Advogado e Jornalista

Opinião|A democracia depende da comunicação do STF


A legitimação discursiva do STF não pode se resumir a um diálogo com os setores mais progressistas e intelectualizados

Por Nicolau da Rocha Cavalcanti

No início de junho de 2013 – poucos dias antes das grandes manifestações que tomaram as ruas do País –, Luís Roberto Barroso foi sabatinado no Senado. Inquirido sobre ativismo judicial e respeito ao Legislativo, expôs sua visão da Constituição e do papel do Supremo Tribunal Federal (STF). Os senadores aprovaram seu nome por 59 votos a 6. Concorde-se ou não com as posições do ministro Barroso, é de justiça reconhecer que seus dez anos de exercício da judicatura no Supremo são um reflexo bastante coerente de suas respostas na sabatina – bem como do que havia escrito e ensinado, ao longo dos anos, sobre teoria constitucional.

Lembrei-me da sabatina de 2013 – das respostas claras e diretas – quando, no discurso de posse, o novo presidente do STF citou, entre os três eixos de sua gestão, a “comunicação, melhorando a interlocução com a sociedade, expondo em linguagem simples o nosso papel, explicando didaticamente as decisões, desfazendo incompreensões e mal-entendidos”. Luís Roberto Barroso foi sempre um defensor da linguagem simples e descomplicada.

A comunicação do Judiciário é fundamental. Não é mera tática circunstancial, para amenizar alguma tensão mais aguda. Ela diz respeito à legitimidade democrática da atividade jurisdicional.

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Os juízes não foram eleitos pelo voto popular e sua atividade não deve estar pautada por critérios de maioria política. Mas isso não significa virar as costas à população. Como escreveu anos antes Luís Roberto Barroso, seguindo a perspectiva proposta por Robert Alexy, “o constitucionalismo democrático possui uma legitimação discursiva, que é um projeto de institucionalização da razão e da correção” (A razão e o voto, FGV Editora, 2017, página 57). Daí o caráter fundamental da motivação das decisões judiciais: o percurso argumentativo até chegar à conclusão é tão importante quanto a própria conclusão.

Se a comunicação é essencial para todo o Judiciário, ela é ainda mais necessária para o Supremo, cujos julgamentos envolvem grandes questões controvertidas na sociedade. Sendo a Constituição de 1988 extremamente abrangente, é natural que a Corte constitucional se veja envolta nesses embates. Não há como escapar deste lugar de exposição e de controvérsia, mesmo quando o tribunal decide não decidir. Por isso, o STF precisa ser exímio comunicador. Suas decisões (e as razões jurídicas que levaram a elas) têm de ser compreensíveis para toda a população.

A esse respeito, faço atrevidamente duas sugestões ao STF.

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A população brasileira mudou significativamente nos últimos anos, nas últimas décadas. E essa mudança não foi no sentido que uma elite intelectual e urbana talvez imaginasse. Houve o florescimento de novas dinâmicas familiares e sociais, de novas religiosidades, de novas modalidades de trabalho, de novas percepções do papel do Estado. O ano de 2013 talvez possa ser lido como o desabrochar deste novo Brasil, ainda a ser compreendido.

E o que isso tem que ver com a comunicação do Supremo? A legitimação discursiva do STF não pode se resumir a um diálogo com os setores mais progressistas e intelectualizados da sociedade. É preciso revisitar nossas percepções sobre o que é o Brasil. Talvez elas já não reflitam a sociedade brasileira atual. Comunicar bem exige conhecer o interlocutor – e, neste momento, talvez já não o conheçamos tão bem. É tempo de escutar, de ampliar a compreensão das pluralidades presentes na sociedade atual.

Minha segunda sugestão. A comunicação do STF ganharia muito com votos mais curtos, muito mais curtos, do que os proferidos habitualmente. É preciso expor com brevidade, clareza e rigor lógico os fundamentos da posição adotada. Decisões judiciais especialmente longas levantam a dúvida sobre sua fragilidade e inconsistência, além de dificultarem a compreensão sobre as verdadeiras razões que as motivam.

