Não se defende a democracia com censura


Ao bloquear as redes de um cidadão que duvidou da lisura das eleições, Alexandre de Moraes atua supostamente em defesa da democracia. Ora, não há democracia sem liberdades individuais

Por Notas & Informações

No dia 13 de junho, o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), atuou uma vez mais supostamente em defesa da democracia. Informado pela assessoria do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sobre um vídeo do podcaster Monark com “notícias falsas sobre a integridade das instituições eleitorais”, o relator do Inquérito 4.923 determinou de ofício o bloqueio, sob pena de multa diária de R$ 100 mil, de todas as contas do entrevistador nas redes sociais.

No texto da decisão, nota-se a convicção do sr. Alexandre de Moraes de que, com os bloqueios de perfis nas redes sociais, ele está prestando um serviço ao País, tornando o regime democrático brasileiro mais seguro. É preciso dizer: a decisão é um desserviço ao País. O STF tem o dever de proteger a democracia tal como está prevista na Constituição. Democracia não é uma ideia vaga a justificar as idiossincrasias de um juiz.

O relator do Inquérito 4.923, que ainda continua em sigilo, afirma que, a depender das circunstâncias, seria possível “o afastamento excepcional de garantias individuais”, já que elas “não podem ser utilizadas como um verdadeiro escudo protetivo para a prática de atividades ilícitas”. Para o sr. Alexandre de Moraes, este é o fundamento do bloqueio dos perfis: atividades ilícitas não podem prosperar no Estado Democrático de Direito e, tendo o ministro tomado conhecimento de atividades desse teor, ele tem o dever de adotar medidas excepcionais, inclusive afastando garantias individuais, como meio de interromper a prática dos ilícitos.

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Na aplicação do raciocínio ao caso, existem dois grandes problemas.

Em primeiro lugar está a própria compreensão do que seriam “atividades ilícitas”. Em nenhum momento, o sr. Alexandre de Moraes explica o motivo pelo qual considera ilícitas as falas de Monark. A ilicitude não é uma ideia abstrata. É a violação, concreta e específica, de uma norma jurídica.

Dizer, como fez Monark, que o TSE tentou manipular as eleições por meio da censura ou que Alexandre de Moraes prendeu pessoas sem base legal pode ser uma grande estupidez, mas não é, por si só, uma atividade ilegal. No limite, essas falas poderiam ser compreendidas como parte de um esquema criminoso para derrubar o regime democrático. No entanto, não cabe presumir esse tipo de contexto. Ele precisa ser muito bem demonstrado. Caso contrário, as garantias constitucionais nada valem. Como se sabe, é justamente nesse tipo de presunção que regimes autoritários se baseiam para perseguir e prender opositores.

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O segundo problema refere-se ao próprio argumento. A suposta prática de uma atividade criminosa não autoriza uma ação estatal absolutista, indiferente às regras de competência, aos procedimentos, à proporcionalidade e às garantias individuais. No entanto, tem sido frequente – e não apenas da parte do sr. Alexandre de Moraes – ignorar essas exigências constitucionais sob o pretexto de proteção do bem maior, condição de todos os outros, que é a democracia.

Se o argumento fosse válido, não precisaria haver regras processuais em relação a muitos crimes, como, por exemplo, os crimes contra a vida. O bem protegido por eles é de tal ordem que deveria autorizar o Estado a ter poderes irrestritos. No entanto, e à parte das opiniões que cada um pode legitimamente ter sobre a gravidade das circunstâncias vividas no País, não foi essa a opção feita pela Constituição de 1988, ao configurar e estruturar o regime democrático. O motivo dessa escolha é simples. O argumento segundo o qual, na proteção de um bem muito importante, não deveria haver limitações para a atuação estatal foi o que o regime militar sempre utilizou em suas violações dos direitos humanos e das garantias fundamentais. A Constituição instaurou uma lógica muito diferente, que é a do Estado Democrático de Direito.

