desafios da vida e para a construção de um país em que todos possam crescer social e economicamente. A formação profissional de qualidade é igualmente indispensável para isso.

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Programas de inclusão social, de combate a todas as formas de discriminação, também fazem parte das ações públicas e privadas de redução das desigualdades sociais e de renda do País.

Políticas públicas mais eficientes em áreas como saúde e assistência social – além, obviamente, da educação – são indispensáveis. Gastar com mais eficiência, reduzindo desperdícios e combatendo duramente a corrupção, representa ajuda expressiva a quem mais necessita do apoio do poder público, que são justamente as camadas de renda mais baixa.

São providências tão óbvias que sua citação parece ociosa. Mas este tem sido um país que, ao ver se reproduzindo, de tempos em tempos, seus velhos problemas, parece contentar-se em aceitar resignadamente seus dramas. É como se tivesse se conformado com a mediocridade.

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JORNALISTA, É AUTOR, ENTRE OUTROS, DO LIVRO O SÚDITO (BANZAI, MASSATERU!) (EDITORA TERCEIRO NOME) E PRESIDENTE DO CENTRO DE ESTUDOS NIPO-BRASILEIROS (JINMONKEN)

O impacto da melhora do mercado de trabalho e do aumento do número de beneficiários dos programas sociais do governo federal sobre o rendimento dos brasileiros foi nítido no ano passado. Vários indicadores atingiram o maior valor da série histórica que o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) vem construindo desde 2012 por meio da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua. Há mais pessoas trabalhando e as pessoas estão recebendo mais de todas as fontes (trabalho remunerado, programas sociais, aposentadoria, pensão e outras).

Há dados que impressionam. A massa de rendimento mensal domiciliar per capita alcançou R$ 398,3 bilhões, o maior valor da série histórica. O crescimento sobre 2022 foi de 12,2%; sobre o resultado de 2019, que era o recorde anterior, o aumento foi de 9,1%. O rendimento médio mensal real domiciliar per capita alcançou R$ 1.848, também o maior valor da série histórica, com aumento de 11,5% sobre o resultado de 2022 e de 6,0% sobre o recorde anterior, de R$ 1.744 em 2019.

O IBGE destaca outro recorde alcançado em 2023, o da proporção da população com rendimento habitualmente recebido do trabalho. Era de 44,5% (ou 95,2 milhões de pessoas) em 2022 e passou para 46,0% (ou 99,2 milhões) em 2023. Em 2020, no auge da pandemia, a proporção era de 40,1%, ou 84,7 milhões de pessoas. Em três anos, praticamente 15 milhões de brasileiros puderam voltar ao mercado de trabalho.

Além da absorção desse grande contingente de trabalhadores pelo mercado, a proporção de domicílios com algum beneficiário do programa Bolsa Família aumentou de 16,9%, em 2022, para 19,0%, em 2023. O rendimento per capita do grupo de domicílios que recebiam Bolsa Família passou de R$ 446 para R$ 635 (aumento de 42,4%) entre 2019 e 2023. Esses números mostram a importância do Bolsa Família na melhora das estatísticas de rendimento da população no ano passado.

Em 2012, a proporção de domicílios com algum benefício do Bolsa Família era de 16,6%. Em 2019, primeiro ano do governo Bolsonaro, a proporção diminuiu para 14,3%. No ano seguinte, com a pandemia, parte de seus beneficiários passou a receber o auxílio emergencial criado para enfrentar os novos problemas sanitários, razão pela qual a proporção caiu para 7,2%. Outros programas sociais passaram a atender as famílias. Esses programas, que atendiam a 0,7% dos domicílios em 2019, passaram a beneficiar 23,7% em 2020. No final de 2021, o Bolsa Família foi substituído pelo Auxílio Brasil, que atingiu 16,9% dos domicílios. Com sua recriação em 2023, o Bolsa Família passou a atender 19% dos domicílios, a maior proporção desde sua instituição.

Ainda assim, como observou o IBGE, “a desigualdade permaneceu bastante acentuada no País”. Talvez coubesse fortalecer essa expressão: a desigualdade continuou vergonhosamente acentuada no Brasil. Este é um dos países mais desiguais do mundo, melhor apenas do que alguns da África. Em 2023, o rendimento per capita médio do 1% de mais ricos do Brasil, de R$ 20.664 por mês, correspondia a 39,2 vezes o rendimento dos que compõem o grupo dos 40% mais pobres, de R$ 527. Se comparado com o rendimento per capita dos 5% mais pobres, o do 1% de mais ricos corresponde a 164 vezes.

