Precedente perigoso


Concessão de descontos a membros da PM na Ceagesp é medida de inspiração miliciana.

Por Notas & Informações

Semanas depois de ter feito um agressivo discurso na Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo (Ceagesp), prometendo que não privatizará a empresa, informando que escolheu para dirigi-la um coronel reformado de sua confiança e elogiando a atuação da Polícia Militar (PM) de São Paulo no combate ao crime, o presidente Jair Bolsonaro voltou a cortejar os membros da corporação. Desta vez, ele os brindou com uma medida absurda e ilegal, anunciada no sábado passado, em mais uma de suas costumeiras falas no cercadinho do Palácio da Alvorada. Sob a alegação de que sempre privilegiou bandeiras corporativas nos tempos em que foi deputado, o presidente anunciou que a Ceagesp dará descontos aos “fardados” que fizerem compras em suas instalações. “O policial militar de São Paulo pode comprar agora, fardado ou com documento, o que quiser para sua mesa com desconto de 20%”, afirmou. Em São Paulo, o coronel reformado da Polícia Militar por ele nomeado para a Ceagesp, Ricardo Mello Araújo, confirmou a concessão do benefício. Em nota, também afirmou que o desconto passará a fazer parte da “política da companhia”. Disse, ainda, que esse tipo de “política” é adotado “em muitos países”, sem enumerá-los.

Nem o presidente nem o coronel reformado, contudo, formalizaram a decisão que anunciaram. Nem poderiam fazê-lo, por vários motivos jurídicos, dos quais três merecem destaque.

Em primeiro lugar, como o Brasil é definido pela Constituição como uma república federativa e a Polícia Militar pertence ao governo do Estado de São Paulo, o presidente da República não tem competência legal para agir em áreas e atividades que não são de sua jurisdição. Apesar de a Ceagesp ser uma estatal federal, a manutenção da ordem pública em São Paulo é de responsabilidade da Secretaria da Segurança.

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Em segundo lugar, como os custos dos descontos não serão bancados por órgãos públicos, mas arcados pelos permissionários da Ceagesp, que terão uma redução no seu faturamento em um período de crise econômica, o presidente da República e o coronel reformado que colocou à frente da Ceagesp estão impondo uma obrigação ilegal à iniciativa privada. Eles não só estão interferindo de modo abusivo e inconstitucional na economia de mercado, como também revelaram seguir uma prática tipicamente miliciana, no pior sentido da palavra, quando afirmaram que o desconto é uma “forma de agradecimento” a quem os protege. A impressão fica ainda mais reforçada quando o presidente da Ceagesp afirma que, apesar de a “política de descontos não ser uma imposição a ninguém”, procurará cada comerciante para que ajude “a quem nos tem ajudado”. Em terceiro lugar, a Constituição é clara quando afirma que os serviços públicos devem ser prestados em caráter geral e impessoal. 

Como as Polícias Militares são, além de órgãos policiais, braços armados dos entes federados, seus membros recebem soldos arrecadados dos contribuintes. Portanto, não faz sentido, em termos jurídicos, institucionais e morais, esse tipo de “agradecimento”. O que poderá ocorrer com quem não quiser “ajudar”? O precedente é perigoso, pois, se a moda pegar, outras corporações do funcionalismo passarão a reivindicar “ajudinhas” para fazer o que é sua obrigação funcional, abrindo assim caminho para uma prática generalizada de chantagem e de perseguição a quem não quiser contribuir. 

Por isso, antes que esse tipo de prática miliciana ou mafiosa se expanda, os órgãos de fiscalização têm de agir imediatamente. Cabe aos Ministérios Públicos federal e estadual investigar o que o presidente Bolsonaro chama de cumprimento de uma de suas “bandeiras corporativistas”. O “desconto a fardados” é um fato grave num momento em que o presidente Bolsonaro, além das “ajudinhas” concebidas para aliciar soldados, insufla motins nas Polícias Militares e flerta com a quebra da autoridade dos governadores sobre essas corporações.