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Mais do que mera questão de tamanho, a sugestão refere-se a uma mudança de cultura, a um novo cuidado com quem é impactado pela decisão. O voto breve e bem escrito facilita que a decisão judicial possa cumprir sua função de pacificação social.

A brevidade evita também que as decisões judiciais sejam confundidas pela população com posicionamentos políticos. Há uma grande diferença, de perspectiva e de procedimento legitimante, entre a política e o direito. As áreas de interseção, tão presentes nos temas submetidos ao Supremo, devem levar a um cuidado ainda maior com a linguagem da Corte, que não se deve parecer com a da política.

Entendo que o ministro Barroso foi muito feliz na escolha da comunicação como uma das prioridades da sua gestão. E ela não é uma via de mão única. Como o novo presidente do STF afirmou em seu discurso: “A gente na vida deve ser janela, e não espelho, ter a capacidade de olhar para os outros, e não apenas para si mesmo”.

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Que a população possa compreender melhor a atuação do STF é elemento fundamental para a consolidação democrática do País. E que o STF possa compreender melhor a população brasileira é elemento fundamental para a consolidação democrática do País.

*

ADVOGADO

No início de junho de 2013 – poucos dias antes das grandes manifestações que tomaram as ruas do País –, Luís Roberto Barroso foi sabatinado no Senado. Inquirido sobre ativismo judicial e respeito ao Legislativo, expôs sua visão da Constituição e do papel do Supremo Tribunal Federal (STF). Os senadores aprovaram seu nome por 59 votos a 6. Concorde-se ou não com as posições do ministro Barroso, é de justiça reconhecer que seus dez anos de exercício da judicatura no Supremo são um reflexo bastante coerente de suas respostas na sabatina – bem como do que havia escrito e ensinado, ao longo dos anos, sobre teoria constitucional.

Lembrei-me da sabatina de 2013 – das respostas claras e diretas – quando, no discurso de posse, o novo presidente do STF citou, entre os três eixos de sua gestão, a “comunicação, melhorando a interlocução com a sociedade, expondo em linguagem simples o nosso papel, explicando didaticamente as decisões, desfazendo incompreensões e mal-entendidos”. Luís Roberto Barroso foi sempre um defensor da linguagem simples e descomplicada.

A comunicação do Judiciário é fundamental. Não é mera tática circunstancial, para amenizar alguma tensão mais aguda. Ela diz respeito à legitimidade democrática da atividade jurisdicional.

Os juízes não foram eleitos pelo voto popular e sua atividade não deve estar pautada por critérios de maioria política. Mas isso não significa virar as costas à população. Como escreveu anos antes Luís Roberto Barroso, seguindo a perspectiva proposta por Robert Alexy, “o constitucionalismo democrático possui uma legitimação discursiva, que é um projeto de institucionalização da razão e da correção” (A razão e o voto, FGV Editora, 2017, página 57). Daí o caráter fundamental da motivação das decisões judiciais: o percurso argumentativo até chegar à conclusão é tão importante quanto a própria conclusão.

Se a comunicação é essencial para todo o Judiciário, ela é ainda mais necessária para o Supremo, cujos julgamentos envolvem grandes questões controvertidas na sociedade. Sendo a Constituição de 1988 extremamente abrangente, é natural que a Corte constitucional se veja envolta nesses embates. Não há como escapar deste lugar de exposição e de controvérsia, mesmo quando o tribunal decide não decidir. Por isso, o STF precisa ser exímio comunicador. Suas decisões (e as razões jurídicas que levaram a elas) têm de ser compreensíveis para toda a população.

A esse respeito, faço atrevidamente duas sugestões ao STF.

A população brasileira mudou significativamente nos últimos anos, nas últimas décadas. E essa mudança não foi no sentido que uma elite intelectual e urbana talvez imaginasse. Houve o florescimento de novas dinâmicas familiares e sociais, de novas religiosidades, de novas modalidades de trabalho, de novas percepções do papel do Estado. O ano de 2013 talvez possa ser lido como o desabrochar deste novo Brasil, ainda a ser compreendido.