Embora maior do que a de 2022, a desigualdade observada em 2023 é menos intensa do que a de anos anteriores. Mas o que os números mostram é a persistência, com variações entre um ano e outro, de um problema histórico que o Brasil não soube vencer, ou não enfrentou com a devida coragem e competência.

Programas de transferência de renda vêm mostrando eficácia na redução emergencial das desigualdades, como mostram os resultados sobre a evolução do rendimento da população nos últimos anos. Sem eles, este seria um país ainda mais desigual. Mas eles não bastam para combater problemas que o País acumulou – e consolidou? – ao longo do tempo.

Só um sistema educacional eficiente, sobretudo nos primeiros anos do ensino, é capaz de preparar todos duradoura e adequadamente, sem distinção de classes de renda, para os desafios da vida e para a construção de um país em que todos possam crescer social e economicamente. A formação profissional de qualidade é igualmente indispensável para isso.

Programas de inclusão social, de combate a todas as formas de discriminação, também fazem parte das ações públicas e privadas de redução das desigualdades sociais e de renda do País.

Políticas públicas mais eficientes em áreas como saúde e assistência social – além, obviamente, da educação – são indispensáveis. Gastar com mais eficiência, reduzindo desperdícios e combatendo duramente a corrupção, representa ajuda expressiva a quem mais necessita do apoio do poder público, que são justamente as camadas de renda mais baixa.

São providências tão óbvias que sua citação parece ociosa. Mas este tem sido um país que, ao ver se reproduzindo, de tempos em tempos, seus velhos problemas, parece contentar-se em aceitar resignadamente seus dramas. É como se tivesse se conformado com a mediocridade.

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JORNALISTA, É AUTOR, ENTRE OUTROS, DO LIVRO O SÚDITO (BANZAI, MASSATERU!) (EDITORA TERCEIRO NOME) E PRESIDENTE DO CENTRO DE ESTUDOS NIPO-BRASILEIROS (JINMONKEN)

O impacto da melhora do mercado de trabalho e do aumento do número de beneficiários dos programas sociais do governo federal sobre o rendimento dos brasileiros foi nítido no ano passado. Vários indicadores atingiram o maior valor da série histórica que o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) vem construindo desde 2012 por meio da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua. Há mais pessoas trabalhando e as pessoas estão recebendo mais de todas as fontes (trabalho remunerado, programas sociais, aposentadoria, pensão e outras).

Há dados que impressionam. A massa de rendimento mensal domiciliar per capita alcançou R$ 398,3 bilhões, o maior valor da série histórica. O crescimento sobre 2022 foi de 12,2%; sobre o resultado de 2019, que era o recorde anterior, o aumento foi de 9,1%. O rendimento médio mensal real domiciliar per capita alcançou R$ 1.848, também o maior valor da série histórica, com aumento de 11,5% sobre o resultado de 2022 e de 6,0% sobre o recorde anterior, de R$ 1.744 em 2019.

O IBGE destaca outro recorde alcançado em 2023, o da proporção da população com rendimento habitualmente recebido do trabalho. Era de 44,5% (ou 95,2 milhões de pessoas) em 2022 e passou para 46,0% (ou 99,2 milhões) em 2023. Em 2020, no auge da pandemia, a proporção era de 40,1%, ou 84,7 milhões de pessoas. Em três anos, praticamente 15 milhões de brasileiros puderam voltar ao mercado de trabalho.

Além da absorção desse grande contingente de trabalhadores pelo mercado, a proporção de domicílios com algum beneficiário do programa Bolsa Família aumentou de 16,9%, em 2022, para 19,0%, em 2023. O rendimento per capita do grupo de domicílios que recebiam Bolsa Família passou de R$ 446 para R$ 635 (aumento de 42,4%) entre 2019 e 2023. Esses números mostram a importância do Bolsa Família na melhora das estatísticas de rendimento da população no ano passado.

Em 2012, a proporção de domicílios com algum benefício do Bolsa Família era de 16,6%. Em 2019, primeiro ano do governo Bolsonaro, a proporção diminuiu para 14,3%. No ano seguinte, com a pandemia, parte de seus beneficiários passou a receber o auxílio emergencial criado para enfrentar os novos problemas sanitários, razão pela qual a proporção caiu para 7,2%. Outros programas sociais passaram a atender as famílias. Esses programas, que atendiam a 0,7% dos domicílios em 2019, passaram a beneficiar 23,7% em 2020. No final de 2021, o Bolsa Família foi substituído pelo Auxílio Brasil, que atingiu 16,9% dos domicílios. Com sua recriação em 2023, o Bolsa Família passou a atender 19% dos domicílios, a maior proporção desde sua instituição.