Semanas depois de ter feito um agressivo discurso na Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo (Ceagesp), prometendo que não privatizará a empresa, informando que escolheu para dirigi-la um coronel reformado de sua confiança e elogiando a atuação da Polícia Militar (PM) de São Paulo no combate ao crime, o presidente Jair Bolsonaro voltou a cortejar os membros da corporação. Desta vez, ele os brindou com uma medida absurda e ilegal, anunciada no sábado passado, em mais uma de suas costumeiras falas no cercadinho do Palácio da Alvorada. Sob a alegação de que sempre privilegiou bandeiras corporativas nos tempos em que foi deputado, o presidente anunciou que a Ceagesp dará descontos aos “fardados” que fizerem compras em suas instalações. “O policial militar de São Paulo pode comprar agora, fardado ou com documento, o que quiser para sua mesa com desconto de 20%”, afirmou. Em São Paulo, o coronel reformado da Polícia Militar por ele nomeado para a Ceagesp, Ricardo Mello Araújo, confirmou a concessão do benefício. Em nota, também afirmou que o desconto passará a fazer parte da “política da companhia”. Disse, ainda, que esse tipo de “política” é adotado “em muitos países”, sem enumerá-los.

Nem o presidente nem o coronel reformado, contudo, formalizaram a decisão que anunciaram. Nem poderiam fazê-lo, por vários motivos jurídicos, dos quais três merecem destaque.

Em primeiro lugar, como o Brasil é definido pela Constituição como uma república federativa e a Polícia Militar pertence ao governo do Estado de São Paulo, o presidente da República não tem competência legal para agir em áreas e atividades que não são de sua jurisdição. Apesar de a Ceagesp ser uma estatal federal, a manutenção da ordem pública em São Paulo é de responsabilidade da Secretaria da Segurança.

Em segundo lugar, como os custos dos descontos não serão bancados por órgãos públicos, mas arcados pelos permissionários da Ceagesp, que terão uma redução no seu faturamento em um período de crise econômica, o presidente da República e o coronel reformado que colocou à frente da Ceagesp estão impondo uma obrigação ilegal à iniciativa privada. Eles não só estão interferindo de modo abusivo e inconstitucional na economia de mercado, como também revelaram seguir uma prática tipicamente miliciana, no pior sentido da palavra, quando afirmaram que o desconto é uma “forma de agradecimento” a quem os protege. A impressão fica ainda mais reforçada quando o presidente da Ceagesp afirma que, apesar de a “política de descontos não ser uma imposição a ninguém”, procurará cada comerciante para que ajude “a quem nos tem ajudado”. Em terceiro lugar, a Constituição é clara quando afirma que os serviços públicos devem ser prestados em caráter geral e impessoal. 

Como as Polícias Militares são, além de órgãos policiais, braços armados dos entes federados, seus membros recebem soldos arrecadados dos contribuintes. Portanto, não faz sentido, em termos jurídicos, institucionais e morais, esse tipo de “agradecimento”. O que poderá ocorrer com quem não quiser “ajudar”? O precedente é perigoso, pois, se a moda pegar, outras corporações do funcionalismo passarão a reivindicar “ajudinhas” para fazer o que é sua obrigação funcional, abrindo assim caminho para uma prática generalizada de chantagem e de perseguição a quem não quiser contribuir. 

Por isso, antes que esse tipo de prática miliciana ou mafiosa se expanda, os órgãos de fiscalização têm de agir imediatamente. Cabe aos Ministérios Públicos federal e estadual investigar o que o presidente Bolsonaro chama de cumprimento de uma de suas “bandeiras corporativistas”. O “desconto a fardados” é um fato grave num momento em que o presidente Bolsonaro, além das “ajudinhas” concebidas para aliciar soldados, insufla motins nas Polícias Militares e flerta com a quebra da autoridade dos governadores sobre essas corporações.