E o que isso tem que ver com a comunicação do Supremo? A legitimação discursiva do STF não pode se resumir a um diálogo com os setores mais progressistas e intelectualizados da sociedade. É preciso revisitar nossas percepções sobre o que é o Brasil. Talvez elas já não reflitam a sociedade brasileira atual. Comunicar bem exige conhecer o interlocutor – e, neste momento, talvez já não o conheçamos tão bem. É tempo de escutar, de ampliar a compreensão das pluralidades presentes na sociedade atual.

Minha segunda sugestão. A comunicação do STF ganharia muito com votos mais curtos, muito mais curtos, do que os proferidos habitualmente. É preciso expor com brevidade, clareza e rigor lógico os fundamentos da posição adotada. Decisões judiciais especialmente longas levantam a dúvida sobre sua fragilidade e inconsistência, além de dificultarem a compreensão sobre as verdadeiras razões que as motivam.

Mais do que mera questão de tamanho, a sugestão refere-se a uma mudança de cultura, a um novo cuidado com quem é impactado pela decisão. O voto breve e bem escrito facilita que a decisão judicial possa cumprir sua função de pacificação social.

A brevidade evita também que as decisões judiciais sejam confundidas pela população com posicionamentos políticos. Há uma grande diferença, de perspectiva e de procedimento legitimante, entre a política e o direito. As áreas de interseção, tão presentes nos temas submetidos ao Supremo, devem levar a um cuidado ainda maior com a linguagem da Corte, que não se deve parecer com a da política.

Entendo que o ministro Barroso foi muito feliz na escolha da comunicação como uma das prioridades da sua gestão. E ela não é uma via de mão única. Como o novo presidente do STF afirmou em seu discurso: “A gente na vida deve ser janela, e não espelho, ter a capacidade de olhar para os outros, e não apenas para si mesmo”.

Que a população possa compreender melhor a atuação do STF é elemento fundamental para a consolidação democrática do País. E que o STF possa compreender melhor a população brasileira é elemento fundamental para a consolidação democrática do País.

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ADVOGADO

No início de junho de 2013 – poucos dias antes das grandes manifestações que tomaram as ruas do País –, Luís Roberto Barroso foi sabatinado no Senado. Inquirido sobre ativismo judicial e respeito ao Legislativo, expôs sua visão da Constituição e do papel do Supremo Tribunal Federal (STF). Os senadores aprovaram seu nome por 59 votos a 6. Concorde-se ou não com as posições do ministro Barroso, é de justiça reconhecer que seus dez anos de exercício da judicatura no Supremo são um reflexo bastante coerente de suas respostas na sabatina – bem como do que havia escrito e ensinado, ao longo dos anos, sobre teoria constitucional.

Lembrei-me da sabatina de 2013 – das respostas claras e diretas – quando, no discurso de posse, o novo presidente do STF citou, entre os três eixos de sua gestão, a “comunicação, melhorando a interlocução com a sociedade, expondo em linguagem simples o nosso papel, explicando didaticamente as decisões, desfazendo incompreensões e mal-entendidos”. Luís Roberto Barroso foi sempre um defensor da linguagem simples e descomplicada.

A comunicação do Judiciário é fundamental. Não é mera tática circunstancial, para amenizar alguma tensão mais aguda. Ela diz respeito à legitimidade democrática da atividade jurisdicional.

Os juízes não foram eleitos pelo voto popular e sua atividade não deve estar pautada por critérios de maioria política. Mas isso não significa virar as costas à população. Como escreveu anos antes Luís Roberto Barroso, seguindo a perspectiva proposta por Robert Alexy, “o constitucionalismo democrático possui uma legitimação discursiva, que é um projeto de institucionalização da razão e da correção” (A razão e o voto, FGV Editora, 2017, página 57). Daí o caráter fundamental da motivação das decisões judiciais: o percurso argumentativo até chegar à conclusão é tão importante quanto a própria conclusão.

Se a comunicação é essencial para todo o Judiciário, ela é ainda mais necessária para o Supremo, cujos julgamentos envolvem grandes questões controvertidas na sociedade. Sendo a Constituição de 1988 extremamente abrangente, é natural que a Corte constitucional se veja envolta nesses embates. Não há como escapar deste lugar de exposição e de controvérsia, mesmo quando o tribunal decide não decidir. Por isso, o STF precisa ser exímio comunicador. Suas decisões (e as razões jurídicas que levaram a elas) têm de ser compreensíveis para toda a população.