Ainda assim, como observou o IBGE, “a desigualdade permaneceu bastante acentuada no País”. Talvez coubesse fortalecer essa expressão: a desigualdade continuou vergonhosamente acentuada no Brasil. Este é um dos países mais desiguais do mundo, melhor apenas do que alguns da África. Em 2023, o rendimento per capita médio do 1% de mais ricos do Brasil, de R$ 20.664 por mês, correspondia a 39,2 vezes o rendimento dos que compõem o grupo dos 40% mais pobres, de R$ 527. Se comparado com o rendimento per capita dos 5% mais pobres, o do 1% de mais ricos corresponde a 164 vezes.

Embora maior do que a de 2022, a desigualdade observada em 2023 é menos intensa do que a de anos anteriores. Mas o que os números mostram é a persistência, com variações entre um ano e outro, de um problema histórico que o Brasil não soube vencer, ou não enfrentou com a devida coragem e competência.

Programas de transferência de renda vêm mostrando eficácia na redução emergencial das desigualdades, como mostram os resultados sobre a evolução do rendimento da população nos últimos anos. Sem eles, este seria um país ainda mais desigual. Mas eles não bastam para combater problemas que o País acumulou – e consolidou? – ao longo do tempo.

Só um sistema educacional eficiente, sobretudo nos primeiros anos do ensino, é capaz de preparar todos duradoura e adequadamente, sem distinção de classes de renda, para os desafios da vida e para a construção de um país em que todos possam crescer social e economicamente. A formação profissional de qualidade é igualmente indispensável para isso.

Programas de inclusão social, de combate a todas as formas de discriminação, também fazem parte das ações públicas e privadas de redução das desigualdades sociais e de renda do País.

Políticas públicas mais eficientes em áreas como saúde e assistência social – além, obviamente, da educação – são indispensáveis. Gastar com mais eficiência, reduzindo desperdícios e combatendo duramente a corrupção, representa ajuda expressiva a quem mais necessita do apoio do poder público, que são justamente as camadas de renda mais baixa.

São providências tão óbvias que sua citação parece ociosa. Mas este tem sido um país que, ao ver se reproduzindo, de tempos em tempos, seus velhos problemas, parece contentar-se em aceitar resignadamente seus dramas. É como se tivesse se conformado com a mediocridade.

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JORNALISTA, É AUTOR, ENTRE OUTROS, DO LIVRO O SÚDITO (BANZAI, MASSATERU!) (EDITORA TERCEIRO NOME) E PRESIDENTE DO CENTRO DE ESTUDOS NIPO-BRASILEIROS (JINMONKEN)

O impacto da melhora do mercado de trabalho e do aumento do número de beneficiários dos programas sociais do governo federal sobre o rendimento dos brasileiros foi nítido no ano passado. Vários indicadores atingiram o maior valor da série histórica que o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) vem construindo desde 2012 por meio da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua. Há mais pessoas trabalhando e as pessoas estão recebendo mais de todas as fontes (trabalho remunerado, programas sociais, aposentadoria, pensão e outras).

Há dados que impressionam. A massa de rendimento mensal domiciliar per capita alcançou R$ 398,3 bilhões, o maior valor da série histórica. O crescimento sobre 2022 foi de 12,2%; sobre o resultado de 2019, que era o recorde anterior, o aumento foi de 9,1%. O rendimento médio mensal real domiciliar per capita alcançou R$ 1.848, também o maior valor da série histórica, com aumento de 11,5% sobre o resultado de 2022 e de 6,0% sobre o recorde anterior, de R$ 1.744 em 2019.

O IBGE destaca outro recorde alcançado em 2023, o da proporção da população com rendimento habitualmente recebido do trabalho. Era de 44,5% (ou 95,2 milhões de pessoas) em 2022 e passou para 46,0% (ou 99,2 milhões) em 2023. Em 2020, no auge da pandemia, a proporção era de 40,1%, ou 84,7 milhões de pessoas. Em três anos, praticamente 15 milhões de brasileiros puderam voltar ao mercado de trabalho.

Além da absorção desse grande contingente de trabalhadores pelo mercado, a proporção de domicílios com algum beneficiário do programa Bolsa Família aumentou de 16,9%, em 2022, para 19,0%, em 2023. O rendimento per capita do grupo de domicílios que recebiam Bolsa Família passou de R$ 446 para R$ 635 (aumento de 42,4%) entre 2019 e 2023. Esses números mostram a importância do Bolsa Família na melhora das estatísticas de rendimento da população no ano passado.