Semanas depois de ter feito um agressivo discurso na Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo (Ceagesp), prometendo que não privatizará a empresa, informando que escolheu para dirigi-la um coronel reformado de sua confiança e elogiando a atuação da Polícia Militar (PM) de São Paulo no combate ao crime, o presidente Jair Bolsonaro voltou a cortejar os membros da corporação. Desta vez, ele os brindou com uma medida absurda e ilegal, anunciada no sábado passado, em mais uma de suas costumeiras falas no cercadinho do Palácio da Alvorada. Sob a alegação de que sempre privilegiou bandeiras corporativas nos tempos em que foi deputado, o presidente anunciou que a Ceagesp dará descontos aos “fardados” que fizerem compras em suas instalações. “O policial militar de São Paulo pode comprar agora, fardado ou com documento, o que quiser para sua mesa com desconto de 20%”, afirmou. Em São Paulo, o coronel reformado da Polícia Militar por ele nomeado para a Ceagesp, Ricardo Mello Araújo, confirmou a concessão do benefício. Em nota, também afirmou que o desconto passará a fazer parte da “política da companhia”. Disse, ainda, que esse tipo de “política” é adotado “em muitos países”, sem enumerá-los.

Nem o presidente nem o coronel reformado, contudo, formalizaram a decisão que anunciaram. Nem poderiam fazê-lo, por vários motivos jurídicos, dos quais três merecem destaque.

Em primeiro lugar, como o Brasil é definido pela Constituição como uma república federativa e a Polícia Militar pertence ao governo do Estado de São Paulo, o presidente da República não tem competência legal para agir em áreas e atividades que não são de sua jurisdição. Apesar de a Ceagesp ser uma estatal federal, a manutenção da ordem pública em São Paulo é de responsabilidade da Secretaria da Segurança.

Em segundo lugar, como os custos dos descontos não serão bancados por órgãos públicos, mas arcados pelos permissionários da Ceagesp, que terão uma redução no seu faturamento em um período de crise econômica, o presidente da República e o coronel reformado que colocou à frente da Ceagesp estão impondo uma obrigação ilegal à iniciativa privada. Eles não só estão interferindo de modo abusivo e inconstitucional na economia de mercado, como também revelaram seguir uma prática tipicamente miliciana, no pior sentido da palavra, quando afirmaram que o desconto é uma “forma de agradecimento” a quem os protege. A impressão fica ainda mais reforçada quando o presidente da Ceagesp afirma que, apesar de a “política de descontos não ser uma imposição a ninguém”, procurará cada comerciante para que ajude “a quem nos tem ajudado”. Em terceiro lugar, a Constituição é clara quando afirma que os serviços públicos devem ser prestados em caráter geral e impessoal. 

Como as Polícias Militares são, além de órgãos policiais, braços armados dos entes federados, seus membros recebem soldos arrecadados dos contribuintes. Portanto, não faz sentido, em termos jurídicos, institucionais e morais, esse tipo de “agradecimento”. O que poderá ocorrer com quem não quiser “ajudar”? O precedente é perigoso, pois, se a moda pegar, outras corporações do funcionalismo passarão a reivindicar “ajudinhas” para fazer o que é sua obrigação funcional, abrindo assim caminho para uma prática generalizada de chantagem e de perseguição a quem não quiser contribuir. 

Por isso, antes que esse tipo de prática miliciana ou mafiosa se expanda, os órgãos de fiscalização têm de agir imediatamente. Cabe aos Ministérios Públicos federal e estadual investigar o que o presidente Bolsonaro chama de cumprimento de uma de suas “bandeiras corporativistas”. O “desconto a fardados” é um fato grave num momento em que o presidente Bolsonaro, além das “ajudinhas” concebidas para aliciar soldados, insufla motins nas Polícias Militares e flerta com a quebra da autoridade dos governadores sobre essas corporações.

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