A esse respeito, faço atrevidamente duas sugestões ao STF.

A população brasileira mudou significativamente nos últimos anos, nas últimas décadas. E essa mudança não foi no sentido que uma elite intelectual e urbana talvez imaginasse. Houve o florescimento de novas dinâmicas familiares e sociais, de novas religiosidades, de novas modalidades de trabalho, de novas percepções do papel do Estado. O ano de 2013 talvez possa ser lido como o desabrochar deste novo Brasil, ainda a ser compreendido.

E o que isso tem que ver com a comunicação do Supremo? A legitimação discursiva do STF não pode se resumir a um diálogo com os setores mais progressistas e intelectualizados da sociedade. É preciso revisitar nossas percepções sobre o que é o Brasil. Talvez elas já não reflitam a sociedade brasileira atual. Comunicar bem exige conhecer o interlocutor – e, neste momento, talvez já não o conheçamos tão bem. É tempo de escutar, de ampliar a compreensão das pluralidades presentes na sociedade atual.

Minha segunda sugestão. A comunicação do STF ganharia muito com votos mais curtos, muito mais curtos, do que os proferidos habitualmente. É preciso expor com brevidade, clareza e rigor lógico os fundamentos da posição adotada. Decisões judiciais especialmente longas levantam a dúvida sobre sua fragilidade e inconsistência, além de dificultarem a compreensão sobre as verdadeiras razões que as motivam.

Mais do que mera questão de tamanho, a sugestão refere-se a uma mudança de cultura, a um novo cuidado com quem é impactado pela decisão. O voto breve e bem escrito facilita que a decisão judicial possa cumprir sua função de pacificação social.

A brevidade evita também que as decisões judiciais sejam confundidas pela população com posicionamentos políticos. Há uma grande diferença, de perspectiva e de procedimento legitimante, entre a política e o direito. As áreas de interseção, tão presentes nos temas submetidos ao Supremo, devem levar a um cuidado ainda maior com a linguagem da Corte, que não se deve parecer com a da política.

Entendo que o ministro Barroso foi muito feliz na escolha da comunicação como uma das prioridades da sua gestão. E ela não é uma via de mão única. Como o novo presidente do STF afirmou em seu discurso: “A gente na vida deve ser janela, e não espelho, ter a capacidade de olhar para os outros, e não apenas para si mesmo”.

Que a população possa compreender melhor a atuação do STF é elemento fundamental para a consolidação democrática do País. E que o STF possa compreender melhor a população brasileira é elemento fundamental para a consolidação democrática do País.

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ADVOGADO

No início de junho de 2013 – poucos dias antes das grandes manifestações que tomaram as ruas do País –, Luís Roberto Barroso foi sabatinado no Senado. Inquirido sobre ativismo judicial e respeito ao Legislativo, expôs sua visão da Constituição e do papel do Supremo Tribunal Federal (STF). Os senadores aprovaram seu nome por 59 votos a 6. Concorde-se ou não com as posições do ministro Barroso, é de justiça reconhecer que seus dez anos de exercício da judicatura no Supremo são um reflexo bastante coerente de suas respostas na sabatina – bem como do que havia escrito e ensinado, ao longo dos anos, sobre teoria constitucional.

Lembrei-me da sabatina de 2013 – das respostas claras e diretas – quando, no discurso de posse, o novo presidente do STF citou, entre os três eixos de sua gestão, a “comunicação, melhorando a interlocução com a sociedade, expondo em linguagem simples o nosso papel, explicando didaticamente as decisões, desfazendo incompreensões e mal-entendidos”. Luís Roberto Barroso foi sempre um defensor da linguagem simples e descomplicada.

A comunicação do Judiciário é fundamental. Não é mera tática circunstancial, para amenizar alguma tensão mais aguda. Ela diz respeito à legitimidade democrática da atividade jurisdicional.