Em 2012, a proporção de domicílios com algum benefício do Bolsa Família era de 16,6%. Em 2019, primeiro ano do governo Bolsonaro, a proporção diminuiu para 14,3%. No ano seguinte, com a pandemia, parte de seus beneficiários passou a receber o auxílio emergencial criado para enfrentar os novos problemas sanitários, razão pela qual a proporção caiu para 7,2%. Outros programas sociais passaram a atender as famílias. Esses programas, que atendiam a 0,7% dos domicílios em 2019, passaram a beneficiar 23,7% em 2020. No final de 2021, o Bolsa Família foi substituído pelo Auxílio Brasil, que atingiu 16,9% dos domicílios. Com sua recriação em 2023, o Bolsa Família passou a atender 19% dos domicílios, a maior proporção desde sua instituição.

Ainda assim, como observou o IBGE, “a desigualdade permaneceu bastante acentuada no País”. Talvez coubesse fortalecer essa expressão: a desigualdade continuou vergonhosamente acentuada no Brasil. Este é um dos países mais desiguais do mundo, melhor apenas do que alguns da África. Em 2023, o rendimento per capita médio do 1% de mais ricos do Brasil, de R$ 20.664 por mês, correspondia a 39,2 vezes o rendimento dos que compõem o grupo dos 40% mais pobres, de R$ 527. Se comparado com o rendimento per capita dos 5% mais pobres, o do 1% de mais ricos corresponde a 164 vezes.

Embora maior do que a de 2022, a desigualdade observada em 2023 é menos intensa do que a de anos anteriores. Mas o que os números mostram é a persistência, com variações entre um ano e outro, de um problema histórico que o Brasil não soube vencer, ou não enfrentou com a devida coragem e competência.

Programas de transferência de renda vêm mostrando eficácia na redução emergencial das desigualdades, como mostram os resultados sobre a evolução do rendimento da população nos últimos anos. Sem eles, este seria um país ainda mais desigual. Mas eles não bastam para combater problemas que o País acumulou – e consolidou? – ao longo do tempo.

Só um sistema educacional eficiente, sobretudo nos primeiros anos do ensino, é capaz de preparar todos duradoura e adequadamente, sem distinção de classes de renda, para os desafios da vida e para a construção de um país em que todos possam crescer social e economicamente. A formação profissional de qualidade é igualmente indispensável para isso.

Programas de inclusão social, de combate a todas as formas de discriminação, também fazem parte das ações públicas e privadas de redução das desigualdades sociais e de renda do País.

Políticas públicas mais eficientes em áreas como saúde e assistência social – além, obviamente, da educação – são indispensáveis. Gastar com mais eficiência, reduzindo desperdícios e combatendo duramente a corrupção, representa ajuda expressiva a quem mais necessita do apoio do poder público, que são justamente as camadas de renda mais baixa.

São providências tão óbvias que sua citação parece ociosa. Mas este tem sido um país que, ao ver se reproduzindo, de tempos em tempos, seus velhos problemas, parece contentar-se em aceitar resignadamente seus dramas. É como se tivesse se conformado com a mediocridade.

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JORNALISTA, É AUTOR, ENTRE OUTROS, DO LIVRO O SÚDITO (BANZAI, MASSATERU!) (EDITORA TERCEIRO NOME) E PRESIDENTE DO CENTRO DE ESTUDOS NIPO-BRASILEIROS (JINMONKEN)

O impacto da melhora do mercado de trabalho e do aumento do número de beneficiários dos programas sociais do governo federal sobre o rendimento dos brasileiros foi nítido no ano passado. Vários indicadores atingiram o maior valor da série histórica que o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) vem construindo desde 2012 por meio da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua. Há mais pessoas trabalhando e as pessoas estão recebendo mais de todas as fontes (trabalho remunerado, programas sociais, aposentadoria, pensão e outras).

Há dados que impressionam. A massa de rendimento mensal domiciliar per capita alcançou R$ 398,3 bilhões, o maior valor da série histórica. O crescimento sobre 2022 foi de 12,2%; sobre o resultado de 2019, que era o recorde anterior, o aumento foi de 9,1%. O rendimento médio mensal real domiciliar per capita alcançou R$ 1.848, também o maior valor da série histórica, com aumento de 11,5% sobre o resultado de 2022 e de 6,0% sobre o recorde anterior, de R$ 1.744 em 2019.