No novo regime, as palavras, especialmente as da lei, importam. Não são manipuláveis. Não podem ser distorcidas. Quando a Constituição proíbe a censura, não é mera sugestão, a depender das circunstâncias. É norma que obriga a todos, sempre.

No dia 13 de junho, o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), atuou uma vez mais supostamente em defesa da democracia. Informado pela assessoria do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sobre um vídeo do podcaster Monark com “notícias falsas sobre a integridade das instituições eleitorais”, o relator do Inquérito 4.923 determinou de ofício o bloqueio, sob pena de multa diária de R$ 100 mil, de todas as contas do entrevistador nas redes sociais.

No texto da decisão, nota-se a convicção do sr. Alexandre de Moraes de que, com os bloqueios de perfis nas redes sociais, ele está prestando um serviço ao País, tornando o regime democrático brasileiro mais seguro. É preciso dizer: a decisão é um desserviço ao País. O STF tem o dever de proteger a democracia tal como está prevista na Constituição. Democracia não é uma ideia vaga a justificar as idiossincrasias de um juiz.

O relator do Inquérito 4.923, que ainda continua em sigilo, afirma que, a depender das circunstâncias, seria possível “o afastamento excepcional de garantias individuais”, já que elas “não podem ser utilizadas como um verdadeiro escudo protetivo para a prática de atividades ilícitas”. Para o sr. Alexandre de Moraes, este é o fundamento do bloqueio dos perfis: atividades ilícitas não podem prosperar no Estado Democrático de Direito e, tendo o ministro tomado conhecimento de atividades desse teor, ele tem o dever de adotar medidas excepcionais, inclusive afastando garantias individuais, como meio de interromper a prática dos ilícitos.

Na aplicação do raciocínio ao caso, existem dois grandes problemas.

Em primeiro lugar está a própria compreensão do que seriam “atividades ilícitas”. Em nenhum momento, o sr. Alexandre de Moraes explica o motivo pelo qual considera ilícitas as falas de Monark. A ilicitude não é uma ideia abstrata. É a violação, concreta e específica, de uma norma jurídica.

Dizer, como fez Monark, que o TSE tentou manipular as eleições por meio da censura ou que Alexandre de Moraes prendeu pessoas sem base legal pode ser uma grande estupidez, mas não é, por si só, uma atividade ilegal. No limite, essas falas poderiam ser compreendidas como parte de um esquema criminoso para derrubar o regime democrático. No entanto, não cabe presumir esse tipo de contexto. Ele precisa ser muito bem demonstrado. Caso contrário, as garantias constitucionais nada valem. Como se sabe, é justamente nesse tipo de presunção que regimes autoritários se baseiam para perseguir e prender opositores.

O segundo problema refere-se ao próprio argumento. A suposta prática de uma atividade criminosa não autoriza uma ação estatal absolutista, indiferente às regras de competência, aos procedimentos, à proporcionalidade e às garantias individuais. No entanto, tem sido frequente – e não apenas da parte do sr. Alexandre de Moraes – ignorar essas exigências constitucionais sob o pretexto de proteção do bem maior, condição de todos os outros, que é a democracia.

Se o argumento fosse válido, não precisaria haver regras processuais em relação a muitos crimes, como, por exemplo, os crimes contra a vida. O bem protegido por eles é de tal ordem que deveria autorizar o Estado a ter poderes irrestritos. No entanto, e à parte das opiniões que cada um pode legitimamente ter sobre a gravidade das circunstâncias vividas no País, não foi essa a opção feita pela Constituição de 1988, ao configurar e estruturar o regime democrático. O motivo dessa escolha é simples. O argumento segundo o qual, na proteção de um bem muito importante, não deveria haver limitações para a atuação estatal foi o que o regime militar sempre utilizou em suas violações dos direitos humanos e das garantias fundamentais. A Constituição instaurou uma lógica muito diferente, que é a do Estado Democrático de Direito.

No novo regime, as palavras, especialmente as da lei, importam. Não são manipuláveis. Não podem ser distorcidas. Quando a Constituição proíbe a censura, não é mera sugestão, a depender das circunstâncias. É norma que obriga a todos, sempre.