Os juízes não foram eleitos pelo voto popular e sua atividade não deve estar pautada por critérios de maioria política. Mas isso não significa virar as costas à população. Como escreveu anos antes Luís Roberto Barroso, seguindo a perspectiva proposta por Robert Alexy, “o constitucionalismo democrático possui uma legitimação discursiva, que é um projeto de institucionalização da razão e da correção” (A razão e o voto, FGV Editora, 2017, página 57). Daí o caráter fundamental da motivação das decisões judiciais: o percurso argumentativo até chegar à conclusão é tão importante quanto a própria conclusão.

Se a comunicação é essencial para todo o Judiciário, ela é ainda mais necessária para o Supremo, cujos julgamentos envolvem grandes questões controvertidas na sociedade. Sendo a Constituição de 1988 extremamente abrangente, é natural que a Corte constitucional se veja envolta nesses embates. Não há como escapar deste lugar de exposição e de controvérsia, mesmo quando o tribunal decide não decidir. Por isso, o STF precisa ser exímio comunicador. Suas decisões (e as razões jurídicas que levaram a elas) têm de ser compreensíveis para toda a população.

A esse respeito, faço atrevidamente duas sugestões ao STF.

A população brasileira mudou significativamente nos últimos anos, nas últimas décadas. E essa mudança não foi no sentido que uma elite intelectual e urbana talvez imaginasse. Houve o florescimento de novas dinâmicas familiares e sociais, de novas religiosidades, de novas modalidades de trabalho, de novas percepções do papel do Estado. O ano de 2013 talvez possa ser lido como o desabrochar deste novo Brasil, ainda a ser compreendido.

E o que isso tem que ver com a comunicação do Supremo? A legitimação discursiva do STF não pode se resumir a um diálogo com os setores mais progressistas e intelectualizados da sociedade. É preciso revisitar nossas percepções sobre o que é o Brasil. Talvez elas já não reflitam a sociedade brasileira atual. Comunicar bem exige conhecer o interlocutor – e, neste momento, talvez já não o conheçamos tão bem. É tempo de escutar, de ampliar a compreensão das pluralidades presentes na sociedade atual.

Minha segunda sugestão. A comunicação do STF ganharia muito com votos mais curtos, muito mais curtos, do que os proferidos habitualmente. É preciso expor com brevidade, clareza e rigor lógico os fundamentos da posição adotada. Decisões judiciais especialmente longas levantam a dúvida sobre sua fragilidade e inconsistência, além de dificultarem a compreensão sobre as verdadeiras razões que as motivam.

Mais do que mera questão de tamanho, a sugestão refere-se a uma mudança de cultura, a um novo cuidado com quem é impactado pela decisão. O voto breve e bem escrito facilita que a decisão judicial possa cumprir sua função de pacificação social.

A brevidade evita também que as decisões judiciais sejam confundidas pela população com posicionamentos políticos. Há uma grande diferença, de perspectiva e de procedimento legitimante, entre a política e o direito. As áreas de interseção, tão presentes nos temas submetidos ao Supremo, devem levar a um cuidado ainda maior com a linguagem da Corte, que não se deve parecer com a da política.

Entendo que o ministro Barroso foi muito feliz na escolha da comunicação como uma das prioridades da sua gestão. E ela não é uma via de mão única. Como o novo presidente do STF afirmou em seu discurso: “A gente na vida deve ser janela, e não espelho, ter a capacidade de olhar para os outros, e não apenas para si mesmo”.

Que a população possa compreender melhor a atuação do STF é elemento fundamental para a consolidação democrática do País. E que o STF possa compreender melhor a população brasileira é elemento fundamental para a consolidação democrática do País.

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ADVOGADO

No início de junho de 2013 – poucos dias antes das grandes manifestações que tomaram as ruas do País –, Luís Roberto Barroso foi sabatinado no Senado. Inquirido sobre ativismo judicial e respeito ao Legislativo, expôs sua visão da Constituição e do papel do Supremo Tribunal Federal (STF). Os senadores aprovaram seu nome por 59 votos a 6. Concorde-se ou não com as posições do ministro Barroso, é de justiça reconhecer que seus dez anos de exercício da judicatura no Supremo são um reflexo bastante coerente de suas respostas na sabatina – bem como do que havia escrito e ensinado, ao longo dos anos, sobre teoria constitucional.