O IBGE destaca outro recorde alcançado em 2023, o da proporção da população com rendimento habitualmente recebido do trabalho. Era de 44,5% (ou 95,2 milhões de pessoas) em 2022 e passou para 46,0% (ou 99,2 milhões) em 2023. Em 2020, no auge da pandemia, a proporção era de 40,1%, ou 84,7 milhões de pessoas. Em três anos, praticamente 15 milhões de brasileiros puderam voltar ao mercado de trabalho.

Além da absorção desse grande contingente de trabalhadores pelo mercado, a proporção de domicílios com algum beneficiário do programa Bolsa Família aumentou de 16,9%, em 2022, para 19,0%, em 2023. O rendimento per capita do grupo de domicílios que recebiam Bolsa Família passou de R$ 446 para R$ 635 (aumento de 42,4%) entre 2019 e 2023. Esses números mostram a importância do Bolsa Família na melhora das estatísticas de rendimento da população no ano passado.

Em 2012, a proporção de domicílios com algum benefício do Bolsa Família era de 16,6%. Em 2019, primeiro ano do governo Bolsonaro, a proporção diminuiu para 14,3%. No ano seguinte, com a pandemia, parte de seus beneficiários passou a receber o auxílio emergencial criado para enfrentar os novos problemas sanitários, razão pela qual a proporção caiu para 7,2%. Outros programas sociais passaram a atender as famílias. Esses programas, que atendiam a 0,7% dos domicílios em 2019, passaram a beneficiar 23,7% em 2020. No final de 2021, o Bolsa Família foi substituído pelo Auxílio Brasil, que atingiu 16,9% dos domicílios. Com sua recriação em 2023, o Bolsa Família passou a atender 19% dos domicílios, a maior proporção desde sua instituição.

Ainda assim, como observou o IBGE, “a desigualdade permaneceu bastante acentuada no País”. Talvez coubesse fortalecer essa expressão: a desigualdade continuou vergonhosamente acentuada no Brasil. Este é um dos países mais desiguais do mundo, melhor apenas do que alguns da África. Em 2023, o rendimento per capita médio do 1% de mais ricos do Brasil, de R$ 20.664 por mês, correspondia a 39,2 vezes o rendimento dos que compõem o grupo dos 40% mais pobres, de R$ 527. Se comparado com o rendimento per capita dos 5% mais pobres, o do 1% de mais ricos corresponde a 164 vezes.

Embora maior do que a de 2022, a desigualdade observada em 2023 é menos intensa do que a de anos anteriores. Mas o que os números mostram é a persistência, com variações entre um ano e outro, de um problema histórico que o Brasil não soube vencer, ou não enfrentou com a devida coragem e competência.

Programas de transferência de renda vêm mostrando eficácia na redução emergencial das desigualdades, como mostram os resultados sobre a evolução do rendimento da população nos últimos anos. Sem eles, este seria um país ainda mais desigual. Mas eles não bastam para combater problemas que o País acumulou – e consolidou? – ao longo do tempo.

Só um sistema educacional eficiente, sobretudo nos primeiros anos do ensino, é capaz de preparar todos duradoura e adequadamente, sem distinção de classes de renda, para os desafios da vida e para a construção de um país em que todos possam crescer social e economicamente. A formação profissional de qualidade é igualmente indispensável para isso.

Programas de inclusão social, de combate a todas as formas de discriminação, também fazem parte das ações públicas e privadas de redução das desigualdades sociais e de renda do País.

Políticas públicas mais eficientes em áreas como saúde e assistência social – além, obviamente, da educação – são indispensáveis. Gastar com mais eficiência, reduzindo desperdícios e combatendo duramente a corrupção, representa ajuda expressiva a quem mais necessita do apoio do poder público, que são justamente as camadas de renda mais baixa.

São providências tão óbvias que sua citação parece ociosa. Mas este tem sido um país que, ao ver se reproduzindo, de tempos em tempos, seus velhos problemas, parece contentar-se em aceitar resignadamente seus dramas. É como se tivesse se conformado com a mediocridade.

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JORNALISTA, É AUTOR, ENTRE OUTROS, DO LIVRO O SÚDITO (BANZAI, MASSATERU!) (EDITORA TERCEIRO NOME) E PRESIDENTE DO CENTRO DE ESTUDOS NIPO-BRASILEIROS (JINMONKEN)

Opinião por Jorge J. Okubaro

Jornalista, é autor, entre outros, do livro 'O Súdito (Banzai, Massateru!)' (Editora Terceiro Nome)

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