No dia 13 de junho, o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), atuou uma vez mais supostamente em defesa da democracia. Informado pela assessoria do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sobre um vídeo do podcaster Monark com “notícias falsas sobre a integridade das instituições eleitorais”, o relator do Inquérito 4.923 determinou de ofício o bloqueio, sob pena de multa diária de R$ 100 mil, de todas as contas do entrevistador nas redes sociais.

No texto da decisão, nota-se a convicção do sr. Alexandre de Moraes de que, com os bloqueios de perfis nas redes sociais, ele está prestando um serviço ao País, tornando o regime democrático brasileiro mais seguro. É preciso dizer: a decisão é um desserviço ao País. O STF tem o dever de proteger a democracia tal como está prevista na Constituição. Democracia não é uma ideia vaga a justificar as idiossincrasias de um juiz.

O relator do Inquérito 4.923, que ainda continua em sigilo, afirma que, a depender das circunstâncias, seria possível “o afastamento excepcional de garantias individuais”, já que elas “não podem ser utilizadas como um verdadeiro escudo protetivo para a prática de atividades ilícitas”. Para o sr. Alexandre de Moraes, este é o fundamento do bloqueio dos perfis: atividades ilícitas não podem prosperar no Estado Democrático de Direito e, tendo o ministro tomado conhecimento de atividades desse teor, ele tem o dever de adotar medidas excepcionais, inclusive afastando garantias individuais, como meio de interromper a prática dos ilícitos.

Na aplicação do raciocínio ao caso, existem dois grandes problemas.

Em primeiro lugar está a própria compreensão do que seriam “atividades ilícitas”. Em nenhum momento, o sr. Alexandre de Moraes explica o motivo pelo qual considera ilícitas as falas de Monark. A ilicitude não é uma ideia abstrata. É a violação, concreta e específica, de uma norma jurídica.

Dizer, como fez Monark, que o TSE tentou manipular as eleições por meio da censura ou que Alexandre de Moraes prendeu pessoas sem base legal pode ser uma grande estupidez, mas não é, por si só, uma atividade ilegal. No limite, essas falas poderiam ser compreendidas como parte de um esquema criminoso para derrubar o regime democrático. No entanto, não cabe presumir esse tipo de contexto. Ele precisa ser muito bem demonstrado. Caso contrário, as garantias constitucionais nada valem. Como se sabe, é justamente nesse tipo de presunção que regimes autoritários se baseiam para perseguir e prender opositores.

O segundo problema refere-se ao próprio argumento. A suposta prática de uma atividade criminosa não autoriza uma ação estatal absolutista, indiferente às regras de competência, aos procedimentos, à proporcionalidade e às garantias individuais. No entanto, tem sido frequente – e não apenas da parte do sr. Alexandre de Moraes – ignorar essas exigências constitucionais sob o pretexto de proteção do bem maior, condição de todos os outros, que é a democracia.

Se o argumento fosse válido, não precisaria haver regras processuais em relação a muitos crimes, como, por exemplo, os crimes contra a vida. O bem protegido por eles é de tal ordem que deveria autorizar o Estado a ter poderes irrestritos. No entanto, e à parte das opiniões que cada um pode legitimamente ter sobre a gravidade das circunstâncias vividas no País, não foi essa a opção feita pela Constituição de 1988, ao configurar e estruturar o regime democrático. O motivo dessa escolha é simples. O argumento segundo o qual, na proteção de um bem muito importante, não deveria haver limitações para a atuação estatal foi o que o regime militar sempre utilizou em suas violações dos direitos humanos e das garantias fundamentais. A Constituição instaurou uma lógica muito diferente, que é a do Estado Democrático de Direito.

No novo regime, as palavras, especialmente as da lei, importam. Não são manipuláveis. Não podem ser distorcidas. Quando a Constituição proíbe a censura, não é mera sugestão, a depender das circunstâncias. É norma que obriga a todos, sempre.

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