Lembrei-me da sabatina de 2013 – das respostas claras e diretas – quando, no discurso de posse, o novo presidente do STF citou, entre os três eixos de sua gestão, a “comunicação, melhorando a interlocução com a sociedade, expondo em linguagem simples o nosso papel, explicando didaticamente as decisões, desfazendo incompreensões e mal-entendidos”. Luís Roberto Barroso foi sempre um defensor da linguagem simples e descomplicada.

A comunicação do Judiciário é fundamental. Não é mera tática circunstancial, para amenizar alguma tensão mais aguda. Ela diz respeito à legitimidade democrática da atividade jurisdicional.

Os juízes não foram eleitos pelo voto popular e sua atividade não deve estar pautada por critérios de maioria política. Mas isso não significa virar as costas à população. Como escreveu anos antes Luís Roberto Barroso, seguindo a perspectiva proposta por Robert Alexy, “o constitucionalismo democrático possui uma legitimação discursiva, que é um projeto de institucionalização da razão e da correção” (A razão e o voto, FGV Editora, 2017, página 57). Daí o caráter fundamental da motivação das decisões judiciais: o percurso argumentativo até chegar à conclusão é tão importante quanto a própria conclusão.

Se a comunicação é essencial para todo o Judiciário, ela é ainda mais necessária para o Supremo, cujos julgamentos envolvem grandes questões controvertidas na sociedade. Sendo a Constituição de 1988 extremamente abrangente, é natural que a Corte constitucional se veja envolta nesses embates. Não há como escapar deste lugar de exposição e de controvérsia, mesmo quando o tribunal decide não decidir. Por isso, o STF precisa ser exímio comunicador. Suas decisões (e as razões jurídicas que levaram a elas) têm de ser compreensíveis para toda a população.

A esse respeito, faço atrevidamente duas sugestões ao STF.

A população brasileira mudou significativamente nos últimos anos, nas últimas décadas. E essa mudança não foi no sentido que uma elite intelectual e urbana talvez imaginasse. Houve o florescimento de novas dinâmicas familiares e sociais, de novas religiosidades, de novas modalidades de trabalho, de novas percepções do papel do Estado. O ano de 2013 talvez possa ser lido como o desabrochar deste novo Brasil, ainda a ser compreendido.

E o que isso tem que ver com a comunicação do Supremo? A legitimação discursiva do STF não pode se resumir a um diálogo com os setores mais progressistas e intelectualizados da sociedade. É preciso revisitar nossas percepções sobre o que é o Brasil. Talvez elas já não reflitam a sociedade brasileira atual. Comunicar bem exige conhecer o interlocutor – e, neste momento, talvez já não o conheçamos tão bem. É tempo de escutar, de ampliar a compreensão das pluralidades presentes na sociedade atual.

Minha segunda sugestão. A comunicação do STF ganharia muito com votos mais curtos, muito mais curtos, do que os proferidos habitualmente. É preciso expor com brevidade, clareza e rigor lógico os fundamentos da posição adotada. Decisões judiciais especialmente longas levantam a dúvida sobre sua fragilidade e inconsistência, além de dificultarem a compreensão sobre as verdadeiras razões que as motivam.

Mais do que mera questão de tamanho, a sugestão refere-se a uma mudança de cultura, a um novo cuidado com quem é impactado pela decisão. O voto breve e bem escrito facilita que a decisão judicial possa cumprir sua função de pacificação social.

A brevidade evita também que as decisões judiciais sejam confundidas pela população com posicionamentos políticos. Há uma grande diferença, de perspectiva e de procedimento legitimante, entre a política e o direito. As áreas de interseção, tão presentes nos temas submetidos ao Supremo, devem levar a um cuidado ainda maior com a linguagem da Corte, que não se deve parecer com a da política.

Entendo que o ministro Barroso foi muito feliz na escolha da comunicação como uma das prioridades da sua gestão. E ela não é uma via de mão única. Como o novo presidente do STF afirmou em seu discurso: “A gente na vida deve ser janela, e não espelho, ter a capacidade de olhar para os outros, e não apenas para si mesmo”.

Que a população possa compreender melhor a atuação do STF é elemento fundamental para a consolidação democrática do País. E que o STF possa compreender melhor a população brasileira é elemento fundamental para a consolidação democrática do País.

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